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1 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO INFORTUNÍSTICA Infortunística é a parte do Direito Previdenciário que foca nas questões relacionadas ao acidente de trabalho, não só do ponto de vista da ocorrência no meio laborativo, nas empresas, mas, também vai cuidar dos benefícios e das consequências decorrentes desse acidente, inclusive a ação acidentária. Historicamente, é possível dizer que foi Bernardino Ramazzini, médico italiano, que em 1.700, ao publicar um livro cujo título traduzido para o português é mais ou menos “A respeito das doenças dos trabalhadores”, quem iniciou o estudo da infortunística (ou então, como querem alguns, a medicina do trabalho). Mas, deixando de lado Bernardino Ramazzini, formalmente foi na Alemanha de Bismarck, em 1.884, que foi editada a primeira lei acidentária de que se tem notícia - lembre-se que naquela época a Alemanha estava com uma efervescência nas questões industriais. No Brasil tivemos a primeira lei infortunística em 1919, portanto no início da “Revolução Industrial” no Brasil. Vejam que a primeira lei de acidentes de trabalho, a primeira lei diretamente ligada à infortunística é anterior à primeira lei da previdência social, que é a famosa Lei Eloy Chaves de 1.923. Fazendo um salto na história, vamos nos centralizar na ideia de acidentes de trabalho ou infortunística como ela está hoje. E nada melhor do que analisarmos imediatamente via Constituição Federal de 1.988. Portanto, o direito ao não-acidente de trabalho, ou seja, o direito à indenização pelo acidente de trabalho, a prevenção ao acidente de trabalho está prevista na CF/88. No art. 201 da Constituição, no § 10 há previsão específica deste direito à indenização dentro do trabalho. E, no art. 7º, quando a CF/88 cuida dos direitos dos trabalhadores, nós temos alguns incisos muito específicos relacionados com essa matéria. Por exemplo, o inciso XXII diz que o trabalhador tem direito a um ambiente de trabalho sadio, tem direito à diminuição dos riscos de acidente de trabalho (cuidado: a Constituição fala em “diminuição”, e não “exclusão”, porque risco no trabalho é inerente à atividade laborativa, o que o trabalhador tem direito é à diminuição desses acidentes do trabalho ou dos riscos a esses acidentes). E no inciso XXVIII está dito que o trabalhador tem direito à indenização por acidente do trabalho cuja contribuição é a cargo do empregador. Então hoje nós temos bem claro que o Seguro de Acidentes de Trabalho – o famoso SAT – é um direito do trabalhador e um dever do empregador, que deve não só diminuir o risco de acidentes de trabalho, como também deve, no caso de ocorrer esses acidentes, indenizar o trabalhador. ACIDENTE DE TRABALHO Esse acidente vai gerar uma série de consequências na vida do trabalhador e na vida das empresas, e claro, para o INSS, para a Previdência Social, que é o seguro obrigatório, o INSS é o segurador obrigatório. Para melhor estudarmos e entendermos o acidente de trabalho, dividiremos em três enfoques: acidente de trabalho-tipo; acidente de trabalho-doença ocupacional e acidente de trabalho por equiparação. O acidente de trabalho-tipo é aquele que é diretamente relacionado com o trabalho, aquele que ocorre durante o exercício do trabalho, geralmente no local de trabalho, a serviço da empresa 2 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO e causa lesividade – incapacidade ou morte. Não há acidente sem lesividade. A previdência, o seguro, indeniza a incapacidade, a doença em si não é indenizável, o que é indenizável é a incapacidade. O acidente-tipo geralmente é súbito, acontece de uma hora para outra, é bem localizado no tempo e no espaço. Por exemplo, o segurado, o trabalhador, estava subindo numa escada, tropeçou no degrau, caiu e quebrou o braço. Naquele momento, com aquela dinâmica, aconteceu o acidente de trabalho. Normalmente há uma certa violência também, mas não necessariamente deve haver tal violência sempre. O importante é que esse acidente de trabalho-tipo, porque é “tipo”, os demais são equiparados a ele, seja a doença ou o equiparado. O acidente-tipo é o padrão, é o paradigma. Um pouco