Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
LINGUISTIC ; DE LINGUISTIC ; DE š , Š ) *'~\ Obr pub/xcd —' . . Com õ CO/õbdrcão da h rî _ r 14 UNl\/ERSIDADE DE SAO PAULO V vrår °š Reítm-: Prcf. Drr \'\/Aidvr Mur\rzO\Ív ' L EDWORA D.-\ UNWERSIDADE DE SÅO PALLO š Presidente: Prof Dr. Mrro Cdrrnreõ Ferrr { Cxxmxxxx Editorxaîz Presidente: Proí. Dr Mário Curmares Ferr. Vlrxxtrmro de Bîocrêocrs Membros: Prdf. Dr Arutomo Brxto da Corrhõ ~Ir\St\tutO de B:ouëmõSB Proí Dr Carlos da Sw Lõcaz xacmdõde de Medrcšnõï, Pror, Dr Pérsu de Souza Srrroè lESCo\õ Poücecmc e Pro. Dr. Roque ° Sperweer Mõuel de Barros xacmdõde de Educgrw Ši Č š , Š ) *'~\ Obră pub/xcădă —' . . Com õ CO/õbdrăcão da h răğîğ _ r 14 UNl\/ERSIDADE DE SAO PAULO V vrăår °š Reítm-: Prcf. Drr \'\/Aidvr Mur\rzO\Ívă ' L EDWORA D.-\ UNWERSIDADE DE SÅO PALLO š Presidente: Prof Dr. Mărro Cdrrnărāeõ Ferrr { Cxxmăxxăxx Editorxaîz Presidente: Proí. Dr Mário Curmarāes Ferr. Vlrxxtrmro de Bîocrêocrćs Membros: Prdf. Dr Arutomo Brxto da ‛ Corrhõ ~Ir\St\tutO de B:ouëmăõSB Proí Dr Carlos da Săwă Lõcaz xřacmdõde de Medrcšnõï, Pror, Dr Pérsău de Souza Sărrroè lESCo\õ Poücecmcă e Proř. Dr. Roque ° Sperweer Mõuel de Barros xřacmdõde de Educăgārw Ši I CIP-Brasil. Cstalcgxço-na-Fome Câmara Brasileira do Livro, SP Fontæine. `lacqueline. F752c 0 Círculo Lingüísrico de Praga / Iacqueiîne Fontaíne ; u'adu· ção de Ïøãø Pedro Mendes. —- São Paulo : Cultrix : Ed. da Univer» Sidade de São Paulo, 1978. Bibliczgrafia. 1. Círculc Lingüístico de Praga. 2. Língüística [. Títulc. E 784297 CDD410 indices para catálogo Sîstemátiw: 1. Circulo Lingüísticn de Praga : Lingüístíca 410 2. Lingùística 410 I CIP-Brasil. Cstalcgxçāo-na-Fome Câmara Brasileira do Livro, SP Fontæine. `lacqueline. F752c 0 Círculo Lingüísrico de Praga / Iacqueiîne Fontaíne ; u'adu· ção de Ïøãø Pedro Mendes. —- São Paulo : Cultrix : Ed. da Univer» Sidade de São Paulo, 1978. Bibliczgrafia. 1. Círculc Lingüístico de Praga. 2. Língüística [. Títulc. E 784297 CDD410 indices para catálogo Sîstemátiw: 1. Circulo Lingüísticn de Praga : Lingüístíca 410 2. Lingùística 410 JACCJUELINE FONTAINE A %; î Ï î O CIRCULO à LINGUISTICO DE PRAGA † Trduçãø de I JOÃD PEDFIO MENDES [ 1 7 `èrrC\~û< ·:».x%;r; EJÁLSÏA'; 1 EDITORA CULTRIX V São Paulo 7* EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Š :4 JACCJUELINE FONTAINE A %; î Ï î O CIRCULO à LINGUISTICO DE PRAGA † Trăduçãø de I JOÃD PEDFIO MENDES [ 1 7 `èrrC\~û< ·:».ăx%;r;ā EJÁLSÏA'; 1 EDITORA CULTRIX V São Paulo 7* EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Š :4 ý Títulu do original: LE CERCLE LINGUISTIOUE DE FRAGUE L Publicsdu por Maxsøn Mame. Paris © MA\SON MAMB 157A Å MCMLXXVIH Díreîtus de tradução para A língua portuguesa adquiridos com excïush/idade pE\a EDITORA CULTRIX LTDA ` Rua Gønseüweîru Furtsdu, 548. fone 27B—4St1.—O15t1 S. Paulo, SP que as reserva a propriedade Iírerárla desta tradução Impressp no Brasil Prlntwl în Bnzll ý Títulu do original: LE CERCLE LINGUISTIOUE DE FRAGUE L Publicsdu por Maxsøn Mame. Paris © MA\SON MAMB 157A Å MCMLXXVIH Díreîtus de tradução para A língua portuguesa adquiridos com excïush/idade pE\a EDITORA CULTRIX LTDA ` Rua Gønseüweîru Furtsdu, 548. fone 27B—4St1.—O15t1 S. Paulo, SP que as reserva a propriedade Iírerárla desta tradução Impressp no Brasil Prlntwl în Bnzll S U M Á R 1 O _ 1 Capítulc I — Nascïmentc do C.L P .. . . . . .. . 7 Cspíîulo H — 0 Manífesto . . . . . . , . . ., ., 19 capitulo N! 0 C L P. herdexrø de Sõuure ,. . .. 33 cuízuiø N — A Fønuicgm . . .. . .. . . . ., . S7 É capitulo V — OS estudos grmõeuùms . .. .. .. .. 81 Cpituln Vl — O estuda pnétxcn . ,, . , . . . 103 È Cõpítuiù VM Lugr de 0 L P AA hitónõ da Lmgüísnc . .. . ' 115 Ccmclusn ., . ,, ,, 139 Bîhhograhs sumária sobre 0 Círculu Lïngûísîxrm de Praga ....., . 141 Š î à 1 S U M Á R 1 O _ 1 Capítulc I — Nascïmentc do C.L P .. . . . . .. . 7 Cspíîulo H — 0 Manífesto . . . . . . , . . ., ., 19 capitulo N! ―― 0 C L P. herdexrø de Sõuăăure ,. . .. 33 ‛ căuízuiø N — A Fønuicgm . . .. . .. . . . ., . S7 É capitulo V — OS estudos grămõeuùms . .. .. .. .. 81 Căpituln Vl — O estuda pnétxcn . ,, . , . . . 103 È Cõpítuiù VM ― Lugăr de 0 L P AA hiătónõ da Lmgüísncă . .. . ' 115 Ccmclusān ., . ,, ,, 139 Bîhhograhs sumária sobre 0 Círculu Lïngûísîxrm de Praga ....., . 141 Š î à 1 1, 9, 1, 9, ` \ ` 1 1 \ ! Capítulo I à NASCXMENTO DO C. L. P. ` \ Ñ i ` \ ` 1 1 \ ! Capítulo I à NASCXMENTO DO C. L. P. ` \ Ñ i Outubro de 1926 — mais precisamente, a noite de 6 de outubro , é a data comumente aceita do nascimento do Circulo Linguístico de Praga lPražsky Lingvistický Kroužeck), quando \/ilem Nlathesius con- ~ vidou os colegas para uma reunião em seu gabinete da Universidade ` Charles, a fim de ouvirem uma palestra do lingüista alemão H. Bea , cker, que ia falar de um problema especifico de sintaxe —~ a unifor- ' î mização sintática, que ele pensava verificar, luntamente com outros i lingüistas, nas linguas faladas no seio de culturas aparentadas, no caso as línguas da Europa Ocidental, A comunicação de Becker inti- tulava-se: “0 Espírito Europeu da Linguagem". No fim da exposição, travouse aceso e animado debatei É que a esse público, em grande parte constituído por lingüistas formados na escola dos Neogramáti 1 cos, a tese do conferencista podia surgir como nova e audaciosa, l uma reposição em pauta do principio basico dessa escola. que exclui Ï a possibilidade de semelhança sintática explicável por um fator di- verso da filiação lingüística. Declcliram reunir-se dali em diante to- dos os meses, para debater questões análogas, em virtude de todos sentirem a necessidade de prosseguir o debate iniciado na ocasião, A pedido dos participantes, aumentou posteriormente a freqüência de tais reuniões. ' , Para o primeiro congresso internacional dos lingüistas, convoca- Š do para Haia em 1Q2S, Floman Jakobson, que então lecionava em 1 Bratislava, redigiu em outubro de 1927 uma espécie de manifesto Ï expondo suas posições de principio sobre os pontos que lhe pare- } ciam capitais na teoria lingüística e, em especial, onológica. Esse texto constituía resposta a uma das questões levantadas pelo comitê do congresso, vindo depois a ser consignado nas Atas desse mesmo i congresso, R, Jakobson submeteu a proposta a dois colegas russos, È como ele emigrados da União Soviética. os quais a subscreveram ` com suas assinaturas: Nicolai Trubetzkoy o principe Trubetzkoy, i como se dizia em Praga —, encarregado de curso em Viena, e Serge Karcevsky, professor em Genebra, onde fora aluno de Ferdinand de Saussure. Fol esse manifesto, que depois N, Trubetzkoy modestamen - te ciiamou de "pequeno programa declarativo", que deu origem a 9 Outubro de 1926 — mais precisamente, a noite de 6 de outubro , ― é a data comumente aceita do nascimento do Circulo Linguístico de Praga lPražsky Lingvistický Kroužeck), quando \/ilem Nlathesius con- ~ vidou os colegas para uma reunião em seu gabinete da Universidade ` Charles, a fim de ouvirem uma palestra do lingüista alemão H. Bea , cker, que ia falar de um problema especifico de sintaxe —~ a unifor- ' î mização sintática, que ele pensava verificar, luntamente com outros i lingüistas, nas linguas faladas no seio de culturas aparentadas, no caso as línguas da Europa Ocidental, A comunicação de Becker inti- tulava-se: “0 Espírito Europeu da Linguagem". No fim da exposição, travou―se aceso e animado debatei É que a esse público, em grande parte constituído por lingüistas formados na escola dos Neogramáti 1 cos, a tese do conferencista podia surgir como nova e audaciosa, l uma reposição em pauta do principio basico dessa escola. que exclui Ï a possibilidade de semelhança sintáticaexplicável por um fator di- verso da filiação lingüística. Declcliram reunir-se dali em diante to- dos os meses, para debater questões análogas, em virtude de todos sentirem a necessidade de prosseguir o debate iniciado na ocasião, A pedido dos participantes, aumentou posteriormente a freqüência de tais reuniões. ' , Para o primeiro congresso internacional dos lingüistas, convoca- Š do para Haia em 1Q2S, Floman Jakobson, que então lecionava em 1 Bratislava, redigiu em outubro de 1927 uma espécie de manifesto Ï expondo suas posições de principio sobre os pontos que lhe pare- } ciam capitais na teoria lingüística e, em especial, řonológica. Esse texto constituía resposta a uma das questões levantadas pelo comitê do congresso, vindo depois a ser consignado nas Atas desse mesmo i congresso, R, Jakobson submeteu a proposta a dois colegas russos, È como ele emigrados da União Soviética. os quais a subscreveram ` com suas assinaturas: Nicolai Trubetzkoy ― o principe Trubetzkoy, i como se dizia em Praga —, encarregado de curso em Viena, e Serge Karcevsky, professor em Genebra, onde fora aluno de Ferdinand de Saussure. Fol esse manifesto, que depois N, Trubetzkoy modestamen― - te ciiamou de "pequeno programa declarativo", que deu origem a 9 todo 0 movimento lingüístico de Praga Seu incentivador foi incon- testavelmente Fl. Jakobson, que redigiu com certo calor essas breves paginas, em seguida apresentadas por ele a aprovação de seus co- legas russos. Ouem era, nessa época, R, Jakohson? Na Rússia, fora ele 0 animador do Circulo Lingtiistico de Moscou (MOskovskii iingvîsti- eskij kružckl, fundado em 1915 pelos estudantes da universidade de Moscou que se interessavam pela Linguistica e pelas tradições populares. Para evitar a curiosidade da policia, o Círculo filiara-se a , comissão de dialefologia, por sua vez dependente da Academia das — Ciências. 