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1 UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA CURSO DE LICENCIATURA PLENA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS WAGNER JOSÉ DE AGUIAR CONCEPÇÕES E PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL ESCOLAR: UM OLHAR NAS EXPERIÊNCIAS DE PROFESSORES DO PROGRAMA CAPIVARA RECIFE 2014 2 WAGNER JOSÉ DE AGUIAR CONCEPÇÕES E PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL ESCOLAR: UM OLHAR NAS EXPERIÊNCIAS DE PROFESSORES DO PROGRAMA CAPIVARA Monografia apresentada ao Curso de Licenciatura Plena em Ciências Biológicas da Universidade Federal Rural de Pernambuco como requisito parcial à obtenção do grau de Licenciado em Ciências Biológicas Orientadora: Profa. Dra. Carmen Roselaine de Oliveira Farias RECIFE 2014 3 Ficha catalográfica A282c Aguiar, Wagner José de Concepções e práticas de avaliação na educação ambiental escolar: um olhar nas experiências de professores do Programa Capivara / Wagner José de Aguiar. – Recife, 2014. 65 f. : il. Orientador: Carmen Roselaine de Oliveira Farias. Monografia (Licenciatura Plena em Ciências Biológicas) – Universidade Federal Rural de Pernambuco, Departamento de Biologia, Recife, 2014. Referências. 1. Fenomenologia 2. Saberes docentes 3. Bacia do Capibaribe I. Farias, Carmen Roselaine de Oliveira, orientador II. Título CDD 574 4 WAGNER JOSÉ DE AGUIAR CONCEPÇÕES E PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL ESCOLAR: UM OLHAR NAS EXPERIÊNCIAS DE PROFESSORES DO PROGRAMA CAPIVARA Monografia apresentada ao Curso de Licenciatura Plena em Ciências Biológicas da Universidade Federal Rural de Pernambuco como requisito parcial à obtenção do grau de Licenciado em Ciências Biológica Aprovada em 06/03/14 BANCA EXAMINADORA ______________________________________________________ Prof. Dra. Carmen Roselaine de Oliveira Farias Universidade Federal Rural de Pernambuco _______________________________________________________ Profa. Dra. Betânia Cristina Guilherme Universidade Federal Rural de Pernambuco _______________________________________________________ Profa. Dra. Bruna Tarcília Ferraz Universidade Federal Rural de Pernambuco _______________________________________________________ Profa. Dra. Ednilza Maranhão dos Santos Universidade Federal Rural de Pernambuco 5 Dedico este trabalho aos meus pais, Valter José de Aguiar e Maria das Graças dos Santos, e a minha avó Maria Felipa da Conceição, por serem os meus maiores exemplos de responsabilidade, perseverança e humildade; e a minha amada companheira Renata Alves de Brito, por todo apoio e compreensão para cada instante comprometido para concretização desse sonho tão esperado. 6 AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a DEUS, pois sem o dom da vida, eu não poderia ter contado com tantas colaborações de professores, colegas, amigos e familiares, não tendo assim chegado ao final de minha graduação e, muito menos, ter iniciado e concluído esta pesquisa de extremo significado para a minha realização enquanto profissional e cidadão sensibilizado pela mudança. Sem a inspiração divina e sem a confiança depositada pela família, incluindo a minha namorada e eterna companheira, e por colegas, nada disso teria sido possível. Agradeço a todos/as aqueles e aquelas que contribuíram de forma direta ou indireta, permanente ou pontual, presencial ou à distância, para que este trabalho finalmente se concretizasse: À professora Carmen Farias, minha orientadora, que com muita seriedade, compromisso e cuidado, me acolheu como orientando, estando sempre aberta ao diálogo. Ao mesmo tempo, agradeço pela sua confiança ao abrir as portas do Programa Capivara e do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação e Sustentabilidade (GEPES), para que eu me aproximasse das vivências e reflexões que viriam a somar com o meu olhar de pesquisa. Em nome dela, estendo os meus agradecimentos a todos os professores, coordenadores, bolsistas e voluntários do Programa Capivara e do GEPES, que muito contribuíram na realização desse estudo. Também agradeço a todos/as professores/as e educadores/as ambientais do Programa Capivara que contribuíram na realização das entrevistas, bem como ao pessoal da Fazenda Fieza onde, no nome do Sr. Paulo Fieza, agradeço a toda sua família pela acolhida nos dias em que estive no Alto Capibaribe. Agradeço, também de um modo especial, às professoras Betânia, Bruna e Ednilza, por inicialmente terem aceitado o convite de participar da banca, e pelas contribuições dadas por cada uma, dentro dos seus olhares e experiências de atuação no campo da Educação Ambiental e da Avaliação Educacional. Agradeço de uma forma geral à Universidade Federal Rural de Pernambuco, espaço no qual construí relações profissionais e pessoais de 7 extrema importância na minha formação acadêmica e cidadã, desde o convívio em sala de aula, com professores/as e colegas de turma, de diferentes realidades e visões de mundo e, até mesmo, de cursos de origem distintos, até com os colegas de escrita acadêmica e contato com concepções e visões diferentes de pesquisas, nos vários eventos pelos quais passei com o apoio institucional. Aprendi bastante também com os projetos e os grupos de estudos, a iniciar pelo Programa Conexões de Saberes e o PET/Conexões Políticas Públicas, dos quais fui bolsista enquanto estudante e que, nos nomes do Professor Alexandro Tenório e da Professora Bruna Tarcília, agradeço a todos os colegas que colaboraram intensamente nas experiências em que busquei me inserir, desde os momentos de estudo, formações continuadas e ações de extensão até as viagens para os nossos eventos, marcados pelas trocas de experiências e de profundas reflexões sobre o nosso papel frente à mudança da sociedade. Foi no convívio com o Conexões que emergiu minha aproximação com a Educação Ambiental, vindo a ser reforçada com a colaboração do Professor Gilberto Farias, do Centro de Ensino, Pesquisa e Extensão sobre Desastres (CEPED), que institucionalmente me proporcionou experiências de grande importância no sentido de me aproximar para uma leitura crítica da questão ambiental associada a uma preocupação com a defesa civil enquanto política pública; e da Professora Fátima Navarro e do amigo João Frasão, ambos da Coordenação de Integração Comunitária da Pró-Reitoria de Extensão da UFRPE e da Agenda 21 da Região de Aldeia, que desde 2010 me oportunizaram a participação em vivências extensionistas de forte significado para a minha definição enquanto acadêmico comprometido com a Educação Ambiental na extensão universitária. Agradeço aos três pela grande contribuição deixada. Identificado com aEducação Ambiental, busquei me aproximar da pesquisa, ingressando em 2012 no Grupo de Gestão Ambiental em Pernambuco (Gampe/UFRPE) e no Núcleo Multidisciplinar de Pesquisa em Direito e Sociedade (NPD/UFRPE) os quais, nos nomes da Professora Soraya El-Deir e do Professor Fernando Joaquim Maia, respectivamente coordenadores dos grupos citados, agradeço a todos os professores e colegas com os quais vivenciei momentos 8 determinantes para a consolidação dos meus interesses na área ambiental, aguçando os meus olhares por outras lentes de interpretação. O contato com a realidade do semiárido, sob a ótica do fazer acadêmico, só foi possível graças a cada um de vocês. Agradeço ainda aos Professores Marcos Reigota (UNISO) e Alexandre Pedrini (UERJ), pesquisadores de renome na área da Educação Ambiental com os quais tive a oportunidade de interação, tanto presencial como à distância, no decorrer de minha pesquisa monográfica. As suas sugestões de leitura e os artigos compartilhados foram de grande importância para ampliar meus horizontes interpretativos. Sintam-se como parte dessa pesquisa. Agradeço também a pessoas que foram de grande importância para o meu ingresso na universidade e estímulo à carreira acadêmica, começando pelos professores/as Gorett Veloso e João Paulo, da Escola Municipal Sociólogo Gilberto Freyre, e Mônica Lins, da Escola Estadual Padre Machado (atualmente, EREM Padre Machado), que despertaram em mim a paixão que tenho pelas Ciências Biológicas; à professora Lucy Medeiros Dias, que desde o Ensino Médio, sempre me motivou à busca pela realização acadêmica e pessoal, vindo a manifestar um gesto que foi decisivo para minha entrada na universidade. Em nome dela, agradeço a todos/as professores/as que me motivaram à chegada na academia, bem como aos colegas e amigos de turma. Agradeço também a Sra. Edna Kilma Iumatti Valença, ao seu esposo Dr. Rui de Lima Cavalcanti Neto e ao Sr. Francisco Flávio Batista Meireles, três amigos que conheci através de meu pai, saindo do ensino médio rumo à universidade, e que tiveram uma participação muito importante no incentivo aos meus estudos acadêmicos. A to@s vocês, independente da menção aos nomes, obrigado pelas suas contribuições: sintam-se tod@s como partes dessa realização!!!! 