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Livro Reinaldo Carcanholo - Capital: Essência e Aparencia - Cópia

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Prévia do material em texto

Reinaldo A. Carcanholo (org.)
CAPITAL: 
ESSÊNCIA E APARÊNCIA
V O L U M E I
I a edição 
Expressão Popular
Copyright © Editora Expressão Popular Ltda.
Revisão Ana Cristina Teixeira e Maria Elaine Andreoti 
Capa, projeto gráfico e diagram ação Krits Estúdio
Impressão Cromosete
Dados internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
C244 Capital: essência e aparência / Reinaldo A. Carcanholo
(org.).-1 ,ed.— São Paulo : Expressão Popular, 2011.
176 p.
indexado em GeoDados - http://www.geodados.uem.br.
ISBN 978-85-7743-177-9
1. Economia. I. Carcanholo, Reinaldo A., org. li. Título.
CDD 335.4
Bibliotecária: Eiiane M. S. Jovanovich CRB 9/1250
1a edição: julho de 2011
Edição atualizada de acordo com a nova regra ortográfica.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro 
pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização da editora.
Editora Expressão Popular Ltda.
Rua Abolição, 201 I Bela Vista I 01319-010 I São Paulo - SP 
Tel (11) 3105 9500 I 3522 7516 I Fax (11) 3112 0941 
livraria@expressaopopular.com.br I www.expressaopopular.com.br
SUMÁRIO
7 Apresentação
13 Introdução
Reinaldo A . Carcanholo
p a r t e i - M e r c a d o r i a , v a l o r e f e t i c h i s m o 
Reinaldo A. Carcanholo
T l Preliminares
29 Capítulo 1 - Mercadoria: Valor de uso e Valor de troca
45 Capítulo 2 - A Expressão do Valor ou as Formas do Valor
69 Capítulo 3 - Complementos sobre a mercadoria e o valor
85 Capítulo 4 - Sobre o fetichismo
p a r t e i i - C a p i t a l e m a i s - v a l i a
101 Capítulo 5 - 0 dinheiro: natureza e funções 
Paulo Nakatani 
Helder Gomes
123 Capítulo 6 - Sobre o capital e a mais-valia 
Reinaldo A . Carcanholo 
Maurício Sabadini
147 Capítulo 7 - 0 trabalho em Marx 
Sérgio A . M . Prieb 
Reinaldo A . Carcanholo
163 Bibliografia geral
169 Sobre os autores
APRESENTAÇÃO
O pensamento de Marx, e em particular sua obra maestra, O capital, está 
mais vigente que nunca. Ao contrario do que, até alguns anos atrás, muitos dos 
seus adversários poderiam pensar, sua importancia para o século 21 talvez chegue 
a ser maior do que no século que passou. A grande crise estrutural do capitalismo 
que se manifestou na primeira década do novo milênio, e que por sua intensi­
dade surpreende a todos, talvez seja a prova de que essa afirmação é adequada. 
A verdade é que a teoria de Marx terá vigência pelo menos enquanto existir o 
capitalismo, as classes sociais, a exploração do homem pelo homem, a escassez, 
o consumismo, o individualismo, a forma social que viola a natureza humana e 
faz das pessoas seres fundamentalmente alienados e infelizes. E, se alguém quiser 
deduzir dessas palavras que nossa perspectiva é de que M arx seria um humanis­
ta, a dedução é correta: seu pensamento é profunda e radicalmente humanista. 
Humanista e revolucionário!
E justamente pela vigência e atualidade do pensamento de Marx que faze­
mos o esforço de preparar este livro e que a Editora Expressão Popular decide 
publicá-lo. Ele constará de dois volumes, dos quais este é o primeiro. Em con­
jun to com este lançamento, a editora realiza, simultaneamente, o esforço da pu­
blicação de uma nova edição d’O capital de Marx em português.
Este livro, Capital: essência e aparência, não é para ser lido; na verdade é para 
ser estudado, pois pretende auxiliar os leitores a entenderem essa obra funda­
mental de Marx, qual seja, O capital. Mas, atenção, não pretendemos oferecer um 
manual. Ao contrário.
Insistamos em um aspecto: os manuais procuram simplificar as questões, 
tornando-as aparentemente mais compreensíveis. Mas, na verdade, deformam e 
escamoteiam as dificuldades e negam aos seus leitores a profundidade que elas 
possam apresentar. Aqui, de maneira inversa, não se trata disso. As questões são 
apresentadas, na medida do possível e do necessário, com todas as suas comple­
xidades, porém utilizando-se de uma redação a mais didática possível.
Tampouco este é um livro para iniciados e, como dissemos, não é um sim­
ples e rasteiro manual sobre economia política marxista. Trata-se de uma cole­
tânea de textos cujo objetivo é fazer com que seus leitores passem a ter algum 
domínio sobre os aspectos fundamentais dessa temática, mas, muito mais impor­
tante que isso, que passem a ter interesse e disposição para a leitura direta de O 
capital, obra-prima indispensável de Marx. Depois da sua leitura e do seu estudo, 
espera-se que se sintam mais do que capazes para enfrentar os textos originais
7
desse autor; que se sintam estimulados a isso. A leitura direta e a adequada com­
preensão de Marx, e particularmente d ’O capital, ao contrário do que se possa 
pensar, não é factível exclusivamente para intelectuais; é mais do que possível e 
recomendável para todos aqueles que se disponham, com um pequeno esforço, 
a entender com profundidade a sociedade capitalista em que vivemos e que te­
nham como esperança uma sociedade superior, a verdadeira sociedade socialista 
sem adjetivos.
Este livro destina-se a pessoas que tenham uma formação mínima compa­
rável aos primeiros anos do ensino médio, que tenham ou não estudos formais 
desse nível. Espera alcançar especialmente os mais diversos tipos de militantes 
sociais que tenham interesse na temática da Economia Política: dirigentes sin­
dicais, ativistas de movimentos sociais, religiosos críticos, militantes estudantis, 
ativistas políticos. Pretende servir também para estudantes do ensino superior 
que queiram se iniciar ou se aprofundar neste tema.
E ste l iv r o e s e u s d o is v o l u m e s
Este é o primeiro dos dois volumes que compõem o livro, constituído de 
ensaios de autores que apresentam uma perspectiva similar sobre o capitalismo 
e sobre a obra de Marx; e, nesse aspecto, embora escrito por diversas mãos, não 
se encontrarão divergências de interpretação entre textos aqui reunidos. U m a ou 
outra repetição poderá ser encontrada, mas divergências não existem.
Este primeiro volume está dividido em duas partes, sendo que a segunda foi 
escrita especialmente para esta coletânea.
A prim eira parte, de nossa autoria, está destinada à exposição sobre a 
mercadoria, o valor de troca e o valor, em um ensaio escrito há m uito tempo. 
Trata-se de um a espécie de guia de leitura do prim eiro capítulo d’0 capital. A 
segunda parte, para a qual contribuem vários autores, discute um a variedade 
de temas: a natureza e as funções do dinheiro, a mais-valia e suas formas e, 
finalmente, o trabalho produtivo e — um assunto correlato —, a discussão 
sobre a centralidade do trabalho. Em ambas partes, os temas discutidos apa­
recem no Livro I d ’0 capital ou estão a ele diretam ente relacionados. Neste 
sentido, cabe ressaltar que todas as citações, neste volume, do Livro I d ’0 ca­
pital seguem a edição portuguesa deste livro publicada pela Edições Avante!, 
em um a cuidadosa tradução de um a equipe coordenada pelo Prof. D outor 
José Barata-Moura.
N o segundo volume serão discutidos temas como o conceito de capital in­
dustrial, a essência e a aparência no capitalismo, a relação entre valor e preço de 
mercado, a tendência decrescente da taxa de lucro, capital comercial, capital a 
juros, capital financeiro, fictício e parasitário, lucros fictícios e renda da terra, 
grande parte incluída por Marx no Livro III d’0 capital.
S o b r e a p r i m e i r a p a r t e d e s t e v o l u m e
Nesta primeira parte apresentamos os conceitos de mercadoria, valor de tro­
ca, valor e também outros a eles relacionados. A extensão deste ensaio se justifica 
pela relativa dificuldade dessa parte d’O capitai, pelo fato de que ali se concentra 
implicitamente o central do método marxista; mas, principalmente, porque se 
criou a falsa ideia de que sua leitura, no original, seria praticamente impossível 
para “o comum dos mortais”. Por razõesde ordem didática, decidimos manter 
a redação das “Preliminares” e dos seus dois primeiros capítulos dividida por 
parágrafos ou pouco mais que isso, numerados sequencialmente, tal como se 
apresentava na primeira edição do ensaio.
A origem da primeira parte - um nosso ensaio denominado “A dialética da 
mercadoria” - é bastante antiga, embora tenha sofrido ajustes e uma significativa 
ampliação com os anexos que foram agregados mais ou menos recentemente.1 
Sua primeira versão foi escrita em espanhol há muitos anos e, desde então, tem 
sido usada intensamente em atividades didáticas.
Seu texto teve como ponto de partida nossos esquemas de aulas ministradas 
em Manágua para aqueles que chegaram a ser, logo em seguida, os professores 
de economia marxista na Universidad Nacional Autónoma de Nicarágua, pouco 
depois da vitória da revolução sandinista, em 1979. Os mesmos esquemas foram 
usados por esses professores em suas aulas. A direção sandinista, de então, havia 
decidido que se ensinasse economia marxista para os alunos de todos os cursos 
da universidade.
Foi justamente a partir desses esquemas que decidimos escrever o texto ori­
ginal do ensaio em espanhol, em mais ou menos 1980. Em 1982, foi publicado 
como capítulo de um livro pela Editora Educa de Costa Rica.2 
N o prefácio dessa edição, Wim Dierckxsens afirmava:
( ...) A dialética da mercadoria ( ...) o autor apresenta como se fosse simplesmente 
um guia de leitura. E muito mais que isso, é uma interpretação dos elementos fun­
damentais da teoria marxista do valor.3
N o Brasil, exceto alguma divulgação mimeografada de uma tradução que 
elaboramos, foi publicado em uma edição artesanal e de circulação limitada de 
1993. Paulo Nakatani, na apresentação, referia-se dessa maneira a esse texto:
( ...) é um roteiro para o estudo do Capítulo I d ’O capital. Nesse sentido não dis­
pensa, de forma alguma, a leitura do original. Ambos devem ser lidos em paralelo. 
