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UNIVERSIDADE POTIGUAR – UnP PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA – NEaD Direito Trabalhista e Legislação Social Livro-texto EaD Natal/RN 2011 B436d Bellan, Rosana. Direito trabalhista e legislação social / Rosana Bellan. – Natal: Edunp, 2011. 300p. : il. ; 20 cm Ebook – Livro eletrônico disponível on-line. ISBN 978-85-61140-99-1 1. Direito trabalhista. I. Título.. RN/UnP/SIB CDU 349.2 DIRIGENTES DA UNIVERSIDADE POTIGUAR – UnP Reitoria Sâmela Soraya Gomes de Oliveira Pró-Reitoria de Graduação e Ação Comunitária Sandra Amaral de Araújo Pró-Reitoria de Pesquisa, Extensão e Pós-Graduação Aarão Lyra NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA DA UNIVERSIDADE POTIGUAR – UnP Coordenação Geral Barney Silveira Arruda Coordenação Acadêmica Luciana Lopes Xavier Coordenação Pedagógica Edilene Cândido da Silva Design Instrucional Priscilla Carla Silveira Menezes Coordenação de Produção de Recursos Didáticos Michelle Cristine Mazzetto Betti Revisão de Linguagem e Estrutura em EaD Priscilla Carla Silveira Menezes Thalyta Mabel Nobre Barbosa Úrsula Andréa de Araújo Silva Gravação e Edição de Vídeos Daniel Rizzi Coordenação de Logística Helionara Lucena Nunes Supervisão de Logística (Mossoró) Fábio Pereira da Silva Apoio Acadêmico Flávia Helena Miranda de Araújo Thalyta Mabel Nobre Barbosa Úrsula Andréa de Araújo Silva Assistente Administrativo Eliane Ferreira de Santana Gibson Marcelo Galvão de Sousa Miriam Flávia Medeiros de Araújo Ricardo Luiz Quirino da Silva Rosana Aparecida Bellan Direito Trabalhista e Legislação Social 1a Edição Natal/RN 2011 EQUIPE DE PRODUÇÃO DE RECURSOS DIDÁTICOS Organização Luciana Lopes Xavier Michelle Cristine Mazzetto Betti Coordenação de Produção de Recursos Didáticos Michelle Cristine Mazzetto Betti Revisão de Linguagem e Estrutura em EaD Thalyta Mabel Nobre Barbosa Ilustração do Mascote Lucio Masaaki Matsuno EQUIPE DE PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO Delinea - Tecnologia Educacional Coordenação Pedagógica Margarete Lazzaris Kleis Coordenação de Editoração Charlie Anderson Olsen Larissa Kleis Pereira Coordenação de Revisão Gramatical e Normativa Simone Regina Dias Eduard Marquardt Revisão Gramatical e Normativa Sandra Spricigo Coordenação de Diagramação Alexandre Alves de Freitas Noronha Diagramação Regina C. Cortellini Ilustrações Alexandre Beck ROSANA ApARecidA BeLLAN Antes de iniciarmos a disciplina de Direito Trabalhista e Legislação Social, gostaria de me apresentar. Meu nome é Rosana, e sou graduada em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (2004). Atuei no exercício da advocacia em 2005 e desde 2006 atuo no Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, onde fui nomeada para o cargo efetivo de Auditora Fiscal de Controle Externo. Em 2007, concluí o curso de especialização em Direito Processual pela Universidade do Amazonas. Sou apaixonada pelo Direito e por isso aceitei o desafio de escrever este livro-texto e apresentar a você as premissas e a aplicabilidade dos temas contemplados nesta importante disciplina. CO N H EC EN D O O A U TO R diReitO tRABALhiStA e LegiSLAçãO SOciAL A disciplina de Direito do Trabalho tem uma importante função na sociedade, pois possui como objetivo estabelecer normas para regular a relação entre empregador e empregado. Você já se deu conta de que o ser humano passa aproximadamente um terço de sua vida trabalhando? Por isso, é de fundamental importância que existam regras claras e que garantam um mínimo de dignidade ao indivíduo nas suas relações de trabalho. A fim de contrapor a superioridade jurídica decorrente do contrato de trabalho, o Direito Trabalhista procura conferir ao empregado uma superioridade jurídico-legalista. De fato, a grande maioria das normas trabalhistas é criada para proteger o empregado dos abusos que possam advir do poder capitalista do empregador. Nesse intuito, a Constituição Federal instituiu uma série de garantias e direitos mínimos, que devem ser respeitados pelo legislador ordinário, pelos aplicadores e principalmente pelos empregadores. Saiba, então, que nesta disciplina vamos tratar de importantes conceitos e aplicações do Direito do Trabalho. Vamos aos estudos! Desejo que faça ótimo proveito para sua formação ao longo da trajetória de nossa disciplina! CO N H EC EN D O A D IS CI PL IN A SU M Á RI OCapítulo 1 - Introdução ao direito do trabalho ......................................... 131.1 Contextualizando ........................................................................................................... 131.2 Conhecendo a teoria ..................................................................................................... 14 1.2.1 Origem e evolução do direito do trabalho ................................................. 14 1.2.2 Definições de direito do trabalho .................................................................. 22 1.2.3 Natureza jurídica .................................................................................................. 24 1.2.4 Fontes do direito do trabalho .......................................................................... 24 1.2.5 Interpretação e aplicação das normas trabalhistas ................................ 28 1.2.6 Princípios do direito do trabalho .................................................................... 35 1.3 Aplicando a teoria na prática ..................................................................................... 42 1.4 Para saber mais ............................................................................................................... 43 1.5 Relembrando ................................................................................................................... 