0 Círculo de Mcscou, segundo o relatório de suas ativida- des elaborado por G. I. Vlnokur, tinha como objetivo “elucidar os problemas lingüísticos da língua corrente e da língua poética, bem como questões de tradições populares e Etnologia", O Circulo defi· nia seu trabalho como sendo pesquisa de laboratório. OS métodos de estudo eram elaborados mediante "pesquisa coletiva" Em 1924, o Clrculo foi dissolvido, após uma atividade de cerca de dez anos. fértil em discussões e confrontos atinentes aos métodos de analise lingülstica a utilizar no estudo da linguagem poética. Realizaramse intercâmbios de pontos de vista entre teóricos e poetas, em que participaram os maiores poetas, como V. Niaiakovski, B. Pasternack e O. Nlandelchtam. infelizmente. devido as dificuldades econômicas e técnicas da época, a maior parte dos estudos que ali se fizeram não foi publicada]. A vocação fundamentai inicial de Fl. Jakobson foi O estudo da linguagem poética, Foi a Poetica que levou Jakobson à Lingüística, Tal vocaçao não foi desmentida ao longo de toda a sua carreira cien- tífica. Em 1962, escrevia ele: "a poesia de Khlebnikov tornou-se lema da minha primeira 'confrontação` com a analise da linguagem em seus meios e funções, um ensaio impresso em Praga no início de 1921, mas escrito e discutido quase dois anos antes. em nosso Cír— 1 culo Lmgulstico de li/loscou," Foi precisamente a indagação sobre a linguagem poetisa que motivou o interesse de Jakooson pela FonO— iogia: ‘A textura fónica nada tem a ver com os sons, e sim com os fonemas, isto e, com representações acústicas suscetíveis de ser associadas as representações semânticas` [Ensain acerca de KhIe bnikov. 1921]. Graças ao apoio de V. Mathesius, o qual, segundo O testemunho de Jakobson, estava desde 192D a par da atividade do ` 1 ct, Jakobson tll. "Un exemple de mrgrafion de termes et de medeies .nst1tut1onnels“. in Tel ûuel. 41. 1910. 10 todo 0 movimento lingüístico de Praga Seu incentivador foi incon- testavelmente Fl. Jakobson, que redigiu com certo calor essas breves paginas, em seguida apresentadas por ele a aprovação de seus co- legas russos. Ouem era, nessa época, R, Jakohson? Na Rússia, fora ele 0 animador do Circulo Lingtiistico de Moscou (MOskovskii iingvîsti- českij kružckl, fundado em 1915 pelos estudantes da universidade de Moscou que se interessavam pela Linguistica e pelas tradições populares. Para evitar a curiosidade da policia, o Círculo filiara-se a , comissão de dialefologia, por sua vez dependente da Academia das — Ciências. 0 Círculo de Mcscou, segundo o relatório de suas ativida- des elaborado por G. I. Vlnokur, tinha como objetivo “elucidar os problemas lingüísticos da língua corrente e da língua poética, bem como questões de tradições populares e Etnologia", O Circulo defi· nia seu trabalho como sendo pesquisa de laboratório. OS métodos de estudo eram elaborados mediante "pesquisa coletiva" Em 1924, o Clrculo foi dissolvido, após uma atividade de cerca de dez anos. fértil em discussões e confrontos atinentes aos métodos de analise lingülstica a utilizar no estudo da linguagem poética. Realizaramse intercâmbios de pontos de vista entre teóricos e poetas, em que participaram os maiores poetas, como V. Niaiakovski, B. Pasternack e O. Nlandelchtam. infelizmente. devido as dificuldades econômicas e técnicas da época, a maior parte dos estudos que ali se fizeram não foi publicada]. A vocação fundamentai inicial de Fl. Jakobson foi O estudo da linguagem poética, Foi a Poetica que levou Jakobson à Lingüística, Tal vocaçao não foi desmentida ao longo de toda a sua carreira cien- tífica. Em 1962, escrevia ele: "a poesia de Khlebnikov tornou-se lema da minha primeira 'confrontação` com a analise da linguagem em seus meios e funções, um ensaio impresso em Praga no início de 1921, mas escrito e discutido quase dois anos antes. em nosso Cír— 1 culo Lmgulstico de li/loscou," Foi precisamente a indagação sobre a linguagem poetisa que motivou o interesse de Jakooson pela FonO— iogia: ‛‘A textura fónica nada tem a ver com os sons, e sim com os fonemas, isto e, com representações acústicas suscetíveis de ser associadas as representações semânticas‛` [Ensain acerca de KhIe― bnikov. 1921]. Graças ao apoio de V. Mathesius, o qual, segundo O testemunho de Jakobson, estava desde 192D a par da atividade do ` 1 ct, Jakobson třll. "Un exemple de mrgrafion de termes et de medeies .nst1tut1onnels“. in Tel ûuel. 41. 1910. 10 > l Círculo de Mosoou e possivelmente desejaria lançar um empreendi- [ mento análogo na Tchescoslováquia. manteve-se no seio do Circulo ~ de Praga a preocupação de dar relevo ao estudo poético entre os Ï estudos geralmente lingüísticos — o que veio e ter certa influência sobre o desenvolvimento do pensamento teórico: podemos até di· ~ zer que, para alguns estudiosos de Praga, em primeiro lugar para Jakobson, a investigação lingüística estava organicamente ligada ao estudo poético. Cumpre, aliás, notar que o setor da Lingüística geral mais estudado em Praga foi o da Fonologia, cujo interesse em Poéti oa é imediato, visto possuir um campo de utilização muito amplo nesse domínio. 0 apadrinhamento poético manifestou-se na própria forma dada` _ ; à redação da Proposiço para o Congresso de Haia; seu tom evoca V 0 de um manifesto, incisivo e peremptório, afirmando posições que l sabemos não poder ser aceitas pelos demais especialistas. Ela po l deria ser colocada na linha da tradição dos manifestos poéticos que 1 floresceram um pouco por toda a parte na Europa no começo do ` século e, particularmente, na Flússia. O texto dessa Proposição foi reformulado, ampliado, submetido à discussão dos membros do Cîrculo e. sob o nome de “Tese do Gírculo de Praga”, publicado no primeiro volume dos Trahalhos do ` Circulo [Travau× du Cerclei. 1 A redação das Teses é de um tom moderado; tem simplesmente * o caráter de um programa que deve surgir como podendo servir de \ texto que reunisse lingüistas de convicções vizinhas. Contudohpor 1 mais moderada que nos pareça a forma revestidapelas escolhas fei- tas pelos russos e seus amigos de Praga, ela rompia com os hábitos ¿ e provocou algum rumor entre os lingüistas. B. Malmberg faz-se eco ` da irritação de alguns: “~Muitos se chocaram pelo zelo e intolerância ` com que os fonologistas avançavam suas opiniões. e objetavam que os princípios básicos não eram bastante originais para motivar tai 1 atitude entre os adeptos da nova escola" (LeS nouvelles tendances \ de la Iinguistique, 1962, trad. fr. de 1966. p. 131"]. 1 O segundo lingüista russo que assinara a Proposiço de Haia 1 era N. Trubetzkoy. Ouem era ele? Um sábio lingüista que se intores~ 1 sare desde os treze anos de idade pela Etnografia e pelos folclores ~ russo e tino-úgrico: encetara uma carreira comum de filólogo, bem ' Malmherg, senti, Au Novos Íeudncixs da Llngniuux. companhia Edltors Nacional, São Paulo. teu. 2: exi.. p. 117. 11 È ` > l Círculo de Mosoou e possivelmente desejaria lançar um empreendi- [ mento análogo na Tchescoslováquia. manteve-se no seio do Circulo ~ de Praga a preocupação de dar relevo ao estudo poético entre os Ï estudos geralmente lingüísticos — o que veio e ter certa influência sobre o desenvolvimento do pensamento teórico: podemos até di· ~ zer que, para alguns estudiosos de Praga, em primeiro lugar para Jakobson, a investigação lingüística estava organicamente ligada ao estudo poético. Cumpre, aliás, notar que o setor da Lingüística geral mais estudado em Praga foi o da Fonologia, cujo interesse em Poéti oa é imediato, visto possuir um campo de utilização muito amplo nesse domínio. 0 apadrinhamento poético manifestou-se na própria forma dada` _ ; à redação da Proposiçāo para o Congresso de Haia; seu tom evoca V 0 de um manifesto, incisivo e peremptório, afirmando posições que l sabemos não poder ser aceitas pelos demais especialistas. Ela po l deria ser colocada na linha da tradição dos manifestos poéticos que 1 floresceram um pouco por toda a parte na Europa no começo do ` século e, particularmente, na Flússia. O texto dessa Proposição foi reformulado, ampliado, submetido à discussão dos membros do Cîrculo e. sob o nome de “Tese do Gírculo de Praga”, publicado no primeiro volume dos Trahalhos do ` Circulo [Travau× du Cerclei. 1 A redação das Teses é de um tom moderado; tem simplesmente * o caráter de um programa que deve surgir como podendo servir de \ texto que reunisse lingüistas de convicções vizinhas. Contudohpor 1 mais moderada que nos pareça a forma revestida pelas escolhas fei- tas pelos russos e seus amigos de Praga, ela rompia com os hábitos ¿ e provocou algum rumor entre os lingüistas. B. Malmberg faz-se eco ` da irritação de alguns: “~Muitos se chocaram pelo zelo e intolerância ` com que os fonologistas avançavam suas opiniões. e objetavam que os princípios básicos não eram bastante originais para motivar tai 1 atitude entre os adeptos da nova escola" ‛(LeS nouvelles tendances \ de la Iinguistique, 1962, trad. fr. de 1966. p. 131"]. 1 O segundo lingüista russo que assinara a Proposiçāo de Haia 1 era N. Trubetzkoy. Ouem era ele? Um sábio lingüista que se intores~ 1 sare desde os treze anos de idade pela Etnografia e pelos folclores ~ russo e tino-úgrico: encetara uma carreira comum de filólogo, bem ' Malmherg, senti, Au Novos Íeudăncixs da Llngniăuux. companhia Edltors Nacional, São Paulo. teu. 2: exi.. p. 117. 