O primeiro capítulo, considerado dos mais difíceis da obra de Marx, é apresentado
1 Agradecemos a M ário Duayer e a M arcelo D . Carcanholo que tiveram a gentileza de ler e fazer suges­
tões para sua melhoria.
2 C A R C A N H O L O , R. Dialéctica de la mercancía y teoría del valor. San José: Educa.1982.
3 DIER CK XSENS, W im . “Presentación”. In: C A R C A N H O L O , op. cit. (tradução nossa).
9
de forma clara nos seus desdobramentos lógicos. Parte da questão fundamental i 
Ciência Econômica, colocada pelos clássicos, sobre a natureza da riqueza na socii 
dade capitalista. Apresenta de forma metodologicamente correta a análise de Mai 
sobre a mercadoria e suas diversas faces, como contradições em movimento. Assin 
exclui, desde o início, a possibilidade de uma leitura positivista d’O capital.
E continua suas considerações:
A explicitação da forma mercadoria como essência e aparência permite distingui 
precisamente o valor do valor de troca e mostra que não é preocupação de Marx a ex 
plicação dos preços relativos. Além disso, permite demonstrar que a teoria do valor 
trabalho de Marx não é metafísica: é materialista dialética. A gênese da mercadori; 
expressa-se através da gênese da sua forma, o valor de troca. Essa forma não é estáti­
ca, mas a expressão dinâmica das contradições sociais através da forma mercadoria.4
N o Brasil, desde 1983, temos utilizado o mencionado ensaio nas aulas da 
universidade e isso também foi feito por colegas de outras universidades de diver­
sos Estados do país: Paraíba, Acre, Rio Grande do Norte, Piauí, Alagoas, Bahia, 
Goiás, Maranhão, Espírito Santo, Paraná e Rio Grande do Sul (Santa Maria e 
Ijuí), e não só em cursos de Economia. O texto também já foi utilizado em cur­
sos de formação de militantes de movimentos sociais (MST, Via Campesina, 
movimento estudantil etc.).
N o entanto, o presente texto sofreu algumas adaptações e foi revisado es­
pecialmente para esta publicação. U m a nova similar, em espanhol, foi recém- 
publicada pela Editora Félix Varela, de Havana.
U m a das alterações para esta publicação foi o esforço de facilitar ao leitor as 
referências das citações d ’O capital em edições brasileiras. São duas as principais 
traduções correntes no Brasil até hoje: a realizada por Reginaldo Sant’anna, pu­
blicada primeiramente pela extina editora Difel e hoje pela editora Civilização 
Brasileira; e a tradução coordenada por Paul Singer publicada pela Nova Cultural 
e depois pela Abril Cultural. Esta última tradução encontra-se hoje esgotada. Ao 
longo da primeira parte deste volume utilizaremos o seguinte procedimento para 
indicar as traduções brasileiras dos trechos citados:
a. Dentro dos parênteses, em seguida ao nome de Marx, aparecerá o núm e­
ro da página correspondente à edição da Edições Avante! (Marx, p. ...)
b. Logo a seguir, entre colchetes, aparecerá o correspondente à edição de 
1998 da Civilização Brasileira [ ]
c. Entre chaves, aparecerá o núm ero da página das antigas edições da 
Coleção dos Economistas { }
4 Sua legítima reclamação, feita em seguida, sobre a ausência da discussão da temática do fetichism o, é 
atendida neste livro no seu capítulo 4.
10
S o b r e a s e g u n d a p a r t e d e s t e v o l u m e
Os textos reunidos na segunda parte deste volume discutem temas como di­
nheiro, capital e mais-valia, as formas da mais-valia, a centralidade do trabalho e 
o trabalho produtivo e contam com a colaboração de vários colegas com os quais 
compartilhamos a interpretação sobre a obra de Marx. São eles: Paulo Nakatani, 
Sérgio Prieb, Helder Gomes e Maurício Sabadini.
E possível que, para alguns dos nossos leitores, a Introdução deste livro — 
que trata da teoria dialética do valor-trabalho —, apresente alguma dificuldade 
para ser compreendida em sua plenitude. Assim, se isso ocorrer, sugerimos que 
abandonem a sua leitura e retornem a ela depois de terem lido pelo menos os seis 
primeiros capítulos do livro. Verão que o conteúdo da “Introdução” se tornará 
algo quase transparente.
Em Vitória (ES), América Latina, janeiro de 2011.
Reinaldo A. Carcanholo
11
I N T R O D U Ç Ã O
Reinaldo A. Carcanholo
“Definição” de valor: - “Valor é a quantidade de trabalho 
socialmente necessária para produzir uma mercadoria.” 
“Entre o valor e o valor de troca não há distinção, 
são expressões que indicam rigorosamente a mesma coisa.” 
“Para Marx, os preços de mercado são sempre proporcionais às quantidades 
de trabalho socialmente necessário para a produção das mercadorias.”
I
As três afirmações em epígrafe, fáceis de serem encontradas em manuais e 
em exposições introdutórias de economia marxista, estão rigorosamente erradas; são 
falsas. Constituem, na verdade, um desserviço ao conhecimento do pensamento 
econômico marxista e são o resultado de uma perspectiva ingênua e superficial 
da teoria.
Comecemos pela terceira das afirmações. E necessário destacar, de início, 
que é mais ou menos generalizada a ideia de que a teoria marxista do valor é uma 
teoria dos preços ou, o que é a mesma coisa, que sua preocupação principal é a 
explicação de como se determinam os preços das mercadorias em uma econo­
mia capitalista, ou por que eles são mais ou menos elevados. Nada mais longe 
da verdade.
Ela é, de fato, uma teoria sobre a natureza da riqueza capitalista e, particu­
larmente, sobre a produção dessa riqueza. Não é por outra razão que o primeiro 
parágrafo do capítulo sobre a Mercadoria d ’O capital (que é seu primeiro capítu­
lo) pergunta-se justam ente sobre isso: o que é riqueza capitalista? Qual é a sua 
natureza?
E verdade que a teoria marxista do valor ou, como passaremos a chamá-la, 
teoria dialética do valor-trabalho, pressupõe a existência de uma relação entre os con­
ceitos de valor e preço de mercado e essa relação é de tipo quantitativo, mas se 
trata de uma relação mediada por certas determinações.1
E indispensáveldizer, desde já, que valor e valor de troca são conceitos total 
e completamente diferentes. Mas, adiantemos neste momento que entre preço
1 Interessante tratamento disso encontra-se em Rosental (s/d), pp. 270 e seguintes.
13
de mercado (o preço que comumente observamos no dia a dia de determinada 
mercadoria) e valor de troca existe sim uma relação muito mais próxima. O pre­
ço de mercado é um tipo de valor de troca especial, quando este último envolve 
uma relação da mercadoria com o dinheiro. Mas, vamos com calma.
O Q U E É V A L O R E O Q U E É V A L O R D E T R O C A P A R A M A R X ?
O valor de troca de uma determinada mercadoria é a proporção de troca que 
ela realmente estabelece com outra mercadoria qualquer. N a sociedade mercan­
til algo desenvolvida e, obviamente, no capitalismo, o valor de troca entre duas 
mercadorias é normalmente intermediado pelo dinheiro.
Assim, a mercadoria não possui somente um valor de troca, mas tantos valo­
res de troca quantas são as demais mercadorias existentes na sociedade. O preço, 
ao contrário de certas interpretações equivocadas,2 é simplesmente o valor de 
troca da mercadoria quando a outra é a mercadoria dinheiro.3
O conceito de valor foi descoberto por Marx a partir de uma observação 
adequada do valor de troca. O que podemos, então, entender por valor? Trata-se, 
em um primeiro momento e só num primeiro m omento,4 de uma propriedade, 
de uma característica intrínseca a cada mercadoria, propriedade essa que é social 
(não natural) e que consiste no poder de compra, no poder de atração que possui 
essa mercadoria sobre as demais e que permite que ela tenha aqueles valores de 
troca determinados e não outros menores ou maiores. Esse poder de compra 
está relacionado, numa primeira análise, à riqueza mercantil que a sociedade re­
conhece na sua existência (a quantidade de trabalho socialmente necessário para 
produzi-la). E aí que fica determinado que a magnitude do valor é a magnitude 
da riqueza mercantil que foi produzida pelo trabalho social, pelo esforço produtivo 
da sociedade desviado eventualmente de outros fins.
Insistamos que o valor não é uma propriedade natural da mercadoria, isto 
é, o objeto que constitui a mercadoria não possui por sua própria natureza essa 
propriedade ou característica; trata-se de uma propriedade social; é-lhe entregue 
à mercadoria pela sociedade e somente pelo fato de esta última estar organizada 
de maneira mercantil ou capitalista (que é uma sociedade mercantil mais desen­
volvida) .
Enquanto o valor, então, é uma propriedade social inerente, interior à mer­
cadoria, expressão nela das particulares relações sociais existentes e, portanto, 
uma categoria da essência da sociedade capitalista, o valor de troca é sua forma
2 Cf., por exem plo, N apoleon i (1981), p. 147.
3 O surgimento do dinheiro de crédito, que é o que conhecem os nos dias de hoje, complica o assunto, 
mas não invalida essa afirmação.
4 C om o qualquer outro conceito da dialética materialista, trata-se de algo que apresenta um desenvol­
vim ento, isto é, transforma-se ao longo do tem po.
14
de manifestação e aparece na superfície mesma dos fenómenos; por isso, dire­
tamente observável.5 O valor é poder de comprar, o valor de troca é a compra 
efetivada ou pelo menos imaginada, com magnitudes definidas das mercadorias 
envolvidas.