44 1.6 Testando os seus conhecimentos ............................................................................. 45 Onde encontrar ...................................................................................................................... 47 Capítulo 2 - Empregado e empregador ..................................................... 49 2.1 Contextualizando ........................................................................................................... 49 2.2.1 Empregado ............................................................................................................. 50 2.2.2 Espécies de trabalhadores ................................................................................ 58 2.2.3 Empregador ........................................................................................................... 65 2.2.4 Poder de direção do empregador .................................................................. 68 2.2.5 Relações de trabalho não empregatícias .................................................... 69 2.2 Conhecendo a teoria ..................................................................................................... 50 2.3 Aplicando a teoria na prática ..................................................................................... 75 2.4 Para saber mais ............................................................................................................... 76 2.5 Relembrando ................................................................................................................... 77 2.6 Testando os seus conhecimentos ............................................................................. 77 Onde encontrar ...................................................................................................................... 79 Capítulo 3 - Contrato individual de trabalho, alteração,interrupção e suspensão do contrato ........................................................ 81 3.1 Contextualizando ........................................................................................................... 81 3.2 Conhecendo a teoria ..................................................................................................... 82 3.2.1 Contrato individual de trabalho ..................................................................... 82 3.2.2 Elementos do contrato individual de trabalho ......................................... 85 3.2.3 Características do contrato de trabalho ...................................................... 89 3.2.4 Forma do contrato de trabalho ....................................................................... 91 3.2.5 Duração do contrato de trabalho................................................................... 94 3.2.6 Alteração do contrato de trabalho ..............................................................105 3.2.7 Suspensão e interrupção do contrato de trabalho ................................108 3.3 Aplicando a teoria na prática ...................................................................................110 3.4 Para saber mais .............................................................................................................112 3.5 Relembrando .................................................................................................................112 3.6 Testando os seus conhecimentos ...........................................................................114 Onde encontrar ....................................................................................................................115 Capítulo 4 - Jornada de trabalho e remuneração .......................................................117 4.1 Contextualizando ..................................................................................................................................117 4.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................118 4.2.1 Jornada de trabalho ...................................................................................................................118 4.2.2 Intervalos para descanso..........................................................................................................136 4.2.3 Repouso semanal remunerado ..............................................................................................137 4.2.4 Férias ................................................................................................................................................140 4.2.5 Remuneração ...............................................................................................................................145 4.2.6 Equiparação salarial ...................................................................................................................148 4.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................150 4.4 Para saber mais ......................................................................................................................................151 4.5 Relembrando ..........................................................................................................................................152 4.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................154 Onde encontrar .............................................................................................................................................155 Capítulo 5 - Cessação do contrato de trabalho ...........................................................157 5.1 Contextualizando ..................................................................................................................................157 5.