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A SOCIOLOGIA DENTRO DA GLOBALIZAÇÃO

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A sociologia diante da globalização: 
possibilidades e perspectivas da Sociologia da Empresa
Ana Maria Kirschner�
Universidade Federal do Rio de Janeiro
“A empresa, um dos fenômenos mais característicos e marcantes da sociedade industrial, se traduz pela aparição e adoção de um novo modelo de organização social. Seu nascimento supõe uma ruptura com a ordem social anterior e a aparição de formas particulares que encontram uma nova legitimidade. Um de seus componentes fortes, em gestação desde o início da Revolução Industrial, surgido no séc.XIX, é a separação radical dos aspectos econômicos do tecido social e sua construção num domínio autônomo. Esta separação, inovação sem precedentes, dá conta de um dos aspectos da Sociologia da Empresa.”
Karl Polanyi- The Great Transformation, 1944
Introdução
A compreensão do mundo atual apresenta muitos desafios para a Sociologia. A globalização nos dá a impressão de viver de fato numa nova época, em que os parâmetros conhecidos estão sendo questionados: o papel do Estado, o emprego e a qualificação dos trabalhadores, assim como a diminuição de seu poder de negociação devem ser analisado sob outra ótica.
A retirada progressiva do Estado das atividades econômicas e o enfraquecimento de sua função reguladora; evidenciam que “deixar as forças do mercado atuarem livremente” deixou de ser apenas um recurso de retórica ou uma tendência apenas percebida para se tornar uma forte política econômica adotada por diversos países.
É compreensível portanto, que num ambiente econômico em que o mercado estabelece as características fundamentais das economias nacionais, as empresas se tornem alvo de atenção de sociólogos, pela sua expressiva participação no desempenho econômico de um país. Entretanto, pouco adiantaria fazer esta afirmação se não dispuséssemos de instrumentos satisfatórios para compreender e explicar as empresas sob uma ótica sociológica.
Este trabalho é uma sucinta discussão sobre as possibilidade e perspectivas abertas pela Sociologia da Empresa. Esta análise busca mostrar através da relação empiria e teoria, que elementos permitiram para que a empresa ressurgisse como objeto sociológico. A exposição de alguns aspectos teóricos e metodológicos, pretende mostrar as possibilidades da análise sociológica das empresas para a compreensão de dimensões importantes do mundo contemporâneo.
As respostas teóricas às mudanças sociais e econômicas a partir da década de 80
A empresa nasce da separação do círculo familiar e do lugar de trabalho. Autores clássicos da sociologia e da economia, como Max Weber e Karl Marx fizeram trabalhos memoráveis. Weber mostra que as oficinas surgiram das comunidades domésticas e de vizinhança, que conheceram diferentes formas de desenvolvimento até chegarem à grande indústria, com uma organização racional do trabalho.� Marx analisa o surgimento do capitalismo a partir das transformações na organização do trabalho - das corporações de artesãos à grande indústria.�
A crise econômica e o crescimento do desemprego que atingiram a Europa, na década de oitenta, contribuíram para que a empresa começasse a ser valorizada pela sua capacidade de salvaguardar o emprego - valor essencial da socialização na sociedade contemporânea. O papel da empresa vai além do econômico: ademais de provedora de emprego é também agente de estabilização social.
Pesquisas de campo analisaram as práticas dos trabalhadores em seu ambiente de trabalho e temas ligados a cultura de empresa emergiram na sociologia�. Tais aportes teóricos e empíricos fizeram a empresa aparecer como um lugar em que se tece uma teia social particular, onde se desenvolve uma criação social autônoma. 