mais difícil de ser identificado é o acidente de trabalho-doença. São as chamadas doenças ocupacionais, porque estão relacionadas com a profissão, com o trabalho, com a ocupação do trabalhador. Doenças ocupacionais são o gênero, ligadas à ocupação do trabalhador. Mas, para entender melhor essa doença ocupacional, que é considerada para todos os efeitos legais, para todas as consequências legais, como acidente de trabalho, nós subdividimos essas doenças em: doenças profissionais e doenças do trabalho. Doenças profissionais são aquelas que decorrem de um trabalho específico, de uma atividade específica, de uma atividade determinada. São resultantes do exercício de trabalho de certas profissões, por isso “doença profissional”, ligada àquela determinada profissão. Dito de outra forma: se algum trabalhador tiver certa doença, esta doença necessariamente é resultante do trabalho dele, é resultante da profissão que ele exerce. Por exemplo, se um trabalhador é acometido de silicose – doença causada pelo pó de sílica, geralmente encontrado nas pedreiras, marmorarias, polimento de cerâmica – é porque está trabalhando ou trabalhou durante muito tempo numa dessas atividades, numa dessas profissões, porque ninguém pega pó de sílica respirando o ar puro das metrópoles. Então, uma característica fundamental e importantíssima para as doenças profissionais é o fato que elas não exigem demonstração de nexo causal com o trabalho, o nexo causal se presume – se alguém tem aquela doença chamada de profissional ela necessariamente e sempre é decorrente do trabalho, porque é impossível que alguém tenha essas doenças se não exercer aquela determinada, aquela específica atividade. Outros exemplos de doenças profissionais: saturnismo, doença provocada pelo chumbo. Ninguém pega saturnismo simplesmente olhando a bateria nova do carro, mas sim quem fica desmanchando a bateria no fundo do quintal; hidragismo, doença ligada ao mercúrio – ninguém pega hidragismo ao colocar o termômetro debaixo do braço para verificar a temperatura, mas sim quando se trabalha em condições insalubres fabricando lâmpadas de mercúrio. A doença do trabalho, por sua vez, difere da doença profissional porque exige nexo causal com a atividade exercida pelo trabalhador (o nexo não é presumido, exige-se nexo de causalidade entre a atividade exercida e o resultado doença). Ou seja, a doença do trabalho decorre não de uma atividade específica, mas sim das condições especiais em que o trabalho é exercido. Então, naquele ambiente de trabalho existe um grau tão elevado de insalubridade que o trabalhador que exerce sua atividade naquelas condições, naquele meio ambiente de trabalho pode vir a ser acometido por uma doença que chamamos de doença do trabalho. Assim, em tese, qualquer doença pode ser doença do trabalho, porque se aquela doença tiver como nexo causal o trabalho, mesmo que seja pelo princípio da concausalidade (que vigora no 3 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO direito infortunístico brasileiro desde 1.934), será doença do trabalho. Os exemplos mais comuns são PAIR (perda auditiva induzida pelo ruído) ou disacusia, pois a perda auditiva pode ser decorrente do trabalho ou de outro ruído (trânsito, aeroporto, etc.). Se no trabalho as condições são tão gravosas, ou seja, há ruído e esse ruído vai afetar o ouvido do trabalhador, essa PAIR é laborativa, é doença do trabalho, mesmo que o ruído do trabalho seja apenas concausa, não necessariamentea causa única (esta significaria o princípio da unicausalidade – e a infortunística do Brasil admite o princípio da concausalidade). Outro exemplo, que está bastante em voga e muitas vezes as pessoas confundem, são as famosas LER/DORT (lesões por esforço repetitivo/distúrbios osteoarticulares relacionados com o trabalho). Veja, se você exerce uma atividade em que movimenta demais certos conjuntos de músculos, ou nervos, ou tendões, você pode vir a ser acometido por uma LER/DORT. Mas nada impede que você, fora do trabalho, também exerça atividades que exijam essa movimentação contínua. Por exemplo, ao fazer tricô também são feitos movimentos com os dedos; quando se vai trabalhar faz-se movimentos com