11 È ` notado na Universidade de Moscou após um estagio em Leipzlg em 1913, cenáculo do pensamento neogramãtico. A Revolução de 1517 . perturbou violentamente o curso dessa carreira. Em 1920, vemOio em Sófia, como “encarregado de curso de Filologia eslava, com direito a ministrar cursos de Lingüística comparada". segundo ele próprio escreve na autobiografia que teve de redigir para os Arquivos da Academia de Viena, da qual foi eleito membro em 1930. Desde o outono de 1922 ocupava a cadeira de Filologia eslava na Univer- sidade de Viena, graças ao eslavista Jagi, que reconhecera sua alta competência. _ ' Em sua autobiografia, Trubetzkoy relata um acontecimento que parece haver influido em sua biografia intelectual: em 1915, foi pu- blicada a obra cujo título traduzido em português e Esboço do Periq- do mais Antigo da História da Língua Russa, do célebre eslavista A. A. Saxmatov, que nela tentava fazer a síntese de suas pesquisas aplicando o método de reconstrução do seu mestre F. F. Fortunatov. chefe da Escola de Moscou. Trubetzkoy, então com vinte anos de idade, apresentou numa sessão da comissão de dialetologia uma aná- lise Crítica minuciosa do livro. A exposição — diz Trubetzkoy “te- ve o efeito de uma bomba", pois era o primeiro ataque a onipotência da escola de Fortunatov em I\/Ioscou. Os jovens lingtiistas tomaram o partido de Trubetzkoy; alguns dedicaram—se, como foi o caso do próprio Trubetzkoy, ã pesquisa de um novo método de reconstrução. A indagação dos princípios de análise lingüística sempre esteve, por tanto, no primeiro plano da atividade científica de Trubetzkoy. Era já pela preocupação do método que Trubetzkoy explicava sua inscrição como aluno na seção de Lingüistica da Llniversidade de l\/loscou: “Jã naquela época eu estava persuadido de que a Linguística era o único ramo das ciências humanas que possuía um método científico positivo", tendo os outros ramos -— Etnografia e História das reli- giões permanecido, de acordo com suas próprias palavras, em “nivel alquimico". Foi sobre o pano de fundo dessa decepção sofrida em relação a doutrina dos neogramaticos e seus herdeiros que Trubetzkoy rece- beu uma carta de Jakobson, em fins de 1926, que propunha preencher “o fosso contranatura entre a analise slncrônica e a ‘fonética nisto- rica' do ponto de vista do sistema global". Ate então, o “historia· dor" Trubetzkoy seguira com interesse a reflexão lingüística sobre os estados das iinguas contemporâneas, mas de algum modo a se- guira de fora, pois não percebera a possibilidade de conciliar os pontos de vista sincronico e diacrônico numa mesma perspectiva. Trubetzkoy ficou desconcertado: mas logo manifestou sua concordân- 12 notado na Universidade de Moscou após um estagio em Leipzlg em 1913, cenáculo do pensamento neogramãtico. A Revolução de 1517 . perturbou violentamente o curso dessa carreira. Em 1920, vemOio em Sófia, como “encarregado de curso de Filologia eslava, com direito a ministrar cursos de Lingüística comparada". segundo ele próprio escreve na autobiografia que teve de redigir para os Arquivos da Academia de Viena, da qual foi eleito membro em 1930. Desde o outono de 1922 ocupava a cadeira de Filologia eslava na Univer- sidade de Viena, graças ao eslavista Jagič, que reconhecera sua alta competência. _ ' Em sua autobiografia, Trubetzkoy relata um acontecimento que parece haver influido em sua biografia intelectual: em 1915, foi pu- blicada a obra cujo título traduzido em português e Esboço do Periq- do mais Antigo da História da Língua Russa, do célebre eslavista A. A. Saxmatov, que nela tentava fazer a síntese de suas pesquisas aplicando o método de reconstrução do seu mestre F. F. Fortunatov. chefe da Escola de Moscou. Trubetzkoy, então com vinte anos de idade, apresentou numa sessão da comissão de dialetologia uma aná- lise Crítica minuciosa do livro. A exposição — diz Trubetzkoy ― “te- ve o efeito de uma bomba", pois era o primeiro ataque a onipotência da escola de Fortunatov em I\/Ioscou. Os jovens lingtiistas tomaram o partido de Trubetzkoy; alguns dedicaram—se, como foi o caso do próprio Trubetzkoy, ã pesquisa de um novo método de reconstrução. A indagação dos princípios de análise lingüística sempre esteve, por tanto, no primeiro plano da atividade científica de Trubetzkoy. Era já pela preocupação do método que Trubetzkoy explicava sua inscrição como aluno na seção de Lingüistica da Llniversidade de l\/loscou: “Jã naquela época eu estava persuadido de que a Linguística era o único ramo das ciências humanas que possuía um métodocientífico positivo", tendo os outros ramos -— Etnografia e História das reli- giões ― permanecido, de acordo com suas próprias palavras, em “nivel alquimico". ‛ Foi sobre o pano de fundo dessa decepção sofrida em relação a doutrina dos neogramaticos e seus herdeiros que Trubetzkoy rece- beu uma carta de Jakobson, em fins de 1926, que propunha preencher “o fosso contranatura entre a analise slncrônica e a ‘fonética nisto- rica' do ponto de vista do sistema global". Ate então, o “historia· dor" Trubetzkoy seguira com interesse a reflexão lingüística sobre os estados das iinguas contemporâneas, mas de algum modo a se- ‛ guira de fora, pois não percebera a possibilidade de conciliar os pontos de vista sincronico e diacrônico numa mesma perspectiva. Trubetzkoy ficou desconcertado: mas logo manifestou sua concordân- 12 ‘ cia: “O caráter logico da evolução da língua e um corolário do fato { de que a língua constitui um sistema" {carta a Fi. Jakobson, de de- zembro de 1926). Essa a razão por que ele subscreveu, ao lado de Jakobson, a Proposfcao ao Congresso de Haia, O terceiro signatário era S Karcevski, Esiudara em Genebra, onde seguira as lëçoes de F de Saussure. do qual se considerava A discipulo. R, Jakobson relata como Karoevski. em 1917 em li/loscou, de volta de Genebra, informava seus colegas da doutrina de Saus- sure, e com que atenção era ouvido, quando na Universidade reinava grande atração pela Psicologia e pela Linguistica sob um fundo de Fenomenologia e de Semiologia nascente. Embora participasse da atividade do Círculo de Praga S Karcevski, na época da Proposiçao, » « continuava a exercer suas funções em Genebra ‘ i E notável que três russos emigrados tenham estado na origem de . um novo questionamento da Lingilistica e, simbolicamente graças a — Proposição de Haia. sido os arautos da nova ciência. Oue motivação ; poderia impeli-los a escolher tal caminho? Sentiram eles. testemu- nhas da Fievoiuco, a necessidade de explorar uma camada estável. permanente. universal. que sofreu a Historia como u'ma invariante? iam eles atrás do sonho de reconstituir um mundo a partir da estaca zero. ou sela, pela da língua? Em todo caso, esta fora de dtlvida que a conjuntura histórica desempenhou importante papel em seus es- V piritos. , Se foi o russo Jakobson o inspirador do Círculo, seu criador foi o tcheco V. iviathesius. Era um "organizador de gênio", segundo , o testemunho de Jakobson. Soube encontrar os meios de fazer viver — o Círculo, estimulando a pesquisa com a oferta de possibilidades de * numerosos e diversos encontros, apelando em especial a pesquisa- dores diversos dos lingilistas, a nacionalidades diversas da tcheca ou da eslovaca. Graças a ele. Praga transformou-se numa tribuna onde expuseram suas idêias lingüistas tão diferentes como Hjeimslev. Bloomfield ou Jones, por exemplo. Em torno de Mathesius achavam-se os seus dois alunos B. Trnka e J. Vachek, assim como B. Havránek, J, Mukaovský, K. Hora- iek, V Sl<aiil<a, L. Novak, î\/i. Weingart [que mais raras rompeu com o C.l. P.) e J. lvi. Koinek — todos tchecos ou eslovacos, Havránek e Koinek haviam sido estudantes iunto a 1. Zubatý, lingüista critico ` dos pontos de vista "mecanisias' dos neogramáticos i Participaram igualmente da atividade do grupo o neerlandês Ar ` W. De Grootr o iuguslavo A Beli, o polonês W. Doroszewski. os , franceses l.. Tesniere e L, Brun, depois A. Martinet e E. Eenveniste, ` o austríaco l<. Bühler e muitos outros ia § ‘ cia: “O caráter logico da evolução da língua e um corolário do fato { de que a língua constitui um sistema" {carta a Fi. Jakobson, de de- ‛ zembro de 1926). Essa a razão por que ele subscreveu, ao lado de Jakobson, a Proposfcao ao Congresso de Haia, O terceiro signatário era S Karcevski, Esiudara em Genebra, onde seguira as lëçoes de F de Saussure. do qual se considerava A discipulo. R, Jakobson relata como Karoevski. em 1917 em li/loscou, de volta de Genebra, informava seus colegas da doutrina de Saus- sure, e com que atenção era ouvido, quando na Universidade reinava grande atração pela Psicologia e pela Linguistica sob um fundo de Fenomenologia e de Semiologia nascente. Embora participasse da atividade do Círculo de Praga S Karcevski, na época da Proposiçao, » « continuava a exercer suas funções em Genebra ‘ i E notável que três russos emigrados tenham estado na origem de . um novo questionamento da Lingilistica e, simbolicamente graças a — Proposição de Haia. sido os arautos da nova ciência. Oue motivação ; poderia impeli-los a escolher tal caminho? Sentiram eles. testemu- nhas da Fievoiucāo, a necessidade de explorar uma camada estável. permanente. universal. que sofreu a Historia como u'ma invariante? iam eles atrás do sonho de reconstituir um mundo a partir da estaca zero. ou sela, pela da língua? Em todo caso, esta fora de dtlvida que a conjuntura histórica desempenhou importante papel em seus es- V piritos. , Se foi o russo Jakobson o inspirador do Círculo, seu criador ğ foi o tcheco V. iviathesius. Era um "organizador de gênio", segundo , o testemunho de Jakobson. Soube encontrar os meios de fazer viver — o Círculo, estimulando a pesquisa com a oferta de possibilidades de * numerosos e diversos encontros, apelando em especial a pesquisa- dores diversos dos lingilistas, a nacionalidades diversas da tcheca ou da eslovaca. Graças a ele. Praga transformou-se numa tribuna onde expuseram suas idêias lingüistas tão diferentes como Hjeimslev. Bloomfield ou Jones, por exemplo. Em torno de Mathesius achavam-se os seus dois alunos B. Trnka e J. Vachek, assim como B. Havránek, J, Mukařovský, K. Hora- iek, V Sl<aiičl<a, L. Novak, î\/i. Weingart [que mais raras rompeu com o C.l. P.) e J. lvi. Kořinek — todos tchecos ou eslovacos, Havránek e Kořinek haviam sido estudantes iunto a 1. Zubatý, lingüista critico ` dos pontos de vista "mecanisias'‛ dos neogramáticos i Participaram igualmente da atividade do grupo o neerlandês Ar ` W. De Grootr o iuguslavo A Belič, o polonês W. Doroszewski. os , franceses l.. Tesniere e L, Brun, depois A. Martinet e E. Eenveniste, ` o austríaco l<. Bühler e muitos outros ia § 0 Circulo Lingüístico de Praga fez editar, de 1929 a 1939, oito volumes de Trabalhos redigidos em francês, alemão ou inglês. Publi- cava em tcheco uma revista. Slovo a slovesnost [MOrte e Arte das ' Palavras), que começou a sair em 1935. Além dísso, eramvpublicados ' no Anuãrio da Universidade, seção de filologia moderna (CaSopic pro moderni filologiii, recensões das comunicações apresentadas no Círculo. . 