Paralelamente, desenvolveu-se a Sociologia da Organização que, a partir dos anos sessenta, tornou-se referência obrigatória no mundo da empresa. Dentre os diferentes ramos da Sociologia, foi a Sociologia da Organização que ficou mais conhecida fora do ambiente acadêmico. Tal sucesso deve-se a alguns fatores, dentre os quais destacamos:
a) os instrumentos da Sociologia da Organização se revelaram eficazes para a compreensão dos comportamentos e das ações dos atores nas empresas;
b) os atores das empresas perceberam a importância da organização sobre o funcionamento e sobre os resultados das empresas;
c) a distância entre pesquisadores e responsáveis nas empresas diminuiu muito, pois o avanço deste conhecimento só foi possível graças a profundos “mergulhos” de acadêmicos em empresas. A conseqüência foi uma modificação do olhar do sociólogo e dos atores envolvidos com a firma. 
As “imposições incontornáveis” sofridas pela empresa foram revistas, a partir do momento em que se passou a admitir a existência de racionalidades e lógicas diferentes no seio empresa. A técnica, o econômico e a cultura começaram a ser considerados como elementos determinantes da organização, e esta passou a ser vista como um construto, resultado da agregação de decisões individuais. Bernoux� lembra que a Sociologia da Empresa não poderia se desenvolver enquanto se pensasse que certas limitações impunham um determinado tipo de organização, por exemplo, enquanto o sistema taylorista predominasse. Até se admitir a legitimidade de lógicas diferentes na empresa, - o que a Sociologia da Organização evidenciou - não era possível conhecer a empresa através de uma abordagem sociológica.
Ao desenvolver-se completamente à parte da Sociologia do Trabalho, o instrumental teórico da Sociologia da Organização não permitiu pensar a empresa como um sujeito que combinasse trabalho e organização. Preenchendo este vazio, nos anos oitenta, muitas pesquisas foram realizadas sobre a cultura e identidade das empresas e trouxeram à tona a existência de redes formais e informais�.
A partir destas evidências, a empresa pode ser tratada como construto social e objeto sociológico, capaz de autonomia e criadora do social no sentido literal do termo, isto é, daquilo que une os indivíduos e constitui uma sociedade. Segundo Bernoux, uma empresa não existe sem o reconhecimento mútuo, sem affectio societatis, sem uma certa comunidade, sem relações privilegiadas entre seus membros, ainda que permeadas pelo conflito; a violência do conflito traduz a esperança decepcionada de uma relação privilegiada. Assim definida, a empresa pode ser vista como um lugar de aprendizado e de cooperação, mesmo quando é palco de ações ou atitudes conflitantes.
A Sociologia das Organizações começa a ser contestada nos anos oitenta, quando a empresa passa por transformações tão profundas que modificam substancialmente a relação empresa/sociedade. Verificou-se a necessidade de outros instrumentos teóricos para explicar a mudança que está sob nossos olhos: hoje o modelo burocrático que serviu de campo de observação para a Sociologia das Organizações deixou de ser considerado um modelo de sucesso.
As grandes organizações permitiram a elaboração de conceitos centrais como sistema, poder, incerteza, racionalidade limitada. Estes conceitos passam a ser questionados porque esse tipo de grande empresa - pesada, burocrática e de difícil “manejo” - mostrou seus limites. A própria pertinência da teoria construída sobre as grandes organizações é posta em questão. As mudanças na organização do trabalho, a externalização de funções, a economia de rede, as mudanças rápidas de direção e/ou proprietário, levam a que não se tenha mais certeza do que está dentro ou fora da empresa. Entretanto, o aporte da análise estratégica permanece importante; seus conceitos principais - ator, incerteza, poder - permanecem úteis; toda empresa pode ser estudada sob este aspecto.
A análise estratégica� vai se esforçar para quebrar esta idéia de modelo e tenta introduzir a idéia de ator, de autonomia, de contingência dos modelos organizacionais e incerteza. Ela mantém o conceito de racionalização, fazendo-o evoluir para o conceito de racionalidade limitada.
Esta mudança teórica coincide com as mudanças no modelo de produção, que evidenciam a importânciadas comunicações entre serviços e entre níveis hierárquicos na empresa, pensada como um sistema de interações.