os dedos, com os ombros, com os músculos. Essa junção das duas atividades pode ensejar LER/DORT. Então a LER/DORT não necessariamente sempre deve ser do trabalho. A nomenclatura DORT sim, inclusive foi incluído o “T” que significa trabalho, mas como o nome mais tradicional era LER, continuou LER/DORT. Ou seja, no fundo qualquer doença, desde que ela seja consequência, desde que ela tenha relação com o trabalho, pode ser considerada doença do trabalho. Assim, enfarte, derrame, AVC também podem ser doenças do trabalho. Veja bem, você vai trabalhar, todo dia perde duas horas no trânsito, já chega cansado, o chefe dá bronca porque você chegou atrasado de novo, uma hora o trabalhador desaba, tem um AVC, um enfarte, ou seja, podem ser doenças do trabalho, uma vez que ligadas às condições especiais em que o trabalho foi exercido. Doenças profissionais também possuem outros nomes (sinônimos): tecnopatias, ergopatias ou doenças profissionais típicas. Doenças do trabalho também são chamadas mesopatias (meso = meio; patia = doença, logo é a doença do meio de trabalho) ou doenças profissionais atípicas (porque não são típicas de nenhuma profissão). Finalmente, o acidente de trabalho por equiparação. A Lei da Previdência Social (Lei nº 8.213/1.991) cuida da matéria [infortunística] entre os arts. 18 e 23. A definição do acidente-tipo está no art. 19; a das doenças no art. 20, e no art. 21 a lei discrimina as hipóteses dos chamados acidentes do trabalho por equiparação (acidentes do trabalho equiparados). De todas as hipóteses que estão discriminadas, por exemplo, acidente de trabalho na hora da refeição, acidente de trabalho na hora em que o segurado vai fazer necessidades fisiológicas, acidente de trabalho por briga com o colega, enfim, de todas essas situações estão discriminadas no art. 21, trataremos aqui, porque é mais importante, do acidente de trabalho de trajeto, acidente de trabalho de percurso ou acidente de trabalho in itinere. O acidente de trabalho de trajeto, acidente de trabalho de percurso ou acidente de trabalho in itinere é aquele que ocorre durante o percurso, no trajeto entre a casa do trabalhador e o local de trabalho e vice-versa. Durante esse percurso, no trajeto, se ocorrer um acidente este acidente será do trabalho por equiparação. Este acidente equiparado tem uma conotação especial, qual seja, ele se relaciona apenas indiretamente com o trabalho. Vejam, se eu sou atropelado quando eu vou trabalhar, diretamente não está relacionado com o trabalho, porque eu não estou trabalhando, não estou na empresa realizando minha atividade, mas estou indo para a empresa ou voltando para casa depois de trabalhar, então o acidente de trabalho equiparado se relaciona apenas indiretamente, enquanto os outros se relacionam diretamente com o trabalho. 4 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO Para melhor entender o acidente de trabalho in itinere focamos em dois nexos. Isto quer dizer que para que haja acidente de trabalho de trajeto devem estar presentes naquele fato, naquela ocorrência, os dois nexos: nexo topográfico; e nexo cronológico. O nexo topográfico diz respeito à topografia. Topografia significa olhar, significa descrever um lugar de cima para baixo (topos = cima). Então eu estou olhando o trajeto, olhando geograficamente, topograficamente a casa do segurado e o lugar de trabalho dele. Então se houver um nexo entre esses dois pontos, estará presente o nexo topográfico. Por exemplo, se o segurado trabalha no Centro de São Paulo e mora na Zona Sul, existem diversos caminhos para se chegar de um ponto a outro, há várias avenidas que se pode seguir, de modo que qualquer uma delas dá nexo topográfico, ele não é obrigado a seguir sempre pelo mesmo caminho, não é obrigado a pegar sempre o mesmo coletivo, o mesmo ônibus, ele pode ir de ônibus, de metrô, de trem, de carro, de moto, de bicicleta, de ônibus da empresa, de carona com o colega, ou seja, não importa o meio de transporte, o que importa é o nexo topográfico. Claro que o segurado não vai para a Zona Sul passeando pela Zona Norte, depois pela Zona Oeste, depois passando pelo Grande ABC, aí obviamente não há nexo topográfico. O nexo