Afirmamos, desde o inicio, que a teoria dialética do valor-trabalho é uma 
teoria da riqueza capitalista e não dos preços. Para ela, a mercadoria é a célula da 
riqueza nesse tipo de sociedade e o conjunto das mercadorias existentes consti­
tui a riqueza disponível. De fato, o dinheiro, que hoje aparece desmaterializado 
e que se apresenta aos nossos olhos como a própria riqueza, nada mais é que 
um título com poder de comprar mercadorias e por isso se apresenta aos nossos 
olhos como riqueza.
A mercadoria, como se sabe, está constituida por dois aspectos ou dois po­
los: o valor de uso e o valor. Sendo este último, na sociedade capitalista (mer­
cantil desenvolvida), o polo dominante, ele constitui, na verdade, através de sua 
grandeza, a magnitude da riqueza social produzida. Por isso é que podemos asso­
ciar a riqueza em nossa sociedade com o valor e este, como propriedade de uma 
determinada mercadoria, representa a riqueza reconhecida pela sociedade como 
engendrada no momento da sua produção.
Mas, ao mesmo tempo em que o valor é a riqueza na época capitalista, con­
siste no já mencionado poder de compra da mercadoria que o possui. Esse poder 
pode ser maior ou m enor dependendo da quantidade de trabalho socialmente 
necessário para produzi-la. N o entanto, a continuidade da análise revelará que o 
valor não é o seu real poder de compra; esse poder real, embora conformado fun­
damentalmente pela riqueza que ela representa, encontra-se alterado por certas 
determinações.
Se denominarmos poder de compra original aquele fixado diretamente pela 
magnitude do valor da mercadoria, podemos dizer que, na verdade, o real poder 
de compra normalmente se situará em um nivel superior ou inferior, dependendo 
da mercadoria, de maneira que aquelas com poder inferior em relação ao original 
compensam as que possuem poder superior. As diferenças entre o poder original 
e o real existem em razão de determinações estruturais do sistema capitalista e 
são explicadas pela teoria. Por outra parte, no dia a dia, o poder efetivo de compra de 
uma mercadoria flutua em torno do poder real e essas flutuações são o resultado de 
determinações secundárias e conjunturais e caracterizam o que na verdade é o seu 
preço de mercado (ou melhor, o preço em dinheiro que vemos no dia a dia).
Em última instância podemos dizer que as flutuações em torno do real poder 
de compra de uma determinada mercadoria são determinadas pelo jogo da oferta 
e da demanda. Assim, dentro desses limites, não seria errado afirmar que, para 
Marx, os valores de troca e, em particular, o preço de uma mercadoria determi- 
na-se pela oferta e demanda.
5 Sobre a relação dialética entre essência e fenôm eno, cf. Rosental (s/d), especialmente o capítulo VI.
15
Podemos resumir o assunto afirmando que três diferentes tipos de poder de 
compra existem em uma mercadoria: o poder original (determinado diretamente 
pelo valor), o poder real (que difere do anterior por determinações estruturais do 
sistema) e o poder efetivo (caracterizado pelo preço de mercado) que flutua no dia 
a dia em torno do poder real em razão de determinações circunstanciais da oferta 
e da demanda.
Poder de compra:
1. original --------------------magnitude do valor
2. real < ---------------- valor + determ inações estruturais
3. efetivo (prego de mercado) ■*---------------- oferta e demanda
Assim, reafirmemos que valor e valor de troca são conceitos diferentes; to­
talmente diferentes, embora relacionados. Enquanto este último, o valor de tro­
ca, é algo perceptível por meio da observação empírica, aquele, o valor, é uma 
dimensão da essência. O valor de troca é uma forma de manifestação do valor, 
forma essa que não é expressão perfeita e nem totalmente adequada deste último. 
Trata-se assim de dois conceitos relacionados, mas que não podem ser confundi­
dos: um se refere à essência e o outro à aparência, formando, em conjunto, uma 
unidade contraditória na qual cada um deles é um de seus poios.
Portanto, na teoria dialética, não há uma “lei do valor” que diga que os valo­
res de troca e os preços estejam determinados diretamente pelas quantidades de 
trabalho socialmente necessário contido nas mercadorias ou, em outras palavras, 
que as mercadorias devam ser trocadas na proporção inversa de seus valores (o 
poder real), como sugerem alguns autores.6 Essa visão equivocada algumas vezes 
é expressa de outra forma, ou seja, que o valor seria “norm a” de intercâmbio. Se 
é que na teoria econômica marxista temalgum sentido falar-se em “lei do valor”, 
com certeza não é no sentido apontado.7
Se imaginássemos uma situação em que o efetivo poder de compra das merca­
dorias em geral não fosse alterado nem por determinações secundárias e nem 
por estruturais e se, assim, ele fosse diretamente proporcional às magnitudes 
dos seus valores, isto é, às quantidades de trabalho socialmente necessário nelas 
contido, teríamos o que denominamos preços correspondentes aos valores e nesse caso 
encontraríamos, na equação de troca entre duas mercadorias quaisquer, de am­
bos os lados, a mesma quantidade de trabalho abstrato (de trabalho socialmente 
necessário para a produção delas).
6 Cf. por exem plo, N apoleoni (1981), p. 147.
7 Sobre o assunto, cf. Borges (2004).
16
Mas, ao contrário, na realidade vamos encontrar preços que não correspon­
dem aos valores, de maneira que diferem entre si o poder efetivo e o poder de com­
pra original (o valor) da mercadoria. Assim, os preços de mercado se distanciam, 
mais ou menos, desses preços correspondentes aos valores, fazendo com que o 
poder original de compra não se efetive exatamente. Que implicação tem isso? 
A consequência é que os produtores de determinada mercadoria se apropriarão 
de magnitude de valor diferente daquela que produziram. O valor produzido 
será diferente do apropriado e essa diferença implicará uma transferência: trans­
ferência de valor de um produtor para outro. Aqueles que consigam preços de 
mercado superiores aos correspondentes aos valores se apropriarão de mais valor 
do que produziram, e os com preços inferiores, ao contrário, se apropriarão de 
menos, compensando o ganho dos anteriores. Daí a necessidade de entendermos 
os conceitos de produção, apropriação e transferência do valor, tema cuja análise 
será detalhada no capítulo 3 deste livro.
Poderíamos resumir tudo isso dizendo que a magnitude do valor de uma 
mercadoria determina a grandeza da riqueza social que ela representa e mede a 
riqueza produzida socialmente no instante de sua produção. N o entanto, a ri­
queza que ela representa em cada instante para seu possuidor (o que chamamos 
de real poder de compra), ao contrário, mede-se pela capacidade que a mercadoria 
possui realmente e em média de, no mercado, apropriar-se de valor sob a forma 
de outra mercadoria ou de dinheiro.8 Isso significa que uma mercadoria ou certo 
montante delas representa uma determinada magnitude de riqueza para socie­
dade e outra diferente para seu possuidor? Em certo sentido isso é correto, mas 
mais adequado seria dizer que são grandezas diferentes quando considerados os 
dois pontos de vista possíveis: o da totalidade e o do ato individual e isolado. O 
primeiro ponto de vista se refere à essência do conceito e o segundo, à aparên­
cia.9
As diferenças entre produção e apropriação de valor resultantes da diferença 
entre o poder de compra original e o efetivo, quando derivadas de determinações 
estruturais, podem e são efetivamente explicadas pela teoria. Algumas delas po­
demos mencionar aqui: o conceito de preço de produção,10 a existência de m o­
nopólios e os correspondentes conceitos de preço de monopólio e de renda abso­
luta de monopólio,11 a intervenção estatal. Quando derivadas de determinações 
secundárias não constituem objeto teórico, pelo menos não interessam a uma 
teoria geral sobre o capitalismo. Dessa forma, a diferença entre o poder original e 
o real é explicado teoricamente; aquela que existe entre o real e o efetivo, por ser 
circunstancial, está fora da preocupação de uma teoria geral.
8 D entro dos lim ites dos valores individuais extrem os do setor que produz essa mercadoria, essa capa­
cidade é denominada por Marx valor social ou de mercado. Sobre o assunto, cf. Carcanholo (2003).
9 Recordem os, uma vez mais, que a aparência para a perspectiva da teoria dialética do valor não se refere
a um equívoco do observador, mas a uma das dim ensões “verdadeiras” do real.
10 Para mais detalhes c f Carcanholo (s/d e 2000a).
11 Sobre esse conceito cf. Carcanholo (1984).
17
Regressemos à primeira frase da epígrafe, a de que valor se “defme” como 
quantidade de trabalho. Talvez já tenha ficado claro que a afirmação é duplamen­
te enganosa. Primeiro porque valor não se define e segundo porque valor não é 
quantidade de trabalho. Mas, a verdade é que também aqui se aplica a expres­
são “onde há fumaça, há fogo”. Em muitos textos, especialmente manuais, ele é 
“definido”, de fato, como a quantidade de trabalho socialmente necessário para 
a produção de uma mercadoria. Como definição de algo sobre o qual pouco ou 
nada se entende pode ser excelente, pois é simples, sintética e facilmente memo- 
rizável. Como algo que chegue a ter alguma significação teórica, essa “definição” 
é descartável e pouco menos que ridícula.
A quantidade de trabalho socialmente necessário determina a magnitude do 
valor, refere-se à sua dimensão quantitativa, à sua grandeza, mas não à sua na­
tureza. O valor não é trabalho, embora encontre nele o seu fundamento. Valor, 
como vimos, aparece inicialmente como uma propriedade social das mercadorias 
que consiste em certo poder de compra, de magnitude só aproximadamente de­
terminada. E uma qualidade delas, um adjetivo atribuído objetiva mas socialmen­
te a elas. E mais: é realmente isso, mas só é isso durante um tempo, um período, 
uma determinada época.
O erro está em confundir a natureza do valor com sua magnitude ougrandeza; 
com sua dimensão quantitativa. De fato, a magnitude do valor determina-se12 pela 
quantidade de trabalho socialmente necessário para a reprodução da mercadoria, e 
esse é um aspecto importante. N o entanto, entender com profundidade o valor 
em sua natureza mais íntima (como processo de desenvolvimento e mais do que 
simples propriedade dos produtos do trabalho, como expressão objetivada das 
relações sociais mercantis) é fundamental para que se entenda o conceito de ca­
pital e, como consequência, o capitalismo contemporâneo, passando pelo capital 
fictício, pelo capital financeiro. O valor-capital, ou simplesmente capital como 
normalmente o chamamos, é, na verdade, um valor; só que um valor desenvol­
vido e que deixa de ser propriedade da mercadoria e passa a ter existência em si 
mesmo, algo como um fantasma desmaterializado.13
Reafirmemos que o valor, como qualquer categoria da dialética marxista, 
não se refere a algo dado, a algo que possa ser definido de uma vez para sempre. 