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................158 5.2.1 Cessação do contrato de trabalho ........................................................................................158 5.2.2 Aviso-prévio ..................................................................................................................................182 5.2.3 Indenização ..................................................................................................................................188 5.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................190 5.4 Para saber mais ......................................................................................................................................191 5.5 Relembrando ..........................................................................................................................................191 5.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................193 Onde encontrar .............................................................................................................................................194 Capítulo 6 - Estabilidade, FGTS, acidentes de trabalho, aposentadoria e retorno ao serviço .......................................................................................................197 6.1 Contextualizando ..................................................................................................................................197 6.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................198 6.2.1 Estabilidade ...................................................................................................................................198 6.2.2 FGTS .................................................................................................................................................207 6.2.3 Acidentes de trabalho ...............................................................................................................212 6.2.4 Aposentadoria..............................................................................................................................219 6.2.5 Retorno ao serviço ......................................................................................................................223 6.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................224 6.4 Para saber mais ......................................................................................................................................226 6.5 Relembrando ..........................................................................................................................................226 6.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................227 Onde encontrar .............................................................................................................................................228 Capítulo 7 - Organização sindical, convenções e acordos coletivos e justiça do trabalho ......................................................................................................231 7.1 Contextualizando ..................................................................................................................................231 7.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................232 7.2.1 Organização sindical ..................................................................................................................2327.2.2 Convenções e acordos coletivos ...........................................................................................249 7.2.3 Justiça do Trabalho .....................................................................................................................251 7.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................258 7.4 Para saber mais ......................................................................................................................................259 7.5 Relembrando ..........................................................................................................................................259 7.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................261 Onde encontrar .............................................................................................................................................262 Capítulo 8 - Tributação de impostos federais, estaduais e municipais .....................263 8.1 Contextualizando ..................................................................................................................................263 8.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................264 8.2.1 Tributos ..........................................................................................................................................264 8.2.2 Impostos federais .......................................................................................................................276 8.2.3 Impostos estaduais ...................................................................................................................285 8.2.4. Impostos municipais .................................................................................................................288 8.