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a criança terminal e a intervenção

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. A criança terminal e a intervenção 
terapêutica do psicólogo 
1. Introdução 
RUTH DA COSTA TORRES· 
WANDA GURGEL GUEDES· 
WILMA DA COSTA TORRES· 
1. Introdução; 2. Pesquisa e atuação 
clínica; 3. As áreas de intervenção tera- . 
pêutica. 
Nossa relação com o pesadelo da morte foi retratada pelo artista E. Munch em seu 
famoso quadro A morte no quarto do doente. As pessoas dispostas em tomo da 
cama e da pessoa morta Dio olham para o morto-e nem se olham entre si. Munch 
. aS pintou como se elas se projetassem e percebessem suas vidas no fun, sofrendo 
cada ~a delas por si mesma e pela sua incapacidade frente à incerteza e ao 
desconhecido. 
Para Gold e Ollendorff (1974), o medo da morte resulta de uma série de 
experiências a que chamam de desencontros, que são preparados na iniancia e 
alimentados através da vida por um continuum de fatores sociais e psicológicos. 
Uma vez inculcado com uma necessidade patológica de segurança, certeza e depen-
dência, o homem experimenta ansiedade quando se defronta com a incerteza e o 
desconhecido. Esta ansiedade é tio intolerável que procura de toda maneira preen-
cher a brecha entre o agora e o depois. A idéia de não ser amedronta a todos n6s. 
Não podemos nos imaginar mortos e Dio podemos imaginar um mundõ em que 
nós não existimos. Assim, a verdaqe de que a morte é uma das mais significativas 
experiências da vida passa a ser freqüentemente esquecida. 
Desta for,ma, Dio é diffci compreender por que a psicologia da morte era, até 
pouco tempo, uma área podada, incapaz de fornecer soluções aos problemas ass0-
ciados com a morte. Não obstante, observa-se mais recentemente uma considerável 
presslo por parte dos especialistas em saúde mental e dos cientistas sociais para 
que se busquem explicações para os fenômenos relacionados com a morte. Consti-
tui, assim, um desafio nJ'0 só nos defrontarmos com os problemas emocionais 
:. Psicólogas do ISOP. 
Arq. bras. Psic., Rio de Janeiro, 32 (1): 418-422", jan./mar. 1980 
desta área, mas também manter o equilíbrio entre o que é esper~do e o que pode 
ser fornecido. 
O objetivo deste artigo é tecer considerações sobre o papel do psicólogo no 
atendimento à criança terminal, tópico que se tomou um dos aspectos centrais do 
atual movimento sobre a morte. 
2. Pesquisa e atuação cUnica 
Durute anos, poucos foram os psicólogos que se arriscaram a dar atendimento às 
crianças agonizantes. Hoje existe não só a preocupação com uma atuação clínica, 
mas também a de realizar pesquisas sistemáticas, a fun de promovêr novos conhe-
cimentos que nos permitam responder a perguntas tais como: haverá um perfd 
psicológico consistente das crianças terminais e de seus pais? Poderemos propor-
cionar alguma forma de treinamento capaz de produzir mudança nas crianças 
terminais e em seus pais? Até que ponto se deve ser direto e honesto com a 
criança que está morrendo? Devem os profIssionais participar da emoção da famí-
lia que tem uma criança terminal e experimentar sua dor? Há perigo de se toma-
rem insensíveis ao estado dos outros? 
Evidentemente, todos os trabalhos clínicos podem ser utilizados para produ-
zir dados quantifIcáveis e sistemáticos. Não obstante, como existem muito mais 
psicólogos envolvidos em trabalho clínico do que em pesquisa, a psicologia vem 
encontrando difIculdade para submeter as observações dos clínicos a estudos mais 
controlados. Apesar disto, muito já se aprendeu com a experiência destes clínicos 
que partilham da morte e agonia de uma criança. 
3. As áreas de intervenção terapêutica 
Defrontar-se com a agonia e a morte de outr. ser humano não é nada fácil, 
sobretudo se este outro ser humano é uma criança. Por isto, desconforto e evasã'o, 
frente à criança terminal, parecem ser a atitude mais freqüente, não só por parte 
da família, mas também dos profIssionais assistenciais muito mais voltados para a 
cura e a saúde. Daí a importância do papel do psicólogo que, em sua atuação, 
poderá vir a ser de grande valia para a equipe de atendimento médico, a família e a 
própria criança terminal. 