9 " O problema da escola não é aprovar ou reprovar; é garantir a aprendizagem." Paulo Freire 10 RESUMO Este estudo teve por objetivo compreender a avaliação na Educação Ambiental (EA) a partir dos significados atribuídos por professores nas suas experiências de projetos e ações desenvolvidos no âmbito escolar. Tendo uma natureza qualitativa, a pesquisa foi de cunho fenomenológico, envolvendo a realização de entrevistas semiestruturadas com professores de escolas articuladas ao Programa Capivara de Educação Socioambiental na Bacia do Capibaribe, uma ação de extensão coordenada pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). As entrevistas ocorreram entre os meses de dezembro de 2013 e janeiro de 2014, alcançando seis professores de cinco escolas situadas no Alto, Médio e Baixo Capibaribe, no estado de Pernambuco, Brasil. Com o suporte de um roteiro, as entrevistas foram audiogravadas e transcritas, recebendo um tratamento analítico em cima dos significados identificados nos discursos dos professores. De um modo geral, a análise apontou para a formação de seis categorias gerais que possibilitaram a conclusão de que as concepções e práticas avaliativas na EA, em função da natureza subjetiva dos critérios adotados, estão alicerçadas numa concepção de avaliação de base qualitativa e distante dos modelos de avaliações tradicionais vigentes no ensino disciplinar. Propõem-se ainda diretrizes que possam subsidiar a estruturação dos processos avaliativos no âmbito do Programa, dentro das vivências e saberes dos professores. Palavras-chave: Fenomenologia. Saberes docentes. Bacia do Capibaribe. 11 ABSTRACT This present study goals to understand the assessment in Environmental Education (EE) obtained from the meanings assigned by teachers in their experiences in projects and actions developed at their school environment. It is a qualitative nature research and presents a phenomenological essence, involving semi-structured interviews with teachers from schools related to the Capybara- Environmental Education Program in Capibaribe Basin (Programa Capivara de Educação Socioambiental na Bacia do Capibaribe), an action promoted by Rural Federal University of Pernambuco (Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE). The interviews took place between December 2012 and January 2014, reaching six teachers from five schools located at High, Medium and Low Capibaribe regions, at Pernambuco, Brazil. With a script support, the interviews have been recorded and transcribed, and after it, they have received an analytical analysis about the meanings identified at the teachers‟ speech. In a general way, the analysis pointed to a formation of six general categories that allowed concluding that conceptions and assessment practices in EE, depending on the adopted subjective nature of the criteria, are built on a conception of qualitative based assessment, which is distant from traditional assessment models currently applied at disciplinary education. It is purposed, further, guidelines that that may help teachers structuring the evaluation process under the Program, within the experiences and knowledge of themselves. Keywords: Phenomenology. Teacher‟s knowledge. Capibaribe Basin. 12 LISTA DE FIGURAS Pág. Figura 1 Localização da Bacia do Capibaribe no estado de Pernambuco 26 Figura 2 Divisão da Bacia do Capibaribe com destaque para as três macrozonas administrativas 26 Figura 3 Esquema representativo do processo de formação das categorias emergentes 31 13 LISTA DE QUADROS Pág. Quadro 1 Concepções de meio ambiente na Educação Ambiental 22 Quadro 2 Perfil dos professores articuladores entrevistados 30 Quadro 3 Análise nomotética para a Categoria Geral 1 35 Quadro 4 Análise nomotética para a Categoria Geral 2 39 Quadro 5 Análise nomotética para a Categoria Geral 3 44 Quadro 6 Análise nomotética para a Categoria Geral 4 49 Quadro 7 Análise nomotética para a Categoria Geral 5 52 Quadro 8 Análise nomotética para a Categoria Geral 6 54 14 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 15 2 OBJETIVOS................................................................................................................ 17 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA......................................... 18 3.1 CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS PARA AS CONCEPÇÕES DE AVALIAÇÃO... 18 3.2 CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS PARA AS CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL................................................................................................................... 21 3.3 A ABORDAGEM FENOMENOLÓGICA COMO METODOLOGIA DE PESQUISA.......................................................................................................................3.4. O PROGRAMA CAPIVARA COMO UM CAMPO DE POSSIBILIDADES PARA COMPREENDER O FENÔMENO INVESTIGADO......................................... 4 METODOLOGIA DA PESQUISA............................................................................ 4.1 CAMPO DE ESTUDO............................................................................................... 25 25 29 29 4.2 SUJEITOS DA PESQUISA....................................................................................... 29 4.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS............................................................... 30 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO................................................................................ 32 5.1 SENSIBILIZAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO COMO FUNÇÕES DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL ESCOLAR....................................................................... 32 5.2 MUDANÇAS DE POSTURAS E PARTICIPAÇÃO COMO CRITÉRIOS AVALIATIVOS NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL........................................................ 36 5.3 A OBSERVAÇÃO COMO TÉCNICA EMPREGADA NA PRÁTICA AVALIATIVA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL........................................................... 40 5.4 AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL É UMA AVALIAÇÃO DIFERENCIADA............................................................................................................. 44 5.5 A AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL ASSUME UMA FUNÇÃO PEDAGÓGICA................................................................................................................ 51 5.6 A AVALIAÇÃO NAS AÇÕES DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL DEVE SER UM EXERCÍCIO COLABORATIVO.................................................................................... 5.7 PROPOSTAS DE DIRETRIZES PARA AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL ESCOLAR: UMA RESPOSTA À REALIDADE INVESTIGADA....... 52 54 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................... REFERÊNCIAS.............................................................................................................. APÊNDICES................................................................................................................... 57 59 65 15 1 INTRODUÇÃO A presente investigação se apresenta como uma interrogativa ao desenvolvimento de processos avaliativos no âmbito dos projetos e ações de Educação Ambiental (EA). Ao mesmo tempo em que a avaliação é destacada na legislação da EA como um dos princípios fundamentais à sua implementação, como nos Artigos 6º, inciso IV, e 8º, inciso IV, da Lei Federal nº 9.795/99, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental (BRASIL, 1999), como no Artigo 3º do Decreto nº 4.281/02 que regulamenta a mesma lei, reflexões no campo teórico vêm se debruçando sobre essa problemática. Nas últimas décadas vêm se trazendo elementos sobre a avaliação em EA, focando concepções e modelos de avaliação (RIBEIRO; GÜNTHER; ARAÚJO, 2002; GASPAR; TONSO, 2010; MATTOS; LOUREIRO, 2011), critérios e indicadores (TOMAZELLO; FERREIRA, 2001; ROLDÃO, 2009), condicionantes e metodologias (DEPRESBITERIS, 2001; 2002), representações de avaliação na EA (PEDRINI; JUSTEN, 2006), além de trabalhos cuja perspectiva expõe a socialização de resultados de avaliações externas, feitas pelos pesquisadores (CURADO; ANGELINI, 2006; MELO, 2010; CUNHA et al., 2013). Partindo das recomendações das diretrizes educacionais em EA, que concebem a avaliação como um processo crítico e fundamental à sua incorporação ao currículo da educação formal (BRASIL, 2012) e das lacunas postas para essa perspectiva, a pesquisa em tela se volta para contexto escolar enquanto um espaço no qual suas práticas são cotidianamente elaboradas e vivenciadas. Todavia, os principais aspectos que favorecem a ausência (ou deficiência) das práticas avaliativas na EA remetem à falta de clareza quantos aos objetivos e métodos pertinentes (TRAVASSOS, 2004; GASPAR, TONSO, 2010) e à complexidade de alguns instrumentos (ANDRADE; LOUREIRO, 2001), ademais da inadequação da maior parte dos instrumentos (MATTOS; LOUREIRO, 2011). Desse modo, esta pesquisa parte das seguintes questões norteadoras: como professores avaliam projetos e ações de EA em seus espaços de atuação? De forma particular, que concepções estes atores trazem acerca da prática da avaliação, e como se dá a adequação dos instrumentos e métodos avaliativos às 16 abordagens de EA? A lógica de avaliação adotada tem sido eficaz frente aos objetivos das atividades, e promovido