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................291 8.4 Para saber mais ......................................................................................................................................292 8.5 Relembrando ..........................................................................................................................................292 8.6 Testando os seus conhecimentos ....................................................................................................293 Onde encontrar .............................................................................................................................................294 Referências ....................................................................................................................297 Capítulo 1 13 Direito Trabalhista e Legislação Social Introdução ao dIreIto do trabalho CAPÍTULO 1 1.1 contextualizando Neste primeiro capítulo destinado à introdução do direito trabalhista, você irá descobrir quando e como teve origem o direito do trabalho. Faremos uma abordagem histórica das formas de trabalho existentes desde o nascimento do homem na sociedade. Inicialmente, você verificará que o direito laboral começou a despontar por pressão dos próprios empregados, que se organizaram e começaram a pleitear condições mais dignas de trabalho. Na sequência, examinaremos o conceito do direito do trabalho e nessa análise é importante que você identifique o objeto de estudo da matéria. Dando continuidade, abordaremos as fontes do direito trabalhista. Examinar a fonte de um direito significa investigar a sua origem, ou seja, quais os fatos sociais ou jurídicos que fazem nascer o direito. Trataremos também dos princípios aplicáveis à nossa disciplina. Você compreenderá que todas as matérias jurídicas estão baseadas em princípios, que podem ser conceituados como proposições genéricas que orientam o ordenamento jurídico. São meios de orientação do intérprete quando da aplicação das leis para solução dos conflitos sociais. Outras matérias relevantes abordadas neste capítulo dizem respeito à natureza jurídica e aos métodos de interpretação e aplicação desta disciplina. Com base nisto, ao final do capítulo, você estará apto a: Capítulo 1 14 Direito Trabalhista e Legislação Social • identificar a origem e a evolução histórica do direito do trabalho; • conceituar os princípios relativos ao direito trabalhista; • compreender os métodos de interpretação e aplicação das normas trabalhistas. 1.2 conhecendo a teoria 1.2.1 Origem e evolução do direito do trabalho Podemos afirmar que toda energia empregada pelo homem com a finalidade produtiva constitui trabalho. Como o homem sempre teve que trabalhar para obter seus alimentos, podemos também afirmar que o trabalho é tão antigo quanto o homem. No decorrer da história, entretanto, o trabalho assumiu diversas formas, que serão explanadas a seguir. A palavra trabalho vem do latim tripalium, que era um instrumento de tortura de três paus ou uma canga que pesava sobre os animais (MARTINS, 2010, p. 4). CURIOSIDADE No momento que o homem se fixa a terra e passa a utilizar o sistema de trocas, ele deixa de trabalhar sozinho e utiliza a mão de obra de terceiros em seu benefício. Nessa oportunidade, surge a primeira importante forma de trabalho – a escravidão. trabalho escravo Na Antiguidade, o escravo sequer era considerado pessoa, pois representava uma coisa, uma propriedade do seu senhorio. Não tinha qualquer direito, apenas a obrigação de trabalhar. Capítulo 1 15 Direito Trabalhista e Legislação Social Apesar de parecer absurdo aos nossos olhos, o serviço escravo era plenamente legítimo até meados do século 19, quando passou a ser condenado e proibido. No Brasil, somente foi abolido em 1888, com a chamada Lei Áurea. Figura 1 – Escravidão no Brasil Fonte: Shizhao <www.everystockphoto.com> Ainda que outras formas semelhantes à escravidão persistam, de acordo com as leis atuais, a escravidão não mais existe no mundo contemporâneo, sendo que o último país a aboli-la foi a Mauritânia em 1981. No Brasil, submeter alguém a condição análoga de escravo é prática considerada crime pelo artigo 149 do Código Penal Brasileiro. SAIBA QUE Servidão Como um segundo momento, temos o sistema da servidão, que predominou na época feudal. O servo ficava preso a terra e entregava parte da produção ao senhor feudal (proprietário das terras) em troca de proteção militar. Capítulo 1 16 Direito Trabalhista e Legislação Social Diferentemente do escravo, ao servo eram reconhecidos alguns direitos, como o de contrair núpcias e constituir família, sendo considerado pessoa, e não uma propriedade do seu senhor. corporações de ofício Um terceiro importante marco da história do trabalho foi o surgimento das corporações de ofício. O aumento da população e o extremo poder dos nobres sobre os servos levaram muitas pessoas dos campos para as cidades, gerando uma aglomeração de trabalhadores que se uniam em defesa de seus direitos, formando as chamadas corporações de ofício. Saiba que as organizações nada mais eram do que grupos de produtores especializados em determinado ofício, que se organizavam de forma rígida, de modo a controlar o mercado e a concorrência, bem como garantir os privilégios dos mestres. Vamos ver como funcionavam as corporações? Existiam três categorias de membros: • os mestres; • os companheiros; • os aprendizes. Os mestres eram os proprietários das oficinas. É possível compará-los aos empregadores de hoje. Os aprendizes eram menores,com mínimo de 12 anos, que se submetiam às ordens do mestre com o objetivo de aprender algum ofício. Além de não receberem qualquer contraprestação, seus pais pagavam uma taxa ao mestre, a fim de que este os ensinasse um ofício. Quando o aprendiz adquiria conhecimentos considerados suficientes, poderia passar à categoria de companheiro. Por fim, os companheiros eram considerados trabalhadores qualificados e recebiam salário pelos serviços prestados aos mestres. Teoricamente, o companheiro poderia se tornar um mestre se fosse aprovado