O valor é, na verdade, um processo de desenvolvimento que, como qualquer ou­
tro, possui seu nascimento, desenvolvimento, maturidade, velhice ou senilidade 
e morte. Se for mais fácil de se entender, podemos dizer que o valor é algo que 
está em permanente processo de desenvolvimento. Esse processo é, ao mesmo 
tempo, o desenvolvimento das relações sociais mercantis no seio da humani­
dade. Como está em permanente desenvolvimento, o que é hoje deixará de ser 
amanhã e é diferente do que foi ontem, da mesma maneira como ocorre com
12 M ede-se pelo tem po de trabalho.
13 Aliás, com o qualquer fantasma que se preze. U m a análise detalhada disso aparece no capítulo 6 deste 
livro.
18
qualquer ser orgânico, inorgânico ou social. Por isso, defini-lo de alguma forma 
é uma completa insensatez.
E verdade que o valor, durante certo período pode ser descrito como uma 
característica, um adjetivo, uma qualidade social. Trata-se de algo que existe no 
interior da mercadoria e não pode desprender-se dela; a destruição da mercado­
ria é sua destruição. Mas tudo isso é correto na etapa de seu desenvolvimento 
anterior à sua maturidade. E essa maturidade é alcançada quando o valor se trans­
forma em capital, com o surgimento do capitalismo.
E isso mesmo! O capital é simplesmente valor, só que um valor mais de­
senvolvido, que já alcançou sua maturidade. Ele agora é capaz de se reproduzir, 
produzir seus filhinhos(a mais-valia). Ele, agora, já não é mais uma simples 
propriedade social ou um simples adjetivo da mercadoria. Ele adquiriu vida pró­
pria, transformou-se em ser com vida própria. Ele não perece com a mercadoria 
que lhe porta, ele agora é eterno, ou melhor, pretende ser eterno.14 Ele saiu da 
infância e adquiriu sua maturidade; é o que Marx chama de “substantivação do 
valor” (de adjetivo, transformou-se em substantivo) quando o valor se converte 
em capital.15
O valor-capital, ou simplesmente capital, agora existe em si e para si. Utiliza- 
se das formas corpóreas das mercadorias e do dinheiro, mas não se confunde 
com elas. Ele se transforma não só em ser com vida própria: passa a ser o sujeito 
da sociedade e da história e transforma o ser humano em mero aspecto seu. E o 
que se pode chamar de inversão do sujeito histórico e social. Seu desígnio de alcançar o 
posto de sujeito absoluto da história é inalcançável, por encontrar seu oponente, 
apesar de tudo, na rebeldia inerente, essencial à natureza humana que, por mais 
que apareça na pré-história da humanidade (isto é, nos nossos dias) como algo 
embotado, violentado, subjugado, manifesta-se sempre, mesmo que de maneira 
pouco eficiente ou significativa; na realidade, a rebeldia humana encontra-se, de 
certa maneira, em todos os momentos da história das sociedades de classe.
A existência em si e para si do valor como capital talvez apareça mais clara­
mente aos nossos olhos nos dias de hoje, com a predominância do que se está 
chamando de capital financeiro e que melhor ficaria caracterizado como capital 
fictício ou capital especulativo parasitário. Neste momento de nossas vidas, o 
capital aparece como um poderoso ser que nem mesmo precisa da materialidade 
das mercadorias para sua existência. Ele aparece como algo total e absolutamente 
abstrato, desprovido de substância material, mas que existe realmente e está aqui, 
ali e em todo lugar, mas não o vemos diretamente. E abstrato, invisível, sem ma­
terialidade, ubíquo e todo poderoso.
O capital hoje não é senão o mesmo conceito anterior de valor, só que agora 
em um estágio superior de seu desenvolvimento. Superou inclusive sua matu-
14 Por sorte isso é uma impossibilidade teórica e histórica.
15 Cf. Carcanholo e Nakatani (1999).
19
ridade. Alcançou a senilidade16 e, sem dúvida, está hoje mais perto de sua morte 
como conceito e como ser que organiza a sociedade e dirige nossas vidas e nossas 
mortes.
Que diferente, agora, ele (o valor) se apresenta daquilo que se pretende defi­
nir simplesmente como quantidade de trabalho socialmente ...! Que insensatez é 
definir valor de qualquer maneira que seja! A única coisa que podemos pretender 
fazer é descobrir as leis de seu desenvolvimento; descrevê-las. Essa foi a tarefa 
de Marx, de sua vida: descrever essas leis em suas linhas mais gerais. E, o que 
podemos pretender fazer? Descobrir suas especificidades contemporâneas, suas 
consequências, suas implicações, as potencialidades do seu trajeto futuro. Não 
é uma tarefa fácil, mas muito do caminho já foi seguido, outro tanto apontado; 
precisamos percorrê-lo e descobrir por onde continua.
Obviamente que, se partíssemos do equívoco mencionado anteriormente 
de confundir os conceitos de valor e valor de troca, entender o conceito de ca­
pital seria absolutamente impossível e impediria uma visão aprofundada da teo­
ria econômica marxista, da teoria dialética do valor-trabalho. Mas por que se 
apresenta esse equívoco de maneira tão frequente com tão sérias implicações 
negativas?17 Por que existe tão generalizadamente esse erro?
N a verdade, nossa hipótese sobre esse equívoco é de que ele deriva, de certa 
maneira, da responsabilidade do próprio Marx. Ocorre que esse autor usa um 
mesmo nome para duas coisas diferentes. Usa o nome de valor de troca para 
referir-se à aparência do valor e a palavra valor a usa para a sua essência. E, qual 
é o nome que dá a unidade desses dois poios contraditórios? Como denomina a 
unidade entre o valor e o valor de troca, entre a essência e a aparência? Para de­
signar a mencionada unidade utiliza também a palavra valor! Não tem um termo 
especifico e diferenciado para ela mesma. U m nome para duas coisas diferentes. 
Algumas vezes, por exemplo, quer se referir à manifestação do valor (ao valor de 
troca) de uma determinada mercadoria e afirma que o valor dela é igual a certa 
quantidade de dinheiro. Assim está se referindo ao valor de troca especial (o pre­
ço), mas fala em valor. Usa a palavra valor pensando na dimensão aparencial da 
unidade contraditória que une a aparência e a essência.
Para finalizar, poderíamos mencionar vários outros aspectos ou afirmações 
que resultam de incompreensões da teoria de Marx, uns resultantes de maior, 
outros de m enor ingenuidade. Mas não faremos isso. E só para despertar a curio­
sidade dos leitores e os induzir à leitura dos próximos capítulos, também a outra 
afirmação que aparece no epígrafe (a de que “a mais-valia é a diferença entre o 
valor produzido pelo trabalho e o valor da força de trabalho paga pelo empresá-
16 N ão deve ser por outra razão que Reinaldo Gonçalves, na sua profunda intuição teórica, chama a 
etapa capitalista atual de senil. Cf. G onçalves (2002).
17 O próprio E. M andei, no seu Tratado de economia marxista (1969), ao usar essas expressões, valor e valor 
de troca, com o se fossem sinônimas, induz à confusão (cf. páginas 85, 95, 213 e 264). N o entanto, 
em algumas passagens do seu texto, especialmente quando fala da transferência de valor, a identidade 
entre esses conceitos parece não estar presente em sua interpretação.
20
rio, pelo capitalista”) deixaremos para discutir depois. Veremos, então, por que 
ela não é correta, pelo menos não é correta totalmente.
II
Independente de visões mais ou menos ingênuas, o fato é que a teoria mar­
xista do valor é muito pouco compreendida pela maioria das pessoas, existindo 
incompreensão mesmo entre aquelas que possuem algum grau de leitura sobre
o assunto. O conceito de valor, referido acima, muitas vezes é visto como algo 
difícil de ser entendido.
Veja-se, por exemplo, o que aparece em um excelente artigo publicado em 
conceituada revista:
Para compreender o capitalismo, precisamos de vários conceitos e teorias. Por exem­
plo, o dificílimo conceito de valor, o conceito da(s) forma(s) valor e das relações de 
valor, sobre os quais a doutrina oficial dominante da economia nada quer saber. Sem 
uma apropriada teoria do valor, sem uma teoria do processo de criação do valor, não 
podemos formular nenhum conceito de capital (...) (Krátke, 2008, pp. 65-66).
A afirmação do autor é correta e extremamente importante, mas em um 
aspecto não podemos concordar: não estamos de acordo que o conceito de valor 
seja dificílimo. Não o é! E estamos seguros de que o acompanhamento dos en­
saios que se apresentam neste livro demonstrará isso.
Que razões existiriam para que muitos considerem que o conceito de valor 
e a teoria do valor de Marx, ou teoria dialética do valor-trabalho, sejam muito 
difíceis?
De fato, alguma complexidade essa teoria do valor realmente apresenta 
(como se pode comprovar pelas linhas acima), mas muito m enor do que muitos 
de seus leitores acreditam e menos do que alguns de seus divulgadores querem 
fazer crer, pelo menos no que se refere aos seus aspectos básicos e indispensáveis 
para uma leitura adequada e satisfatória d ’O capital.
E interessante notar que, apesar dessa nossa compreensão, a verdade é que 
mesmo alguns leitores qualificados de Marx, tanto no que se refere aos aspec­
tos mais filosóficos do seu pensamento, quanto particularmente ao seu método 
dialético, encontram dificuldades ao enfrentarem-se com a teoria do valor. E 
isso é um aspecto curioso e nos faz pensar que algo de relevante existe em tudo 
isso. Como é possível que alguém, com compreensãoprofunda sobre a dialética 
marxista e, em particular, com capacidade para entender a dialética presente n’O 
capital não consiga apropriar-se adequadamente da teoria do valor ali exposta?
