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Teletrabalho = alteração do art. 6º da CLT e horas extras

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Teletrabalho: alteração do art. 6º da CLT e horas extras
Tratei da regulamentação do art. 6º, da CLT, no texto anterior (Regulamentação do teletrabalho: alteração do artigo 6º da CLT). Aliás, nele fiz pequena alteração: havia deixado de mencionar que, no próprio caput do art. 6º, da CLT, foi incluída a expressão: “realizado a distância”, o que não altera a substância do texto, porque apenas se formalizou o que a jurisprudência já vinha reconhecendo. O ponto fulcral da alteração está, realmente, na inclusão do parágrafo único, cujo texto está ensejando uma série de polêmicas.
A discussão se dá em relação à suposta obrigatoriedade de se reconhecer horas extras "fora do expediente normal”, já que, a teor do referido dispositivo legal, não se distingue do trabalho realizado no estabelecimento do empregador o executado a distância. Não penso assim. Uma não coisa não está necessariamente ligada à outra. Equiparação entre labor a distância e o realizado no local tradicional de trabalho é um fato, gerando instituto jurídico específico, sobretudo reconhecimento de vínculo de emprego, como descrito, de forma inequívoca, na parte final do referido parágrafo único. A realização de horas extras, a distância, ou in loco, é outro fato, com causa e consequências diversas da interpretação que se dar ao dispositivo legal alterado. Ao que parece, criou-se estardalhaço sem razão, como, inclusive, é comum no surgimento de novas normas trabalhistas.
Mesmo antes da alteração do art. 6º, da CLT, caput e parágrafo único, se o empregado realizasse labor além da oitava diária e quadragésima quarta semanal, seria devida hora extra. Otávio Pinto e Silva, advogado e professor, em reportagem da Folha.com (Nova lei sobre e-mail não vai elevar hora extra, dizem empresas) explica a assertiva:
"A nova lei alterou o artigo 6º da CLT quanto à relação de subordinação do empregado ao patrão, equiparando os meios tecnológicos de controle aos demais". Mas não há nada que diga que um e-mail ou telefonema trocado entre funcionário e empregador fora do ambiente de trabalho seja necessariamente hora extra. Assim, em caso de processo judicial, o funcionário vai continuar precisando – como já acontece hoje – comprovar que trabalhou todas as horas regulares e as extras, com a ajuda de prova testemunhal.”
Sem dúvida, o que vai demandar pagamento de horas extras não é a alteração do artigo em questão, onde apenas se equiparou teletrabalho ao trabalho tradicional, mas, a comprovação do labor além do horário normal.
Comenta-se, especialmente, que a referida alteração legal se confrontaria com recente entendimento sobre uso de celular, sumulado pelo Tribunal Superior do Trabalho, que vinha se inclinando pela inexistência de horas extras, nessa hipótese. Não é bem assim (data vênia!). Hora extra seria indevida em princípio, isto é, apenas pelo fato de o obreiro portar o celular. Na verdade, o entendimento firmado através da Súmula 428, do TST, restringe-se à portabilidade do aparelho eletrônico, tal que, por si só, não ensejaria sobreaviso. Não obsta, por outro lado, pagamento de horas extras se estas forem, claro, efetivamente realizadas.
É necessário, então, que o empregado seja acionado  –  e se o for, após a oitava diária, restam devidas horas extras. O entendimento sumulado não mudou essa realidade e nem poderia, sob pena de flagrante inconstitucionalidade. A propósito, a Súmula 428 do TST (conversão da OJ 49):
"428. Sobreaviso. O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço."
A expressão "por si só" já denota o escopo da Súmula: a mera permanência do empregado (como se fosse um "plantão") com o celular, na residência ou em outro espaço distante do estabelecimento do empregador, não enseja o sobreaviso, mas, não impede a configuração de hora extra, que é outro instituto jurídico.
É bem verdade que, apesar de não ensejar horas extras por falta de acionamento, fora do experiente normal de trabalho, o mínimo razoável seria o pagamento de adicional de sobreaviso, que é desgastante de per si (como, no caso dos ferroviários). 
Não obstante tudo isso, é preciso se levar em conta duas questões: 
Em primeiro lugar, embora o debate sobre a influência da alteração do art. 6º, da CLT, na jornada de trabalho, pareça residir no campo retórico, convém lembrar que a letra da lei, com a evolução dos fatos sociais, costuma ensejar entendimentos diferentes da (suposta) intenção inicial do legislador, não sendo impossível que, com o tempo, o fundamento legal para pagamento de horas extras, no labor a distância, seja justamente o dispositivo em questão. 
Insisto que esse caminho é desnecessário, pois o fundamento para a jornada de trabalho está no art. 59 da CLT, em nada se alterando o fato de o empregado laborar a distância. Ademais, a Constituição Federal veda discriminação entre trabalhador comum e teletrabalhador, principalmente pela proteção em face da automação (art. 7º, XXVII) e, indiretamente, pela proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos (art. 7º, XXXII).
Em segundo lugar, se o empregado, por exemplo, portar aparelho de celular fora do expediente normal de trabalho (especialmente em finais de semana), devendo aguardar ser acionado a qualquer momento, como é comum no trabalho envolvendo tecnologia, não está afastada a possibilidade de caracterização de violação do direito ao lazer. Consulte a propósito:

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