o fortalecimento da EA enquanto uma prática institucional? Diante dessas inquietações, percebe-se que a avaliação está sendo aqui interpretada como um fenômeno característico da realidade escolar que, administrado de forma autônoma e compartilhada, tem as suas lógicas de desenvolvimento (re)inventadas pelos sujeitos do ensino-aprendizagem e, portanto, da definição da cultura organizacional da escola. Esse processo de reinvenção se dá na medida em que professores criam e experimentam diferentes estratégias de como avaliar os resultados alcançados com os objetivos de sua intervenção, com a clareza de sua prática é passível de readequações e melhorias. Nessa direção, um dos movimentos para entender as concepções e práticas de avaliação em EA escolar é buscar uma aproximação com os professores, atores primordiais da definição das atividades de EA. Partindo desse entendimento, esta pesquisa focará o contexto dos projetos e ações de EA desenvolvidos no âmbito do “Programa Capivara: educação socioambiental na bacia do Capibaribe”, uma iniciativa de extensão universitária da Universidade Federal Rural de Pernambuco em parceria com o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Capibaribe, vigente desde 2011. O Programa teve por objetivo incentivar pessoas e instituições educativas na disseminação de uma cultura de sustentabilidade hídrica e socioambiental na Bacia do Rio Capibaribe, pela dinamização de espaços democráticos de formação, educação e comunicação socioambiental (PROGRAMA CAPIVARA, 2014). Nessa direção, o contexto do Programa Capivara traduziu um campo de possibilidades para o aprofundamento das indagações vislumbradas nesta pesquisa, tendo em vista a diversidade de experiências acumuladas ao longo da existência do Programa. Além da aproximação com professores engajados, atores fundamentais do processo de planejamento, execução e avaliação das ações educativas, este estudo favoreceu a identificação de possibilidades e de desafios encontrados por estes atores. Dessa forma, espera-se a possibilidade de proposição de diretrizes que possam nortear práticas avaliativas na EA, dentro das experiências já acumuladas. 17 2 OBJETIVOS 2.1 GERAL Compreender a avaliação na Educação Ambiental (EA) a partir dos significados atribuídos pelos professores, integrantes do Programa Capivara, nas suas experiências de projetos e ações desenvolvidos no âmbito escolar. 2.2 ESPECÍFICOS Identificar critérios/parâmetros empregados pelos professores nas práticas avaliativas da EA; Conhecer os instrumentos e procedimentos utilizados nas práticas de avaliação na EA; Interpretar as concepções de avaliação dos professores a partir das suas percepções com relação à suas experiências de avaliação; Analisar a relação das concepções e práticas de avaliação com as concepções de EA; Propor diretrizes que possam subsidiar a estruturação dos processos avaliativos no âmbito dos projetos escolares de EA vivenciados no Programa Capivara.18 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA 3.1 CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS PARA AS CONCEPÇÕES DE AVALIAÇÃO Debruçar-se sobre a temática da avaliação na Educação Ambiental (EA) escolar não poderia iniciar com um passo dado do ponto zero, mas sim partir das concepções pedagógicas que norteiam a prática da avaliação educacional, considerando as suas diferentes significações ao longo da história da educação. Segundo Chueiri (2008, p. 51), a avaliação no contexto da escola é realizada “conforme objetivos escolares implícitos ou explícitos que, por sua vez, refletem valores e normas sociais”. Nesse sentido, a prática da avaliação esteve condicionada a um entendimento de mundo, de ciência e de educação que, por sua vez, define uma forma de conceber e de praticar a avaliação, passando desde o enfoque da avaliação como exame (tendência tradicional) até a avaliação qualitativa (tendência contemporânea/progressista). Todavia, é importante explicitar de início a compreensão de avaliação trazida neste estudo. Entende-se aqui que a avaliação enquanto prática pedagógica deve cumprir um papel de apoio à aprendizagem, mas especialmente exercendo uma função de regulação das aprendizagens. Para Jorba e Sanmartí (2003, p. 25), a ideia de regulação engloba tanto a adequação dos procedimentos adotados numa prática às necessidades e progressos dos alunos, como de autorregulação de modo que os alunos criem um sistema pessoal de aprendizado adquirindo autonomia maior. Sob essa visão, a avaliação envolve três etapas principais: (1) coleta de informação, que pode ser ou não instrumentada; (2) análise dessa informação e conclusão sobre o resultado da análise; e, (3) tomada de decisões de acordo com a conclusão (Ibid.). Para embasar a compreensão acerca da avaliação na EA escolar, do ponto de vista da interpretação das concepções de avaliação trazidas pelos professores, serão utilizadas aqui as contribuições das revisões de Meneghel e Kreisch (2009). Para essas autoras, são percebidas na literatura três tendências para identificar as práticas avaliativas nos meios escolares: classificatória, diagnóstica e emancipatória. A avaliação classificatória (Ibid. 9822-9823), não possibilita a reconstrução do saber, já que há uma preocupação com avanço nos conteúdos programados 19 diante de uma metodologia de ensino centrada na reprodução de conteúdos e técnicas, tendo instrumentos com ênfase na quantificação do produto final, sendo alunos bons os de maior capacidade mimética, isto é, de reproduzir determinados conceitos ou ideias tal qual da forma que lhes foram “passados”. Percebe-se aqui uma aproximação com as representações de avaliação como exame e da avaliação como processo de medida, trazidas por Chueiri (2008), de modo que pela primeira se examine o que foi “absorvido” pelos alunos e, pela segunda, se quantifique essa “aprendizagem”, gerando assim uma distinção entre os alunos que obtiveram boas notas e aqueles que não as obtiveram. A segunda tendência, a da avaliação diagnóstica (MENEGHEL; KREISCH, 2009, p. 9823-9824), visa identificar fraquezas e potencialidades dos estudantes, de modo a informar futuras estratégias ao professor e ao aluno. Nesse modelo, o foco da avaliação é o desempenho do estudante através de um constante olhar crítico sobre o que está sendo feito e, diante de uma avaliação classificatória, os dados fornecidos por esta assumiriam importância no sentido de reorientar o trabalho pedagógico, sendo ponto de partida para o avanço e o crescimento. Jorba e Sanmartí (2003) e Sant‟Anna (2010) tratam também da avaliação diagnóstica, mas no sentido de traçar inicialmente um perfil da situação em que o aluno se encontra, antes de inseri-lo num processo de ensino-aprendizagem, de modo que este processo seja adaptado às suas necessidades de aprendizagem. A tendência da avaliação emancipatória (MENEGHEL; KREISCH, 2009, p. 9824-9825), tem como foco principal a promoção de sujeitos, isto é, promover nos alunos o protagonismo na percepção de suas dificuldades de aprendizagem e na consequente identificação de meios para superá-las. Desse modo, propõe-se uma avaliação em que professor e aluno atuem como parceiros, de forma que o primeiro aprenda a “perceber os limites e o estágio de conhecimento do aluno em relação a determinado tema/assunto”, e o segundo aprenda a “detectar os temas em que tem dificuldade”. Assim, privilegia-se uma avaliação de processo (SANT‟ANNA, 2010), sendo os instrumentos diversificados e contínuos. Para atingir essa última tendência, foram propostos alguns modelos avaliativos como focos e elementos específicos (MENEGHEL; KREISCH, 2009, p. 9825-9828), a saber: Avaliação formativa ou formadora: tem por objetivo fornecer um feedback de seus progressos, considerando avaliações feitas em diferentes 20 momentos e instrumentos. Segundo Jorba e Sanmartí (2003, p. 30), este modelo tem uma “função ajustadora do processo de ensino-aprendizagem para possibilitar que os meios de formação respondam às características dos estudantes”. Aqui, os erros são objetos de estudo, servindo de base para compreender as dificuldades apresentadas pelos estudantes na realização de determinadas tarefas – aqui se expressa a função pedagógica da avaliação (Ibid. p. 26); Avaliação mediadora: este modelo tem como foco à ação docente no processo avaliativo. Caracteriza-se por exigir maior dedicação de tempo do professor, em termos de atenção às especificidades e acompanhamento individual. Para Hoffmann (1994), a definição de acompanhamento extrapola a simples ideia de estar junto ao aluno, significando, por parte do professor, o favorecimento do desenvolvimento do aluno, utilizando meios diversos que o auxiliem na construção do seu aprendizado; Avaliação dinâmica: este modelo, por sua vez, tem o foco no estudante, partindo do entendimento de que este tem a capacidade de modificar-se, avaliando-o na trajetória entre o não-aprendido ao aprendido. Assemelha- se da avaliação formativa, no sentido de que identificar dificuldades de aprendizagem e trabalhá-las de modo a ajudar os alunos, com ajustamento da proposta da atividade ao aluno. Conforme as contribuições de Méier (apud MENEGHEL; KREISCH, 2009), esse modelo envolve a complementação entre uma avaliação quantitativa e outra qualitativa; Avaliação apreciativa: também com o foco no estudante, esta é voltada para a valorização das produções dos alunos. Ao invés de direcionar a atenção para os problemas e os aspectos que não funcionaram bem, o que há é um reforço dos resultados positivos. Isso não significa necessariamente que os resultados negativos não sejam percebidos, mas se estimula que uma determinada forma de organização, que resulta em êxito, seja buscada com mais frequência, de modo que se fortaleça a capacidade de admitir falhas e a iniciativa de solucioná-las; e, Meta-avaliação: sendo este modelo o da “avaliação da avaliação”, admite- se aqui tanto a avaliação de avaliadores, quanto do próprio processo avaliativo, em procedimentos e instrumentos, sendo de fundamental importância para avaliadores, gestores e educadores. 