0 termino da atividade do C.L.P. foi marcado pelo surgimento do último volume dos Trabalhosg coincidiu com o advento da guerra, a morte de Trubetzkoy em 1938 e a fuga de Jakobson para a Dinæ marca. Após a guerra, os membros do Círculo de Praga mal tiveram tempo de publicar a Compilaço de Bratislava, um volume de mis- celãneas em homenagem a l<oi'inel< [1948], redigido com preocupa- ções bem afins das do período clássico do C.L,P., quando a Lingüís tica tcheca estava submetida as tributações ideológicas importadas da União Soviética. Desde então, os lingüistas de Praga tentaram reatar com a tradição do C.L.P. e, em 1966. deram início à publica- ção de novos Trabalhos denominados Trabalhos Língüístîcos de Pra- ga [T.L.P.). Ciual a situação de Praga quando foi criado o C,P.L.? Oue terreno possibilitou a eclosão de tal empreendimento? “/-\ marca do universo tcheco-eslovaco esta em sua situação na encruzilhada de culturas diferentes”, afirmou Jakobson numa pales- tra sobre o trabalho da Escola de Praga ~lCopenhague, 1936, trad. francesa in Change, 3, 1969]. Com efeito, Praga está numa situação geográfica propícia aos intercâmbios com a Áustria, a Alemanha; a Hungria e a Suíça, situação essa que a história política e cultural ainda contribui para tornar mais propícia: a Tcheco~Eslováquia é a plata- forma giratória da Europa central. O período quevai de 1780 a 1848 é chamado período do Desper tar nacional. Em países tchecos sob dominação dos Habsburgos, ele `~ foi marcado pelo ressurgimento da língua e literatura tchecas, obra daqueles que alguém já denominou "DespertadoreS" [Boditelel. Es- tes, apoiandose na classe popular essencialmente camponesa. portanto , empreenderam urna autêntica reconstrução da língua tcheca, extremamente ameaçada em regiões onde a germanização ia muito avançada. O combate foi travado em nome de uma ideolo- gia pan—esIavista. Na Eslovaquía, por outro lado, sob dominação do reino da Hungria, a primeira tarefa do Despertar nacional consistiu em criar uma língua escrita independente, a partir de um dos dia- letos. Apos alguns decênios de vicissitudes políticas acompanhadas 1/1 0 Circulo Lingüístico de Praga fez editar, de 1929 a 1939, oito volumes de Trabalhos redigidos em francês, alemão ou inglês. Publi- cava em tcheco uma revista. Slovo a slovesnost [MOrte e Arte das ' Palavras), que começou a sair em 1935. Além dísso, eramvpublicados ' no Anuãrio da Universidade, seção de filologia moderna (CaSopic pro moderni filologiii, recensões das comunicações apresentadas no Círculo. . 0 termino da atividade do C.L.P. foi marcado pelo surgimento do último volume dos Trabalhosg coincidiu com o advento da guerra, a morte de Trubetzkoy em 1938 e a fuga de Jakobson para a Dinæ marca. Após a guerra, os membros do Círculo de Praga mal tiveram tempo de publicar a Compilaçāo de Bratislava, um volume de mis- celãneas em homenagem a l<oi'inel< [1948], redigido com preocupa- ções bem afins das do período clássico do C.L,P., quando a Lingüís tica tcheca estava submetida as tributações ideológicas importadas da União Soviética. Desde então, os lingüistas de Praga tentaram reatar com a tradição do C.L.P. e, em 1966. deram início à publica- ção de novos Trabalhos denominados Trabalhos Língüístîcos de Pra- ga [T.L.P.). Ciual a situação de Praga quando foi criado o C,P.L.? Oue terreno possibilitou a eclosão de tal empreendimento? “/-\ marca do universo tcheco-eslovaco esta em sua situação na encruzilhada de culturas diferentes”, afirmou Jakobson numa pales- tra sobre o trabalho da Escola de Praga ~lCopenhague, 1936, trad. francesa in Change, 3, 1969]. Com efeito, Praga está numa situação geográfica propícia aos intercâmbios com a Áustria, a Alemanha; a Hungria e a Suíça, situação essa que a história política e cultural ainda contribui para tornar mais propícia: a Tcheco~Eslováquia é a plata- forma giratória da Europa central. O período que vai de 1780 a 1848 é chamado período do Desper tar nacional. Em países tchecos sob dominação dos Habsburgos, ele `~ foi marcado pelo ressurgimento da língua e literatura tchecas, obra daqueles que alguém já denominou "DespertadoreS" [Boditelel. Es- tes, apoiandose na classe popular ― essencialmente camponesa. portanto ―, empreenderam urna autêntica reconstrução da língua tcheca, extremamente ameaçada em regiões onde a germanização ia muito avançada. O combate foi travado em nome de uma ideolo- gia pan—esIavista. Na Eslovaquía, por outro lado, sob dominação do reino da Hungria, a primeira tarefa do Despertar nacional consistiu em criar uma língua escrita independente, a partir de um dos dia- letos. Apos alguns decênios de vicissitudes políticas acompanhadas 1/1 do renascimento das culturas nacionais, deuse o desmembramento da AuStriaHungria e a proclamação, em 28 de outubro de 1918, da República em Praga, logo depois da proclamação da união dos tche- cos e eslovacos em um só Estado. Foi nomeado presidente provisório da Republica um dos principais artifices do Fienascimento tcheco desde 1880, Thonias-Garrigue l\/lasar;/l<. Aluno de F Brentano, amigo de Husseri e de N/Iarty, l\/iasaryk era, desde 1882, professor de Filo- sofia na Universidade tcheca de Praga, depois de têlo sido em Viena. A influência de l\/lasaryk não podia deixar de incentivar a discussão linguistlca. Ele próprio, num texto amiúde citado pelos in- tegrantes do Circulo de Praga — Princípius de Lógica Concreta {Zak- Iadové kronkretné logiky, Praga, 1885] — traduzido para o alemão no ano seguinte, se pronunciara a favor de uma clara distinção entre estudo estético e estudo histórico da Ilngua. “Fiealista" (do nome do partido político que ele promovera), hostil ao nacionalismo emo~ cional e às manifestações de chauvinismo, ele contribuiu, com a aluda do boernista Jan Gebauer, para desmascarar a fraude dos ma nuscritos do Kralove Dvïir e da Zelena Hora, fragmentos "achados", no início do século Xl><, de uma epopéia escrita em tcheco antigo, Eis como Jan Mukarovský apresenta a situação de Praga na época da fundação do C.L.P.: “Depois da primeira guerra mundial, nasceu um forte élan cultural da derrocada austro-húngara. O império. o Es- tado austro-húngaro. era um muro que nos separava do resto do mun- do" [entrevista de J. Aiiukaovský, in Change, 3, 196,9l. A que língua de cultura universal se iria fazer apelo para servir de traço de união com o “mundo" com o qual se restabelecia contactoî A língua alemã ficaria reduzida. por motivos óbvios, a um papel de comodi- dade; o mundo anglo-saxônio, não obstante os vinculos pessoais de lvlasaryk com ele, parecia muito distante; a orientação foi para a Franca, onde O novo governo tcheco, particularmente na pessoa de Eenes, colaborador de ivlasaryk, possuia amizades e que. ainda na época, era símbolo de liberdade e cultura. Os Trabalhos do Círculc de Praga foram, pois, com muita freqüência redigidos em francês, da mesma forma que as intervenções dos seus membros nos diferentes congressos. Foi igualmente em francês que se redigiram as Teses. internacionalmente aberto. 0 C.L.P, também o era no plano da informação cultural. O Circulo tornou-se lugar de encontro para os lingüistas e alguns representantes da vanguarda literária tcheca, co- mo V. Nezval, K. Teige e L. Vanura, No Gírculo de Praga, como no Circulo de Moscou. estavam amalgamados o estudo da língua e a pratica da linguagem literãria, poética. Era a retornada de uma tra- ÍS do renascimento das culturas nacionais, deuse o desmembramento da AuStriaHungria e a proclamação, em 28 de outubro de 1918, da República em Praga, logo depois da proclamação da união dos tche- cos e eslovacos em um só Estado. Foi nomeado presidente provisório da Republica um dos principais artifices do Fienascimento tcheco desde 1880, Thonias-Garrigue l\/lasar;/l<. Aluno de F Brentano, amigo de Husseri e de N/Iarty, l\/iasaryk era, desde 1882, professor de Filo- sofia na Universidade tcheca de Praga, depois de têlo sido em Viena. A influência de l\/lasaryk não podia deixar de incentivar a discussão linguistlca. Ele próprio, num texto amiúde citado pelos in- tegrantes do Circulo de Praga — Princípius de Lógica Concreta {Zak- Iadové kronkretné logiky, Praga, 1885] — traduzido para o alemão no ano seguinte, se pronunciara a favor de uma clara distinção entre estudo estético e estudo histórico da Ilngua. “Fiealista" (do nome do partido político que ele promovera), hostil ao nacionalismo emo~ cional e às manifestações de chauvinismo, ele contribuiu, com a aluda do boernista Jan Gebauer, para desmascarar a fraude dos ma― nuscritos do Kralove Dvïir e da Zelena Hora, fragmentos "achados", no início do século Xl><, de uma epopéia escrita em tcheco antigo, Eis como Jan Mukarovský apresenta a situação de Praga na época da fundação do C.L.P.: “Depois da primeira guerra mundial, nasceu um forte élan cultural da derrocada austro-húngara. O império. o Es- tado austro-húngaro. era um muro que nos separava do resto do mun- do" [entrevista de J. Aiiukařovský, in Change, 3, 196,9l. A que língua de cultura universal se iria fazer apelo para servir de traço de união com o “mundo" com o qual se restabelecia contactoî A língua alemã ficaria reduzida. por motivos óbvios, a um papel de comodi- dade; o mundo anglo-saxônio, não obstante os vinculos pessoaisde lvlasaryk com ele, parecia muito distante; a orientação foi para a Franca, onde O novo governo tcheco, particularmente na pessoa de Eenes, colaborador de ivlasaryk, possuia amizades e que. ainda na época, era símbolo de liberdade e cultura. Os Trabalhos do Círculc de Praga foram, pois, com muita freqüência redigidos em francês, da mesma forma que as intervenções dos seus membros nos diferentes congressos. Foi igualmente em francês que se redigiram as Teses. internacionalmente aberto. 