cronológico, por sua vez, é aquele que se relaciona com o tempo. Aquele tempo que, normalmente, se gasta para percorrer aquele trajeto, esse é o tempo normal do percurso. Claro que se houver uma greve, uma enchente, se houver um buraco, um acidente, pode haver atrasos. Se eu demoro normalmente uma hora e meia e eventualmente demorar duas horas no trajeto, se houver justificativa/explicação, ainda assim haverá nexo cronológico. Cuidado: pequenos desvios nos dois nexos, seja no nexo cronológico, seja no nexo topográfico, não cortam o nexo, não excluem os nexos. Por exemplo: você para um ponto antes da sua casa para passar na padaria e comprar o pão e o leite do dia seguinte. Neste momento a padaria é assaltada e você recebe uma bala perdida. Ainda, assim é acidente de trabalho de trajeto, porque foi um pequeno desvio (seja cronológico – atraso de 5 minutos para passar na padaria, seja topográfico – a padaria pode estar na rua de trás). Entretanto, se você parar no boteco da esquina para ver o jogo de seu time predileto, demora uma hora, uma hora e meia, e aí vem o bandido e te dá um tiro, neste caso não é possível dizer que se tratou de um “pequeno desvio”. Então, acidente de trabalho de trajeto é muito fácil, mas é necessário ser analisado caso a caso. Sempre que houver um acidente de trabalho de trajeto deve ser feito um B.O. (boletim de ocorrência) ou um T.O. (termo de ocorrência), para ter sempre à mão um documento oficial e, de preferência, se houver socorro médico, que seja público, porque eles são obrigados a fazer a anotação da ocorrência, para evitar que surjam dúvidas futuras. As empresas não gostam de acidentes de trabalho de trajeto porque eles aumentam sua sinistralidade sem elas terem culpa – e de fato não têm mesmo, mas isso entra na estatística da sinistralidade da empresa. Então é importante ter sempre à mão um documento oficial. Vimos até então o acidente-tipo, a doença e o acidente por equiparação. Para terminar esse tópico, existem algumas doenças que a lei, por definição, não considera doenças ocupacionais. São elas: 5 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO doenças degenerativas – são aquelas relacionadas com o desgaste normal do corpo humano; doenças inerentes ao grupo etário – doenças que, em geral a partir da quinta ou sexta décadas de vida, instalam-se no corpo humano. Contudo, tanto as doenças degenerativas quanto as doenças inerentes ao grupo etários podem, eventualmente, ser doenças ocupacionais, se houver nexo de causalidade com o trabalho. Por exemplo, a partir de certa idade todo mundo vai ter problema de audição, ou seja, é doença inerente ao grupo etário. Mas isso não significa que, porque ele perdeu parte da audição,que esta perda não está relacionada ao trabalho. Se houver relação de causalidade pode sim, talvez a pessoa tenha trabalhado a vida inteira em ambiente ruidoso, logo provado o nexo de causalidade ou de concausalidade com o trabalho essa doença não seja considerada da idade, e sim ocupacional. Outro exemplo, hérnia de disco. Todo mundo tem, todo mundo tem dor nas costas. A partir dos 60 anos as pessoas tendem a andar mais curvadas, mais corcundas. Mas, se essa pessoa passou a vida inteira empurrando carrinhos de 100 Kg, ou carregando sacos, ou fazendo movimentos repetitivos forçando a coluna, é óbvio que essa hérnia de disco pode estar relacionada com o trabalho, e nestes casos será doença ocupacional. Então, não é porque a doença é inerente ao grupo etário ou degenerativa que ela não pode ser ocupacional. Há também outros dois grupos de doenças que a lei não considera como ocupacionais: doenças que não produzem incapacidade – o seguro indeniza incapacidade, e não doença, logo doença que não produz incapacidade não é ocupacional. Por exemplo, se eu tiver uma úlcera, ou uma gastrite, ou enxaqueca, nada disso pode ser considerado doença ocupacional porque não produzem incapacidade; doenças endêmicas – são aquelas que existem normalmente em determinados lugares, em certas regiões. Por exemplo, malária em Belém do Pará, todo mundo tem, mesmo quem não trabalha pode vir a ter essa doença. Agora, numa situação em que o trabalhador é de São Paulo e a