Isso é muito mais grave ainda pelo fato de que essa teoria do valor não se 
constitui em aspecto de menor significação. A apresentação feita por Marx sobre
21
o tema não se limita ao primeiro capítulo d ’O capital; encontra-se desenvolvida, 
em sua totalidade, no conjunto dessa obra, ao longo de suas diferentes partes. 
Assim, os capítulos do seu livro III, por exemplo, pelo menos a grande maioria, 
são fundamentais para a teoria dialética do valor. Poderíamos ir mais longe e 
dizer que essa teoria se confunde mesmo com a teoria econômica do capitalis­
mo, exposta n ’O capital, e que conceitos desenvolvidos em capítulos avançados 
dessa obra, inclusive os do livro III, são meros aspectos seus. Conceitos como os 
de capital, mais-valia, capital comercial, capital a juros, capital fictício, renda da 
terra não passam de elementos dentro da teoria do valor, conceitos mais desen­
volvidos do próprio valor. Não entender o significado do valor é não entender 
a verdadeira natureza de cada um desses conceitos. Em resumo podemos dizer 
que a teoria marxista do valor, ou teoria dialética do valor-trabalho, é, ela mesma, 
a teoria de Marx sobre a sociedade capitalista, incluindo seus aspectos chamados 
econômicos e também os não econômicos. Destaquemos aqui também os seus 
aspectos não econômicos!
Não temos uma resposta definitiva para a questão apresentada: a dificulda­
de que se apresenta para muitos em entender a mencionada teoria. Poderíamos 
pensar que a razão estivesse na existência de muitas interpretações equivocadas 
e contrapostas sobre ela, divulgadas por vários meios. Sem embargo, em última 
instância, isso não resolveria o problema. Muitas vezes tais interpretações não 
resultam de uma deliberada intenção de seus autores em deformá-la, mas são 
fruto de verdadeiro equívoco de seus autores. Assim, essas interpretações defor­
madoras não seriam a causa, mas consequência da dificuldade da mencionada 
compreensão teórica.
E verdade que existem deformações deliberadas e o exemplo mais emble­
mático é, talvez, a de Steedman (1985), mas é mais correto pensar que a maioria 
provém de equívocos de seus formuladores.
Nossa hipótese preliminar é a de que a dificuldade tem como origem a con­
taminação que a teoria marxista sofre com elementos, convicções, formulações 
e conclusões provenientes de concepções científicas diferentes, em particular, 
provenientes da teoria ricardiana do valor,18 mas não só dela.
Indiscutivelmente a teoria dialética do valor-trabalho aparece contaminada 
com elementos estranhos, em grande parte originados das interpretações dis­
poníveis. Essa contaminação aparece tanto em textos de divulgação com caráter 
didático (em particular os famosos manuais), quanto em trabalhos com carac­
terísticas científicas que pretendem criticar ou aprofundar teoricamente certas 
questões.
Pior que tudo isso é o fato de que essas interpretações contaminadoras, em 
particular as expressas em textos com caráter mais científico, induzem muitos 
pesquisadores marxistas ou paramarxistas, na tentativa de solucionar as dificul­
18 Para conhecer a nossa interpretação sobre a teoria do valor de Ricardo, cf. Carcanholo e Teixeira 
(1992) e Carcanholo (2002).
22
dades ou as supostas dificuldades teóricas que apareceriam no texto de Marx, 
a trilhar caminhos complexos, multifários, contrapostos.19 O resultado disso é 
que terminam mais confundindo que levando à solução das dificuldades teóricas 
existentes ou sugeridas. As interpretações contaminadoras, ao mal interpretar as 
palavras de Marx e, como consequência disso, ao apontar dificuldades teóricas 
inexistentes ou a expressá-las de modo inadequado, levam à improdutividade 
muitos esforços sérios.
Entre os paramandstas estão, inclusive, aqueles que já não consideram rele­
vante a teoria marxista do valor. Pior ainda, não atribuem significação alguma a 
qualquer teoria do valor ou qualquer preocupação com ela. Esse tipo de teoria, 
para eles, constituiria uma espécie de pecado de juventude de qualquer estudio­
so e a conclusão seria de que, em sua maturidade, insistir nela implicaria pura 
ingenuidade. E verdade que esses paramandstas, que em quase todos os aspectos 
são irmãos dos antimarxistas, não causam maior dano, pois, ao abandonarem a 
preocupação com tal teoria, não a seguem contaminando com influências estra­
nhas ou diversionistas. Sofrem seus discípulos, aos serem condenados à ignorân­
cia de seus mestres, mas, pelo menos, a teoria permanece isenta das contamina­
ções que poderiam produzir.
Dificuldade maior causam muitos marxistas ou os paramandstas que ainda 
consideram relevante a questão. Sua legítima preocupação científica de enfren­
tarem os problemas e dificuldades existentes ou criados, ao formularem as in­
terpretações multifárias e contrapostas, só produzem “ruídos” que dificultam a 
compreensão adequada da teoria e fazem-na parecer muito mais difícil do que 
realmente é. Essas dificuldades que terminam criando funcionam como se fos­
sem “ruídos estáticos” que prejudicam as comunicações por ondas de rádio. Isso 
ocorre com muita frequência no que se refere à problemática da transformação 
do valor em preço de produção. A teoria de Marx dos preços de produção, na 
dificuldade de que se explique por que o lucro total não é igual à mais-valia total 
(problema que também é apresentado de outras maneiras20) constitui o objeto 
privilegiado de análise por parte dessas multifárias interpretações.
Assim, as péssimas influências produzidas pelo ecletismo e o ruído resul­
tante das tentativas multifárias podem, muito bem, ser a explicação da questão 
apresentada desde o início. Sem dúvida, esses elementos influenciam de maneira 
decisiva as tentativas de exposição didática da teoria, em particular nos manuais. 
Como eles se constituem em referência obrigatória para todos aqueles que en­
frentam dificuldades ao estudar a teoria do valor, o trajeto está concluído: ecletis­
mo mais ruído teórico, elaboração de manuais, incompreensão da teoria, resis­
tência em realizar um esforço de superação das dificuldades. A teoria marxista do
19 Originais, sim , mas pouco prom issores no que se refere ao seu resultado concreto.
20 Essa dificuldade, nas form ulações ainda mais diversionistas, é apresentada com o a impossibilidade da
existência das duas identidades fundamentais (o chamado “lem a” de Marx) ou ainda com o a “absur­
da” existência de duas diferentes taxas média de lucro (uma em valor, outra em preço de produção).
N ossa interpretação sobre a problemática aparece em Carcanholo (s/d e 2000).
23
valor aparece, pelo menos para alguns, como a matemática para aqueles que têm 
dificuldade com ela: basta uma equação qualquer, a mais elementar que seja, e o 
leitor já não entende mais nada.
Poder-se-ia argumentar que essa nossa perspectiva e todas as considerações 
anteriores padecem do defeito de que consideramos equivocadas todas as inter­
pretações diferentes da que professamos e que só ela seria, na verdade, a correta. 
E esse argumento em grande parte é correto. Consideramos adequada, em suas 
linhas básicas, nossa perspectiva sobre a teoria marxista do valor ou teoria dia­
lética do valor-trabalho, sujeita obviamente a discussões e aperfeiçoamentos em 
alguns de seus aspectos, mas não em sua perspectiva mais geral. Esperamos que 
as próximas páginas sejam suficientes para fazer com que as dificuldades aparen­
tes da teoria possam ser superadas.
24
PARTE I
M ERCADORIA , V A L O R E F E T I C H I S M O 1
Reinaldo A. Carcanholo
“Sente-se na própria essência do dinheiro algo da essência da prostituição.”
G. Simmel
“Se o dinheiro, segundo Augier, vem ao mundo com uma mancha natural desangue 
numa de àuas faces, o capital, ao surgir, escorrem-lhe sangue e sujeira por todos os 
poros, da cabeça aos pés.”
K. Marx
1 Agradeço os com entários de M ário Duayer e de M aurício Sabadini.
PRELIMINARES
1. A teoria do valor de Marx é, na verdade, muito mais ampla do que se 
tende a pensar. Em primeiro lugar, não se trata de uma teoria que se preocupe 
simplesmente em especificar os fatores que determinam os preços relativos ou o 
nivel dos preços no mercado. Ela não é isso. Seus objetivos são muito mais am­
plos e complexos e seu ponto de partida é a determinação teórica da natureza da 
riqueza capitalista.
Em segundo lugar, ela não se limita ao que se encontra desenvolvido no 
primeiro capítulo d’O capital, mesmo que complementada por aqueles dedicados 
ao problema da transformação dos valores em preços de produção. Os conceitos 
de capital e mais-valia, capital industrial, capital fictício, por exemplo, são as­
pectos fundamentais da mencionada teoria do valor, sem os quais ela não estaria 
completa e seria incompreensível. N a verdade, tais conceitos não são mais que 
formas desenvolvidas do valor e, portanto, os capítulos e seções d’O capital de­
dicados a eles são indispensáveis para a referida teoria; eles aparecem discutidos 
ao longo de toda a mencionada obra, em seus três diferentes livros. Capital, por 
exemplo, é o próprio valor em fase avançada de seu desenvolvimento. Assim, 
poderíamos dizer, sem nenhum exagero, que a exposição da teoria marxista do 
valor encontra-se no conjunto da obra econômica de Marx e, em particular, em 
seu livro maior: O capital.
2. Talvez essa seja uma das razões para que, desde sempre e até hoje, tenha 
existido exagerada incompreensão sobre a teoria de Marx sobre a sociedade capi­
talista, inclusive entre muitos daqueles que se consideram iniciados nesse tema. 
Essa incompreensão, além disso, tem como fundamento o fato de que muitos 
tratam de encontrar ali, de maneira imediata, resposta a perguntas não pertinen­
tes ou, pelo menos, mal formuladas.
3. Nosso objetivo, neste trabalho, é construir um roteiro de estudos sobre 
os aspectos básicos da teoria marxista do valor; sobre aqueles aspectos que apare­
cem desenvolvidos no primeiro capítulo d’O capital. Para isso seremos obrigados 
a apresentar nossa interpretação sobre o tema.