0 C.L.P, também o era no plano da informação cultural. O Circulo tornou-se lugar de encontro para os lingüistas e alguns representantes da vanguarda literária tcheca, co- mo V. Nezval, K. Teige e L. Vančura, No Gírculo de Praga, como no Circulo de Moscou. estavam amalgamados o estudo da língua e a pratica da linguagem literãria, poética. Era a retornada de uma tra- ÍS diço instaurada pelos russos da década de 20. Em compensação, não se estabelecera um vínculo com a vanguarda oientifica. ao passo , que, em Copenhague, eram estreitos os contaotos entre cientistas e ‘ lingüistas. 0 neopositivismo do Circulo de Viena interessava os lin- güistas de Praga: segundo o testemunho de R. Jakobson. estes convi- daram, em 1935, Fi. Carnap a vir expor suas idéias acerca da lingua- gem, Por outro lado, sabe-se que o interesse por um estudo da Iin . guagem do ponto de vista da lógica aproximava, por exemplo, Fi. Jakobson do lingüista dinamarquês V. Bröndal. }` Praga era assim o lugar em que, por diversas razões — históri- ’ cas, culturais, conjugadas com intenções individuais [em primeiro lugar a de li/lathesius), que souberam acolher a iniciativa e dar-lhe os meios para se desenvolver —, deviam ganhar corpo uma certa reflexão e uma certa atividade lingüísticas. A flexibilidade da fórmula de organização favoreceu o debate de idéias; segundo l\/lukaovský. “a condição única necessária para ingresso no Círculo era apresen- tar um trabalho discutido em comum /. . ./ em cada sessão. depois de exposto qualquer trabalho, era norma a discussão oral" [entre- vista de J. l\/lukaovský, in Change, 3, 1969). Jakobson, por seu turno, insiste no caráter “independente e não-convencional" do C.L.P.: as primeiras reuniões tiveram lugar no gabinete de li/Iathesius na Uni- versidade Charles, ou na residência de um dos membros, depois nas salas de conferências da Universidade, para mais tarde, fugindo a tentação de acaclemismo, serem escolhidos os salões reservados dos bares de Praga (c. "Un exemple de migration de termes“, in Tel Ouel, 41, 1970i. O trabalho em grupo, com discussões regulares nes- sa associação livre, encorajava o debate de idéias, que eram novas para a maioria dos lingüistas que aí se reuniam. Cada um tinha a sensação de que caira a barreira que até ali o mantivera numa espé- cie de compartimento sem abertura para o exterior, de gueto. Deste modo, vários trabalhos dão a impressão de haver sido redigidos num t certo clima de arrebatamento filosófico: tornara-se possível expri- mir-se sobre determinados assuntos que antes eram considerados tabus. Já uma primeira “oiência humana". a Psicologia. com a Gestal!- theorie se libertara dessa dependência rotineira da experimentação, questionando as bases do seu estudor Ela não podia deixar de servir de referência a nova Lingüistica. Para além da Gestaltpsychologie, a ' referencia ao pensamento de l-iusserl — de quem Nlathesius fora aluno-ouvinte —— paira, frouxa, todavia presente. sobre a reflexão dos estudiosos de Praga. iß diçāo instaurada pelos russos da década de 20. Em compensação, não se estabelecera um vínculo com a vanguarda oientifica. ao passo , que, em Copenhague, eram estreitos os contaotos entre cientistas e ‘ lingüistas. 0 neopositivismo do Circulo de Viena interessava os lin- güistas de Praga: segundo o testemunho de R. Jakobson. estes convi- daram, em 1935, Fi. Carnap a vir expor suas idéias acerca da lingua- gem, Por outro lado, sabe-se que o interesse por um estudo da Iin― . guagem do ponto de vista da lógica aproximava, por exemplo, Fi. Jakobson do lingüista dinamarquês V. Bröndal. }` Praga era assim o lugar em que, por diversas razões — históri- ’ cas, culturais, conjugadas com intenções individuais [em primeiro lugar a de li/lathesius), que souberam acolher a iniciativa e dar-lhe os meios para se desenvolver —, deviam ganhar corpo uma certa reflexão e uma certa atividade lingüísticas. A flexibilidade da fórmula de organização favoreceu o debate de idéias; segundo l\/lukařovský. “a condição única necessária para ingresso no Círculo era apresen- tar um trabalho discutido em comum /. . ./ em cada sessão. depois de exposto qualquer trabalho, era norma a discussão oral" [entre- vista de J. l\/lukařovský, in Change, 3, 1969). Jakobson, por seu turno, insiste no caráter “independente e não-convencional" do C.L.P.: as primeiras reuniões tiveram lugar no gabinete de li/Iathesius na Uni- versidade Charles, ou na residência de um dos membros, depois nas salas de conferências da Universidade, para mais tarde, fugindo a tentação de acaclemismo, serem escolhidos os salões reservados dos bares de Praga (cř. "Un exemple de migration de termes“, in Tel Ouel, 41, 1970i. O trabalho em grupo, com discussões regulares nes- sa associação livre, encorajava o debate de idéias, que eram novas para a maioria dos lingüistas que aí se reuniam. Cada um tinha a sensação de que caira a barreira que até ali o mantivera numa espé- cie de compartimento sem abertura para o exterior, de gueto. Deste modo, vários trabalhos dão a impressão de haver sido redigidos num t certo clima de arrebatamento filosófico: tornara-se possível expri- mir-se sobre determinados assuntos que antes eram considerados tabus. Já uma primeira “oiência humana". a Psicologia. com a Gestal!- theorie se libertara dessa dependência rotineira da experimentação, questionando as bases do seu estudor Ela não podia deixar de servir de referência a nova Lingüistica. Para além da Gestaltpsychologie, a ' referencia ao pensamento de l-iusserl — de quem Nlathesius fora aluno-ouvinte —— paira, frouxa, todavia presente. sobre a reflexão dos estudiosos de Praga. iß A emulação científica e uma certa íamiliaridade com o pensa- ` mento filosófico contemporâneo, sobretudo 0 da fenomenologia hus- serliana. ia conhecida no Circulo de Ívloscou, contribuíram para gerar um clima de ažividade e criatividade, do qual Trubetzkoy iria conser- var emocionada lembrança: numa carta endereçada a V. l\/laîhesius a propósito do décimo anîversario do Circulo de Praga, escreve: "As diversas etapas do desenvolvimento do Circulo de Praga que com ele vivi retornam a minna memória i.. ' Todas essas recordações estão associadas em meu espirito a um maravilhoso sentimento de excitação pois a todo contacto com o Circulo de Praga eu experi- mentava um novo arroubo de alegria criadora. que sempre acabava por entorpecer-se durante o meu trabalho solitário longe de Praga.l` A manifestação do C.L.P que meîor agitação provocou foi a da 7 Reunião Fonologica internacional, realizada em Praga ern dezembro de 1930. O objetivo era preparar o Congresso dos Lingüistas de Ge- nebra, em 1931. Fora O C.l..P. que, em seu nome, convocara a Fšeu- nião. Participaram cerca de vinte linguistas tchecos e russos, bem como estudiosos vindos do exterior. entre os quais A. Sommereit, l<. Buhler, J. \/an Ginneken, A W De Groot, W. Doroszewski e A. Eeii. No final da Reunião, foi decidida a criação de uma Associaço internacional de Fonologša, sendo eleito N. Trubetzkoy para seu pre- sidente. A Reunião foi inteiramente consagrada a Fonologia, As con- tribuições dos membros do Círculc de Praga ficaram consignadas no volume l\/ dos T.C.L.P. [1931). No suplemento desse volume apare- ` ceram os dois proletos ["Terminologia Fonologica F’adronizada"· e "Transcriço Fonologica"] que haviam sido elaborados ern Cornurn pe- los membros do Clrculo e publzcados aposter sido "inserido no texto certo número de correções propostas por Bally, Brun e Tes- niere". correspondentes do Circulo. A Reunião de Fonologia foi opor- . tunidede para numerosos debates e intercâmbios com lingüistas que trabalhavam noutros países: E. Saoir e W. F. Tvvadell nos Estados Uni- dos, A. Meillet em Paris Alguns excertos de cartas recentemente publicados por A. lvlertinet [in La Linguistique, l, 1967} dão uma idéia do movimento que se fez, a partir dessa eooca, em torno do C.L.P. e de Trubetzkoy. Este explica a Sapir que a participação da América na Assoclação pode ser de grande valia para os lingüistas de Praga, ainda relativamente isolados no concerto europeu dos lingüistas. Eie cita a tradicional Revue des Etudes Slaves de Paris como `orgo de combate contra a Fonolcgia` e da esta explicação: “Se quisermos achar uma razão para O surgimento e o êxito da Fonologia em dife~ rentes países, podemos dizer que ela prospera melhor nos locais 17 ` l A emulação científica e uma certa íamiliaridade com o pensa- ` mento filosófico contemporâneo, sobretudo 0 da fenomenologia hus- serliana. ia conhecida no Circulo de Ívloscou, contribuíram para gerar um clima de ažividade e criatividade, do qual Trubetzkoy iria conser- var emocionada lembrança: numa carta endereçada a V. l\/laîhesius a propósito do décimo anîversario do Circulo de Praga, escreve: "As diversas etapas do desenvolvimento do Circulo de Praga que com ele vivi retornam a minna memória i.. ' Todas essas recordações estão associadas em meu espirito a um maravilhoso sentimento de excitação pois a todo contacto com o Circulo de Praga eu experi- mentava um novo arroubo de alegria criadora. que sempre acabava por entorpecer-se durante o meu trabalho solitário longe de Praga.l` A manifestação do C.L.P que meîor agitação provocou foi a da 7 Reunião Fonologica internacional, realizada em Praga ern dezembro de 1930. O objetivo era preparar o Congresso dos Lingüistas de Ge- nebra, em 1931. Fora O C.l..P. que, em seu nome, convocara a Fšeu- nião. Participaram cerca de vinte linguistas