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As Crises de Superprodução

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As Crises de Superprodução6 
Pierre Salama & Jacques Valier 
 
Introdução 
 
l. Revela-se claramente que o desenvolvimento do capitalismo industrial, do século XVIII 
até os nossos dias, foi marcado por uma grande instabilidade: aos períodos de prosperidade e de 
expansão da produção, sucederam-se sempre crises de superprodução, seguidas de depressão (ou de 
―recessão‖) da atividade econômica e de crescimento agudo do desemprego. Desde o início do 
século XIX até a Segunda Guerra Mundial, as fases de prosperidade foram catorze vezes 
acompanhadas por crises gerais de superprodução, as duas últimas sendo a de 1929 e a que explodiu 
em 1938, mas que foi interrompida pela guerra. 
Após a Segunda Guerra Mundial, o fenômeno prosseguiu, embora — por motivos que 
analisaremos em seguida — as crises e as depressões, sem desaparecerem, tenham sido menos 
amplas que no passado: crises em 1948, em 1953, em 1957, etc. 
As fases de prosperidade se caracterizam por um desenvolvimento da produção, ligado 
freqüentemente ao aparecimento de novos escoadouros, provenientes da extensão geográfica da 
produção capitalista (penetração em ambientes não capitalistas, tanto dentro quanto fora das 
fronteiras); do aparecimento de novos setores de produção (estradas de ferro, eletricidade, indústria 
química, indústria nuclear, etc.) ligado ao desenvolvimento do progresso técnico; e, finalmente, às 
bruscas alterações nas relações de concorrência (como, por exemplo, o desaparecimento de um 
concorrente em decorrência de uma guerra). A prosperidade se caracteriza igualmente, em princípio, 
por um desenvolvimento dos investimentos privados, do emprego, das exportações, do crédito, etc. 
As fases de depressão (ou de recessão, tal como são chamadas após 1945 por causa de sua 
menor amplitude) se caracterizam, por sua vez, através de fenômenos inversos: queda da produção 
(ou diminuição no ritmo do aumento), dos investimentos privados, das exportações, crescimento do 
desemprego, etc. 
Notemos, finalmente, que — quanto mais se avançou no século XIX — tanto mais se 
desenvolveu a transmissão internacional dos diversos movimentos, embora o paralelismo não exclua 
importantes diferenças de intensidade de pais para país. 
Por ocasião das crises de superprodução, a tendência à queda da taxa de lucro se 
manifesta na realidade, de modo periódico. A crise, como veremos, caracteriza-se pelo que se 
designa como superacumulação de capital e por uma brusca e intensa queda da taxa média de 
lucro; ao mesmo tempo, todavia, ela cria condições favoráveis a um novo aumento da taxa média de 
lucro. 
 