em uma prova chamada “obra mestra”. A prova, além de difícil, era muito cara, o que tornava quase impossível um companheiro passar à categoria de mestre. Capítulo 1 17 Direito Trabalhista e Legislação Social Aquele que já tinha atingido a condição de companheiro e se casasse com filha ou viúva do mestre atingia esta condição, independentemente da realização da prova. Também poderiam atingir o status de mestre, independentemente da realização da prova, os filhos do mestre (MARTINS, 2010). Em meados do século 18, a ideologia de liberdade individual defendida pelos teóricos da Revolução Francesa tornou-se incompatível com as existentes corporações de ofício, ou com qualquer outra forma de trabalho que não respeitasse a livre vontade individual do homem. empregado Apesar da existência das formas de trabalho já mencionadas, o que de fato marcou o surgimento dos primeiros direitos trabalhistas foi a Revolução Industrial, ocorrida no final do século 18, momento em que aparece o emprego remunerado. Sabemos que, nessa época, a invenção e uso da máquina a vapor tirou inúmeros postos de trabalho, resultando em uma grande massa de desempregados. Porém, de outro lado, surgiu a necessidade de mão de obra qualificada para operar as referidas máquinas. Dessa forma, os trabalhadores com tal habilidade passaram a ser contratados, dando ensejo ao trabalho do empregado assalariado. revolução Francesa: ocorrida na França ao final do século 18, foi um movimento social e político que resultou na queda da monarquia e no estabelecimento da república naquele país. O lema da Revolução Francesa era “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, deixando claro o objetivo maior do movimento: assegurar direitos iguais a todos (MOTA, 2007). revolução Industrial: momento histórico que teve início na Inglaterra, em meados do século 18, e aos poucos espalhou-se pelo mundo. Uma das características mais importantes da revolução industrial foi a substituição da força humana no trabalho pelas máquinas, possibilitada pela invenção do motor a vapor (IGLÉSIAS, 1982). SAIBA QUE Capítulo 1 18 Direito Trabalhista e Legislação Social É importante entender que a ideologia do liberalismo proclamada por ocasião da Revolução Francesa era contra qualquer intervenção do Estado nas relações particulares. Assim, como não havia qualquer tipo de intervenção do Estado na relação entre trabalhador e patrão, muitos abusos acabavam existindo. Geralmente, o trabalhador se submetia a duríssimas jornadas de trabalho, sem qualquer tipo de prevenção ou auxílio no caso de acidentes. Esta situação fez com que os empregados se unissem para reivindicar melhores condições de trabalho, fazendo surgir as primeiras leis com o objetivo de proteger o empregado contra os abusos do patrão. Nas palavras do professor Sérgio Pinto Martins, nesse período começa a haver a necessidade de intervenção estatal nas relações do trabalho, dados os abusos que vinham sendo cometidos, de modo geral, pelos empregadores, a ponto de serem exigidos serviços em jornadas excessivas para menores e mulheres, de mais de 16 horas por dia ou até o pôr-do-sol, pagando metade ou menos dos salários que eram pagos aos homens. No princípio, verifica-se que o patrão era o proprietário da máquina, detendo os meios de produção, tendo, assim, o poder de direção em relação ao trabalhador. Isso já mostrava a desigualdade a que estava submetido o trabalhador, pois este não possuía nada. Havia, portanto, necessidade de maior proteção ao trabalhador, que se inseria desigualmente nessa relação (MARTINS, 2010, p. 6). A partir daí, gradualmente vão sendo reconhecidos alguns direitos aos trabalhadores por meio de diversas leis. Mas foi no século 20 que eles passaram a ser reconhecidos constitucionalmente. Figura 2 – Empregada em fábrica de aviões nos EUA na década de 1940 Fonte: <www.everystockphoto.com> Capítulo 1 19 Direito Trabalhista e Legislação Social A primeira Constituição que reconheceu direitos trabalhistas em seu texto foi a do México, em 1917. Posteriormente, em 1919, a Constituição de Weimar (na Alemanha) também versou sobre o assunto. Em 1919, o Tratado de Versalhes previu a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT), com o objetivo de criar normas de proteção para as relações entre empregados e empregadores no âmbito internacional. evolução do direito do trabalho no Brasil No Brasil, a Constituição de 1824, no seu art. 179, XXV, aboliu as corporações de ofício, privilegiando a liberdade de exercício de ofícios e profissões. Em 1888, por meio da Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel, foi abolida a escravatura. A primeira Constituição brasileira a tratar explicitamente de direitos dos trabalhadores foi a de 1934. O direito ao trabalho foi colocado na Constituição como um direito social fundamental do homem, enumerado no caput do art. 6º. Significativos direitos foram conferidos aos obreiros por esta Constituição, como a garantia à liberdade sindical (art. 120), o direito ao salário mínimo, à jornada de oito horas, repouso semanal remunerado, férias remuneradas e isonomia salarial entre homens e mulheres (art. 121, parágrafo 1º). DEFINIÇÃO A Constituição Federal é a lei superior do ordenamento jurídico brasileiro, de maneira que todas as demais leis existentes no país devem respeitar às normas nela inscritas. Leis infraconstitucionais são aquelas dispostas abaixo da Constituição e que devem obrigatoriamente respeitar às normas nela contidas. Este tipo de lei é elaborado por meio de um processo legislativo bem menos rigoroso do que o exigido para a elaboração da Constituição. Capítulo 1 20 Direito Trabalhista e Legislação Social Muitas leis infraconstitucionais trataram dos mais diversos