tchecos e russos, bem como estudiosos vindos do exterior. entre os quais A. Sommerřeit, l<. Buhler, J. \/an Ginneken, A W De Groot, W. Doroszewski e A. Eeiić. No final da Reunião, foi decidida a criação de uma Associaçāo internacional de Fonologša, sendo eleito N. Trubetzkoy para seu pre- sidente. A Reunião foi inteiramente consagrada a Fonologia, As con- tribuições dos membros do Círculc de Praga ficaram consignadas no volume l\/ dos T.C.L.P. [1931). No suplemento desse volume apare- ` ceram os dois proletos ["Terminologia Fonologica F’adronizada"· e "Transcriçāo Fonologica"] que haviam sido elaborados ern Cornurn pe- los membros do Clrculo e publzcados apos ter sido "inserido no texto certo número de correções propostas por Bally, Brun e Tes- niere". correspondentes do Circulo. A Reunião de Fonologia foi opor- . tunidede para numerosos debates e intercâmbios com lingüistas que trabalhavam noutros países: E. Saoir e W. F. Tvvadell nos Estados Uni- dos, A. Meillet em Paris Alguns excertos de cartas recentemente publicados por A. lvlertinet [in La Linguistique, l, 1967} dão uma idéia do movimento que se fez, a partir dessa eooca, em torno do C.L.P. e de Trubetzkoy. Este explica a Sapir que a participação da América na Assoclação pode ser de grande valia para os lingüistas de Praga, ainda relativamente isolados no concerto europeu dos lingüistas. Eie cita a tradicional Revue des Etudes Slaves de Paris como `‛orgāo de combate contra a Fonolcgia`‛ e da esta explicação: “Se quisermos achar uma razão para O surgimento e o êxito da Fonologia em dife~ rentes países, podemos dizer que ela prospera melhor nos locais 17 ` l onde é débil a tradição neogramatica, ou onde foi rejeitada por uma geração por motivos precisos” [carta a H. Lindrofn, de 1531]. i Em 1938. numa carta a A. Martinet, Trubetzkoy comunicava sua impressão de que a Fonologia ainda não se impusera entre os lln- güistas: “O programa preliminar do Congresso de Gand que recebl há cerca de dois meses mostre que os fonologistas terão que lutar nesse Congresso com grande número de adversários? Foi a partir da convocação da Reunião fonológica de 1930 que o Circulo de Praga obteve audiência internacional. Seus membros manitestaram-se no primeiro Congresso das Ciências Foneticas de Amsterdã de 1932, onde pela primeira vez foi usada a expressão 'Escola de Praga”, e mais tarde no terceiro Congresso dos Lír\güis~ ias de Roma, em 1933. Em 1935, realizouse O segundo Congressodas Ciências Fonéticas em Londres e apareceu a revista do Círculo [SIOvc a sIoveSnost); em 1936. o quarto Congresso dos Lirtgüistas em Copenhague, onde Trubetzkoy verificou os progressos feitos pela Fonologia entre os jovens lingüistas: "Pe|a vez primeira em Cope- nhague, tornouse claro que não apenas ocupamos postos de van- guarda, mas também que somos seguidos pelos jovens formados pelos nossos escritos, podendo trabalhar de forma independente` (carta de outubro de 1936). 0 tema da luta com vistas a promover a idéia nova da FonoIo— gia entre os lingüistas acompanha toda a atividade dos estudiosos de Praga, partlcularmente de Trubetzkoy. As dificuldades materiais por este experimentadas para criar a Associação internacional de Fonologia são como que o eco da dificuldade encontrada para difun dir as novas idéias fora de Pragai. Alvo dos ataques e das críticas mais ou menos competentes, Trubetzkoy sempre se sentiu firme na obrigação de assegurar as bases da análise fonológica o que O induziu a concentrar-se sobre esse aspecto da língua. quiçá a superestimado; em todo caso. devido iï à sua própria limitação, a explorá-lo no plano da metodologia, assim como no da prática lingüística. r. cr. “Extraits de la eorrapandsnce de N. S. íroubetzl<Oy' par Claue Hsgaae. in \.x ltngustiqua. iss7, 1. 18 onde é débil a tradição neogramatica, ou onde foi rejeitada por uma geração por motivos precisos” [carta a H. Lindrofn, de 1531]. i Em 1938. numa carta a A. Martinet, Trubetzkoy comunicava sua impressão de que a Fonologia ainda não se impusera entre os lln- güistas: “O programa preliminar do Congresso de Gand que recebl há cerca de dois meses mostre que os fonologistas terão que lutar nesse Congresso com grande número de adversários? Foi a partir da convocação da Reunião fonológica de 1930 que o Circulo de Praga obteve audiência internacional. Seus membros manitestaram-se no primeiro Congresso das Ciências Foneticas de Amsterdã de 1932, onde pela primeira vez foi usada a expressão 'Escola de Praga”, e mais tarde no terceiro Congresso dos Lír\güis~ ias de Roma, em 1933. Em 1935, realizouse O segundo Congressodas Ciências Fonéticas em Londres e apareceu a revista do Círculo [SIOvc a sIoveSnost); em 1936. o quarto Congresso dos Lirtgüistas em Copenhague, onde Trubetzkoy verificou os progressos feitos pela Fonologia entre os jovens lingüistas: "Pe|a vez primeira em Cope- nhague, tornouse claro que não apenas ocupamos postos de van- guarda, mas também que somos seguidos pelos jovens formados pelos nossos escritos, podendo trabalhar de forma independente` (carta de outubro de 1936). 0 tema da luta com vistas a promover a idéia nova da FonoIo— gia entre os lingüistas acompanha toda a atividade dos estudiosos de Praga, partlcularmente de Trubetzkoy. As dificuldades materiais por este experimentadas para criar a Associação internacional de Fonologia são como que o eco da dificuldade encontrada para difun― dir as novas idéias fora de Pragai. Alvo dos ataques e das críticas mais ou menos competentes, Trubetzkoy sempre se sentiu firme na obrigação de assegurar as bases da análise fonológica ― o que O induziu a concentrar-se sobre esse aspecto da língua. quiçá a superestimado; em todo caso. devido iï à sua própria limitação, a explorá-lo no plano da metodologia, assim como no da prática lingüística. r. cr. “Extraits de la eorraăpandsncede N. S. ‛íroubetzl<Oy' par Clauće Hsgaae. in \.x ltngustiqua. iss7, 1. 18 Capítulo II 0 MANIFESTO Capítulo II 0 MANIFESTO Acabamos de examinar as circunstancias historicas, culturais e filosóficas que serviram de pano de fundo ao surgimento do Círculo Lingüistico de Praga, A historia da Lingüistica possui a vantagem de ter ao seu dispor, além dos diversos escritos assinados pelos mem- bros do Círculo, em sua maioria já publicados nos oito volumes dos. Trabalhos que foram saindo de 1929 a 1939 em Praga (em abreviatura ' T.C.L.P.], mas também na revista Slovo a slovesnost e em coleções particulares, a mais importante das quais foi a miscelênia em home- nagem a V, l\/Iathesius [ChSriSteria Guilelmo Mathesio quinquagene- rio a discipulis et circuli lingvistiei pragensis sodalibus oblata, Pra- gae, 1932], sem contar o que foi escrito fora de Praga por uns e por outros. o texto do manifesto do grupo conhecido pelo nome de Teses do Círculo Lingüístico de Praga. Essas Teses, em sua redação defini- tiva, são, portanto, obra coletiva e, por isso mesmo, marcadas por um tom de compromisso muito sensível, que pode, em determina- dos passos, tornar o texto dificilmente compreensivel: em tais casos, e necessário recorrer aos escritos individuais, onde o desenvolvi- mento das idéias segue um curso mais fácil de rastrear. 0 texto das Teses foi discutido e redigido pelo comitê do Cir- culo, então integrado por V, Nlathesius. R. Jakobson, J Mukaiovský e B. Trnka, com base em esboços que haviam sido elaborados por di- versos membros do Círculo. Em 1969. quarenta anos mais tarde, Fl. Jakobson fornecia as seguintes indicações sobre os autores de tais esboços icf. Change, 3): o texto da primeira tese foi preparado por V. Mathesius e R. Jakobson: na segunda tese o concernente ao aspecto fònico da língua e aquele que, na terceira tese, evoca as funções da Iingua foram elaborados por Fi. Jakobson; o trecho sobre a língua literária, na terceira tese, foi apresentado por B. Havranek, ao passo que, nesta mesma tese, o texto sobre a língua poética foi preparado, em colaboração, por J. lvlukaovský e Fi. Jakobson; a tese número quatro, sobre os "Problemas Atuais do Eslavo de igreja", foi obra do russo Durnovo: o texto da tese Sete. sobre os "Problemas Eslavos Reiativos a um Atlas Lingüístico, Sobretudo LexiCal`, e o da tese oito, acerca dos ‘Problemas de lvletodo da Lexicografia Eslava", foram elaborados por N, Trubetzkoy. 21 Acabamos de examinar as circunstancias historicas, culturais e filosóficas que serviram de pano de fundo ao surgimento do Círculo Lingüistico de Praga, A historia da Lingüistica possui a vantagem de ter ao seu dispor, além dos diversos escritos assinados pelos mem- bros do Círculo, em sua maioria já publicados nos oito volumes dos. Trabalhos que foram saindo de 1929 a 1939 em Praga (em abreviatura ' T.C.L.P.], mas também na revista Slovo a slovesnost e em coleções particulares, a mais importante das quais foi a miscelênia em home- nagem a V, l\/Iathesius [ChSriSteria Guilelmo Mathesio quinquagene- rio a discipulis et circuli lingvistiei pragensis sodalibus oblata, Pra- gae, 1932], sem contar o que foi escrito fora de Praga por uns e por outros. o texto do manifesto do grupo conhecido pelo nome de Teses do Círculo Lingüístico de Praga. Essas Teses, em sua redação defini- tiva, são, portanto, obra coletiva e, por isso mesmo, marcadas por um tom de compromisso muito sensível, que pode, em determina- dos passos, tornar o texto dificilmente compreensivel: em tais casos, e necessário recorrer aos escritos individuais, onde o desenvolvi- mento das idéias segue um curso mais fácil de rastrear. 