21 Considerando essas diferentes tendências no campo da avaliação educacional, cabe então a partir delas buscar um referencial para interpretar o fenômeno da avaliação nas práticas de EA, dentro da realidade aqui investigada. Por outro lado, em consideração ao dizer de Luckesi (2008), quando destaca que a avaliação está “a serviço de uma pedagogia”, é de interesse analisar a relação das concepções de EA com as práticas de avaliação. Nesse sentido, se focará adiante as concepções de EApresentes nas práticas escolares. 3.2 CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS PARA AS CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL Desde a sua emergência no cenário brasileiro, a Educação Ambiental (EA) esteve fortemente marcada pelo viés naturalista, visto que inicialmente ela foi concebida como “preocupação dos movimentos ecológicos com uma prática de conscientização capaz de chamar a atenção para a finitude e a má distribuição no acesso aos recursos naturais” (CARVALHO, 2008, p. 51-52), sendo impulsionada pelas políticas ambientais. A inserção da EA nos currículos escolares brasileiros, pela via das políticas educacionais, se deu a partir de 1990 (ZAKRZEVSKI, 2003 apud VENDRUSCOLO et al., 2013), sendo então ressignificada dentro das teorias da educação. Não diferentemente do que ocorreu com avaliação educacional, a EA também sempre foi influenciada por uma compreensão de educação e de mundo – ou, de modo mais particular, por uma compreensão de meio ambiente. Embora autores venham se debruçando sobre correntes filosóficas (SAUVÉ, 2005) e identidades da EA (LAYRARGUES, 2004), defende-se aqui que no núcleo de uma determinada concepção situa-se uma visão formada de meio ambiente que, por sua vez, norteia uma forma de trabalhar a EA. De acordo com Morales (2009, p. 167), “as concepções mudam de acordo com o processo de construção e reconstrução da EA, já que esse é um campo constante de expansão e reformulações”. Para discutir as concepções de EA a serem identificadas nesta pesquisa, será utilizada aqui a contribuição de Sauvé (1997; 2005a). Para esta autora, “mais do que uma educação „a respeito do, para ou no, pelo ou em prol do‟ meio ambiente, o objeto da EA é de fato, fundamentalmente, nossa relação com o meio 22 ambiente” (2005, p. 317). Embora ela proponha 15 correntes filosóficas para compreender a diversidade da EA (SAUVÉ, 2005), muitas destas aplicadas em pesquisas focadas em estudos de concepções de EA (GERMÂNIO; CRUZ; OLIVEIRA, 2012; VENDRUSCOLO et al., 2013), se partirá aqui das concepções de meio ambiente trazidas em seus trabalhos (Quadro 1). Quadro 1 - Concepções de meio ambiente na EA segundo Sauvé Representação do meio ambiente Problema identificado Objetivos da EA Natureza: para ser apreciada e preservada. Dicotomia da relação ser humano-natureza. Renovação do ser humano com a natureza, tornando-o como parte dela; Desenvolvimento de sensibilidade para o pertencimento. Recurso: para ser gerenciado. Ser humano apropriando-se de forma ilimitada dos recursos. Manejo e gestão ambiental para um futuro sustentável. Problema: para ser resolvido. Relação negativa do ser humano com o ambiente ameaçado. Desenvolver competências e ações para a resolução dos problemas por meio de comportamentos responsáveis. Sistema: para compreensão e tomada de decisão. Ser humano percebe o sistema fragmentado. Desenvolver o pensamento sistêmico para a tomada de decisão. Meio de vida: para conhecer e cuidar do ambiente. Ser humanos é habitante do ambiente, porém sem o sentido do pertencimento (Re) descobrir os próprios meios de vida, despertando o sentido do pertencimento. Biosfera: como local para ser vivido. Ser humano não é solidário e a cultura ocidental não reconhece a relação do ser humano com a Terra Desenvolver uma visão global do ambiente, considerando as interrelações. Projeto comunitário: para ser envolvido e comprometido. Ser humano é individualista e falta compromisso com a comunidade. Desenvolver a práxis (ação- reflexão-ação) por meio do espírito crítico e coletivo. Relação sociedade- natureza (concepção emergente e recorrente nos fundamentos da EA). Ser humano se depara com o conhecimento científico fragmentado e estilos de vida que leva ao consumo exagerado. Integrar os conhecimentos sobre natureza e sociedade; Facilitar a reflexão crítica e o planejamento ambiental. Fonte: Morales (2009) 23 Observa-se que cada uma das representações de meio ambiente remete a uma problemática ambiental específica e aos objetivos da EA frente a cada problema. A partir de então, tem-se um subsídio para interpretar as concepções de meio ambiente, presentes nos discursos e nas práticas dos educadores ambientais. Em matéria de concepções de EA, conforme já mencionado, há muitas contribuições que orientam estudos dessa natureza, seja pela via do estudo das correntes filosóficas (numa perspectiva mais universal), seja pela via do estudo das identidades da EA brasileira. Todavia, considerando que da mesma forma que a educação brasileira seja influenciada, ora por uma pedagogia tradicional, ora por uma pedagogia progressista, esse mesmo fenômeno é percebido na EA. Para essa reflexão, serão válidas as contribuições de Tozoni-Reis (2008), com as “perspectivas adaptadoras-reprodutoras/perspectivas transformadoras”, e as de Rheinheimer e Guerra (2012), que focam “EA convencional e conservadora/ EA crítica e transformadora”. Com relação às contribuições de Tozoni-Reis (2008, p. 157), na perspectiva adaptadora-reprodutora, a EA tem a função de “adaptar” os indivíduos a um modelo de sociedade já definido que, “embora mais preocupado com o tema ambiental, não questiona o modelo de desenvolvimento em curso”. Nessa perspectiva, destacam-se enfoques e estratégias diversas (disciplinatória, ingênua, ativista e conteudista), em que as abordagens favorecem a reprodução das relações entre os grupos sociais e deles com o ambiente, definidas pela modernidade. No dizer de Carvalho (2008, p. 153), enquadrar-se-iam nessa perspectiva as “boas práticas ambientais” ou “bons comportamentos ambientais”. Por outro lado, ela ressalta a perspectiva transformadora na qual a EA partiria de análises críticas das relações entre os grupos sociais e deles com o ambiente habitado, “compreendendo-as como relações históricas, cuja marca é a desigualdade social e a degradação ambiental” (TOZONI-REIS, 2008, p. 158). Aqui se traduziria a EA crítica, anunciada por Carvalho (2008, p. 156-157), voltada para uma “mudança de valores e atitudes formando um „sujeito ecológico‟ capaz de identificar e problematizar as questões socioambientais e agir sobre elas”. De modo complementar a esse detalhamento, Rheinheimer e Guerra (2012) apontam para a distinção entre uma EA conservadora e convencional e uma EA crítica e transformadora. Sobre a primeira (Ibid., p. 163), as autoras 24 colocam que a EA sendo conservadora se sustenta numa “visão de mundo que fragmenta a realidade, simplificando e reduzindo-a, perdendo a riqueza e a diversidade da relação” o que produz “uma prática pedagógica objetivada no indivíduo (na parte) e na transformação de seu comportamento (educação individualista e comportamentalista)”. Sendo convencional, a EA visa à “mudança de comportamentos compatíveis a um determinado padrão idealizado de relações corretas com a natureza, com uma tendência a aceitar a ordem social estabelecida como condição dada”. Estabelecendo uma comparação com a perspectiva adaptadora- reprodutora de Tozoni-Reis (2008), observa-se que o viés comportamentalista e a visão reducionista da realidade, anteriormente ressaltados, são aqui reforçados. Por outro lado, um aspecto diferencial é evidenciado nas contribuições de Rheinheimer e Guerra, que remete ao foco da ação no indivíduo. Já em relação à EA crítica e transformadora, Rheinheimer e Guerra (2012) discutem que essa concepção reflete uma açãopolítica voltada para a transformação social, tendo por princípios de cooperação, coletividade e participação como norteadores do processo educativo. Aqui o objetivo é transformar as relações dos homens consigo e deles com o ambiente. Apoiando- se nas reflexões de Loureiro, as autoras destacam que a EA transformadora: [...] enfatiza a educação como processo permanente e coletivo pelo qual agimos e refletimos, transformando a realidade de vida. Está focada nas pedagogias problematizadoras do concreto vivido como meio para se buscar novas sínteses que indiquem caminhos democráticos, sustentáveis e justos para todos. Baseia-se no princípio de que as certezas são relativas; na crítica e na autocrítica constantes e na ação política como forma de se estabelecer movimentos emancipatórios e de transformação social que possibilitem o estabelecimento de novos patamares de relações na natureza (LOUREIRO, 2004, p. 81). Nessa direção, Carvalho (2008, p. 187) coloca que “o sujeito da ação política é aquele capaz de identificar problemas e participar dos destinos e decisões que afetam seu campo de existência individual e coletivo”. Frente a essas contribuições teóricas, que refletem representações de meio ambiente e concepções de EA, cabe agora analisar como elas se relacionam com as concepções e práticas avaliativas realizadas no cotidiano escolar. 