4. Devemos advertir imediatamente sobre uma importante característica 
d’O capital. Não vamos encontrar nesse livro a exposição dos resultados finais de 
uma pesquisa terminada; algo assim como um resumo das conclusões. De certa 
maneira, o que ali se expõe é a trajetória da pesquisa, os passos metodológicos 
necessários para ir descobrindo progressivamente cada nova categoria. Veremos 
que, ao lermos atenta e ordenadamente cada um dos seus sucessivos parágrafos,
27
estaremos sendo conduzidos de mãos dadas pelo autor. Ele nos levará da obser­
vação sistemática e metódica da realidade, ao descobrim ento das categorias; des­
tas e de um a nova observação do real, nos guiará para o descobrim ento de novas 
categorias. Com eçarem os logo a sentir-nos com o os verdadeiros descobridores 
das mesmas.
Aceitemos o convite do autor, cam inhemos sob sua condução durante al­
gum tem po, nos passos mais simples ou nos mais difíceis. N ão tardará m uito 
e nos daremos conta de que, em alguns passos, já não necessitaremos sua mão; 
poderem os cam inhar sozinhos.
5. N o entanto, com o estamos acostumados a exposições sobre resultados fi­
nais, sobre conclusões, inicialmente não entenderem os o convite do autor. Suas 
palavras soarão com o afirmações conclusivas.
Nossa intenção nos próximos parágrafos é, em relação exclusivamente ao 
prim eiro capítulo, dem onstrar ao leitor que o autor d ’O capital efetivamente en­
tregou-nos o referido convite e dar os passos mais importantes ali explicitados, 
aceitando as duas mãos de Marx. Em algumas oportunidades nos atreveremos a 
dar alguns passos sem sua ajuda; nesse m om ento estaremos convidando o leitor 
para que nos acompanhe.
6. Antes de entrarm os diretam ente no tema, é indispensável um a última 
observação. N a verdade, a exposição d ’O capital não expressa de maneira com ­
pleta o cam inho de um a verdadeira pesquisa. Esta, na realidade, tem caminhos 
tortuosos; há m om entos de êxito e tam bém de fracassos; às vezes as perguntas 
formuladas são corretas, outras vezes é necessário começar de novo; um a ação 
específica pode resultar produtiva ou deve ser abandonada antes de terminar. A 
pesquisa, por m elhor projetada que seja, não transcorre por um a linha reta, como 
poderia se pensar inicialmente; em outras palavras, ela não é um processo que 
possa ser totalmente planificado a priori.
É certo que se encontrará em O capital a exposição do processo de pesquisa 
científica, mas não do processo real, tal como efetivamente se deu. O processo 
de pesquisa científica que ali se explicita é ideal, no sentido de que se abstraem os 
erros, os fracassos, as ações realizadas, em bora improdutivas; ali o processo apa­
rece com o se transcorresse por um a linha reta previamente traçada. As categorias 
vão sendo descobertas um a depois das outras; não existe lugar para a intuição, 
para a imaginação e a criação. Q uem se tenha dedicado a um a verdadeira pesqui­
sa científica saberá que aquele processo descrito como linear não é mais do que 
um a caricatura. N o entanto, o procedim ento expositivo usado por M arx é ade­
quado: aos novos pesquisadores no tema, só é necessário com unicar os aspectos 
produtivos da pesquisa realizada e não os seus cam inhos equivocados. Assim, a 
posteriori, é possível e correto fazer a exposição como se ela houvesse transcorrido 
por um a linha reta, sem desvios.
28
C A P ÍT U L O 1
MERCADORIA: VA L O R DE USO 
E V A L O R DE TROCA
A R IQ U E Z A C A P IT A L IS T A
7. Aceitemos o objeto de estudo assinalado pelo autor em O capital, já no seu 
primeiro parágrafo: a riqueza capitalista, isto é, a riqueza na época de domínio do 
capital. O nosso problema é identificar a natureza dessa riqueza. Em outras pala­
vras, nossa pergunta é: o que é riqueza na época capitalista?
8. O autor diria que, para responder a essa pergunta, não temos outro ins­
trum ento científico senão a observação da realidade: “A riqueza das sociedades 
nas quais domina o modo de produção capitalista aparece como um ‘imenso 
acúmulo de mercadorias (...)”.1
Em outras palavras, observamos que a riqueza capitalista é um “imenso acu- 
mulamento de mercadorias”; aparece como uma imensa quantidade de mercado­
rias. Não se trata de uma definição;2 riqueza capitalista é mercadoria. Trata-se de 
uma constatação, a partir da simples observação da realidade.
Seria possível, aqui, dizer que riqueza é dinheiro, em vez de mercadoria. N o 
entanto, esse simples e sujo pedaço de papel (embora muito complexo e miste­
rioso do ponto de vista teórico) e que constitui pelo dinheiro só pode ser consi­
derado riqueza por ser capaz de comprar mercadorias; qualquer mercadoria.
9. Assim, se quisermos conhecer a riqueza capitalista e se olharmos a socie­
dade em que esse regime de produção rege, veremos que tal riqueza está forma­
da por mercadorias e, portanto, não teremos outra coisa a fazer senão observar3 a 
mercadoria mais de perto. Isso é o que diz implicitamente o nosso autor.
10. Se observarmos a mercadoria, nos daremos conta de que ela apresenta 
duas características que possui dois aspectos imediatamente observáveis. Ela é, 
“antes de mais, um objeto exterior, uma coisa, que, por meio das suas proprie­
dades, satisfaz necessidades humanas de qualquer espécie. A natureza dessas ne­
cessidades, quer surjam, p. ex., do estômago ou da fantasia, em nada modifica a 
questão” (Marx, p. 45) [57]{45}. Em segundo lugar, ela é um objeto capaz de 
intercambiar-se com outros, com outras mercadorias; ela é capaz de compraroutras mercadorias.
1 MARX, K. O capital. Crítica da economia política. Lisboa: Edições Avante, livro 1,1.1, 1990 ,, p. 45.
2 N ão se trata de definição é extrem amente importante. N a teoria de Marx, ao contrário do que esta­
m os acostumados, não existem definições.
3 A observação da realidade é o primeiro passo do m étodo científico da dialética materialista, caracterís­
tica do pensam ento de Marx.
29
11. Essas duas características da mercadoria não são produto da imaginação 
do autor d ’O capital, pois são facilmente observáveis por qualquer um de nós. O 
que M arx fez foi dar nom es a tais características, criar term os relativos a esses 
aspectos. A mercadoria é um valor de uso pela sua capacidade de satisfazer neces­
sidades, e é um valor de troca (ou tem valor de troca) devido a sua capacidade de 
com prar outras mercadorias.
Assim, podem os dizer que a mercadoria (M) é valor de uso (V ) e é valor de 
troca (V ); é a unidade desses dois aspectos.
12. N ossa pesquisa não tem outro cam inho a seguir senão observar mais de 
perto os dois aspectos da mercadoria. Aqui, não analisaremos o valor de uso, 
um a vez que este não nos interessa por ora. C orrem os o risco, no entanto, de 
que se pense que esse aspecto da m ercadoria tem um papel secundário na teo­
ria de Marx, o que é, evidentem ente, incorreto. A verdade é que destacar aqui 
sua im portância implicaria demasiado espaço, mais do que poderíam os dispor 
neste lugar.4
DO V A L O R D E T R O C A A O V A L O R
13. O que é valor de troca de um a mercadoria? Valor de troca é a “relação 
quantitativa, a proporção na qual os valores de uso de um a espécie se trocam por 
valores de uso de outra espécie5” (Marx, p. 46-47) [58]{46}, é a proporção em 
que se trocam valores de uso de um tipo por valores de uso de outro.
4 Afirmemos, no entanto, que, se a teoria de M arx for entendida adequadam ente, em toda a sua pro­
fundidade, seu conceito de utilidade pouco tem a ver com o m esm o conceito neoclássico. Enquanto 
para os autores dessa corrente a utilidade se esgota em um a relação subjetiva entre indivíduo e objeto, 
na teoria marxista essa relação subjetiva deve ser entendida com o m era aparência. O estudo adequado 
dos esquemas da reprodução (livro II d ’O capital) perm ite entender que a utilidade, em sua essência, 
refere-se às necessidades do capital e não de cada indivíduo, pois o sujeito social no capitalismo so­
fre um a inversão (o ser hum ano é substituído pelo capital, no papel de sujeito econôm ico e social). 
Assim, a utilidade para os neoclássicos está m uito longe da utilidade para Marx. E é natural que isso 
ocorra, pois estamos frente a duas teorias: a primeira com um a perspectiva unidim ensional da realida­
de, e a outra, dialética. Observe-se que, para Marx, a afirmação de que a utilidade seja um a relação sub­
jetiva indivíduo/objeto não constitui erro ou engano; ela é correta, mas insuficiente, pois a aparência 
é um a das duas verdadeiras dimensões da realidade. O erro ocorreria se pensássemos que a utilidade é 
só isso, que tem apenas essa dimensão; o engano está constituído pela crença na unidim ensionalidade 
do real. Para mais informações sobre a im portância do valor de uso na teoria econômica de Marx, cf. 
Rosdolsky (2001), Cap. 3, pp. 75-92, cf. tam bém M arx (1966), pp. 719-720.
5 Tampouco, aqui, se trata de definição. Frente a um a das características da mercadoria, M arx atribui
um nom e.
30
Isso significa que uma mercadoria não tem um valor de troca, tem valores de 
troca. Quantos? Por exemplo:
1 kg de trigo = 5 kg de milho 
= 0 ,5 kg de carne 
= 2 1 de leite 
= 6 kg de mandioca 
= 3 kg de feijão 
etc.
Poderíamos dizer, assim, que uma mercadoria tem tantos valores de tro­
ca quanto existam mercadorias diferentes dela no mercado e possam, portanto, 
intercambiar-se consigo.