assuntos relacionados ao direito do trabalho. Por este motivo, em 1943, foi editado o Decreto-Lei 5.452, que aprovou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Observe, no entanto, que a CLT não criou novas leis, direitos e deveres em relação ao trabalho, mas somente teve como função reunir, ou consolidar, em um único documento, as leis já existentes. A atual Constituição Federal, proclamada em 5 de outubro de 1988, deu muita importância aos direitos trabalhistas, tratando-os de forma bastante detalhada nos arts. 7º a 11, dentro do título reservado aos direitos e garantias fundamentais. Conforme já mencionamos, a Constituição Federal é a Lei maior de nossa Nação. O seu atual art. 7º estabelece os direitos mínimos conferidos aos trabalhadores. Sendo assim, caso uma lei infraconstitucional venha a tratar das matérias ali previstas, deverá respeitar esses preceitos mínimos. Isto quer dizer que se a lei tiver por objetivo conferir mais direitos, ela poderá assim fazer. Como você deve imaginar, o que evidentemente não poderá é restringir os direitos estabelecidos no texto constitucional. Apesar de não ser objeto de análise neste momento, consideramos oportuno transcrever o art. 7º na integralidade, a fim de permitir que você tenha uma visão geral do que será abordado ao longo dos capítulos seguintes. Confira. Art. 7º São direitosdos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; Figura 3 – Carteira de trabalho brasileira Fonte: <http://commons.wikimedia.org/> Capítulo 1 21 Direito Trabalhista e Legislação Social II – seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário; III – fundo de garantia do tempo de serviço; IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim; V – piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho; VI – irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo; VII – garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; VIII – décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria; IX – remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; X – proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; XI – participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei; XII – salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei; XIII – duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; XIV – jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva; XV – repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; XVI – remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal; XVII – gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal; XVIII – licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias; XIX – licença-paternidade, nos termos fixados em lei; XX – proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei; XXI – aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei; XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; XXIII – adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei; XXIV – aposentadoria; Capítulo 1 22 Direito Trabalhista e Legislação Social XXV – assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; XXVI – reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; XXVII – proteção em face da automação, na forma da lei; XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa; XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho; XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; XXXI – proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; XXXII – proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos; XXXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos; XXXIV – igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso. Parágrafo único. São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI e XXIV, bem como a sua integração à previdência socialBRASIL, 1988). 1.2.2 definições de direito do trabalho Conforme afirmamos no início deste capítulo, toda energia empregada pelo homem, seja física ou intelectual, com finalidade produtiva é considerada trabalho. Mas fique atento: nem toda energia produtiva utilizada pelo homem é objeto do direito do trabalho. Este último, desde seu nascimento no auge da Revolução Industrial, veio para disciplinar a relação de trabalho subordinado – aquela existente entre empregado e empregador. É fundamental compreender que o empregador, como detentor dos meios de produção, encontra-se em uma posição de superioridade econômica em relação ao empregado. Sendo assim, você perceberá, no decorrer do estudo desta disciplina, que, com a finalidade de compensar a desproporção Capítulo 1 23 Direito Trabalhista e Legislação Social econômica existente entre empregador e empregado, o direito do trabalho procura atribuir a este último uma relativa superioridade jurídica. Ou seja, você poderá observar que as normas trabalhistas preocupam-se sempre com a proteção do trabalhador em prol do patrão. Desse modo, podemos conceituar o direito do trabalho como o ramo do Direito que disciplina as relações de trabalho subordinado, conferindo ao trabalhador medidas de proteção, a fim de assegurar-lhe melhores condições de trabalho e sociais em relação ao empregador. CONCEITO Sérgio Pinto Martins (2010, p. 16) nos apresenta o seguinte conceito: “direito do trabalho é o conjunto de princípios, regras e instituições atinentes à relação de trabalho subordinado e situações análogas, visando assegurar melhor condições de trabalho e sociais ao trabalhador, de acordo com as medidas de proteção que lhe são destinadas”. A fim de esclarecer o conceito, afirma o autor: O Direito do Trabalho vai estudar uma espécie de trabalhador: o empregado, que é o trabalhador subordinado ao empregador, que não tem autonomia em seu mister. [...] Com o emprego da expressão situações análogas, pretendemos tratar