Possibilidades da análise sociológica das empresas 
O campo da Sociologia das Empresas é diferente do campo de análise dos sociólogos do trabalho. Parte dos seguintes temas: indivíduo, poder, estratégia e sistema. Saliente-se que estes temas fundamentais já foram desenvolvidos ao longo desta análise. Neste ponto, convém ressaltar outras categorias e seu respectivo alcance analítico.�
1 - A empresa como construto social
Na década de oitenta, Sainsaulieu, em seu livro “Sociologie de l’Organisation et de l’Entreprise” � analisa as estruturas e o desenvolvimento dos sistemas sociais assim como os jogos de poder que ocorrem no interior das empresas, abrindo espaço para que elas recebam tratamento de objeto sociológico. A empresa é tratada como construto social: considerada como lugar autônomo de criação e regulação de relações sociais, é também lugar de identidade, cultura e convenções. Ela apresenta uma certa autonomia em relação aos meio-ambientes - econômico, sócio-político e institucional em que se insere. Os diferentes meio-ambientes constituem a realidade à qual a empresa não só se adapta, como também transforma.
Já na década noventa, seguindo a mesma linha, Bernoux (1995) aprofunda o problema das relações formais e informais no interior da empresa. O autor trata os jogos de poder a partir das próprias questões que os atores colocam, e mostra que elas estão longe de se esgotarem pela lógica do interesse econômico. Diz, por exemplo: 
“O projeto da empresa pode ser lido num extremo como a fria busca do lucro, e no outro, como uma história de amor, com muitos parceiros. ... Sob outro ângulo, a empresa pode ser considerada como uma soma de indivíduos ou como um corpo social, às vezes autônomo, às vezes reproduzindo traços da sociedade em que se localiza.”�
2 - A empresa como sistema aberto
Durante muito tempo, as regras nas empresas foram definidas a partir da ótica de seu meio-ambiente externo: técnico, econômico, cultural e sociopolítico. Os estudiosos de empresas consideravam que os diferentes meio-ambientes estabeleciam padrões de funcionamento tão impositivos que o espaço de liberdade reservado ao grupo humano reunido na empresa era muito limitado. A perspectiva adotada explicava a construção das regras pela influência direta das imposições, e não pela recomposição destas mesmas regras através de um agregado de ações individuais. Tal consideração remetia a um impasse teórico-metodológico: como fazer da empresa um objeto sociológico se ela vive ao sabor das circunstâncias externas? Ou, de outra forma, um objeto sociológico pode ser considerado como tal se não dispõe de autonomia?
Desde que a empresa começou a ser considerada como fonte autônoma de construção de relações sociais, ela passou a ser compreendida através do modelo de sistema aberto, que associa as noções de autonomia e dependência na relação empresa/meio-ambiente�. Um sistema aberto faz constantes trocas com seu meio; tem necessidade destas trocas para existir. Entretanto, estas trocas não dependem apenas do meio. Um sistema não é aberto a qualquer tipo de influência, possui uma fronteira seletiva que filtra o que deixa passar. Em contrapartida, exporta para seu meio-ambiente produtos muito controlados. 
É possível questionar outra dimensão desta autonomia: uma empresa pode realizar um projeto apesar das circunstâncias desfavoráveis de seu meio, ou ela só pode conceber e realizar projetos que respondam a uma demanda deste meio?
Uma empresa não cria um projeto social ex nihilo. Através de seus trabalhadores, ela importa as características sócio-culturais de seu meio-ambiente. Entretanto, 
“... ela forma um meio social original que imprime sua marca sobre os indivíduos. Esta transformação não se limita a seu espaço interior, porque a empresa não retém seus membros de maneira permanente. Eles se reintegram à sociedade onde agem, utilizando também os comportamentos aprendidos na empresa que vão influenciar a sociedade inteira”.�
3 - Empresa e seu meio-ambiente
Os efeitos sociais diretos da empresa - aqueles ligados à produção, à aquisição de conhecimentos, à mudança de comportamentos - acabam sendo menos importantes que os efeitos indiretos, ou seja, as transformações que não estão explicitamente inscritas nos objetivos do empresário. A história nos mostra que as modificações sociais mais importantes e de maior duração apareceram como efeitos inesperados ou perversos de objetivos econômicos ou técnicos da empresa. Se os indivíduos foram reunidos por necessidades da produção, esta reunião teve um papel importante na propagação de idéias e nas transformações sociais.