empresa em que ele trabalha tem uma obra em Carajás (PA) e pega malária; nesta situação trata-se de doença ocupacional, porque o trabalhador não está naquele ambiente, foi até lá a serviço da empresa, logo há nexo de causalidade entre a malária e o trabalho. Alerta: o art. 20 da Lei nº 8.213/1.991 diz que só se consideram doenças ocupacionais, sejam doenças profissionais, sejam doenças do trabalho, se estiverem relacionadas ao Anexo II do Regulamento (regulamento tratado anteriormente – Decreto nº 3.048/1.999). O Anexo II traz duas listas: há os fatores que podem provocar as doenças, ou seja, os riscos aos quais estão expostos os trabalhadores que podem a ser acometidos pelas doenças. Cuidado: o Regulamento é meramente exemplificativo, ele não é exaustivo. Isto significa que pode haver uma doença que não esteja elencada nem na lista 1 nem na lista 2. Hoje, as listas do Anexo II são muito bem feitas. São do Ministério da Previdência Social e do Ministério da Saúde conjuntamente, então, praticamente não existe uma doença que não esteja lá relacionada com um fator de risco inerente ao trabalho. Mas pode haver alguma doença que não esteja na relação, então não é pelo fato de não estar no Anexo II que ela não possa vir a ser doença profissional ou doença de trabalho, desde que ela preencha os requisitos, tenha as características, ela será doença do trabalho ou profissional. A Previdência abre uma exceção para doenças excepcionais, que a própria Previdência pode caracterizá-las como doenças ocupacionais. Por exemplo, doenças relacionadas à voz, porque na 6 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO realidade, tais doenças são muito pouco estudadas ainda no Brasil – são as grandes doenças como câncer das cordas vocais, rouquidão. Assim, há um parágrafo no art. 20 (§ 2º) que excepciona certas doenças. Assim, ocorrendo um desses acidentes, seja ele de que tipo for, a Previdência precisa ser informada. Na Previdência Social, essa informação é feita por meio de um documento chamado CAT – Comunicação de Acidente do Trabalho. Esta CAT é um documento do segurado, o segurado tem direito a esse documento, e ao mesmo tempo é um documento do INSS, da Previdência. É com base nos dados desse documento que a Previdência vai analisar se aquele evento ali narrado, ali informado, é ou não um acidente de trabalho, independentemente de ser uma doença, um acidente-tipo ou um acidente por equiparação. A emissão da CAT pela empresa é obrigatória e a empresa tem até o primeiro dia útil subsequente ao acidente para proceder a essa informação (art. 22). Hoje é muito mais fácil, pois devido à informática é tudo feito pelo computador. Nesta CAT são colocados os dados básicos do evento: o nome do segurado, a data em que ocorreu o acidente, o horário, a quantas horas o segurado estava trabalhando (isto é muito importante para se saber, estatisticamente, quantos acidentes de trabalho ocorrem nas primeiras horas de trabalho ou nas últimas), enfim, há uma série de dados a serem preenchidos. O preenchimento da CAT, no caso do acidente-tipo e do acidente por equiparação é bem simples, é fácil, porque os eventos estão bem localizados no tempo e no espaço (“tal dia, tal hora, fazendo tal coisa, aconteceu tal acidente”). Agora, se for uma doença, seja ela profissional ou do trabalho, qual será a data, o termo inicial que deve ser colocado na CAT? É sobre esse termo inicial que futuramente será pago o benefício. Uma doença não aparece de uma hora para outra, geralmente ela vai se implantando aos poucos. Devem ser observadas as seguintes regras, previstas em lei, para colocar a data como termo inicial da doença ocupacional: data do diagnóstico ou data da incapacidade ou data da segregação. A segregação já não existe mais, logo em geral o termo inicial será a data do diagnóstico ou a data da incapacidade. A lei, no art. 23, diz que será aquele que ocorrer primeiro. Vejam, o médico do trabalho, que é aquele que faz parte do SESMET – Serviço Especializado da Medicina do Trabalho – pode diagnosticar uma doença e não afastar o trabalhador. Nada impede que o diagnóstico seja feito sem o afastamento. Ou então, ele pode não conseguir fazer o