25 3.3 A ABORDAGEM FENOMENOLÓGICA COMO METODOLOGIA DE PESQUISA Considerando o cunho qualitativo desta pesquisa (OLIVEIRA, 2007), a sua metodologia será de natureza fenomenológica. Segundo Holanda (2006, p. 371): O método fenomenológico constitui-se numa abordagem descritiva, partindo da ideia de que se pode deixar o fenômeno falar por si, com o objetivo de alcançar o sentido da experiência, ou seja, o que a experiência significa para as pessoas que tiveram a experiência em questão e que estão, portanto, aptas a dar uma descrição compreensiva desta. Corroborando com essa definição, Dutra (2002, p. 376) coloca que a pesquisa fenomenológica permite “captar o sentido e o significado que as experiências vividas possuem para as pessoas no seu viver”. Como reforça Coltro (2000, p. 39), “parte da compreensão do viver e não de definições ou conceitos, e é uma compreensão voltada para os significados do perceber”. De um modo geral, “envolve um retorno à experiência para obter descrições compreensivas que darão a base para uma análise estrutural reflexiva criando um retrato da essência da experiência” (HOLANDA 2006, p. 370-371). Inspirada nesses pressupostos, a pesquisa buscará compreender a avaliação na EA a partir das experiências vivenciadas pelos professores, e não tendo como pretensão levantar críticas com relação à “coerência” dos critérios ou instrumentos empregados nas suas práticas avaliativas. Trata-se então de um movimento em que, para a interpretação e compreensão do fenômeno, requer uma disposição em conhecer e dialogar com as experiências dos sujeitos. 3.4 O PROGRAMA CAPIVARA COMO UM CAMPO DE POSSIBILIDADES PARA COMPREENDER O FENÔMENO INVESTIGADO O “Programa Capivara: educação socioambiental na Bacia do Capibaribe” é um programa de extensão universitária coordenado pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), em parceria com o Comitê da Bacia Hidrográfica do Capibaribe e outras organizações governamentais e não governamentais. Foi 26 aprovado com recurso nos Editais do Programa de Extensão Universitária do Ministério da Educação de 2011 e 2013 (PROEXT/MEC)1. O Programa tomou como referencial geográfico a Bacia do Rio Capibaribe (do tupi Caapiuar-y-be ou Capibara-ybe: “Rio das capivaras” – daí o nome do Programa), situada na porção norte do estado de Pernambuco, abrangendo áreas do Agreste, Zona da Mata e Litoral (Figura 1). Tendo uma extensão de 275 km, o Rio Capibaribe e os seus afluentes cortam 42 municípios, distribuídos nas três macrozonas administrativas da Bacia: Alto (MZ1), Médio (MZ2) e Baixo (MZ3) Capibaribe (Figura 2). Figura 1- Localização da Bacia do Capibaribe no estado de Pernambuco Fonte: Programa Capivara (2014) Figura 2- Divisão da Bacia do Capibaribe com destaque para as três macrozonas administrativas Fonte: PROJETEC (2010) 1 Segundo o site institucional, o Programa de Extensão Universitária (ProExt) tem o objetivo de apoiar as instituições públicas de ensino superior no desenvolvimento de programas ou projetos de extensão que contribuam para a implementação de políticas públicas. Criado em 2003, o ProExt abrange a extensão universitária com ênfase na inclusão social (Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12241&Itemid=488 Acesso em 28/03/2014). 27 Ao passo de que o Rio Capibaribe é reconhecido por muitos como o “gigante pernambucano”, esse mesmo gigante carrega, ao longo do seu percurso, vestígios fortes da exploração antrópica, expostos majoritariamente como problemas ambientais que implicam na necessidade de uma nova cultura face os usos múltiplos da água. Segundo exemplos trazidos no Plano Hidroambiental da Bacia Hidrográfica do Capibaribe, destacam-se como problemas diagnosticados (PROJETEC, 2010, p. 18-19): Desmatamento em cabeceiras, nascentes e nas margens do rio Capibaribe e seus afluentes; Avanço da atividade agrícola sobre as margens de rios e reservatórios; Solos expostos em encostas para extração de argila e saibro e a extração de areias em margens e calhas de rios; Construção indiscriminada de barramentos em afluentes e no próprio rio; Ocupação desordenada ao longo das margens de rios; Lançamento de esgotos domésticos e de matadouros municipais in natura e de efluentes industriais, com destaque para as lavanderias do Pólo Têxtil, diretamente na rede hídrica; Descarte de resíduos sólidos em vazadouros a céu aberto (lixões) ou nas margens dos rios; Salinização decorrente das condições climáticas e geológicas, potencializada por práticas agrícolas inadequadas. Frente a esse cenário, o Programa fomentou ações de educação socioambiental, visando à promoção de uma cultura sustentabilidade hídrica e socioambiental, com a participação de estudantes da graduação e da pós- graduação (bolsistas e voluntários) e a integração de docentes e pesquisadores da UFRPE e de outras instituições, além da parceria firmada com escolas públicas e privadas e com Organizações Não-Governamentais. Registros trazidos por Santos et al. (2012) apontam para a mobilização de aproximadamente 26 escolas no primeiro ano de atuação do Programa. Em termos de ações realizadas, destacaram-se cursos de formação para educadores ambientais (AGUIAR et al., 2013), eventos comemorativos (SANTOS; FARIAS, 2013), atividades com contação de histórias e produção de desenhos 28 (GOMES et al., 2012), oficinas com produção de poemas (ARAÚJO; OLIVEIRA; GUILHERME, 2012), atividades com ferramentas de educomunicação (CURRALO; CAVALCANTI; CYSNEIROS FILHO, 2012), atividades de campo (OLIVEIRA et al., 2012; SILVA et al., 2013), entre tantas outras que possibilitaram o encontro de saberes e fazeres dos educadores ambientais da Bacia. A partir do seu propósito e da articulação alcançada com escolas das três macrozonas da Bacia, o Programa Capivara representou um espaço de formação inicial para os graduandos inseridos na equipe de execução, bem como de formação continuada para os professores das escolas parceiras no sentido da inserção e/ou ampliação da questão ambiental nas suas práticas pedagógicas, dentro das experiênciasjá acumuladas bem como no tocante à abertura para a experimentação de novas abordagens metodológicas. Diante desse movimento, de ressignificação de saberes e fazeres pedagógicos, enxergou-se a possibilidade de uma aproximação com os professores, no intento de dialogar com esses atores a respeito de suas concepções e práticas de avaliação nas experiências de EA desenvolvidas nas escolas. A forma como se deu essa aproximação é foco da etapa seguinte. 29 4 METODOLOGIA DA PESQUISA 4.1 CAMPO DE ESTUDO A pesquisa foi desenvolvida em escolas articuladas ao Programa Capivara, situadas em três municípios do Alto, Médio e Baixo Capibaribe, sendo um município para cada macrozona. A escolha de unidades escolares em pontos diferentes foi feita no intento de obter representações de contextos distintos. Foram alcançadas cinco escolas, sendo três situadas no Alto, uma no Médio e outra no Baixo Capibaribe. Desse quantitativo, apenas uma foi da rede privada e, dentre as demais públicas, três eram da rede municipal e uma da rede estadual. A identificação e a seleção das escolas foram feitas com o auxílio da coordenação do Programa, considerando a articulação dessas instituições com os trabalhos desenvolvidos no âmbito das ações promovidas, bem como os professores articuladores que até então participavam das atividades. Estes, consequentemente, foram os sujeitos da pesquisa. 4.2 SUJEITOS DA PESQUISA Foram alcançados seis professores2 (Quadro 2), todos com formação de graduação e pós-graduação (lato sensu), tendo a maioria experiência docente superior ao tempo de 10 anos. Destes, apenas uma não estava no exercício da docência, desempenhando atualmente a função de gestora. O contato com os sujeitos se deu previamente, para agendar os dias e os horários dos encontros. Os encontros ocorreram entre dezembro de 2013 e janeiro de 2014, com a ida do pesquisador às escolas preestabelecidas. 2 Os professores foram denominados com nomes fictícios, tendo suas identidades preservadas. 