A morte inevitável do paciente apresenta duas ~eas distintas para resposta: a 
física e a emocional. Quase todo médico aceita seu papel qüanto ao cuidado físico 
do doente terminal. Ele foi bem treinado para isso, e empenha-se, acima de tudo, 
em aliViar a dor e prolongar a vida, em servir à vida e aos vivos. A vida é a meta 
principal da medicina. Conseqüentemente, os médicos resistem em realizar um 
esforço terapêutico que tenha a morte como conclusão inevitável, tendendo a 
perder o interesse pela criança terminal. Del>u forma, quando uma criança é 
Crilmça termiMI 419 
diagnosticada como estando fatalmente doente, eles enfrentam não' só um pro-
fundo sentimento de fracasso pessoal, mas também experimentam uma reação 
normal de luto, tendo que lidar, portanto, com a tristeza e a raiva. Esta raiva faz 
com que não só o pediatra, como também toda a equipe de atendimento descu-
bram que são menos tolerantes com esse jovem paciente que nunca ficará bom. 
Descobrem ainda com espanto, por exemplo, que se molestam com os pais destas 
crianças, acusando-os de não estarem cooperando. AS resistências e as dificuldades 
da equipe de atendimento podem e devem ser compreendidas. O psicólogo deve 
estar alerta a essas reações normais do médico e de sua equipe, e deverá estar pre-
parado para ajudá-los a canalizar essas reações de maneira terapêutica. 
Os pais vêem nos ftlhos sua própria imortalidade. A tristeza e a alegria com 
que cada geraçlio contempla a próxima está no conhecimento de que a próxima 
enterrará a anterior. Não há desgraça maior do que sobreviver aos próprios filhos e 
assim saber que o nosso lugar, no processo. das gerações que se sucedem, será uma 
lacuna. 
Desta forma, o diagnóstico de urna doença fatal em urna criança submete toda 
a família a um intenso stress emocional, e o luto começa inevitavelmente a ser 
vivenciado. Aliás, esta reação de luto pode começar antes mesmo de qualquer 
diagnóstico médico oficial. Os membros da família que cuidam da criança perce-
bem, através de várias comunicações nlio-verbais, que a criança se tomou total-
mente diferente. Pai, mie e irmãos dirlio mais tarde que eles sabiam e que reagiam 
profundamente a esse conhecimento. Portanto, quando o diagnóstico fatal é final-
mente fornecido pelo médico, o luto da família poderá apenas se tomar mais' 
aberto e óbvio. 
Em todo luto há inevitavelmente um sentimento de tristeza e raiva. Os pais 
sentirão tristeza porque estão perdendo uma relação significativa com a criança, 
porque suas esperanças não serão mais preenchidas, e também porque parte deles 
está morrendo com a criança. E, em sua angústia, afastam-se da criança, tomando-
se emocionalmente menos disponíveis para ela. A criança também se afasta porque 
percebe que é motivo de dor e nio deseja fazê-los sofrer. 
Os pais sentirão raiva da tristeza da perda, da inutilidade da morte de uma 
criança. E como nossa cultura ocidental fornece poucos canais socialmente aceitá-
veis para esta raiva, ficarão preocupados e se sentirão culpados ao descobrirem sua 
raiva em relação à criança que está morrendo. 
Além disso, como chama a atençãoLogan Wright (1974), as crianças termi-
nais .apresentam desafios educacionais que os pais nl'<> poderão manipular se não 
forem auxiliados. Um desses desafios é a tendência destas crianças para se tor-
narem excessivamente dependentes. O sentimento de culpa dos pais leva-os a 
responder desnecessariamente ao mais leve desejo da criança, vestindo-a, alimen-
tando-a etc. Ora, o que a criança geralmente está dizendo com este comporta-
mento é que necessita de apoio emocional e a superproteção dos pais não satisfará 
a tal necessidade, pemíitindo apenas que essas crianças morram como pessoas 
antes de morrerem biologicamente. Os membros da família necessitam ser ajuda-
420 A.B.P.I/ROdos em relaçlo a esses sentimentos e dificuldades, a fun de que possam dar maior 
auxílio à criança agonizante, e sua morte possa dar a eles um conhecimento mais· 
profundo e produtivo de sua própria humanidade. . 
Embora muitos profissionais conheçam a importância de uma abordagem 
. terapêuttca preventiva com o irmI'o da criança terminal, freqüentemente pouco é 
feito para ajudá-la, a menos que ela mostre sinais de perturbação. Entretanto, esta 
criança tem o direito de ser incluída em uma situação que llie afeta tão grave-
mente, quer como indivíduo, quer como membro da família. Essas crianças, fre-
qüentemente, entram em conflito com seus sentimentos em relação ao irmão 
doente, reagindo muitas vezes com raiva às atenções e privilégios especiais dados a 
este, motivo. pelo qual se sentem culpados. 
