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MA111 - Ca´lculo I Prof. Dr. Ricardo Miranda Martins Esboc¸ando gra´ficos de func¸o˜es diferencia´veis. 1 Roteiro para esboc¸ar gra´ficos Dada uma func¸a˜o g : A→ B, o gra´fico de g e´ definido como o conjunto Gr(g) = {(x, y) ∈ A×B; y = g(x)}, ou seja, Gr(g) e´ um subconjunto de A×B. Em geral, a expressa˜o “gra´fico de g” tambe´m e´ usada para designar a curva t 7→ (t, g(t)) (na verdade, o trac¸o desta curva). Neste texto na˜o faremos distinc¸a˜o entre todas estas nomenclaturas. Mostraremos como utilizar me´todos do ca´lculo diferencial para esboc¸ar gra´ficos de func¸o˜es difer- encia´veis. Uma pergunta natural, neste caso, e´ a seguinte: se hoje em dia e´ ta˜o fa´cil ter acesso a um dispositivo que esboc¸a gra´ficos (como o excelente site http://www.wolframalpha.org/, por exemplo), por qual motivo devemos saber esboc¸ar “na ma˜o” gra´ficos de func¸o˜es? A resposta menos dida´tica para a pergunta acima e´ que isto sera´ cobrado na prova. Outra e´ a histo´ria do navegador e a bu´ssola: mesmo em tempos de GPS, o que acontece se a fonte de energia parar de funcionar? Em todo caso, melhor gastar algum tempo aprendendo a usar cartas na´uticas, orientac¸a˜o por estrelas e ter sempre uma boa bu´ssola. Pore´m, a melhor resposta e´ mais simples: fazer o gra´fico de uma func¸a˜o “no brac¸o” e´ um excelente teste para saber se compreendemos bem os conceitos iniciais do ca´lculo diferencial, ale´m de ser um desafio intelectual bem divertido. Estando convencidos da importaˆncia do assunto, vamos comec¸ar. O roteiro abaixo e´ baseado na refereˆncia [1]. Seja f : D → R uma func¸a˜o definida num domı´nio D. Vamos supor que f e´ de classe C∞ em D, exceto possivelmente em um conjunto finito de pontos de D. 1. O primeiro passo para fazer o esboc¸o do gra´fico de f e´ saber bem como e´ o domı´nio de f . Dada a expressa˜o de f(x), costuma ser fa´cil decidir qual conjunto e´ D. Por exemplo, pontos que anulam o denominador de f na˜o podem estar no domı´nio de f . O mesmo vale para valores de x que tornam negativas as expresso˜es que esta˜o “dentro” de raizes quadradas ou que envolvam logaritmo ou func¸o˜es trigonome´tricas inversas. 2. Para comec¸ar a fazer o esboc¸o, como em geral desenhamos o sistema de eixos coordenados xy, deve-se marcar os pontos de intersec¸a˜o, tanto com o eixo x como o eixo y. 3. Para simplificar a ana´lise ou restringi-la a um certo subconjunto do domı´nio, deve ser analisada a presenc¸a de simetrias no sistema. Por exemplo, se a func¸a˜o for par, ou seja, se para todo x ∈ D for verdade que f(x) = f(−x), enta˜o o gra´fico de f sera´ sime´trico com respeito ao eixo y. Se a func¸a˜o for ı´mpar, ou seja, se para todo x ∈ D tivermos f(x) = −f(−x), o gra´fico sera´ sime´trico com respeito a` origem. Se a func¸a˜o for perio´dica, ou seja, se existir T > 0 tal que f(x) = f(x+ T ) para todo x, enta˜o o gra´fico de f se repetira´ a cada subintervalo de comprimento T . Este passo na˜o e´ exatamente necessa´rio, mas pode simplificar bastante a ana´lise. 4. E´ preciso determinar o comportamento da func¸a˜o quando x→ ±∞; analogamente, e´ preciso saber os valores de a ∈ D para os quais limx→a f(x) = ±∞. Estas sa˜o as ass´ıntotas de f . Como as ass´ıntotas podem variar conforme consideramos limites laterais, devemos calcular: i) para ass´ıntotas horizontais: a curva y = L sera´ uma ass´ıntota horizontal se limx∞ f(x) = L, logo devemos calcular estes dois limites. ii) para ass´ıntotas verticais: a curva x = a sera´ uma ass´ıntota vertical se limx→a± f(x) = ±∞, logo devemos calcular estes quatro limites (os s´ımbolos de ± sa˜o independentes). Obviamente, e´ preciso ter algum bom “chute” de qual valor de a tomaremos para fazer esta conta. Uma boa dica e´ testar os valores que anulam o denominador (no caso de func¸o˜es racionais) ou os valores onde a func¸a˜o na˜o esta´ definida (ou na˜o e´ cont´ınua). 