14. Tomemos agora um particular valor de troca de uma mercadoria qual­
quer. Essa proporção ou relação quantitativa, que é o valor de troca, “muda cons­
tantemente com o tempo e o lugar” (Marx, p. 47) [58]{46}.
Em outras palavras, se observarmos no mercado o valor de troca de uma 
mercadoria com outra qualquer, veremos que essa proporção não permanece 
invariável: ela muda com o tempo. Entretanto, se no mesmo momento obser­
varmos diferentes mercados, distantes uns dos outros, veremos distintos valores 
de troca de uma mercadoria em relação à outra determinada.
15. Essa variabilidade, em relação ao tempo e ao espaço, pode sugerir que o 
valor de troca tem a casualidade como uma de suas características.
16. N o entanto, o valor de troca de uma mercadoria, como proporção que é, 
muda conforme a outra mercadoria com a qual se troca a primeira.
17. A variabilidade do valor de troca de uma mercadoria, dependendo da 
outra mercadoria com a qual se intercambia, determina naquele a característica 
de relatividade. O valor de troca é uma característica relativa a ambas mercadorias 
que participam de uma relação de intercâmbio.
18. Em conclusão, a observação sistemática do mercado permite, ao nosso 
autor, descobrir duas características imediatamente observáveis do valor de troca: 
a variabilidade e a relatividade. A variabilidade, característica facilmente visível, faz 
com que Marx manifeste suspeita sobre a possibilidade de que o valor de troca 
seja casual. A variabilidade sugere, assim, a possibilidade da casualidade.
O valor de troca parece, por isso, ser algo de casual e puramente relativo, um valor
de troca interior à mercadoria, imanente (yaleur intrinseque), portanto, [parece] uma
contradictio in adjecto (Marx, p. 47) [58] {46}.
Em outras palavras, parece um contrassenso pensar a existência de um valor 
no próprio interior da mercadoria.
19. Então, a conclusão do nosso autor é a seguinte: a) se é certo que o valor 
de troca é relativo e se ele possuísse uma explicação científica, esta não se en-
31
contraria na mercadoria (“imanente” a ela); ela deveria ser encontrada em am­
bas mercadorias em conjunto: na que está à esquerda e na que está à direita da 
igualdade; b) no entanto, se o valor de troca fosse puramente casual (parágrafo 
18), não teria nenhum sentido buscar uma explicação para ele; as coisas casuais 
não têm explicação científica, exceto por meio da lei das probabilidades, o que na 
verdade não é o que interessa aqui.
20. N o entanto, esse aparente contrassenso de buscar uma explicação para o 
valor de troca e, além do mais, de buscá-la no próprio interior da mercadoria, e 
não na sua relação com outra, não leva nosso autor a renunciar à busca de uma 
teoria do valor. Veremos que a conclusão de que não tem sentido buscar essa 
explicação, isto é, buscar o valor, é resultado exclusivo da observação imediata, 
preliminar da realidade, da superfície dos fenômenos reais.
21. Não existe outra maneira de superar essa conclusão preliminar - de su­
perar o nível aparencial — senão a própria observação dos fenômenos. É por 
isso que o nosso autor afirma que a existência de um valor intrínseco parece 
uma contradição em termos: “um valor de troca interior à mercadoria, imanente 
(•valeur intrinsequé), portanto, [parece] uma contradictio in adjecto. Consideremos a 
questão mais de perto” (Marx, p. 47) [58] {46}.
22. Vejamos, então, a coisa mais de perto. A aparente casualidade do valor 
de troca era consequência do fato da sua variabilidade no tempo e no espaço. 
Eliminemos as mudanças que ocorrem no tempo e no espaço; se dessa maneira 
encontrarmos alguma regra sistemática à qual atenda o valor de troca, então po­
deremos concluir que, na verdade, ele não é casual e que, portanto, se pode e se 
deve encontrar uma explicação científica causal para ele.
Observemos que, encontrada um a única regularidade em um fenômeno 
que supomos ser casual, a casualidade deve ser afastada. Basta considerar o 
exemplo desorteios de loteria, se, na observação dos seus resultados sucessi­
vos, encontrarmos uma única regularidade que permaneça por tempo mais ou 
menos prolongado, em algum m om ento chegaremos à conclusão de que algo 
está interferindo de maneira deliberada nos resultados; de que não pode ser 
algo casual. Assim, procuremos um a regularidade no valor de troca; uma única j 
regularidade.
23. Como dissemos, eliminemos as variações no tempo e no espaço. 
Observemos de novo o mercado e suponhamos que encontramos ali que:
1 kg de trigo = 5 kg de milho 
= 0 ,5 kg de carne 
= 2 1 de leite 
= 6 kg de mandioca 
= 3 kg de feijão 
etc.
32
Perguntemos agora qual seria o valor de troca, neste instante e neste lugar, 
de 2 litros de leite em termos de mandioca. Não é necessário buscar muito essa 
resposta, pois o mesmo mercado nos indica:
2 litros de leite = 6 kg de mandioca
E, se quiséssemos saber o valor de troca dessa quantidade de leite em termos 
de todas as demais mercadorias, a resposta seria:
2 litros de leite = 6 kg de mandioca 
= 5 kg de milho 
= 0 ,5 kg de carne 
= 3 kg de feijão 
e tc.6
24. O que significa o anterior? Dados os valores de troca do trigo, os valores 
de troca do leite não são casuais, mas estão determinados. Entretanto, se tivésse­
mos partido do valor de troca do leite, o valor de troca do trigo não poderia ser 
qualquer um, ele já estaria determinado e, portanto, não seria casual. A casualida­
de, como característica do valor de troca, era puramente da aparência. Devemos 
então buscar a explicação do valor de troca.
25. Tomemos outra vez as diferentes expressões do valor de troca de 1 kg 
de trigo:
5 kg de m ilho,
0 ,5 kg de carne,
2 1 de leite,
6 kg de mandioca,
3 kg de feijão.
Podemos ver que todas essas quantidades de diferentes mercadorias são in- 
tercambiáveis entre si no mesmo mercado e no mesmo momento já assinalado, 
exatamente no volume ali indicado. Isso significa que elas são, no mercado, todas 
iguais entre si. Todos os diferentes valores de troca da mercadoria trigo são iguais 
entre si, e quem afirma isso é o próprio mercado.
Isso constitui uma regularidade. E verdade que isso ocorre em um mercado e 
em um determinado momento, isto é, eliminando-se as variações de espaço e tem-
6 Este raciocínio poderia ser vítima de uma crítica baseada no fato da existência de lucro do intermediário. 
Para evitar mais discussões, basta indicar que o que nos interessa aqui é somente chegar à conclusão de 
que os diferentes valores de troca da mesma mercadoria são todos iguais entre si e que essa igualdade é 
determinada pelo próprio mercado. Para demonstrar isso, talvez fosse suficiente argumentar que, com 
as quantidades especificadas das diferentes mercadorias, qualquer possuidor poderá adquirir sempre a 
mesma quantidade da mercadoria trigo, isto é, daquela cujo valor de troca estamos estudando.
33
po, como dissemos anteriormente. Mas também é verdade que é um fato no inte­
rior de qualquer mercado e em qualquer instante do tempo, trata-se de uma regu­
laridade que sempre ocorre, o que nos permite descartar a ideia da casualidade.
26. Vejamos novamente as expressões de troca de 1 kg de trigo e pergunte­
mos: o que fazem todas essas coisas iguais entre si, do lado direito da igualdade?
Em outras palavras, o que obrigou que todas essas quantidades de diversas 
mercadorias fossem iguais?
O que impõe a existência da igualdade de todas elas só pode ser uma carac­
terística da própria mercadoria trigo. Quem atrai para si as demais mercadorias 
é o trigo, e as atrai em quantidades que as fazem iguais entre si. Assim, não pode 
ser de outra maneira: alguma propriedade interior ao trigo é a responsável. Essa 
propriedade imanente à mercadoria, descoberta por meio da observação sistemá­
tica, é denominada, pelo nosso autor, valor.1
27. Resumamos todas as considerações anteriores com as extremamente 
suscintas palavras de Marx:
U m a certa mercadoria, um quarter de trigo, p. ex., troca-se por x de graxa ou por y 
de seda ou por z de ouro etc., em suma, por outras mercadorias nas mais diversas 
proporções. Portanto, o trigo tem múltiplos valores de troca, em vez de um único. 
Porém, como x de graxa, assim com o y de seda, assim como z de ouro etc. têm o 
valor de troca de um quarter de trigo, então x de graxa, y de seda, z de ouro etc. têm 
de ser valores de troca substituíveis entre si ou de igual magnitude entre si. Segue-se 
daí, primeiro, que os valores de troca vigentes de uma mesma mercadoria expres­
sam algo de igual; segundo, porém, que o valor de troca, em geral, apenas pode ser o 
modo de expressão, a “forma fenoménica” [Erscheinungsform] de um conteúdo dele 
[valor de troca] diferenciável (Marx, p. 47) [58-59] {46}.
28. Assim, o valor de troca de uma mercadoria é a maneira de expressar-se, 
a forma de manifestação, a expressão, a forma fenoménica de um conteúdo da 
(algo imanente à) mercadoria. Essa substância que se pode distinguir do valor de 
troca tem um nome dado por Marx: mlor.s
7 Algo similar ocorre com o magnetismo. U m ímã atrai outros objetos de ferro devido à sua propriedade 
interior chamada magnetismo. D e maneira similar (nesse aspecto), o valor é uma propriedade imanente 
às mercadorias que não pode ser observada diretamente. Só sabemos da sua existência devido às suas 
manifestações: os valores de troca. Podemos olhar um ímã por todos os seus lados, jamais saberemos 
da existência de sua imantação a não ser por sua manifestação: a atração de outros objetos de ferro. Da 
mesma maneira com o a imantação transforma um objeto de ferro em ímã, em um objeto que era mais 
ou m enos misterioso antigamente, o valor transforma os valores de uso, produtos do trabalho humano, 
em mercadorias, objetos total e absolutamente misteriosos até hoje. Talvez, mais hoje do que ontem .