das situações que têm semelhança com o trabalho subordinado, mas que necessariamente não são iguais a ele. O trabalhador temporário e o empregado doméstico não deixam de ser subordinados. O trabalhador avulso não é subordinado, mas será estudado pelo Direito do Trabalho. [...] O Direito do Trabalho tem por fundamento melhorar as condições de trabalho dos obreiros e também suas situais sociais, assegurando que o trabalhador possa prestar seus serviços num ambiente salubre, podendo, por meio de seu salário, ter uma vida digna para que possa desempenhar seu papel na sociedade (MARTINS, 2010, p. 16-17). Capítulo 1 24 Direito Trabalhista e Legislação Social 1.2.3 Natureza jurídica Para descobrirmos a natureza jurídica de um ramo do Direito precisamos entender suas características e enquadrá-lo no universo do próprio Direito. Para você compreender melhor do que estamos tratando, é preciso saber que todo o Direito é dividido em dois grandes grupos: direito público e direito privado. A função do direito público é regular os interesses das entidades estatais e da sociedade considerada em um conjunto. Já a função do direito privado é regular as relações que envolvem a pessoa considerada individualmente. O seu objetivo é garantir harmonia no convívio entre as pessoas. Como trabalhador e empregadornão são totalmente livres para estipular as cláusulas do contrato de trabalho, alguns estudiosos da matéria entendem que o direito trabalhista classifica-se como um ramo do direito público, já que a vontade das partes seria substituída pela vontade das normas estatais. Há, por outro lado, os que sustentam a tese de que o direito do trabalho enquadra-se no direito privado, pois apesar de existir um intervencionismo básico do Estado, que determina normas mínimas a serem respeitadas, há liberdade das partes em contratar. Assim, o direito do trabalho estabelece um regramento mínimo, nada impedindo que as partes convencionem melhores condições para ambas. Apesar da existência de posicionamentos divergentes, prevalece o entendimento de que o direito do trabalho possui natureza jurídica de direito privado. 1.2.4 Fontes do direito do trabalho Antes de prosseguirmos, vamos fazer um breve parêntese para explicar o que aqui queremos dizer com fonte. Capítulo 1 25 Direito Trabalhista e Legislação Social Como o próprio nome sugere, fonte é a expressão utilizada para designar a origem de alguma coisa. Portanto, estudar a fonte de um direito significa analisar de onde ele se origina, qual o seu ponto de partida. Em se tratando de direito do trabalho, suas fontes podem ser classificadas como materiais ou formais. Fontes materiais Você pode estar se perguntando: mas o que são as fontes materiais? São fatos ou movimentos sociais que antecedem as normas, sejam elas contratuais ou legais. São situações pré-jurídicas que dão origem às normas. Como exemplo de fonte material do direito do trabalho, podemos citar as greves realizadas pelos trabalhadores em busca de melhores condições de trabalho. Lembre-se que quando tratamos, no início do capítulo, sobre a evolução do direito do trabalho, verificamos que os abusos e as duríssimas jornadas a que eram submetidos os empregados no período da Revolução Industrial fizeram com que eles se unissem e pleiteassem condições mais dignas de trabalho, surgindo assim os primeiros direitos laborais. Perceba que tal situação nada mais é do que uma fonte material do direito do trabalho, pois se configurou em um acontecimento social que fez nascer normas prevendo melhores condições de trabalho para aquela época. Fontes formais E as fontes formais? Bem, estas são representadas pela própria norma. É a exteriorização do direito por meio de leis, costumes, convenções, acordos coletivos etc. As fontes formais, por sua vez, podem ser classificadas em fontes formais autônomas e fontes formais heterônomas. Capítulo 1 26 Direito Trabalhista e Legislação Social No Direito, a expressão lei pode ser utilizada em sentido amplo ou em sentido estrito. Em seu sentido amplo, o termo pode dizer respeito à Constituição, às leis complementares, leis ordinárias, medidas provisórias, leis delegadas, decretos legislativos ou resoluções emanadas do Legislativo. Em sentido estrito, lei é apenas a Lei Ordinária. Neste livro-texto, quando afirmamos que a lei é fonte formal do direito do trabalho, estamos nos referindo à lei em sentido amplo. SAIBA QUE Fontes formais autônomas São as produzidas diretamente pelos destinatários do direito, sem a interferência de agente externo. São formadas pela vontade dos próprios sujeitos da relação de emprego (empregado e empregador). Como exemplos, podemos citar os costumes, as convenções e os acordos coletivos de trabalho. Os costumes são práticas habituais e constantes que, por este motivo, são tidos por obrigatórios. A gratificação natalina, por exemplo, nasceu em razão de uma prática reiterada por parte dos empregadores. Todos os anos, era comum eles entregarem um valor como presente em razão do Natal. Com o passar do tempo, a gratificação natalina tornou-se compulsória e deu ensejo ao atual 13º salário. Você pode observar que este é um bom exemplo de um direito consagrado em lei, mas que teve origem a partir da prática de um costume do empregador. As convenções e os acordos coletivos são importantes fontes autônomas do direito do trabalho, pois nascem da participação dos sindicatos nas negociações entre empregados e empregadores. As convenções coletivas são ajustes realizados entre sindicato dos empregadores (ou sindicato patronal) e sindicato dos trabalhadores (ou Capítulo 1 27 Direito Trabalhista e Legislação Social sindicato profissional) sobre condições laborais de uma determinada categoria profissional. Já os