5. Ainda que seja um esboc¸o, o comportamento de crescimento/decrescimento da func¸a˜o deve ser re- speitado no seu desenho. Assim, precisamos saber os intervalos de crescimento e decrescimento da func¸a˜o. No caso de func¸o˜es diferencia´veis, lembre-se de que se f e´ crescente num intervalo I (resp. decrescente) enta˜o f ′ e´ positiva (resp. negativa) neste intervalo. 6. Quando f passa de um comportamento “crescente” para um comportamento “decrescente”, ocorre um ma´ximo local. Devemos encontrar e classificar os pontos de ma´ximo/mı´nimo locais, ou seja, devemos calcular todos os pontos onde f ′(x) = 0 e realizar o teste da derivada segunda neste ponto. Se f ′(a) = 0 e f ′′(a) > 0, enta˜o a e´ um mı´nimo local; se f ′(a) = 0 e f ′′(a) < 0 enta˜o a e´ um ma´ximo local. 7. Mesmo sabendo que a func¸a˜o e´ crescente num intervalo, existem duas formas dela fazer isto: ela pode ser coˆncava para cima (f ′′ > 0) ou coˆncava para baixo (f ′′ < 0). Os pontos de mudanc¸a de concavidade sa˜o chamados ponto de inflexa˜o. 8. Agora basta unir todos os pedac¸os e o esboc¸o do gra´fico estara´ pronto! 2 Exemplos Exemplo 1 Seja f(x) = x2 − 4 (x− 1)(x+ 1) . Vamos esboc¸ar o gra´fico de f . Observe que o domı´nio de f e´ o conjunto R \ {−1, 1}. Para estudarmos a intersec¸a˜o com os eixos, vejamos: • intersec¸a˜o com o eixo x: f(x) = 0⇔ x 2 − 4 (x− 1)(x+ 1) = 0⇒ x = ±2 • intersec¸a˜o com o eixo y: f(0) = 4 Simetrias: Note que f(x) = f(−x), logo a func¸a˜o e´ par. Assim, podemos restringir a ana´lise do gra´fico aos valores positivos de x (dica: func¸o˜es racionais pares so´ envolvem poteˆncias pares, analogamente para func¸o˜es racionais ı´mpares). Para estudarmos as ass´ıntotas, note que limx→±∞ f(x) = 1. Logo, a reta y = 1 e´ uma ass´ıntota horizontal. Candidatos para ass´ıntotas verticais sa˜o as retas x = −1 e x = 1, que anulam o denominador da func¸a˜o. Como limx→−1− f(x) = −∞, limx→−1+ f(x) =∞, limx→1− f(x) =∞, limx→1+ f(x) = −∞, segue que as retas x = ±1 sa˜o ass´ıntotas verticais. Vamos calcular as derivadas de f . Temos f ′(x) = 6 x (x+ 1) 2 (x− 1)2 , f ′′(x) = −6 3x 2 + 1 (x+ 1) 3 (x− 1)3 . Note que f ′(x) = 0⇔ x = 0, logo x = 0 e´ o u´nico ponto cr´ıtico. Como f ′′(0) > 0, este ponto cr´ıtico e´ de mı´nimo. Ale´m disto, f ′(x) > 0 para x > 0 (onde esta´ definido) e f ′(x) < 0 para x < 0 (onde esta´ definido), logo f e´ crescente para valores positivos de x e decrescente para valores negativos de x. Analisando f ′′, vemos que f ′′(x) > 0 para x ∈ (−1, 1) e negativa caso contra´rio. Logo, f e´ coˆncava para cima se x ∈ (−1, 1) e coˆncava para baixo caso contra´rio. Na˜o ha´ pontos de inflexa˜o. Um esboc¸o do gra´fico de f (e das ass´ıntotas verticais) esta´ na figura abaixo: � Exemplo 2 Na figura abaixo vemos os gra´ficos de f ′(x) (azul) e de f ′′(x) (vermelho) (o gra´fico esta´ fora de escala). Sabe-se que o domı´nio de f e´ R \ {0}, que f(±2pi) = ±1/(2pi), que f(−pi) > 0, f(pi) < 0, limx→0− f(x) = −∞ e limx→0+ f(x) =∞. Fac¸a um esboc¸o do gra´fico de f para x ∈ [−2pi, 2pi]. � Exemplo 3 (Exerc´ıcio feito pelo amigo) Fac¸a um esboc¸o do gra´fico de h(x) = (x2+x−3)/(x−1)2. References [1] J. Stewart, Ca´lculo, vol. 1, Cengage Learning.
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