Seção I — A possibilidade das crises 
 
l. Uma crise econômica se manifesta, via de regra, através de uma interrupção do processo 
normal de desenvolvimento da produção e de uma diminuição da quantidade de mão-de-obra e de 
instrumentos de trabalho utilizados. 
Nas sociedades pré-capitalistas, as crises se apresentavam sob a forma de destruição dos 
próprios produtores ou dos meios de produção, em seguida a catástrofes naturais ou inundações, 
guerras, etc. Essa destruição dos produtores (epidemias) ou dos meios de produção provocava uma 
queda da produção. A crise pré-capitalista, portanto, é uma crise de subprodução de valores-de-
uso, um fenômeno de escassez que ocorre em conseqüência de um desenvolvimento insuficiente da 
produção essencialmente agrícola. 
Coisa absolutamente diversa ocorre no caso das crises capitalistas: a interrupção do 
processo normal de desenvolvimento da produção, a diminuição da quantidade de mão-de-obra e de 
instrumentos de produção utilizados não são causas, mas conseqüências da crise. Por exemplo: 
Na crise pré-capitalista, ocorria: desenvolvimento de uma epidemia, levando à diminuição da 
quantidade de força-de-trabalho utilizada e, desse modo, à crise; 
Na crise capitalista, é porque tem lugar a crise que há diminuição da quantidade de força-de-
trabalho empregada. 
A crise capitalista, com efeito, aparece como uma crise de superprodução de valores-de-
troca: ela se explica, não por uma insuficiência da produção, mas por uma insuficiência da demanda 
solvável de mercadorias. Há um relativo excesso de mercadorias em relação à demanda. Todo ou 
parte do valor-de-troca criado (na produção) não pode ser realizado (através da venda no mercado): 
as mercadorias que valem c + v + m (capital constante + capital variável + mais-valia) não podem ser 
vendidas por seu valor, tendo em vista a insuficiência da demanda. 
2. Esse novo tipo de crise, as crises de superprodução, resulta das próprias características 
da mercadoria, assim como do fato de que o capitalismo se caracteriza pela 
produção generalizada de valores-de-troca, ou seja, de bens destinados a serem vendidos no mercado 
e transformados em dinheiro, enquanto nas sociedades pré-capitalistas produziam-
se unicamente valores-de-uso, produzia-se não para vender, mas para satisfazer as necessidades da 
comunidade. 
Para consumir uma mercadoria, no sistema capitalista, é preciso possuir o equivalente de 
seu valor-de-troca em dinheiro; é preciso poder comprá-la. Em tais condições, as crises de 
superprodução se tornam teoricamente possíveis: basta, para que elas se produzam, que os 
proprietários de mercadorias não mais possam encontrar clientes possuidores de dinheiro suficiente 
para comprar todas as mercadorias por seu valor, para realizar todo o valor-de-troca de tais 
mercadorias. 
Pode-se afirmar que é esse desdobramento do valor em mercadoria e dinheiro que cria a 
possibilidade das crises gerais de superprodução capitalista. 
A crise é assim a expressão do caráter particularmente contraditório assumido pela 
acumulação do capital. Contraditório porque os interesses do capitalista entram em frequente 
oposição, mais ou menos aguda, com seus interesses enquanto integrante da classe capitalista. 
Vejamos um exemplo: se o capitalista ―A vê cair sua taxa de lucro, ele pode inicialmente dispensar 
trabalhadores e aumentar a intensidade do trabalho, esperando assim diminuir os custos e reencontrar 
suas margens de ganho. Mas, se muitos capitalistas fizerem o mesmo, — e o capitalista ―A não 
pode lhes impedir de fazê-lo, — a meta buscada não é alcançada. Longe de se restabelecer, a taxa de 
lucro cai e a crise se generaliza. O capitalista ―A obtém o inverso do que busca, precisamente 
porque não domina as leis do mercado e essas se voltam contra ele. A criação de desemprego, 
resultante da sua ação e daquela de seus imitadores, não permite — embora diminua provisoriamente 
seus custos — que as mercadorias sejam vendidas pelo seu valor. A mais-valia não se realiza ou não 
se realiza integralmente. O crescimento do desemprego significa menos dispêndio de salários e, 
portanto, menos possibilidades de escoar as mercadorias. A forma dinheiro é insuficiente em relação 
à forma mercadoria, impedindo que essa seja escoada pelo seu valor. 
Se a venda das mercadorias por seu valor não se verifica, ou se verifica apenas em parte, 
os capitalistas não poderão recomeçar imediatamente o processo de produção em escala 
ampliada. Isso pode ocorrer tanto a um capitalista individual quanto ao conjunto dos capitalistas, ou 
seja, ao capital em seu conjunto: o que se conhece como reprodução ampliada do capital é 
momentaneamente interrompida. 
Em suma, diremos que o valor deve ser não apenas produzido sob forma de mercadoria, 
mas também convertido à forma dinheiro. Essa unidade da produção e da conversão deve ser 
afirmada, mas não o é necessariamente: há possibilidade de crise. 
 