A noção de transformação social é apropriada para representar os efeitos sociais da empresa. Mostra que a empresa modifica seu meio escolhendo o que lhe interessa. Apropria-se destes elementos, impondo a marca de sua especificidade. Esta transformação conjuga múltiplos aspectos da situação, técnicos, jurídicos, econômicos e humanos, cujas conseqüências são inseparáveis. Estas conseqüências, a curto prazo, geram efeitos perversos ou inesperados em relação aos objetivos proclamados; a longo prazo, contribuem para modificar o meio-ambiente, o que pode acarretar evoluções ou ruptura macroeconômicas para toda a sociedade.
Quando vários aspectos (econômico, técnico, social) estão presentes num projeto, os efeitos acarretados são potencializados. Isso faz com que a influência da empresa aumente assim como sua autonomia.
A autonomia da empresa tem aspectos muito complexos. Não se pode separar a dimensão social da empresa de suas dimensões técnica e econômica, o que torna mais difícil definir e explicar seus efeitos. A autonomia social aparece como uma representação necessária para a análise, mas que não pode ser observada no cotidiano da empresa. 
A autonomia social não se caracteriza simplesmente em termos de distinção e dependência em relação ao meio-ambiente. Ela exige a noção de abertura seletiva, que associa a necessidade de trocas contínuas entre a empresa e seu meio-ambiente com a noção de escolha no seio destas trocas. Ela se apoia na noção de transformação.
“ ... a empresa é um poderoso ator no campo social pela razão paradoxal que ela mistura os fatos sociais, os projetos econômicos e as realizações técnicas. Esta realidade multidisciplinar deveria se impor cada vez mais a todos que querem agir nas empresas ou estudá-las”.�
4 - O sistema social da empresa e relações de poder
O diagnóstico das relações de poder depende da compreensão da dinâmica intra e inter serviços, o que exige uma leitura extensiva dos sistemas de ação que, de coalizões a alianças duráveis, podem ir além das fronteiras formais do organograma e incluir os atores no meio-ambiente sindical, institucional e educacional.
O sistema social na empresa é um conjunto de interações, ou de relações entre atores, que se reproduzem e estabelecem relações coletivas duráveis que mediatizam e transformam os efeitos previstos pela regra da organização formal.
Quando se desvenda este sistema social, pode-se conhecer melhor os grupos humanos ativos e passivos, seus objetivos mobilizadores e suas modalidades de interações conflituais ou consensuais.
5 - os indivíduos e a empresa 
Uma das maiores dificuldades da explicação sociológica das empresas é o lugar atribuído aos indivíduos. O senso comum valoriza o papel dos indivíduos, enquanto grande parte dos sociólogos preferem silenciar sobre os indivíduos e buscar explicações através do social, das regras e do coletivo.
Assume-se aqui uma postura próxima do individualismo metodológico, ou seja, os fatos coletivos são considerados como o produto, a combinação, a agregação de um conjunto de ações individuais. Recusa-se a idéia de um fato social coletivo, imposto de fora aos indivíduos. Tal método exige que se passe pelos indivíduos para se chegar ao composto que é o fato social, visto como algo construído,que se deve em parte à agregação dos comportamentos individuais. Para os sociólogos da empresa, esta é uma construção social, cujo conhecimento deve ter como base uma interpretação que considere o conjunto - indivíduos e imposições - ligado a um corpo social.