0 texto das Teses foi discutido e redigido pelo comitê do Cir- culo, então integrado por V, Nlathesius. R. Jakobson, J Mukaiovský e B. Trnka, com base em esboços que haviam sido elaborados por di- versos membros do Círculo. Em 1969. quarenta anos mais tarde, Fl. Jakobson fornecia as seguintes indicações sobre os autores de tais esboços icf. Change, 3): o texto da primeira tese foi preparado por V. Mathesius e R. Jakobson: na segunda tese o concernente ao aspecto fònico da língua e aquele que, na terceira tese, evoca as funções da Iingua foram elaborados por Fi. Jakobson; o trecho sobre a língua literária, na terceira tese, foi apresentado por B. Havranek, ao passo que, nesta mesma tese, o texto sobre a língua poética foi preparado, em colaboração, por J. lvlukařovský e Fi. Jakobson; a tese número quatro, sobre os "Problemas Atuais do Eslavo de igreja", foi obra do russo Durnovo: o texto da tese Sete. sobre os "Problemas Eslavos Reiativos a um Atlas Lingüístico, Sobretudo LexiCal`‛, e o da tese oito, acerca dos ‘‛Problemas de lvletodo da Lexicografia Eslava", foram elaborados por N, Trubetzkoy. 21 0 texto das nove teses representava o programa do C.L.P. ao qual se era obrigado a aderir para tornar-se membro do Círculo. Como à manifesto do novo grupo, foi apresentado ao Congresso dos filólogos eslavos em Praga. em outubro de 1929, e proposto a debate nesse mesmo congresso. Um ano antes, no primeiro congresso internacional dos lingüis- tas em Haia, a proposição intitulada “Ouais os Nlétodos mais Ade- quados a Uma Exposição Completa e Prática da Fonologia de Guai- quer Língua?”, redigida por R. Jakobson, depois subscrita por S. Kar- ¿ cevski e N. Trubetzkoy, fora igualmente submetida a reflexão dos membros do congresso. Esse primeiro texto, mais curto e incisivo que O segundo, constitui referência necessária à compreensão das Teses do C.LJP, no que diz respeito aos trechos sobre Fonologia. ~Em que bases teóricas e metodológicas entraram em acordo os membros do Círculo provindos de horizontes geográficos e filosóficos diversos? Esfa pergunta será respondida pelo exame das Teses, que são em número de nove, das quais apenas três reterão aqui nossa atenção, por debaterem problemas de Iinguística geral, enquanto as seis restantes abordam problemas concernentes a Eslavística - es- pecialidade da maioria dos membros do Círculo - aliás considera- dos dependentes das posições expressas nas três primeiras teses. As Teses estão redigidas em francês, como já dissemos. A primeira tem este título: “Froblemas de Método Decorrentes da Concepção de Lingua Como Sistema e importância da Fleferida Concepção Para as Línguas Eslavasf A língua deve ser concebida como um “sistema funcional"Ï Ela possui caráter de finalidade como os demais produtos da atividade humana, quer dizer. os meios por ela utilizados o são em vista de um fim. “A língua é um sistema de meios de expressão adequados a um objetivo? Tal objetivo pode ser a comunicação ou a expressão, Em ambos os casos, a intenção do locutor apresenta-se como a ex- 4 plicação “mais natural" em análise lingüística: essa intenção do lo- cutor e que fundamenta o discurso. Como complemento do aspecto funcional da língua, surge seu aspecto sistemático: “Não se pode compreender um único fato lin- güístico sem referi|o ao sistema ao qual pertencef De qual estado de língua é possível dar conta com mais sucesso e comodidade? De um estado de língua atual, por ser o único a “ofe ' recer materiais completos cuja percepção direta e impossível ter". Foi V. Nlathesius quem se expressou com mais insistência sobre a prioridade do estudo sincrônico em qualquer pesquisa lingüística. 0 22 0 texto das nove teses representava o programa do C.L.P. ao qual se era obrigado a aderir para tornar-se membro do Círculo. Como à manifesto do novo grupo, foi apresentado ao Congresso dos filólogos eslavos em Praga. em outubro de 1929, e proposto a debate nesse mesmo congresso. Um ano antes, no primeiro congresso internacional dos lingüis- tas em Haia, a proposição intitulada “Ouais os Nlétodos mais Ade- quados a Uma Exposição Completa e Prática da Fonologia de Guai- quer Língua?”, redigida por R. Jakobson, depois subscrita por S. Kar- ¿ cevski e N. Trubetzkoy,fora igualmente submetida a reflexão dos membros do congresso. Esse primeiro texto, mais curto e incisivo que O segundo, constitui referência necessária à compreensão das Teses do C.LJP, no que diz respeito aos trechos sobre Fonologia. ~Em que bases teóricas e metodológicas entraram em acordo os membros do Círculo provindos de horizontes geográficos e filosóficos diversos? Esfa pergunta será respondida pelo exame das Teses, que são em número de nove, das quais apenas três reterão aqui nossa atenção, por debaterem problemas de Iinguística geral, enquanto as seis restantes abordam problemas concernentes a Eslavística - es- pecialidade da maioria dos membros do Círculo - aliás considera- dos dependentes das posições expressas nas três primeiras teses. As Teses estão redigidas em francês, como já dissemos. A primeira tem este título: “Froblemas de Método Decorrentes da Concepção de Lingua Como Sistema e importância da Fleferida Concepção Para as Línguas Eslavasf A língua deve ser concebida como um “sistema funcional"Ï Ela possui caráter de finalidade como os demais produtos da atividade humana, quer dizer. os meios por ela utilizados o são em vista de um fim. “A língua é um sistema de meios de expressão adequados a um objetivo? Tal objetivo pode ser a comunicação ou a expressão, Em ambos os casos, a intenção do locutor apresenta-se como a ex- 4 plicação “mais natural" em análise lingüística: essa intenção do lo- cutor e que fundamenta o discurso. Como complemento do aspecto funcional da língua, surge seu aspecto sistemático: “Não se pode compreender um único fato lin- güístico sem referi|o ao sistema ao qual pertencef De qual estado de língua é possível dar conta com mais sucesso e comodidade? De um estado de língua atual, por ser o único a “ofe ' recer materiais completos cuja percepção direta e impossível ter". Foi V. Nlathesius quem se expressou com mais insistência sobre a prioridade do estudo sincrônico em qualquer pesquisa lingüística. 0 22 l l recurso à “percepção direta', à introspecção, é proposto como ar- . gumento de comodidade: que referência melhor podia ter o lingüista , do que a dada pela sua percepção da língua? Porem, ele é igualmente É compelido por uma preocupação filosófica: a consciência lingüís- l tica é o lugar onde se funda a análise lingüística [Matheslus fora ouvinte de Husserl). Não é somente no plano sincrõnico, isto é, no plano da língua atual, que a concepção da língua como sistema correspondente a uma função deve prevalecer, também quando o pesquisador se dedique a estudar os estados passados da língua, “quer se trate de reconstruí- los, quer de verificar-lhes a evOlução”. . Com efeito, as mudanças sofridas pela língua não podem ser` ‘ consideradas “ataques destruidores lançados ao acaso, independen- temente uns dos outros": isso seria incompatível com a concepção de língua como sistema. Se houver mudança, o sistema é necessaria- mente afetado. Contudo, a redação do texto apresenta neste ponto certa atenuação: “as mudanças lingüísticas visam freqüentemente o sistema", 0 advérbio “freqüentemente” representa um compromisso: vários membros do C.L.P. e, em particular, B. Trnka do comitê — e inclusive N. Trubetzkoy — contestavam a fatalidade “absoluta' da incidência de uma alteração lingüística sobre o sistemas Por outro lado, uma vez que a língua foi analisada como respondendo essen- cialmente a uma função, o sistema lingüístico, submetido a mudança, é envolvido num processo de perpétuo remanejamento a fim de manter essa funcionalidade, num esforço incansável de estabilização (princípio de teleologia e “motivaço terapêutica" das mudanças lin- güísticas), “A questão que se impõe cada vez mais ao lingüista, em lugar da tradicional questão das causas, e a da finalidade de um acontecimento fonético" [Froposiçãc ao Gongresso de Haia, 1927). E, portanto, uma certa concepção determinista que aqui se expõe. Em outro sentido, trazse um esclarecimento à noção de sincro nia, anteriormente definida mediante referência à consciência lin- güísrica: a descrição Sincrõnica não pode “excluir em absoluto a noção de evolucão”, pois em qualquer estado da língua coexistem elementos tidos como produtivos, no estagio considerado, e outros sentidos como arcaísmos, sobreviventes de um estado mais antigo da língua. Fazer esta distinção introduz na analise sincrônica dos “fatos de diacroníaï Desta forma. sincronia e diacronia são tributárias uma da outra, surgindo numa relação dialética. 23 l l recurso à “percepção direta', à introspecção, é proposto como ar- . gumento de comodidade: que referência melhor podia ter o lingüista , do que a dada pela sua percepção da língua? Porem, ele é igualmente É compelido por uma preocupação filosófica: a consciência lingüís- l tica é o lugar onde se funda a análise lingüística [Matheslus fora ‛ ouvinte de Husserl). Não é somente no plano sincrõnico, isto é, no plano da língua atual, que a concepção da língua como sistema correspondente a uma função deve prevalecer, também quando o pesquisador se dedique a estudar os estados passados da língua, “quer se trate de reconstruí- los, quer de verificar-lhes a evOlução”. . Com efeito, as mudanças sofridas pela língua não podem ser` ‘ consideradas “ataques destruidores lançados ao acaso, independen- temente uns dos outros": isso seria incompatível com a concepção de língua como sistema. Se houver mudança, o sistema é necessaria- mente afetado. Contudo, a redação do texto apresenta neste ponto certa atenuação: “as mudanças lingüísticas visam freqüentemente o sistema", 0 advérbio “freqüentemente” representa um compromisso: vários membros do C.L.P. e, em particular, B. Trnka do comitê — e inclusive N. Trubetzkoy — contestavam a fatalidade “absoluta' da incidência de uma alteração lingüística sobre o sistemas Por outro lado, uma vez que a língua foi analisada como respondendo essen- cialmente a uma função, o sistema lingüístico, submetido a mudança, é envolvido num processo de perpétuo remanejamento a fim de manter essa funcionalidade, num esforço incansável de estabilização (princípio de teleologia e “motivaçāo terapêutica" das mudanças lin- güísticas), “A questão que se impõe cada vez mais ao lingüista, em lugar da tradicional questão das causas, e a da finalidade de um acontecimento fonético" [Froposiçãc ao Gongresso de Haia, 1927). E, portanto, uma certa concepção determinista que aqui se expõe. Em outro sentido, trazse um esclarecimento à noção de sincro nia, anteriormente definida mediante referência à consciência lin- güísrica: a descrição Sincrõnica não pode “excluir em absoluto a noção de evolucão”, pois em qualquer estado da língua coexistem elementos tidos como produtivos, no estagio considerado, e outros sentidos como arcaísmos, sobreviventes de um estado mais antigo da língua. Fazer esta distinção introduz na analise sincrônica dos “fatos de diacroníaï Desta forma. sincronia e diacronia são tributárias uma da outra, surgindo numa relação dialética. 