diagnóstico, mas afasta o trabalhador imediatamente. Então diz a lei, no art. 23, “da data do diagnóstico ou da data da incapacidade, aquela que ocorrer primeiro”. O médico do trabalho é quem vai decidir qual data constará na CAT. E se a empresa se recusar a emitir a CAT? A lei, no art. 22, prevê que podem emitir a CAT o próprio segurado, os seus dependentes, o sindicato ao qual pertence o segurado, o serviço médico que atendeu o segurado e a autoridade ao qual se dirija o segurado informando a ocorrência do acidente. Então a empresa é obrigada a emitir a CAT e se não o fizer poderá sofrer sanções pecuniárias, mas se ela se negar o segurado não precisa se preocupar, pois ele mesmo, os dependentes, o sindicato, o serviço médico e qualquer autoridade podem emitir essa CAT. Mais uma vez lembramos que a CAT é documento do segurado, que lhe garante futuros direitos. Se a CAT não for emitida, posteriormente não será possível pleitear um auxílio-doença acidentário, ou então uma indenização por danos materiais ou danos 7 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO morais contra a empresa. Então a CAT é documento fundamental, documento básico sempre que ocorrer acidente de trabalho, seja ele acidente-tipo, acidente-doença ocupacional ou acidente por equiparação. Quem tem direito ao seguro de acidente de trabalho? Nem todos segurados possuem esse direito. Apenas três categorias de segurados possuem esse direito: segurado empregado; segurado avulso e segurado especial. Os respectivos dependentes também têm direito aos benefícios decorrentes do acidente do trabalho. Isto está regulado no §1º do art. 18 da Lei nº 8.213/1.991. Os demais segurados – doméstico, individual e facultativo são excluídos do seguro de acidentes do trabalho – SAT. Não há explicação para tal exclusão, apenas a lei diz que somente aquelas categorias estão incluídas. Para o professor, tal exclusão pode estar justificada por que o art.7º, inciso XXVIII, da CF/88 diz que é direito do trabalhador o seguro por acidente de trabalho às custas do empregador. Vejam bem, para o doméstico o empregador é uma pessoa física, o individual possui diversos empregadores, o facultativo não tem empregador. Mas, não é apenas por causa disso, pois o especial não tem empregador e tem direito ao seguro. A questão é que não há o recolhimento, não há o pagamento de uma contribuição adicional para o seguro de acidente de trabalho. Se houvesse essa contribuição certamente os outros segurados também teriam direito ao seguro de acidente de trabalho. E não é só: até pouco tempo atrás as relações trabalhistas estavam praticamente, unicamente, no meio ambiente do trabalho, era fácil fiscalizá-las, era fácil saber que aquele evento, que aquele sinistro, que aquele acidente era relacionado ao trabalho. Agora, contudo, com o advento do trabalho à distância, do home office, torna-se mais difícil. Então, a infortunística deve mudar um pouco esse enfoque. Mas enfim, era difícil afirmar que houve acidente de trabalho de uma empregada doméstica, porque se ela dorme no trabalho não há horário, e se ela se queima no fogão ou cai, não é possível determinar se foi trabalhando ou batendo papo com a colega. O facultativo não, porque ele não trabalha. Seria muito fácil para a Previdência, na própria guia de recolhimento do doméstico e do individual colocar uma contribuição adicional para o acidente de trabalho, que é o que provavelmente vai acontecer, porque agora as relações de trabalho são muito mais flexibilizadas, relativizadas, a fiscalização que talvez fosse a motivação maior até agora praticamente deixou de existir, exatamente por essa evolução das relações de trabalho. De qualquer forma, apenas o empregado, o avulso e o especial têm direito ao seguro de acidente de trabalho. A importância disso não é muito grande: a razão mais importante, e tirando aquelas hipóteses que foram tratadas nas aulas de benefícios, das diferenças de ser ou não ser acidente de trabalho, é que as prestações relacionadas com o acidente de trabalho têm o mesmo nome e têm o mesmo valor das prestações comuns, que não sejam de natureza acidentária do trabalho. Então, vejam, o auxílio-doença relacionado