É absurdo pensar que o sucesso ou o fracasso de uma empresa dependa, exclusivamente, da ação ou da personalidade de um indivíduo, ainda que ele seja um ator-chave�. Claro que há configurações individuais que desempenham um papel maior ou menor em situações particulares. O problema a ser resolvido é exatamente esta equação. 
“Conhecer o indivíduo é importante, desde que não se considere seu comportamento resultante somente dos componentes de sua psiquê. Trata-se de apreendê-lo na sua relação com o grupo onde ele age. Como qualquer grupo humano, a empresa é um lugar de articulação do individual e do social. Sem esta articulação, é impossível conhecer a empresa.”�
6 - Sistema social: relações formais e informais
Segundo Michel Crozier�, os três princípios que norteiam o sistema de organização burocrática estão na origem das regras formais da empresa. São os seguintes:
- um princípio igualitário, que corresponde à aplicação do regulamento da antigüidade,
- um princípio hierárquico fechado: as categorias dos trabalhadores são bem delimitadas e pouco sujeitas às mudanças,
- um princípio de impessoalidade das regras e dos procedimentos, que permite eliminar ao máximo o arbítrio da direção.
Um desequilíbrio deste sistema em uma empresa pode acarretar mudanças que dêem lugar a uma rede particular de relações. Criam-se, paralelamente, regras e relações informais, conhecidas apenas por aqueles que estão diretamente envolvidos nas atividades concernidas.
É de extrema importância conhecer estas regras informais, pois os administradores encontram sérias resistências quando tentam implementar mudanças que as contrariem. É fundamental detectar os pontos-chave de articulação entre os diversos grupos.
7 - Ator e Ator-chave
A literatura sobre administração de empresas atribui uma importância muito grande ao agente capaz de implementar mudanças numa organização. Este agente é chamado ator-chave, pois dispõe de poder e autoridade ou influência suficientes para tomar decisões importantes para o futuro do grupo no qual está inserido, ou mesmo da empresa.
Para a Sociologia, os indivíduos não são milagrosos. Nem os mais competentes conseguem sozinhos mudar radicalmente uma empresa, conduzindo-a ao sucesso ou ao fracasso.
Bernoux comenta: 
“O tema do ator-chave e de seu papel meio milagroso se baseia na experiência que algumas pessoas tiveram ao vivenciar sua própria autonomia, ao desfrutar de liberdade individual; experiência, portanto limitada àqueles que tiveram condições de viver tais situações.” � 
Em empresas, só dirigentes, gerentes ou alguns líderes têm condições de viver estas situações. A questão que se coloca é: em que medida se pode reduzir a mudança em uma empresa à ação de alguns atores-chave?
Esta questão supõe que a relação do líder com o grupo é unilateral, excluindo a expectativa dos membros do grupo. Quando trabalhamos com a noção de legitimidade, tal como Weber a concebe, esta questão se amplia e diz respeito ao grupo todo. Um líder é bem sucedido na medida em que sua ação corresponde às aspirações do grupo, e não apenas a seu carisma individual. É exatamente esta correspondência que lhe confere legitimidade e que faz o grupo aceitar sua liderança. O ator-chave não é, portanto, independente do grupo do qual ele é líder. Convém examinar a relação que ele estabelece com seu grupo: para agir sobre um grupo, o líder deve compreender suas expectativas e expressá-las.
Podemos nos perguntar sobre quais as possibilidades que um ator-chave dispõe para mudar uma organização ou para fazer uma empresa evoluir.
O estabelecimento de novos objetivos em uma empresa implica em estabelecer novas regras formais. Chamamos atenção para um ponto: a mudança nas regras formais não implica necessariamente em mudança nas regras informais.