30 Quadro 2 – Perfil dos professores articuladores entrevistados. Entrevistado Região do Capibaribe Experiência no magistério Formação Nível educacional em que atua Ana Baixo (BC) 7 anos Licenciatura em Biologia, com Especialização em Mídias na Educação e Psicopedagogia Professora de Ciências do Ensino Fundamental (anos finais) Isabel Médio (MC) 13 anos Licenciada em Biologia e em Pedagogia, e com especialização em Psicopedagogia Gestora João Alto (AC) 22 anos Licenciatura em Pedagogia, com Especialização em Psicopedagogia Professor do Ensino Fundamental (anos iniciais) Laura Médio (MC) 14 anos Licenciatura em Pedagogia, e com especialização em Psicopedagogia Professora do Ensino Fundamental (anos iniciais) Luiz Alto (AC) + 10 anos Graduação em Ciências Sociais, com especialização no Ensino de Geografia Professor de Geografia e Sociologia do Ensino Médio Rosa Alto (AC) 18 anos Licenciada em Ciências, com habilitação em Biologia, e Especialização em Ensino de Ciências, Ensino de Biologia e Mídias na Educação Professora de Ciências do Ensino Fundamental (anos finais) Fonte: Autor (2014) 4.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Partindo dos pressupostos de uma abordagem fenomenológica, a pesquisa requereu um resgate às experiências vividas pelos professores dentro das atividades de EA, no sentido compreender os significados atribuídos à avaliação nas suas práticas cotidianas. Sendo assim, a coleta de dados adotou a técnica da entrevista semiestruturada na qual: “o entrevistador faz perguntas a partir de um roteiro, e deixa que o entrevistado responda em seus próprios termos permitindo que se estabeleça um diálogo entre entrevistador e entrevistado de modo a atender os objetivos precípuos da pesquisa” (TEROSSI; SANTANA, 2013, p. 68). 31 Conforme a natureza do método fenomenológico (DUTRA, 2002, p. 377), as entrevistas foram realizadas com o suporte de um roteiro guia (apêndice 1), contemplando questões abertas que remetiam a experiências vivenciadas e visões de EA e de avaliação. Os depoimentos cedidos foram audiogravados, transcritos literalmente, com a autorização dos sujeitos da pesquisa através da assinatura de um Termo de Consentimento Livre Esclarecido (apêndice 2). Os procedimentos de análise foram inspirados na metodologia utilizada por Farias e Carvalho (2007), incluindo a identificação de unidades de significados, elaboradas a partir da seleção e interpretação de fragmentos discursivos individuais, extraídos das entrevistas transcritas (no caso da pesquisa feita pelos autores, envolvia um estudo com a participação de alunos do ensino médio). Posteriormente, buscou-se compreender o significado coletivo do fenômeno através da análise nomotética. Segundo Carvalho (apud FARIAS; CARVALHO, 2007, p. 166), esta análise: “interessa-se em buscar as convergências e divergências entre as essências dos discursos individuais. É um processo de interpretação que procura trazer à luz as idéias comuns e discrepantes no conjunto dos discursos dos sujeitos”. Uma vez formadas, as unidades de significado foram agrupadas a partir de suas convergências, formando unidades de significados coletivos, denominadas categorias amplas. Estas, ao se aproximarem semanticamente umas das outras, foram agrupadas em categorias maiores, denominadas categorias gerais (Figura 3) As categorias emergentes na pesquisa são foco da seção seguinte. Figura 3- Esquema representativo do processo de formação das categorias emergentes. Fonte: Autor (2014) 32 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO Com base nos dados obtidos e interpretados, houve a formação de 6 categorias gerais, emergentes pela convergência de categorias amplas resultantes da semelhança de visões e de experiências práticas relacionadas à avaliação na EA escolar. Nesse sentido, são apresentadas as categorias gerais identificadas, incluindo as categorias amplas, e discutidas a partir das Unidades de significado (US) sinalizadas nos discursos dos professores. 5.1 SENSIBILIZAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO COMO FUNÇÕES DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL (EA) ESCOLAR Investigar a função da EA na escola, a partir da perspectiva dos professores, foi um movimento que possibilitou, a esta pesquisa, identificar elementos que poderiam a apontar para alguma concepção de EA. Ademais, uma vez conhecendo os significados atribuídos ao papel da EA, pode-se então estabelecer um elo com os aspectos relacionados às práticas avaliativas, já que a partir do papel se pensam os objetivos de uma prática educativa e, destes, critérios e procedimentos definidores de uma avaliação na EA escolar. Os significados atribuídos pelos professores ao papel da EA na escola permitiram identificar duas categorias: a de sensibilização e a de conscientização. Para a categoria de sensibilização, foram registradas as seguintes ideias: Olha, a gente parte do princípio da sensibilização... práticas que voltem, assim, pra mudanças de postura [...] solicitando assim dos próprios moradores da comunidade que, assim, criassem neles posturas, sensibilização, atitudes sustentáveis, eles mesmos multiplicando o conhecimento que aprenderam (Professora Ana, BC, US 12). Pra sensibilizar os alunos, através de atividades que vivenciem a importância do meio ambiente para os seres vivos, pra que eles possamagredir menos o meio ambiente (Professora Laura, MC, US 14). Em ambas as respostas a sensibilização é voltada para uma mudança de postura, ora criando “atitudes sustentáveis”, com disseminação de conhecimentos 33 para comunidade; ora atenuando a “agressão” ao meio ambiente, como resultado de atividades que tratam da importância do meio ambiente para os seres vivos. Partindo das contribuições teóricas para as concepções de EA, a interpretação que se faz é de que a concepção da professora Ana traz alguns elementos que se aproximam da EA convencional (RHEINHEIMER; GUERRA, 2012), visto que aparentemente os alunos são condicionados a internalizar posturas e, em seguida, induzir na comunidade a reprodução dessas posturas, como uma espécie de norma ou padrão a ser seguido. No caso da professora Laura, o seu discurso expõe uma retratação do meio ambiente como “vítima” de uma agressão protagonizada pelos alunos (de um modo geral, pelos humanos). A interpretação que se pode construir, a partir do seu depoimento, foi de que a sua concepção de EA está influenciada por uma visão de meio ambiente como natureza, sendo o problema a dicotomia sociedade-natureza (SAUVÉ, 1997), pois, sendo o “homem” o agente agressor, espera-se que os seres vivos vitimados, geralmente referenciados, sejam seres não-humanos, como animais, plantas, etc. Para entender essa concepção, Loureiro (apud BERTOLUCCI; MACHADO; SANTANA, 2005, p. 3) coloca “ações práticas dirigidas para a manutenção intacta de áreas protegidas e a defesa da biodiversidade, dissociando sociedade e natureza” remetem a uma concepção conservadora de EA. Sendo complexo definir uma concepção a partir de elementos trazidos num depoimento, caberia então refletir se, o fato de uma professora trazer uma compreensão de EA assentada numa visão de meio como natureza, estaria induzindo-a a buscar uma visão integrada de sociedade e natureza, já que o problema parte da dicotomia homem-natureza; ou, se há uma persistência na compreensão de meio ambiente como uma natureza desconectada das significações sociais pode-se atestar que essa prática tem uma essência reducionista, portanto, conservadora. No tocante à categoria conscientização, foram estas as respostas que registraram esse significado: Aí a gente conscientizou os meninos de não tá jogando lixo no lixo, que lugar do lixo é no lixo, né? [...] E hoje em dia eles também falam, né, que não é pra matar a capivara [..] É a conscientização mesmo de fazer o bem (Professora Isabel, MC, US 30 e 34). 34 Ela, de certa forma, desperta esse olhar, mais próximo de você o conteúdo, mas relacionado com o dia-a-dia. Eu acho que essa é a grande contribuição da EA. Até porque nós estamos num planeta com recursos finitos e, ao mesmo tempo, há procura, despertamento para o consumo. E aí essa consciência que a EA desenvolve primeiro no professor. Então, se o professor tem essa consciência, automaticamente ele vai querer expandir, transmitir pra os alunos, tentar despertar os alunos também pra essa consciência ambiental. Acho que é fundamental (Professor Luiz, US, fala 8). Percebe-se, na fala da professora Isabel, certa aproximação como o foco da sensibilização, sendo o objetivo a mudança de posturas dos alunos, tendo o meio ambiente, ora como o “lugar” ou “meio de vida” (já que nos depoimentos posteriores, ela ressalta o cuidado com o lixo como uma forma de conservar o ambiente escolar), ora como natureza a ser protegida. Já no depoimento do professor Luiz, o papel da EA assume uma função instrumental, sendo um meio para se alcançar um estado de consciência ambiental, diante de uma visão de meio ambiente como “relação sociedade-natureza” (SAUVÉ, 1997), uma vez que é anunciada uma problemática global e que requer uma relação da questão ambiental com conteúdos abordados nas aulas (saberes científicos), para gerar uma determinada compreensão. Um ponto que chamou atenção nas respostas dadas nessa categoria foi de que, na primeira, a professora se vê como protagonista da consciência formada nos alunos, enquanto que na segunda o processo de conscientização se dá a partir de experiências vivenciadas pelos professores. Este é outro fator que torna