Seção II — A significação das crises 
 
É dupla: 
l. A crise é expressão de uma desproporção entre os dois grandes setores da produção: 
o setor que produz bens de consumo (que permitem satisfazerdiretamente as necessidades dos 
consumidores: alimentação, vestuário, automóveis, etc.) e o setor que produz bens de produção ou 
bens de equipamento (máquinas utilizadas para produzir os próprios bens de consumo). A crise 
significa a existência de um desenvolvimento não proporcional entre os dois setores e reflete a 
necessidade desse desenvolvimento não proporcional. 
Mais precisamente: para que a reprodução ampliada do capital (a acumulação em escala 
mais alta) se efetue sem interrupção, é preciso que sejam constantemente reproduzidas certas 
condições de equilíbrio. Quais são elas? 
A oferta total anual de mercadorias O, que é igual a c + v + m, decompõe-se em duas: O1 + 
O2, onde: 
O1 = produção de bens de produção; O2 = produção de bens de consumo. 
O valor anual dos bens de produção, por sua vez, decompõe-se em seus termos 
constituintes, ou seja: c1 + v1 + m1; enquanto o valor anual dos bens de consumo se decompõe em: 
c2 + v2 + m2. 
 
Temos, portanto: O = c + v + m 
O = O1 + O2 
A demanda total anual de mercadorias D decompõe-se, igualmente, em duas: D1 + D2, onde: 
D1 = demanda de bens de produção; D2 = demanda de bens de consumo. 
 
A demanda de bens de consumo tem três origens: 
Os salários pagos aos trabalhadores7: v1 + v2. 
A parte da mais-valia que os capitalistas utilizam para comprar bens de consumo; 
vamos chamá-la de r, que se decompõe em r1 (parte da mais- valia que os capitalistas do setor que 
fabrica bens de produção utilizam para comprar bens de consumo) e r2 (parte da mais-valia que os 
capitalistas do setor que fabrica bens de consumo utilizam para comprar bens de consumo). 
A parte da mais-valia acumulada que os capitalistas usam para contratar novos trabalhadores, 
isto é, que serve pra pagar novos salários, que serão utilizados para aumentar a demanda de bens de 
consumo: vamos chamá-la de mv, que se divide por sua vez em mv1 e mv2, conforme se trate de um 
ou de outro setor. 
 
Já a demanda de bens de produção tem duas origens: 
A demanda de bens de produção que servem simplesmente para renovar o material utilizado: 
é o capital constante amortecido, c, que se divide em c1 e c2, conforme se trate da demanda dos 
capitalistas de um ou de outro setor. 
A parte da mais-valia acumulada que os capitalistas consagram à compra de novos bens de 
produção: vamos chamá-la, de mc, que também se divide em mc1 e mc2. 
No fim das contas, temos: 
Oferta de bens de produção = O1 = c1 + v1 + m1 
Oferta de bens de consumo = O2 = c2 + v2 + m2 
Demanda de bens de produção = D1 = c1 + c2 + mc1+ mc2 
Demanda de bens de consumo = D2 = v1 + v2 + r1+ r2 + mv1 + mv2 
Para que o sistema esteja em equilíbrio, é necessário que a. oferta e a demanda se equilibrem 
para ambas as categorias de mercadorias; portanto, deve-se ter: 
O1 = D1 
O2 = D2 
 