23 Depois de ter tratado da concepção de língua como “sistema funcional' e das relações entre sincronia e diacronia, a primeira tese A aborda um ponto importante da metodologia lingüística dos membros do Circulo de Praga: a utilização do método comparativo. Ate então, o método comparativo fora apenas empregado numa perspectiva ge- netica, “em busca do patrimônio comum", pelos lingüistas que rece- beram a denominação de comparatistas e por seus sucessores. Do- ravante, esse método servirá para fazer surgir as leis de estrutura dos sistemas lingüísticos, podendo a comparação analítica ser estu- ( dada tanto entre línguas não-aparentadas, muito dessemelhantes, · quanto entre línguas estreitamente aparentadas como as eslavas. que apresentam “diferenças profundas sobre uma base de semelhan- ças essenciais e numerosas? O objetivo final do método de comparação analítica e constituir uma tipologia de todas as línguas,começando pelas línguas eslavas. Na opinião de V. Matheeius, trata-se de uma justificativa filosófica da investigação lingüística: comparar os meios postos em ação pelas diferentes línguas, para responder as necessidades da comunicação e, desta forma, atingir o conhecimento da linguagem. Ao nível de cada língua. Mathesius propõe, desde o Congresso de Haia, a orga- nização hierárquica dos traços distintivos numa “caraCterologia", o que implica uma unidade necessária na descrição não apenas fono- Iógica, mas também gramatical, lexicológica, etc. É a distinção entre “parentescO de origem ou Consangiiineidade" e “parentesco adquirido ou afinidade" (as expressões são de ~Fl. Ja- kobsoni que permite a Trubetzkoy agrupar as línguas segundo ‘dois tipos: famílias [Sprachfamilien) de fundo gramatical e lexical comum e alianças [Sprachbiinde] que apresentem semelhanças notáveis em suas estruturas sintática. morfológica e fonológica. Mathesius insis- tirá amiúde no parentesco adquirido do inglês moderno com o fran- cês e de seu relativo afastamento do alemão. li 0 método de comparação estrutural aplicado a evolução das lín- guas eslavas permitirá revelar algumas leis de solidariedade entre fatos que serão chamados de convergentes e fatos que serão cha- mados de divergentes, que anteriormente surgem como tendo um “carãter fortuito e episódico'. As tendências evolutivas das diver- sas línguas eslavas poderão em seguida ser confrontadas com as das línguas geograficamente vizinhas, fino-úgricas ou balcânicas não ; 1. cvi S. Tmka. wiexncde de ao-nparaism analytique ex grammaire compares nisrariquai ir- \'. c. L. F.. i, luza. 24 Depois de ter tratado da concepção de língua como “sistema funcional' e das relações entre sincronia e diacronia, a primeira tese A aborda um ponto importante da metodologia lingüística dos membros do Circulo de Praga: a utilização do método comparativo. Ate então, o método comparativo fora apenas empregado numa perspectiva ge- netica, “em busca do patrimônio comum", pelos lingüistas que rece- beram a denominação de comparatistas e por seus sucessores. Do- ravante, esse método servirá para fazer surgir as leis de estrutura dos sistemas lingüísticos, podendo a comparação analítica ser estu- ( dada tanto entre línguas não-aparentadas, muito dessemelhantes, · quanto entre línguas estreitamente aparentadas como as eslavas. que apresentam “diferenças profundas sobre uma base de semelhan- ças essenciais e numerosas? O objetivo final do método de comparação analítica e constituir uma tipologia de todas as línguas, começando pelas línguas eslavas. Na opinião de V. Matheeius, trata-se de uma justificativa filosófica da investigação lingüística: comparar os meios postos em ação pelas diferentes línguas, para responder as necessidades da comunicação e, desta forma, atingir o conhecimento da linguagem. Ao nível de cada língua. Mathesius propõe, desde o Congresso de Haia, a orga- nização hierárquica dos traços distintivos numa “caraCterologia", o que implica uma unidade necessária na descrição não apenas fono- Iógica, mas também gramatical, lexicológica, etc. É a distinção entre “parentescO de origem ou Consangiiineidade" e “parentesco adquirido ou afinidade" (as expressões são de ~Fl. Ja- kobsoni que permite a Trubetzkoy agrupar as línguas segundo ‘dois tipos: famílias [Sprachfamilien) de fundo gramatical e lexical comum e alianças [Sprachbiinde] que apresentem semelhanças notáveis em suas estruturas sintática. morfológica e fonológica. Mathesius insis- tirá amiúde no parentesco adquirido do inglês moderno com o fran- cês e de seu relativo afastamento do alemão. li 0 método de comparação estrutural aplicado a evolução das lín- guas eslavas permitirá revelar algumas leis de solidariedade entre fatos que serão chamados de convergentes e fatos que serão cha- mados de divergentes, que anteriormente surgem como tendo um “carãter fortuito e episódico'. As tendências evolutivas das diver- sas línguas eslavas poderão em seguida ser confrontadas com as das línguas geograficamente vizinhas, fino-úgricas ou balcânicas não ; 1. cvi S. Tmka. wiexncde de ao-nparaisćm analytique ex grammaire compares nisrariquai ir- \'. c. L. F.. i, luza. 24 eslavas, o que possibilitará esclarecer os problemas levantados pe- las “uniões regionais” (por exemplo, o problema da eliminação da declinação na língua búlgara, fato excepcional nas línguas eslavas, fato comum ao conjunto das línguas balcânicas?]. A reconsideração da Lingüistica histórica na perspectiva estru- turalista acima caracterizada implica uma revisão da noção de lei. A lei não e mais, como o era para os neogramáticos, o registro de “fatos produzidos arbitrariamente e ao acaso conquanto realizados com uma regularidade absoluta`; ela torna-se o fundamento da evo- lução do sistema: trata-se de uma nomogênese. Esta nova posição leva a repensar o problema do “desmembrarnento” da língua comum , original, foco de constantes discussões entre os eslavistas prece- “ dentes, Considerar-se-a a existência de uma língua una “na medida em que os dialetos seiam capazes de desenvolver mudanças co- muns”. Se esses dialetos provêm historicamente de uma língua ini- cial única, e problema sem grande interesse. caso se admita a idéia de que o importante e o estudo da evolução dos sistemas lingüísti- cos. Em outras palavras, não se procura mais resolver o problema da língua de origem que subsiste como problema, mas que já não aflora na perspectiva estrutural-funcionalista, que e a dos Praguenses. A segunda tese enuncia as tarefas a abordar pelo estudo de um sistema lingüístico, em particular o do sistema eslavo, do ponto de vista tônico e gramatical. Nas pesquisas sobre o aspecto fônico da língua, e preciso “dis- tinguir o som como fato fisico objetivo, como representação e como elemento do sistema funcional". Deve ser dada prioridade a análise acústica sobre a analise articulatória, “pois é precisamente a ima- gem acústica e não a imagem motora que é visada pelo sujeito fa- lante'. 0 estudo dos fenômenos acústico-motores, estritamente falan- do, não entra nas preocupações do lingüista, visto que tal estudo ig- nora a “funço diferencial de significações” ou função distintiva dos sons que constituem o sistema fonológico. O mesmo acontece com ' as imagens acústico-motoras subjetivas que, enquanto tais, ignoran- tes da referência distintiva, não podem servir de definição aos ele- mentos do sistema. 2. Hevrnek iniciou esta pesquisa sobre as línguas balcânicas iArquavas Neer- iarraesee de Fonética Experimerrrai. ia de setembro de tez:] e Jekalxsorr tratou das línguas da Eurásia no cume congresso de Lirrgnisxice (Atas do congresso de Cu- penhegue, assai 25 eslavas, o que possibilitará esclarecer os problemas levantados pe- las “uniões regionais” (por exemplo, o problema da eliminação da declinação na língua búlgara, fato excepcional nas línguas eslavas, fato comum ao conjunto das línguas balcânicas?]. A reconsideração da Lingüistica histórica na perspectiva estru- turalista acima caracterizada implica uma revisão da noção de lei. A lei não e mais, como o era para os neogramáticos, o registro de “fatos produzidos arbitrariamente e ao acaso ― conquanto realizados com uma regularidade absoluta`; ela torna-se o fundamento da evo- lução do sistema: trata-se de uma nomogênese. Esta nova posição leva a repensar o problema do “desmembrarnento” da língua comum , original, foco de constantes discussões entre os eslavistas prece- “ dentes, Considerar-se-a a existência de uma língua una “na medida em que os dialetos seiam capazes de desenvolver mudanças co- muns”. Se esses dialetos provêm historicamente de uma língua ini- cial única, e problema sem grande interesse. caso se admita a idéia de que o importante e o estudo da evolução dos sistemas lingüísti- cos. Em outras palavras, não se procura mais resolver o problema da língua de origem que subsiste como problema,
Compartilhar