complexa a interpretação de uma concepção de EA, a forma como se emprega o termo conscientização. Na definição trazida a partir da Conferência de Tbilisi, a conscientização reflete um papel em que a EA deve “ajudar aos indivíduos e aos grupos sociais a adquirir consciência do meio ambiente global e a sensibilizar-se por essas questões” (DIAS, 1994, p. 11). No entanto, a partir das reflexões trazidas por Oliveira e Carvalho (2007), percebe-se que o processo de conscientização se dá inerentemente a cada indivíduo, a partir de meios que vão desencadear a sensibilização para que, por conseguinte, os sujeitos tomem consciência, não sendo a consciência ambiental formada por terceiros. Desse modo, o fato da professora Isabel ter assumido a condição de “conscientizadora” poderia, dentro de um enfoque pedagógico, dar subsídio para 35 interpretar a sua concepção de EA como conservadora, já que uma mesma “consciência ambiental” estaria sendo internalizada pelos alunos, e não se adequando às suas particularidades de visão de mundo, sendo ressignificada a partir das experiências de vida de cada um. Contudo, isso não permite afirmar, do ponto de vista das concepções de ensino-aprendizagem, que a professora tem uma postura centralizadora, uma vez que esta pesquisa parte de dados obtidos em relatos de uma entrevista com recortes específicos da sua prática – no caso, em torno de experiências de avaliação na EA. A partir dos significados presentes nos discursos dos professores, postos para o papel da EA na escola, pode-se chegar a Categorias Amplas (CA) que, por sua vez, constituíram essa primeira Categoria Geral (CG), conforme a síntese no quadro a seguir: Quadro 3 – Análise nomotética para a Categoria Geral 1. CG.1. SENSIBILIZAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO COMO FUNÇÕES DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL (EA) ESCOLAR Categoria Ampla Professor/a CA.1. A EA na escola deve se voltar para sensibilização para a importância do meio ambiente para os seres vivos CA.2. A EA na escola deve favorecer a conscientização para a proteção na natureza e conservação dos seus recursos CA.3. A EA na escola promove a consciência ambiental nos professores para inserir a questão ambiental nas suas disciplinas Ana x Isabel x Laura x x João x Luiz x Rosa x Fonte: Autor (2014) Observa-se, de uma maneira geral, a predominância de uma sensibilização/conscientização pautada numa preocupação ecológico-naturalista. Por outro lado, compreender a EA a partir da visão dos professores, protagonistas das ações planejadas e avaliadas, requer uma interação com as demais categorias gerais a fim de que, no final, se possa obter uma interpretação capaz de explicar o fenômeno da avaliação na EA escolar. 36 5.2 MUDANÇAS DE POSTURAS E PARTICIPAÇÃO COMO CRITÉRIOS AVALIATIVOS NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL Nas experiências relatadas pelos professores, um dos critérios evidenciados, em matéria de análise de conjunto, foi a mudança de posturas dos alunos. De um modo geral, essas mudanças contemplavam posturas relacionadas à proteção da natureza e à conservação dos recursos ambientais, conforme os depoimentos expostos: É aquela coisa, você percebe no diálogo deles, às vezes repreendendo o próprio colega quando deixa ali a torneira aberta... quando percebem água desperdiçando, aí já vão gritandopra diretora pra dizer; ao sair das salas, eles já apagando as luzes, o ventilador. São pequenas posturas, mas a gente já sente que está brotando alguma coisa ali (Professora Ana, BC, US 40 e 42). [...] E hoje em dia eles também falam, né, que não é pra matar a capivara: „Que o meu pai, que mora do outro lado, na Rua da mangueira, quiser matar, eu não vou deixar‟, né? [...] Mas é como eu te falei, é a mudança mesmo de estilo do aluno, sabe? De você chegar pra eles....antes eles faziam isso, hoje eles já não faz mais, né? Eles jogavam lixo em tudo que é canto, e em casa também. É a conscientização mesmo de fazer o bem (Professora Isabel, MC, US 34 e 58). Porque eles provam pra mim, pra toda a escola, a forma como eles chegam contando: „Olhe, meu pai queria cortar uma árvore, eu não deixei‟; „Meu pai queria enterrar o lixo, eu não deixei, ensinei ele como fazer‟; „Meu pai queria matar um animal, eu não deixei‟ [...] Isso é a prova que realmente tá surtindo efeito (Professor João, AC, US 24). Em matéria de contexto, observa-se que as falas da professora Isabel e do professor João contemplam mudanças em cima de relatos feitos pelos alunos, com situações do cotidiano familiar e comunitário, enquanto que a da professora Ana retrata observações feitas no espaço da escolar. Outra observação que, de certo modo, reforça o fato da escolha das escolas em regiões distintas, é de que o elemento da proteção aos seres vivos só foi evidenciado nas entrevistas das escolas do Médio e do Alto Capibaribe, regiões que, comparadas a de um município situado na região metropolitana, possuem um quadro mais estável de conservação da natureza. 37 Analisando esses elementos à luz das concepções de EA, infere-se que as práticas educativas trazem elementos que as tornam próximas de uma EA mais conservadora, já que aqui as “boas práticas ambientais” orientadas por uma compreensão de meio ambiente como “natureza” ou “recurso” (SAUVÉ, 1997, 2005) aparentam ser o foco das ações. Todavia, não é pretensão dessas reflexões discriminar perspectivas tradicionais e progressistas de EA, até porque o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas é um dos princípios da EA, conforme o Artigo 3º, inciso III da Política Nacional de Educação Ambiental (BRASIL, 1999). Mas, buscar compreender a constituição de um parâmetro avaliativo a partir de uma concepção de EA. Outra reflexão a partir desse critério remete à distinção feita por Carvalho (2008), entre comportamento e ação. Segundo a autora, os comportamentos “refletem padrões aprendidos” enquanto que a ação “passa-se no plano da atribuição de sentidos às experiências humanas, no qual se criam as regras do jogo social e da convivência” (Ibid., p. 188). A partir dessa comparação, emerge a seguinte inquietação: que tipo de posturas os professores estão tomando como critério na avaliação – comportamentos ou ações? Haveria uma clareza com relação a essa distinção, e as implicações pedagógicas que se tem ao adotar um ou outro? Sobre esse ponto, Depresbiteris (2002, p. 81) afirma que “pensar em critérios é refletir sobre o que avaliar”, já que a função do critério está estreitamente ligada com a dimensão do acompanhamento da aprendizagem, o que não significa tornar a avaliação na EA uma processo técnico, mas sim uma prática consciente e planejada. Nessa direção, Silva (2008, p. 35) considera a existência de dois tipos de objetivos educativos no processo da avaliação: os previstos e os emergidos. Os previstos, como a própria denominação expõe, foram determinados previamente no planejamento docente, enquanto que os emergidos surgem no movimento da concretização da ação docente. Dessa forma, seriam as mudanças de posturas um critério previamente estabelecido ou emergido? Enfim, essa é mais uma questão que exibe a inesgotabilidade da discussão em torno da avaliação na EA. Outro parâmetro que se sobressaiu foi a participação dos alunos. Essa participação, segundo os depoimentos cedidos, refletia, de uma forma geral, o 38 engajamento dos alunos nas atividades de EA, conforme o observado nas falas a seguir: [...] A gente fez um livro ecológico e, né, mobilizou algumas turmas. E, assim, a gente percebe também quando um objetivo é alcançado porque essas turmas que participaram levam pra outras turmas que não participaram, e que gostariam também de participar (Professora Laura, MC, US 38) [...] Esse ano tem uma turma minha, que criou uma página no Facebook, e divulgou com a escola. Eles próprios que criaram e que ficam postando questões ambientais, discussões sobre meio ambiente, pra que os coleguinhas possam ver, possam opinar ou curtir, enfim. Então eu vejo que essa mobilização, pra mim, ela é um fator positivo na questão da avaliação, porque eu vejo que eles tão tendo uma mudança, eles tão tendo uma preocupação com a questão ambiental (Professora Rosa, AC, US 32) O que se percebe é que a participação relatada pelas professoras está voltada para um propósito fortemente popularizado nos discursos dos educadores ambientais, que remete à ação multiplicadora, no sentido de fazer com que determinada atividade alcance outros atores sociais, seja no âmbito escolar ou fora das dependências físicas da escola, conforme o evidenciado na internalização do Facebook como ferramenta de suporte à EA. Trabalhos como o de Hoffmann e Szymanski (s.d.) divergem do reconhecimento da participação como critério de avaliação – já que, para elas, a participação, do mesmo modo que as posturas, é uma condição que faz parte do fazer pedagógico e, portanto, não indica aprendizagem. Talvez o olhar das autoras esteja influenciado por uma compreensão de uma avaliação de base quantitativa, já que, segundo Zabala (1998 apud CORTÊS 2010, p. 78), é visível a “possibilidade de as pessoas menosprezarem a percepção da formação de atitudes enquanto um „conteúdo‟, pelo fato de não