O ator-chave será capaz de modificar os projetos da empresa e os objetivos de um grupo se levar em consideração a cultura e os mitos� que permitirão mobilizar indivíduos e grupos. As empresas são construídas socialmente através de mitos, símbolos e culturas que alguns sujeitos contribuem mais do que outros para forjá-los. A instância mítica é essencial para compreender o funcionamento de um grupo e os líderes ocupam uma posição estratégica que lhes permite trabalhar com ela. Porque este papel dos mitos? 
“Porque toda sociedade exige, para se instaurar e se perpetuar, a referência a uma ordem que legitime sua existência. Esta ordem cria os indivíduos sociais, investe as consciências, rege as inconsciências e se desdobra num discurso fundador. Não há sociedade sem discurso fundador, sem mitos aos quais se identificar. Estes podem tomar a forma de pessoas, de fundadores. O ator-chave pode desenvolver algumas imagens, orientando e/ou reforçando alguns mitos. Entretanto, isto só é factível se corresponder às imagens e expectativas do grupo. Ele não pode criar integralmente os mitos.”�
8 - Motivação
A Sociologia das Empresas considera que o sucesso dos projetos de empresa estão associados à legitimidade daquele que os conduz. Os projetos bem sucedidos são implementados por indivíduos que conseguiram compreender o sistema social em que estão inseridos e que conhecem bem os pontos-chave da articulação entre os grupos.
O conceito de motivação, na Sociologia das Empresas, é referido ao sentido que o ator dá às suas ações. Segundo Bernoux, a motivação é uma construção do indivíduo ligada ao sentido que ele atribui à ação que executa. O sentido é social. A motivação não corresponde a necessidades fundamentais e universais, mas a construções sociais enraizadas nos indivíduos e em grupos complexos e evolutivos.
Portanto, em relação aos projetos de empresa, um sentido novo e motivante só pode surgir se a relação de trabalho mudar, a nível da própria tarefa ou dos grupos de trabalho, ou da interrelação entre os grupos, ou da organização e da sua cultura. Enfim, um indivíduo se motiva quando sua situação social relativa, sua identidade profissional - a maneira como ele é visto pelos outros - evolui num sentido favorável a seus olhos, de forma a sentir-se reconhecido e valorizado em sua função.
Conclusão
A empresa é, segundo Sainsaulieu, locus de produção de sociabilidades, de projetos, de articulação da diversidade dos sistemas de representação; é portanto, 
“... uma microsociedade capaz de instituir duravelmente e fazer interiorizar pelos agentes suas próprias regras de funcionamento social.”�
A Sociologia da Empresa vai além dos modelos que definem o espaço fabril como espaço de relações antagônicas de classe. A empresa tem uma função identificadora na sociedade e constitui, portanto, verdadeira instituição social: ela instaura um conjunto de relações sociais e culturais e produz, assim, identidades novas. Nela se desenvolvem relações de oposições e de alianças e o ator vivencia as relações de trabalho de forma interativa e estratégica. 
A Sociologia da Empresa rompe com os modelos que interpretam as estratégias dos atores apenas em termos das oportunidades de poder, que omitem da análise a função dos valores e lógicas coletivas que permeiam as práticas sociais. 
A mobilização dos recursos humanos para fins econômicos depende não só das capacidades profissionais mas também das regulações das relações sociais de produção de forma a suscitar a complementaridade das ações coletivas, a solidariedade, a comunicação e a criatividade no seio do sistema social.
Tradicionalmente, a literatura sobre administração de empresas, quando se refere a dirigentes e, principalmente a fundadores, apresenta-os sob uma ótica shumpeteriana: invariavelmente é empreendedor, dinâmico, com agudo faro para detectar novas oportunidades de negócios. Sua trajetória profissional é formada por sucessos,seus fracassos são mencionados no máximo para mostrar que aproveitou bem uma experiência mal sucedida. Michel Bauer�, em pesquisas realizadas nas décadas de oitenta e noventa, faz uma ruptura com esta abordagem que apresenta as ações dos dirigentes de empresa como puramente guiadas pela lógica econômica. O autor mostra que as lógicas políticas e familiares, desempenham um papel fortíssimo no universo econômico moderno. A quebra da regra do “falar somente economia” é, para Bauer, indispensável para compreender o comportamento dos atuais donos de empresas e suas decisões; é necessário considerar suas ações como produto de racionalidades diferentes e inextrincavelmente ligadas.