com o trabalho tem o mesmo nome – auxílio- doença, tem o mesmo valor – 91% do salário de benefício, que é calculado da mesma forma, então o valor é o mesmo, as diferenças são aquelas estudadas em aulas anteriores. Pensão acidentária: pensão por morte acidentária do trabalho é o mesmo valor, o mesmo cálculo. Então, em princípio, não há grandes diferenças no que diz respeito às prestações. Há apenas um benefício que pode se pode dizer, com algumas ressalvas, que é específico do acidente de trabalho – o chamado auxílio- 8 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO acidente. AUXÍLIO ACIDENTE O auxílio-acidente é um benefício devido ao segurado que depois que retornou do auxílio- doença acidentário (auxílio-acidentário do trabalho ou auxílio-acidentário de qualquer natureza – será explicado mais adiante) permanece com sequelas que de alguma forma diminuíram sua capacidade laborativa, sobretudo para as ocupações que ele exercia à época do acidente, no momento em que se acidentou. Então este benefício chamado de auxílio-acidente é devido a este trabalhador, este segurado que, tendo sofrido um acidente do trabalho (ou de qualquer natureza), quando retorna do auxílio-doença permanece com algum tipo de sequela. Este auxílio-acidente, a Lei nº 8.213/1.991, em sua edição original possuía três “tipos” de auxílio acidente, três percentuais do benefício. Havia o auxílio-acidente com 30% do salário de benefício, havia o auxílio-acidente com 40% do salário de benefício e o auxílio-acidente com 60% do salário de benefício. Estes três percentuais dependiam do grau de sequelas que o trabalhador sofria, as sequelas residuais, a incapacidade residual. Se era uma sequela “pequena”, de modo que o trabalhador ainda podia realizar a atividade que fazia à época do acidente, mas com um pouco mais de esforço, então era uma sequela mínima, recebia então 30%; se era uma sequela um pouco mais séria, que não podia exercer a mesma atividade, mas outra com o mesmo nível de complexidade, dizia a lei que o trabalhador receberia 40%. E se fosse uma sequela tão grave que ele somente podia ser habilitado a exercer uma atividade de complexidade inferior, recebia 60%. Vejam como a lei nº 8.213/1.991, na sua forma original, era muito bem elaborada. Veio então a Lei nº 9.032/1.995 que acabou com essa diferença, dizendo: o auxílio acidente é de 50% para todos, independentemente se o trabalhador perde a ponta do dedo ou o braço inteiro, ou a perna inteira, ou a cabeça. Vejam que o nosso legislador não foi técnico, foi político, esquecendo que os peritos da previdência não vão dar um benefício de 50% de salário de benefício para alguém que perde a ponta do dedo. Não é lógico que se dê o mesmo percentual do salário de benefício (50%) para aquele que perde a ponta do dedo e para aquele que perde a perna e pode exercer outra atividade. Então, tecnicamente essa Lei nº 9.032 foi um desastre em relação ao auxílio-acidente, porque criou problema tanto para o segurado, que não recebe administrativamente, precisa entrar na justiça, quanto para a Previdência, que vai pagar 50% do salário de benefício para qualquer tipo de sequela, porque a justiça acidentária concede. Hoje o auxílio-acidente é devido na proporção de 50% do salário de benefício, sempre que o segurado retorna do auxílio-doença acidentário. E foi falado acidente “do trabalho e não do trabalho (de qualquer natureza)”. O que isso significa? Vejam, a filosofia do auxílio acidente está diretamente relacionada ao trabalho. Antigamente, até a Lei nº 9.032/1.995, era somente acidente do trabalho que ensejava a concessão do auxílio- acidente, porque filosoficamente você vai ter uma incapacidade menor ou maior para trabalhar, para exercer a atividade. Mas essa Lei nº 9.032/1.995 fala em “acidente de qualquer natureza”. Ora, se é “acidente de qualquer natureza”, não necessariamente precisa ser do trabalho. Então, se o segurado empregado, avulso ou especial se acidentar fora do trabalho e no retorno do auxílio-doença acidentário (que não é do trabalho) permanecer com sequelas, ele terá direito ao auxílio acidente, o que é um absurdo. Por exemplo, uma comparação: dois advogados, um deles é