poderem ser quantificadas”. Nesse sentido, a reflexão das autoras não cabe nesta análise, já que a participação, sendo um critério avaliativo, requer uma abordagem avaliativa de cunho qualitativo. A partir dos significados presentes nos discursos dos professores, postos para os critérios empregados na avaliação da EA escolar, pode-se chegar a Categorias Amplas (CA) que, por sua vez, constituíram essa primeira Categoria Geral (CG), conforme a síntese no quadro a seguir: 39 Quadro 4 – Análise nomotética para a Categoria Geral 2. CG.2. MUDANÇAS DE POSTURAS E PARTICIPAÇÃO COMO CRITÉRIOS AVALIATIVOS NA EA Categoria Ampla Professor/a CA.5. Mudanças de posturas como critério são percebidas no dia-a-dia escolar. C.A.6. Mudanças de posturas como critério são percebidas a partir de relatos trazidos pelos alunos e pelos pais. C.A.7. A participação como critério avaliativo envolve produções dos alunos e sua socialização na escola. CA.8. A participação como critério avaliativo abrange a mobilização dos alunos em pesquisas e socialização de notícias ambientais, com efeito multiplicador. Ana x x Isabel x x Laura x x João x x Luiz x x Rosa x x Fonte: Autor (2014) De um modo geral, tanto a mudança de postura como a participação nas atividades são critérios qualitativos que podem, de certa forma, ser refletidos e melhor estruturados, no sentido de se obter a clareza com relação a que posturas se estão buscando e que participação é esperada por parte dos alunos. Outro elemento importante, que não foi evidenciado nas falas, diz respeito ao compartilhamento do conhecimento dos critériosadotados, pois, segundo Depresbiteris (2002, p. 83), os critérios quando não explícitos para todos conduzem a uma avaliação injusta, já que “uma pessoa que não sabe como será avaliada não sabe o que se espera dela”. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) sobre Meio Ambiente e Saúde apontam critérios para avaliação das práticas transversalizadas pela temática ambiental (BRASIL, 1997, p. 48-49). São estes os critérios propostos: Observar as características do meio ambiente e identificar a existência de ciclos e fluxos na natureza; Identificar as intervenções com as quais a sociedade local vem realizando transformações no ambiente, na paisagem, nos espaços em que habita ou cultiva; 40 Contribuir para a conservação e a manutenção do ambiente mais imediato em que vive; Identificar as substâncias de que são feitos os objetos ou materiais utilizados pelos alunos, bem como alguns dos processos de transformação por que passaram; Participar, pessoal e coletivamente, de atividades que envolvam tomadas de posição diante de situações relacionadas ao meio ambiente; Perceber a relação entre a qualidade de vida e um ambiente saudável; Valorizar o uso adequado dos recursos disponíveis. A forma como os critérios foram escritos e são apresentados os tornam mais próximos de competências e capacidades a serem formadas do que propriamente de parâmetros avaliativos. Ademais, nota-se que a forma como essas orientações são majoritariamente apresentadas tende a pouco estimular a capacidade de interpretação e reelaboração pelos professores, dentro das especificidades do seu contexto de atuação. Nesse sentido, defende-se a apresentação de orientações que possam estimular aos professores a refletirem acerca do papel da EA e da função e do desenvolvimento da avaliação nas atividades realizadas, sem que a avaliação da EA não seja entendida como um roteiro padronizado a ser seguido. Para tanto, além dos critérios a serem pensados, é necessário buscar os instrumentos que possam, de fato, favorecer uma leitura fidedigna dos resultados alcançados. 5.3 A OBSERVAÇÃO COMO TÉCNICA EMPREGADA NA PRÁTICA AVALIATIVA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL Dentre a diversidade de instrumentos e métodos avaliativos existentes tanto para o campo da avaliação educacional, de um modo geral (SANT‟ANNA, 2010) como para a prática da avaliação na EA (DEPRESBITERIS, 2001, 2002), um procedimento utilizado é a observação. De acordo com Sant‟Anna (2010, p. 99) a observação possui uma dupla qualificação, sendo processo ao passo em que se constitui “no ato de apreender coisas e acontecimentos, comportamentos 41 e atributos pessoais, e concretas interrelações”, e sendo técnica, por ser um “modo organizado de ação, que se desenvolve para atingir fins específicos”. A adoção do método observacional foi expressa nos seguintes registros abaixo: [...] Através de questionários, dessas devolutivas das explicações deles, das observações, da percepção, é que eu vou avaliando até que ponto, eles estão atingindo o entorno (Professora Ana, BC, US 32) É quando o aluno chega inconscientemente e inocentemente, ele chega e relata [...] Observações que eles trazem, relatos de casa, de vivência própria. [...] Nas atuações em sala de aula, quando é feita alguma atividade, eles relatam isso também, sabe? Eles botam pra fora o que eles sentem, o que eles tão aprendendo(Professor João, AC, US 24, 26 e 30) Então eu vejo que essa mobilização, pra mim, ela é um fator positivo na questão da avaliação, porque eu vejo que eles tão tendo uma mudança, eles tão tendo uma preocupação com a questão ambiental (Professora Rosa, AC, US 32) Os relatos expostos pelos professores apontam para uma observação livre, visto que, no decorrer da entrevista, não foi feita numa menção com relação a algum instrumento que subsidiasse essa avaliação observacional. Segundo Sant‟Anna (2010, p. 100-101), uma observação livre ou não-estruturada permite “perceber acontecimentos significativos, porém não previstos pelo avaliador ao ponto de ser estruturada com instrumentos”; diferente do que se observa na observação estruturada ou sistemática, que é realizada com “propósitos definidos e em condições controladas, havendo uma coleta de dados intencional”. Nesse aspecto, quando se fala em uma observação feita em situações controladas, trata-se de um entendimento da avaliação como regulação (JORBA; SANMARTÍ, 2003), em que uma observação permite a obtenção de informações capazes de nortear a criação de estratégias para superar limitações identificadas no processo. Um elemento importante no uso do método observacional é a questão do registro, definido por Sant‟Anna (2010) como uma técnica/instrumento de observação. Em algumas das entrevistas, alguns depoimentos emergiram, evidenciando a pouca prática do registro feito pelos professores, conforme o evidenciado nos depoimentos abaixo: [...] A gente faz. Agora assim, eu percebo que, assim, há uma necessidade da gente fazer mais. [...] Eu tava até conversando 42 com Isabel pra nos próximos a gente passar a registrar mais, porque a gente tem mais o hábito de registrar o que a gente faz junto com eles. Mas assim, o que eles especificamente fazem, existe; mas assim, eu acredito que ainda é pouco. Porque o que a gente registrava assim, produção de texto, né, quando a gente vai fazer, quando a gente faz aula, bota os temas na sala de aula (Professora Laura, MC, US 66). [...] Foi que alguns registros, alguns fatos que ocorriam no dia-a- dia na sala de aula, não tinha registro, e aí a professora Carmen falando da importância do registro. E aí, como professor, numa atividade corrida, de desvalorização do salário, aí você ocupa, praticamente, os três turnos – manhã, tarde e noite, e aí não sobra tempo, de certa forma, pra você se dedicar à pesquisa. Então, não havia registro, a não ser, alguns registros fotográficos. [...] Porque a gente cobra do aluno uma participação dele [...]; no entanto, nós como, professores, acaba, de certa forma, deixando de lado, sem fazer um registro. E aí eu acho que foi nessa situação que o Capivara contribuiu, que o próprio professor registrasse a sua prática. Acho que foi essa a contribuição, também, do Capivara pra minha vida profissional (Professor Luiz, AC, US 6 e 22). Em ambas as falas, os professores expõem práticas de registros feitos pelos alunos, no entanto reconhecendo uma necessidade de incorporá-los como parte do seu trabalho pedagógico. Na fala do professor Luiz, ele aponta dificuldades inerentes a sua rotina de trabalho, porém ressaltando a contribuição do Programa Capivara no estímulo à prática do registro das atividades que desenvolve. Por outro lado, em outras entrevistas percebe-se a consideração de algumas limitações no uso do método da observação, segundo as seguintes falas: [...] Pra saber até que ponto ele só, digamos, vivenciou aquele momento comigo e, tipo assim, tipo, se despertou aquilo, digamos, assim, no ambiente dele, aquela prática fosse utilizada, entende? Aí até que ponto aquilo vai ficar, aí não tenho mensurar (Professora Ana, BC, US 58). [...] Mas eu acho que o foco é a questão de postura de cada um, que a gente vê na escola, né? A gente não tem a dimensão do todo porque, depois da escola, ele vai pra rua, vai pra casa, a gente não sabe como é que tá... (Professora Rosa, AC, US 32) Um primeiro elemento observado, presente na fala da professora, é uma representação de avaliação inspirada numa concepção de avaliação como medida (CHUEIRI, 2008) e que, de certa não, se aplicaria à EA (essa observação 43 será retomada
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