O instrumental teórico e metodológico utilizado na Sociologia da Empresa tem permitido estabelecer relações entre família, propriedade e administração com resultados muito interessantes. O avanço de pesquisas ligadas a temas como mudança da propriedade em grupos econômicos tradicionais; formação de um novo tipo de empresário; formação e trajetória de grandes dirigentes; processo sucessório em empresas familiares; reconstituição da história de grupos econômicos; papel dos empresários nas economias nacionais globalizadas, tudo isto abriu novas perspectivas no estudo de fenômenos sociais e econômicos da década de noventa.
�Este trabalho contou com a colaboração de Gisele Lopes Machado.
Agradeço as críticas e sugestões da Professora Wally Chan Pereira, que sem dúvida, contribuiram muito para deixar este texto mais claro.
�WEBER, M. (1977) - Economía y Sociedad, Fondo de Cultura Económica, Mexico. (1a edição alemã de 1922).
WEBER, M. (1967) A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, Livraria Pioneira Editora, São Paulo. (1a edição alemã de 1947)
�MARX, K. (1971) - Le Capital, Editions Sociales, Paris. (1a edição alemã de 1867)
�SAINSAULIEU (R.) - 1987 - Sociologie de l’Organisation et de l’Entreprise, Presse de la Fondation Nationale des Sciences Politiques & Dalloz, Paris.
�BERNOUX (P) - 1995 - La Sociologie des Entreprises, Editions du Seuil, Paris.
�SAINSAULIEU (R.) - 1987 - Op. cit.
LIU (M.) - 1992 - Op. cit.
ROMANTSOA (B.) - 1992 - “L’autonomie stratégique des entreprises”, in L'Entreprise, une affaire de société, in SAINSAULIEU (R.) éd., Presse de la Fondation nationale des sciences politiques, Paris.
�CROZIER, (M.) - 1977 - L’acteur et le systéme, Seuil, Paris.
ROMANTSOA (B.) - 1992 - “L’autonomie stratégique des entreprises”, in L'Entreprise, une affaire de société, SAINSAULIEU (R.) éd., Presse de la Fondation nationale des sciences politiques, Paris.
PORTER (M.) - 1986 - L’avantage concurrenciel, InterEditions, Paris.
� Seria interessante pensar o operariado, as organizações sindicais e suas lideranças utilizando algumas destas categorias empregadas na Sociologia das Empresas.
�SAINSAULIEU, R. (1987) - Op. cit.
�BERNOUX, (P.) - 1995 - Op. cit., pág. 15
�LIU (M.) - 1992 - “L’autonomie des entreprises dans le champs social”, in L'Entreprise, une affaire de société, SAINSAULIEU (R.) éd., Presse de la Fondation nationale des sciences politiques, Paris.
�BERNOUX (P.) - 1995 - Op. cit. pág. 125.
�BERNOUX (P.) - 1995 - Op. cit. pág. 130.
.�Categoria que será analisada mais adiante.
�BERNOUX, (P.) - 1995 - Op. cit. pág.70.
� CROZIER, (M.) - 1977 - Op. cit.
�BERNOUX (P.) - 1995 - Op.cit. pág.79.
�SAINSAULIEU (R.) - 1988 - L’Identité au Travail ,Presse de la Fondation Nationale des Sciences Politiques, Paris (1a edição: 1977). 
�BERNOUX.(P.) - 1995 - Op.cit .pág.73.
�SAINSAULIEU (R.) - 1987 - Op. cit. pág. 208.
�BAUER (M.) - 1993 - Les patrons de PME entre le pouvoir, l’entreprise et la famille. Paris, InterEditions.

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