empregado de uma empresa e o outro é autônomo (portanto, individual). O advogado individual não tem direito ao SAT, já o empregado tem. Os dois vão andar de bicicleta ou jogar futebol no fim de semana e ambos sofrem acidente e ficam com sequelas após o 9 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO retorno do auxílio-doença acidentário – nesta hipótese, o advogado empregado tem direito ao auxílio-acidente, já o outro não possui o direito. Percebe-se, então, a incongruência da Lei nº 9.032/95, não só por ter determinado um único percentual, mas também por ter estendido o acidente para “qualquer natureza”. Afinal, se o acidente é “de qualquer natureza”, ou seja, não necessariamente está relacionado ao trabalho, por que o trabalhador individual, o doméstico e o facultativo também não possuem direito ao auxílio-acidente? A lei diz que o auxílio-acidente é devido ao segurado após o retorno do auxílio-doença se permanecer com sequelas. “Após o retorno do auxílio-doença” implica em que o segurado tenha entrado em gozo do auxílio-doença. Se o segurado não entrou em gozo do auxílio-doença, não retorna de lugar nenhum, afinal sequer entrou, sequer foi. Há quem afirme que o auxílio-acidente é devido independentementedo tempo em que o segurado ficar em gozo do auxílio-doença, basta que sofra um acidente do trabalho. Então alguns sindicatos dizem “sofreu o acidente do trabalho, já tem direito à estabilidade, já tem direito ao auxílio-acidente”. Não é bem assim que funciona. A lei fala em “retorno”. Por outro lado também há quem defenda (sobretudo quem está ligado às empresas) que para ter direito à estabilidade é necessário ter sequelas, ou seja, a estabilidade estaria ligada ao auxílio acidente. São duas coisas completamente diferentes: o auxílio-acidente segue as regras anteriormente mencionadas – pode ser acidente do trabalho ou não do trabalho, só fazem jus segurados empregados, avulsos e especiais – enquanto a estabilidade segue a regra do art. 118, de modo que ela não está vinculada à concessão ou não do auxílio-acidente, porque basta que segurado tenha entrado em gozo do auxílio-doença e no momento em que ele retorna do auxílio-doença ele já em esta estabilidade, independentemente da concessão do auxílio-acidente, conforme diz textualmente o art. 118. Antes da edição da Lei nº 9.032/1.995 existiam também outros benefícios ligados ao acidente do trabalho (aqui sim exclusivamente acidente do trabalho). Eram os chamados “pecúlios” – espécie de seguro de vida (no caso, de acidentes) que nos casos em que o trabalhador se acidentava no trabalho e permanecia inválido, era-lhe concedida a aposentadoria por invalidez acidentária e ele recebia 75% do teto de contribuição. Se ele viesse a falecer os dependentes receberiam 150% do teto de contribuição. Eram pecúlios, portanto, valores pagos de uma só vez, valores esses relacionados ao acidente do trabalho, um deles no valor de 75% do teto de contribuição quando o segurado ficava inválido em decorrência do acidente de trabalho e o outro de 150% do teto máximo de contribuição no caso de morte acidentária do trabalho. 10 DIREITO PREVIDENCIÁRIO PROF. ANTÔNIO LOPES MONTEIRO PERGUNTAS: 1) O que é infortunística? 2) O que é acidente do trabalho? 3) Quais suas modalidades? 4) O que é acidente de trabalho tipo? 5) Qual a diferença entre doença profissional e doença do trabalho? 6) O que é acidente do trabalho por equiparação? 7) O que é acidente in itinere? 8) Qual a diferença entre nexo topográfico e nexo cronológico? 9) Quais as doenças não ocupacionais? 10) O que são doenças excepcionais? 11) Quando a CAT deve ser expedida? 12) Qual a consequência da não expedição da CAT? 13) Quem são os beneficiários do seguro de acidente do trabalho? 14) Qual a diferença entre segurado empregado, segurado avulso e segurado especial? 15) O empregado doméstico tem direito aos benefícios acidentários? 16) Qual o benefício específico do acidente do trabalho? 17) Qual o valor do auxílio acidente? 18) Quando é devido o auxílio acidente? 19) Para receber auxílio acidente é preciso receber antes o auxílio doença? 20) Ainda existe pecúlio?
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