Que pode ser escrito assim: 
c1 + v1 + m1 = c1 + c2 + mc1+ mc2 
c2 + v2 + m2 = v1 + v2 + r1+ r2 + mv1 + mv2 
Essas duas igualdades, condição de equilíbrio geral da produção capitalista, podem ser 
reduzidas a uma única igualdade. Com efeito, se decompusermos m1 e m2, obteremos: 
m1 = r1 + mc1 + mv2 m2 = r2 + mc2 + mv2 
Substituamos m1 e m2 por seu valor, nas duas igualdades. Teremos então: 
c1 + v1 + r1+ mc1+ mv1 = c1 + c2 + mc1 + mc2 
Eliminando os termos comuns de ambos os lados da equação, obtemos: v1 + r1+ mv1 = c2 + mc2 
Obtém-se assim uma única e mesma condição de equilíbrio geral da produção capitalista. 
Essa condição de equilíbrio do mercado capitalista não representa um dado fictício: v1 + r1+ mv1, ou 
seja, os salários pagos e a fração da mais-valia não acumulada em capital constante no setor de bens 
de produção é a demanda total dos bens de consumo criada pela produção dos bens de 
produção. c2 + mc2, ou seja, o capital constante a substituir e o capital constante a acumular no setor 
dos bens de consumo é a demanda total de bens de produção criada pela produção de bens de 
consumo. A equação entre essas duas grandezas, enquanto equação de equilíbrio do mercado 
capitalista, significa simplesmente o seguinte: a economia capitalista está em equilíbrio quando a 
produção de bens de produção suscita uma demanda de bens de consumo igual à demanda de bens 
de produção suscitada pela produção de bens de consumo. 
Em outras palavras: o mercado capitalista está em equilíbrio quando a oferta e a demanda 
recíprocas de mercadorias é igual entre os dois setores da produção capitalista. 
Em troca, a crise de superprodução significa que essa condição de equilíbrio não é e não 
pode ser respeitada: a crise é expressão da evolução não compatível dos dois setores. Mais 
precisamente: a crise é um momento no desenvolvimento do sistema capitalista. É uma sanção. É 
expressão intensa da anarquia do sistema. Como as condições de equilíbrio não podem ser 
respeitadas, já que resultam de decisões individuais mais ou menos independentes entre si, o sistema 
capitalista se encontra sempre numa destas três fases: a pré-crise, a crise, a pós-crise. Ele jamais está 
em equilíbrio. A evolução da produção tem de ser caótica; jamais pode ser regular. E isso, 
precisamente, por supor a exploração dos trabalhadores, a impossibilidade de integrá-los íntegra e 
definitivamente. 
2. Se se quer apreender a significação essencial das crises de superprodução, é preciso 
relacionar seu desenvolvimento e consequências aos movimentos da taxa média de lucro e, portanto, 
à mutável posição do capital em face do trabalho. 
 
Com efeito, pode-se afirmar: 
a) que a crise se caracteriza por uma brusca e intensa queda da taxa média de lucro: a 
tendência à queda da taxa de lucro se manifesta na realidade, de modo periódico, quando das crises 
de superprodução; 
b) que a crise cria condições favoráveis a um novo aumento da taxa média de lucro e ao 
processo de retomada econômica. 
 
