UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL Centro de Ciências Jurídicas Disciplina de Direito Penal Professora Gisele Mendes Aluno João Manganeli Neto Uma mulher de condições de vida abastadas tem problemas com seu automóvel, e então para deslocar-se precisa dispor do serviço de ônibus. Informa-se com suas filhas a respeito disso, e então dirige-se ao ponto de ônibus para ir aonde deveria. Desde o início desacostumada com a situação, ficou aguardando o ônibus correto, e logo percebeu que chegou ao ponto de ônibus um rapaz jovem que lhe pareceu trombadinha. Observou que o rapaz estava próximo demais, no seu entendimento, e passou a preocupar-se se não seria assaltada pelo mesmo. Entrou no ônibus abarrotado de passageiros tão logo ele chegou ao ponto, e percebeu que o rapaz que a deixou desconfiada também embarcou, aumentando sua preocupação em ser assaltada por ele. Algumas paradas adiante, vagou um local perto de janela do ônibus e a mulher sentou-se tentando tranquilizar-se, porém logo o espaço ao seu lado vagou e o rapaz que ela temia assaltá-la sentou-se ao seu lado. Nervosa, ela passa a mão em seu pulso e percebe estar sem seu relógio, assumindo prontamente que fora roubada pelo rapaz. Assim, ela fala-lhe, sem que os demais passageiros ouçam, para que lhe devolva o objeto. O rapaz parece manter-se calado e ignorando a situação, como se não a tivesse entendido, e a mulher irrita- se lhe dizendo então que ele deveria passar-lhe o relógio logo ou ela iria realizar um escândalo no ônibus, chamar a polícia, enfim realizar um transtorno. Nervoso, o rapaz entrega algo na mão dela, que sem olhar coloca dentro de sua bolsa, e então rapidamente desce na parada seguinte do ônibus. Ao chegar de volta à sua casa a mulher então relata a tentativa de assalto do rapaz e que corajosamente obteve seu relógio de volta. Mas ao chegar em seu quarto, verifica que seu relógio estava encima do toucador. Duvidosa então do quê houve, abre a bolsa e constata que o rapaz lhe entregou o próprio relógio masculino que usava. Esta mulher praticou crime? Sim. Furto Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. [...] § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa. O roubo é o furto realizado com o emprego de violência, de grave ameaça ou de qualquer outro recurso que reduz a possibilidade de resistência da vítima. No furto, viu-se, o agente limita-se a subtrair, usando violência, quando muito, em relação à coisa ou a algum obstáculo à subtração. Não há ataque à vida ou à integridade, física ou moral, de qualquer pessoa.1 Qual artigo da parte geral do CP se aplica? Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei. Descriminantes putativas § 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo. A mulher cometeu erro justificado, a seu ver, pelas circunstâncias, supondo situação em que seu bem patrimonial estava em risco, e usando-se no seu entendimento de legítima defesa de seus objetos. Se a sua suposição estivesse correta não teria havido crime e a ação seria legítima, daí se entender que houve de fato um furto putativo. Só é punível o furto doloso. O agente deve agir com consciência da conduta, consciência de que a coisa móvel é alheia, consciência do resultado que causará e vontade livre de tirar a coisa da vítima, privando-a da sua posse ou detenção. Se o agente, porém, não tem consciência de que a coisa é alheia, atua por erro de tipo, ficando excluído o dolo e, portanto, a tipicidade do fato. Será um indiferente penal, porque não há furto culposo.2 1 TELES, Ney Moura. Direito Penal II. Editora Atlas. Capítulo 35. 2 IDEM ao 1, capítulo 33.