8 Identificar valor de troca e valor, o que equivale a confundir valor e preço, é um erro absolutamente 
primário; trata-se de identificar essência e aparência. O que é mais surpreendente é a frequência com 
que podem os nos encontrar com essa equivocada interpretação. Mais adiante verem os que o próprio 
Marx tem algo de culpa ao induzir seus leitores m enos atentos a esse engano; e não foi intencional (cf. 
parágrafo 51 mais adiante). O que é inegável é que, em muitas passagens d’O capital, não fica a m enor 
dúvida de que se trata de conceitos diferentes, embora relacionados.
34
29. Façamos uma breve pausa neste momento e vejamos, nos parágrafos ante­
riores, o processo metodológico utilizado para chegar aos resultados encontrados. 
Já havíamos destacado que o ponto de partida do nosso autor é sempre a realidade, 
e não conceitos criados pela sua própria imaginação, por seu pensamento; seu mé­
todo de investigação científica é a observação sistemática dessa realidade.9 
Vejamos a referência do próprio autor sobre essa questão:
(...) eu nunca parto dos “conceitos”, nem portanto do “conceito de valor” (...) Eu 
parto da forma social mais simples na qual se corporifica o produto do trabalho na 
sociedade atual, que é a mercadoria. Analiso-a e o faço fixando-me especialmente na 
forma sob a qual ela se apresenta. Descubro, assim, que “mercadoria” é, por um lado, 
na sua forma material, um objeto útil ou, em outras palavras, um valor de uso; e, 
por outro, encarnação do valor de troca e, desde este ponto de vista, “valor de troca” 
ela própria. Sigo analisando o “valor de troca” e descubro que ele não é mais do que 
uma “forma de manifestar-se”, uma maneira especial de aparecer o valor contido na 
mercadoria, razão pela qual procedo à análise deste último.10
O V A L O R
30. Portanto, como vimos, o valor é uma qualidade, um atributo, uma pro­
priedade da mercadoria.11 Essa qualidade ou propriedade da mercadoria consiste 
na sua capacidade de comprar (de intercambiar-secom) outras mercadorias - to­
das as demais mercadorias - sem exceção. Até agora, não sabemos muito sobre 
ele, praticamente nada. Só sabemos que se trata de um determinado poder de 
compra. Observemos, então, a coisa mais de perto.
31. A propriedade valor da mercadoria não aparece (não se expressa) por si, não 
aparece como tal propriedade, mas sim por meio de sua manifestação: o valor de troca. 
Por isso, o valor de troca é a forma necessária, imediata, de manifestação do valor.
32. Essa propriedade-valor que as coisas possuem na sociedade mercantil 
não é natural a elas. Em outras palavras, as coisas não têm valor por serem coisas; 
só possuem valor porque encontram-se dentro de uma sociedade mercantil. E 
essa sociedade, ao igualar o trigo com o milho no mercado, que confere ao trigo 
sua propriedade de ser valor; ela e só ela lhe confere o poder de comprar.
9 O m étodo utilizado por Marx, e im plícito desde o com eço, poderia ser resumido da seguinte maneira: 
formular uma questão, observar, descobrir, descrever o descoberto, dar nom e; em seguida, se neces­
sário, observar mais de perto antes de uma nova questão.
10 M ARX, K., 1966, pp. 717-718 (tradução nossa).
11 O valor não será uma simples propriedade da mercadoria para sempre. C om o qualquer outro conceito da 
teoria de Marx, ele se refere não a algo dado, mas a um processo de desenvolvimento. Ele chegará a trans­
formar-se de simples propriedade adjetiva em realidade substantiva, em ser com vida própria. E o que se 
chama substantivação do valor. Para melhor compreensão disso, c f Carcanholo e Nakatani (1999).
35
33. Então, o valor é uma qualidade entregue às coisas pela sociedade, mas 
não por qualquer sociedade, exclusivamente pela sociedade mercantil. Logo, o 
valor é uma qualidade social e histórica das coisas.
34. Algo, quando é produto do trabalho humano, adquire valor porque na 
sociedade ocorre intercâmbio mercantil. Este é resultado da existência de deter­
minado tipo de relações sociais entre os produtores, de relações entre produtores 
formalmente independentes e autônomos, que produzem uns para os outros, 
para a troca.
Portanto, o valor não é mais que a expressão, nas coisas, das particulares rela­
ções sociais de produção existentes na sociedade mercantil. Assim, as relações 
mercaníis de produção expressam-se nas coisas, como uma qualidade social des­
tas: como valor.
35. O valor é uma espécie de carimbo que a sociedade estampa sobre a mate­
rialidade física de cada valor de uso, transformando-o em mercadoria. Essa marca 
indelével, impressa na face da mercadoria, diz: Valor. Indelével, mas invisível. Ele 
é algo similar, na mercadoria, à nacionalidade de uma pessoa. A nacionalidade 
indica, em geral, o local de nascimento do indivíduo: “sou brasileiro”, por exem­
plo. O valor revela que o valor de uso que o possui provém de (ou é originário 
de, foi produzido sob) relações sociais mercantis de produção. O valor é uma 
espécie de passaporte que confere ao seu possuidor (a mercadoria) o poder de 
comprar (de trocar-se por) suas similares (isto é: outras mercadorias).
Muitas vezes se diz que o valor é uma relação social. Esta não é uma afir­
mação rigorosamente correta. O valor é, na realidade, a relação social mercantil 
expressa nas coisas produzidas pelo trabalho como uma propriedade (ou qualidade 
específica delas), propriedade que consiste num determinado poder de compra 
sobre as demais coisas.
36. Portanto, o valor não tem materialidade física, mas, ao mesmo tempo, 
não é uma simples ideia, um simples pensamento. O valor é real e tem materia­
lidade, só que materialidade social e histórica.
V a l o r e t r a b a l h o 12
37. Qual é o mecanismo que a sociedade utiliza para estampar nas coisas o 
carimbo Valor, a característica valor?
12 A relação entre valor e trabalho hum ano, isto é, o fato de que este seja a fonte do valor, não nos pa­
rece que tenha recebido, n ’0 capital, o tratamento mais adequado e suficiente. Provavelmente isso se 
explica pelo fato de que, na época de sua redação, pelo m enos entre os grandes autores, o assunto não 
era tão controvertido. A verdadeira razão que perm ite a M arx sustentar ser o trabalho hum ano o que 
produz valor é, na verdade, diferente do que aparece no capítulo sobre a mercadoria. N o s dias atuais, 
quando m uito se discute o assunto, é indispensável um tratamento diferente. Por isso, deixaremos 
para discutir mais cuidadosamente o assunto no Capítulo 3 deste livro.
36
E sse m ecan ism o é o trabalho hum an o.
38. O m ercado, ao igualar duas m ercadorias quaisquer, em certas quantida­
des, por ex em p lo trigo e ferro,
x trigo = y ferro
ao m esm o tem p o nos diz que o trabalho do produtor de trigo, incorporado a esse 
bem , e o que prod u ziu o ferro são iguais.
N o entanto, é ev idente que esses dois trabalhos são objetivam ente d iferen­
tes entre si e, então, não é que eles sejam iguais n o m ercado; este os faz iguais, os 
iguala, abstrai suas diferenças.
39. A ssim , da m esm a m aneira que a m ercadoria é a unidade de dois aspectos 
(valor de uso e valor), o trabalho m ercantil (na sociedade m ercantil por exce lên ­
cia, q u e é a sociedade capitalista) é ao m esm o tem p o trabalho concreto (ou útil) 
e trabalho abstrato. E trabalho concreto (ou útil) na m edida em que prestam os 
atenção nas suas propriedades específicas, as que p erm item distinguir entre u m 
e outro tipo de trabalho. É trabalho abstrato na m edida em que o consideram os 
co m o sim ples trabalho h u m an o, in d istin tam en te.13
Se agora não olharm os ao valor de uso do corpo das mercadorias, apenas lhes resta 
um a propriedade, a de produtos de trabalho. N o entanto, tam bém o produto de tra­
balho se nos transform ou já na mão. Se abstrairmos do seu valor de uso, abstraímos 
tam bém das formas e com ponentes corpóreas que fazem dele [produto de trabalho] 
um valor de uso. Ele já não é mesa, casa ou fio ou qualquer outra coisa útil. Todas 
as suas qualidades sensíveis se apagaram. Ele tam bém já não é o produto de trabalho 
do m arceneiro ou de trabalho de construção ou de trabalho de fiação ou de qualquer 
outro trabalho produtivo determ inado. Juntam ente com o caráter útil dos produtos 
de trabalho desaparece o caráter útil dos trabalhos neles expostos [dargesellt]e desapa­
recem, portanto, tam bém as diversas formas concretas desses trabalhos, que já não 
se diferenciam, antes se encontram reduzidas, no seu conjunto, a trabalho hum ano 
igual, trabalho hum ano em abstrato14 (Marx, p. 48-49)[60]{47}.
40. A ssim , o trabalho m ercantil capitalista tem duas faces ou , em outras pa­
lavras, é a unidade de dois aspectos (ou poios): trabalho concreto (ou útil) e tra­
balho abstrato.
, , .. . / trabalho concreto
trabalho humano = (
V trabalho abstrato
13 “Se abstrairmos da determinidadc da atividade produtiva e, portanto, do caráter útil do trabalho, o que 
nele permanece é o fato de ser dispêndio de força de trabalho humana. Costura e tecelagem, embora 
atividades produtivas qualitativamente diferentes, são ambas dispêndio produtivo de cérebro, músculos, 
nervos e mãos humanos etc., e, neste sentido, são ambas trabalho humano” (Mane, p. 55) [66] {51}.
14 Outras traduções possíveis de “trabalho humano em abstrato” seriam “trabalho humano abstrato” ou 
simplesmente “trabalho abstrato”.
37
É ju stam en te por possuir esse duplo aspecto que ele é capaz de produzir 
u m a m ercadoria, isto é, produzir duas coisas ao m esm o tem po: valor de u so e 
valor.
C o m o trabalho con creto (útil), o trabalho cria valores de u so ;15 co m o traba­
lh o abstrato, produz valor:
E nquanto cristais dessa substância social com um , eles são valores - valores de merca­
dorias. (...) U m valor de uso ou bem, portanto, apenas tem um valor porque

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