Examinemos mais de perto esses dois pontos. 
a) A crise se caracteriza por uma brusca e intensa queda da taxa média de lucro. Com 
efeito, à medida que se desenvolve a fase de prosperidade, três fenômenos se 
manifestam: 
1° fenômeno: um aumento de c/v (composição orgânica do capital), provocado pela criação 
de equipamentos modernos durante a fase da prosperidade; 
2° fenômeno: uma queda de m/v (taxa de mais-valia), devida aos eventuais aumentos de 
salários (a prosperidade cria condições favoráveis à luta dos trabalhadores para obterem salários mais 
elevados) e à impossibilidade de aumentar a duração do trabalho e sua intensidade além de um certo 
limite; 
3° fenômeno: à medida que as capacidades de produção se desenvolvem, aumenta a oferta 
de mercadorias no mercado. Chega um momento em que a oferta vai se tornar superior à demanda. 
Mais precisamente: a parte das mercadorias produzidas em condições de produção piores (ou seja, 
onde os custos de produção = c + v são mais elevados) é invendável pelo seu valor. 
Essas mercadorias, em outras palavras, contêm tempo de trabalhodesperdiçado em nível 
social. Num certo momento, a distância entre a oferta e a procura atinge tal magnitude que os preços 
das mercadorias baixam (ou entram em colapso); as empresas que trabalham nas condições de 
produção piores ver-se-ão obrigadas a encerrar suas atividades. 
É de notar que esse fenômeno é um traço específico do capitalismo, o qual se caracteriza 
pela apropriação privada dos meios de produção e pela ausência de planejamento central. 
Com efeito, é porque o aumento da produção não é planejado de maneira centralizada, 
sendo ligado às decisões individuais de cada capitalista (que busca maximizar sua taxa de lucro), é 
por isso que em dado momento a oferta de mercadorias vai se tornar superior à demanda. 
Os produtores que trabalham em condições piores de produtividadenão podem realizar no 
mercado todo o valor (c + v + m) de suas mercadorias: o tempo de trabalho efetivamente despendido 
para a produção delas é superior ao tempo de trabalho socialmente necessário (ou seja, levando-se em 
conta a produtividade média). 
As crises, precisamente, vão permitir que periodicamente haja uma adaptação entre a 
quantidade de trabalho efetivamente despendido na produção e a quantidade de trabalho socialmente 
necessário. São a punição pelo desperdício de tempo de trabalho. Dado que a produção capitalista 
não é conscientemente planejada, o ajustamento se produz não a priori (isto é, antes da 
produção), mas a posteriori (isto é, quando a produção, já efetuada, aparece no mercado). Em outras 
palavras: quando a produção chega ao mercado com seu valor c + v + m, e o mercado não a aceita 
por esse valor, percebe-se a posteriori que houve tempo de trabalho desperdiçado. Os produtores 
mais arcaicos serão punidos e, consequentemente, eliminados. 
Esses três fenômenos (elevação de c/v, queda de m/v, oferta superior à demanda implicando 
em queda de preços) explicam que, em determinado momento, ocorra uma brusca e intensa queda da 
taxa média de lucro. 
b) Ao lado disso, a crise cria condições favoráveis a um novo aumento da taxa média de 
lucro e ao processo da retomada. 
Com efeito, assiste-se a: 
1) uma queda de c/v (composição orgânica do capital): põe-se em funcionamento máquinas 
e fábricas já existentes, mas se contrata nova mão-de-obra; 
2) um aumento da taxa de mais-valia (m/v) devida à existência do fim da depressão, de 
salários reais baixos, bem como às possibilidades de aumentar a duração e a intensidade do trabalho; 
3) e, sobretudo, a crise — por causa das falências e fechamentos de empresas que ela implica 
— significa uma descapitalização, isto é, a destruição de uma massa de máquinas e de matérias-
primas, assim como uma depreciação do capital, devida à queda de seu preço. 
Essa descapitalização e essa depreciação do capital, ambas brutais e que significam uma 
queda em volume e valor do capital constante, trazem uma solução provisória à superacumulação de 
capital, ao mesmo tempo em que permitem um novo aumento da taxa média de lucro. 
Assim, é através das crises que se realiza a queda tendencial da taxa de lucro. Mas as crises, 
ao mesmo tempo, constituem a reação do sistema contra essa queda. 
Seção III — As causas das crises 
Entramos aqui num terreno ao mesmo tempo difícil e pouco explorado. Não traremos nada 
de novo; contentar-nos-emos com um nível bastante geral. Desse ponto de vista, é possível afirmar 
que dois elementos desempenham um importante papel conjunto na irrupção das crises: a tendência a 
limitar o consumo das massas e a anarquia da produção. 
 
l. A tendência a limitar o consumo das massas 
O capitalismo tem de vender suas mercadorias no mercado e, para tanto, tem de encontrar 
compradores. Ora, o capitalista se esforça por limitar ao máximo o dinheiro que distribui sob a forma 
de salários. O capital tende, no valor total das mercadorias produzidas, a diminuir relativamente a 
parte necessária à manutenção e à reprodução da força de trabalho. Cada capitalista vai tentar 
diminuir ao máximo o custo da força-de-trabalho que emprega, ou seja, os salários pagos aos seus 
próprios operários. O que é verdade para o capitalista é aqui verdade também para a classe capitalista 
em seu conjunto. Chega-se assim a uma contradição: os capitalistas, buscando valorizar ao máximo 
seu capital, devem, por um lado, transformar em dinheiro (vendendo-a no mercado) sua produção 
cada vez maior de mercadorias e, por outro, devem se esforçar no sentido de limitar a quantidade de 
dinheiro entregue a seus operários sob a forma de salários. 
No nível social, portanto, o conjunto da classe capitalista se esforça no sentido de limitar o 
poder de compra dos trabalhadores. Ocorre uma tendência a lançar o mínimo de dinheiro na 
circulação; mas, ao mesmo tempo, a realização do valor implica na necessidade de retirar cada vez 
mais dinheiro da circulação. 
Essa contradição entre a tendência ao desenvolvimento ilimitado da produção e a tendência 
à restrição relativa do consumo das grandes massas, portanto, desempenha um certo papel na 
irrupção das crises. 
Decerto, o limitado poder de compra da classe operária não representa o conjunto do poder 
de compra existente em um determinado momento. O poder de compra da burguesia (compra de bens 
de consumo e, sobretudo, de bens de produção) é também uma componente do poder de compra do 
conjunto da sociedade. 
Em particular, deve-se levar em consideração a demanda de bens de produção pela 
burguesia, que é também uma fonte de escoadouros, cuja importância pode —durante certo tempo —
 compensar a insuficiência da demanda de bens de consumo. Mas a demanda de bens de 
produção não pode ser um paliativo permanente para essa insuficiência do consumo. Com efeito, os 
bens de produção (máquinas, matérias- primas) são, por definição, bens que servem para a produção 
de bens de consumo. A demanda de bens de produção, portanto, será em última instância limitada 
pela demanda de bens de consumo: nenhum produtor de têxteis duplicará sua capacidade de 
produção (através da compra de novos bens de produção) se a análise do mercado lhe demonstrar que 
não há razão para esperar nenhuma expansão da venda de produtos têxteis. A produção de bens de 
produção não pode se estender permanentemente sem levar em conta o crescimento da demanda de 
bens de consumo. 
 