O atendimento ao irmão da criança terminal, como assinala Kübler-Ross 
(1974), muitas vezes deverá se prolongar mesmo após a morte desta, pois observa-
se, por parte dos pais, uma tendência a idealizar a criança morta, o que pode 
suscitar um sentimento de inferioridade na sobrevivente. Além disso, a criança que 
perdeu um irmão deve ser auxiliada no sentido de se evitar uma identificação desta 
com a criança morta. 
Quanto ao apoio emocional que o psicólogo pode dar à criança terminal, não 
há nenhuma justificativa para deixar que esta criança se debata sozinha com o 
problema de sua morte iminente. Deve-se permitir a ela que expresse suas emo-
çOes, fantasias, medos e sentimentos. Além disso, todo esforço deve ser feito no 
sentido·de encorajar a criança e os adultos que a rodeiam a se aproximarem uns 
dos outros e a serem verdadeiros uns com os outros. Com esta aproximação e esta 
verdade mÍltuas, como diz Easson (1974), as pessoas sadias e os doentes terminais 
podem-se descobrir reciprocamente, descobrindo também o verdadeiro significado 
da vida. 
Aliás, Farkas (1974). ao relatar wa pesquisa com famílias de doentes terminais, 
assinala ter descoberto qulo resistentes e adaptáveis são os seres humanos ao se 
defrontarem com um,stress que parece insuportável. Expressa seu sentimento de 
admiraçlo por esses pais e essas crianças que são capazes de se defrontar tão 
corajosamente com a terrível possibilidade de viver um tempo emprestado, e 
conclui dizendo: "Sinto que aprendi muito a respeito da vida ao fazer essa pes-
quisa." (1974, p. 43.) Fica, assim, evidente que, além do conhecimento da litera-
tura a respeito da morte, é importante também que o pesquisador e o psicólogo 
clínico recebam, como assinala Willis (1974), um treinamento na área da dor. 
Finalmente, é importante ressaltar que o psicólogo que vai lidar com a criança 
e a morte necessita chegar a termo com sua própria morte, pois, do contrário, sua 
tarefa será dificultada, tomandoase provável o emprego de eufemismo para prote-
ger a criança, o que poderá provocar mais ameaça do que segurança. Portanto, o 
psicólogo deve estar certo de que estabeleceu sua própria orientação fJlosófica em 
relação ao problema da morte antes de começar a lidar profissionalmente com as 
respostas emocionais da criança terminal e de sua família. :e necessário ter resol-
vido seu próprio problema ~ relação à morte ou, pelo menos, lidar de certa 
CriIInÇtl tenninlll 421 
forma" com seus medos e preocupações antes que se possa ser eficiente com outros 
nesse setor. Como lembra Constance DeMuth Berg (1973, p. 29), o artista Van 
"Gogh belamente expressou "a eterna questã'o de se nós podemos ver toda a vida 
ou somente conhecer um hemisfério dela antes da morte". O psicólogo pode nã'o 
ter a aceitaçã'o intuitiva da morte como parte da vida da mesma forma que o 
artista, mas deve fazer uma escolha - se vai ignorar ou se defrontar com a impor-
tância do problema em sua vida pessoal e profissional. 
Bibliografia 
DeMuth Berg, Constance. Cognizance of the death taboo in counseling children. The School 
Counselor, 21 (1):28-33, Sept. 1973. 
Easson, W. M. Management of the dying child. Joumal of Clinicai Child Psychology, 
3 (2):25-7, Summer, 1974. 
Farkas, Andrea. Research ori families of terminally i1l children: problems and rewards. Joumal 
ofClinical Child Psychology, 3 (2):41-3, Summer, 1974. 
Gold, M. S. & Ollendorff, R. H. V. The unencounter with death. Humanitas, 10 (1):43-60, 
Feb.1974. . 
Kübler-Ross, Elisabeth. The languages of dying. Joumal of Clinicai Child Psychology, 
3 (2):22-5, Summer, 1974. 
Willis, Diane J. The families of terminal1y i1l children: symptomatology and management. 
Joumal o/Clinicai Child Psychology, 3 (2):32-3, Summer, 1974. 
Wright, L. An emotional support program for parents of dying Children. Joumal of Clinicai 
Child PsychololQ', 3 (2):37-8, Summer, 1974. 
422 A.B.P.1/80

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