2. A anarquia da produção 
Esse fato subverte periodicamente as condições de equilíbrio entre os dois grandes setores 
(o de bens de produção e o de bens de consumo), condições que determinamos mais acima. 
Observemos que essa anarquia da produção capitalista não deve ser considerada como uma 
causa em si das crises, independente de todas as demais características do modo de produção 
capitalista e, em particular, da contradição entre a tendência a aumentar a produção e a tendência a 
limitar relativamente o consumo das massas. Com efeito, a existência de uma certa proporção entre a 
capacidade de produção e o poder de compra disponível para a compra de bens de consumo é parte 
integrante das condições de proporcionalidade necessárias para evitar uma crise. 
De modo mais geral, podemos dizer que é em conjunto que a tendência ao consumo 
limitado das massas (que restringe os escoadouros para a produção) e a anarquia da produção (que se 
manifesta notadamente através das diferenças periódicas entre as taxas de lucro e as produções dos 
dois grandes setores) atuam. no sentido de provocar a irrupção das crises. 
A crise, em última instância, significa a impossibilidade "de manter o antigo nível de 
valores, de preço e de taxa de lucro. com uma massa maior de capitais. É o conflito entre as 
condições de acumulação e de valorização do capital; esse conflito não é mais que a explicitação de 
todas as contradições inerentes ao capitalismo, que intervêm em sua totalidade na explicação das 
crises: contradição entre o maior desenvolvimento da capacidade de produção e o desenvolvimento 
mais restrito da capacidade de consumo das grandes massas; contradições decorrentes da anarquia da 
produção que resultam da concorrência, do aumento orgânica do capital e da queda da taxa de lucro. 
 
Conclusão 
1. As crises de superprodução produziram-se periodicamente durante toda a história do 
capitalismo industrial. Essas crises se tornaram cada vez mais graves. Se se toma o exemplo da crise 
de 1929 nos Estados Unidos, constata-se que, de 1929 a 1933, a produtividade industrial reduziu-
se pela metade; os investimentos industriais caíram em 90%; os preços, em 30%; a massa salarial, em 
55%; o emprego, em 30% (em1933, 27% da população ativa estava desempregada); 6.000 bancos 
suspenderam seus pagamentos, etc. Notemos que, em 1938, o nível de produção ainda era inferior ao 
alcançado em 1929, às vésperas da crise, e que 17% da população ainda estava desempregada. 
A crise de 1929 é o exemplo mais brutal de descapitalização e de depreciação jamais 
conhecido pelo capitalismo. 
2. O capitalismo, desde a Segunda Guerra Mundial, conheceu certamente algumas crises 
(em 1948-49, em 1953-54, em 1957-58, em 1960-61), mas surgiram novas características: 
 
Duração maior das fases de expansão; 
Menor intensidade das crises; 
Existência de uma constante elevação de preços, inclusive durante as fases de recessão.

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