acordos coletivos são ajustes firmados entre uma ou mais empresas e o sindicado dos trabalhadores, também com o objetivo de regular condições laborais daquela categoria profissional. Perceba que a diferença existente entre um acordo e uma convenção está no fato de que enquanto na convenção coletiva existe negociação entre dois ou mais sindicatos, no acordo a negociação ocorre entre empresa e sindicato. Uma vez firmados, os acordos e as convenções coletivas tornam-se obrigatórios pelo prazo máximo de dois anos (art. 614, parágrafo 3º, da CLT). Conforme você pôde constatar, as convenções e os acordos coletivos de trabalho são fontes formais autônomas, pois surgem da negociação entre os próprios envolvidos na relação trabalhista, sem a necessidade de intermediação de terceiros estranhos àquela relação jurídica. Fontes formais heterônomas São aquelas que necessitam de um terceiro, estranho à relação jurídica, para nascerem. São as formadas sem a participação direta dos destinatários do direito. Como fontes formais heterônomas, podemos citar a Constituição, as leis complementares e ordinárias, a medida provisória, a sentença normativa, os tratados e as convenções internacionais. Segundo afirmamos quando versamos sobre a evolução do direito do trabalho no Brasil, a Constituição Federal é a Lei superior de um ordenamento jurídico. Logo, todas as demais leis devem obediência a ela. Sendo assim, a mais importante fonte formal do direito do trabalho é a Constituição Federal. No âmbito infraconstitucional, existem várias leis que regulam as relações trabalhistas. A mais importante delas é a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Capítulo 1 28 Direito Trabalhista e Legislação Social As sentenças normativas são decisões dos Tribunais Superiores do Trabalho (TST) no julgamento de dissídios coletivos (que são conflitos envolvendo uma categoria de profissionais). Os tratados e convenções internacionais são pactos firmados pelo Brasil com outras Nações. Eles ingressam no ordenamento jurídico brasileiro como lei infraconstitucional. LEMBRETE As fontes formais heterônomas são assim chamadas porque necessitam da intermediação de terceiros para serem formadas. No caso da Constituição e das leis, temos a intervenção do Legislativo. No caso das sentenças normativas, temos a intervenção do Judiciário. 1.2.5 interpretação e aplicação das normas trabalhistas Podemos conceituar as normas como o conjunto de princípios e leis que regem uma matéria. Os princípios, como estudaremos a seguir, são proposições genéricas que servem para orientar a interpretação e aplicação do direito ao caso concreto. As leis, por sua vez são atos normativos abstratos, ou seja, são proposições genéricas e coercitivas (obrigatórias) aplicáveis a todos os sujeitos e situações, de forma indistinta. Tanto os princípios quanto as leis, para serem aplicados às situações concretas, necessitam de interpretação. Isto ocorre porque o direito não é um comando exato e não consegue abarcar todas as situações da vida em sociedade, que é permeada das mais complexas e infinitas relações. Figura 4 – Estátua da Justiça- Escultura Fonte: <http://photos.fencer.com> Capítulo 1 29 Direito Trabalhista e Legislação Social Sabemos que as relações sociais vivem em constante mutação, e se a função do direito é gerir estas relações, ele também deve modificar-se constantemente. Segundo Delgado (2010), como o direito refere-se permanentemente à vida concreta das pessoas, é necessário que haja um constante exercício do operador jurídico, por meio de três operações específicas e combinadas: • a interpretação; • a integração; • a aplicação jurídica. No entendimento do autor citado (2010, p. 205), “interpretação é o processo analítico de compreensão e determinação do sentido e extensão da norma jurídica”. Já integração é o processo utilizado para suprir eventuais lacunas normativas. Por fim, aplicação é o processo de incidência e adaptação das normas jurídicas às situações concretas. Versaremos inicialmente sobre a operação de interpretação, conforme você acompanha na próxima seção. interpretação das normas jurídicas trabalhistas Conforme já mencionamos, interpretar uma norma significa tentar compreender e determinar o seu sentido e extensão. Para auxiliar esse processo de compreensão, foram criados alguns métodos, aplicáveis não só ao direito do trabalho, mas a todos os ramos do Direito. Traremos aqui os mais importantes métodos de interpretação das normas trabalhistas. Para você, qual é o significado da palavra interpretar? Você já refletiu sobre o que implica o ato de interpretar? REFLEXÃO Capítulo 1 30 Direito Trabalhista e Legislação Social Se você pensou que interpretar é dar um sentido a alguma coisa, está correto. Toda vez que tiramos conclusões sobre o que alguém falou ou escreveu, estamos interpretando. Interpretar uma norma jurídica envolve um processo semelhante. A diferença é que alguns métodos foram criados pelos estudiosos do Direito a fim de organizar a forma de pensamento do intérprete. Vejamos alguns deles: • método gramatical ou literal: consiste em verificar o sentido literal das palavras colocadas no texto da norma; • método lógico ou racional: busca identificar o pensamento lógico e harmônico contido no texto normativo; • método teleológico ou finalístico: procura averiguar a finalidade buscada pelo legislador quando da elaboração da norma; • método sistemático: busca o sentido de uma determinada norma considerando-a como parte de um sistema. Em outras palavras, interpreta-se a norma levando-se em conta todo o sistema jurídico em que ela está inserida, sem considerá-la de forma isolada; • método histórico: como o direito decorre de um processo evolutivo ocorrido na sociedade, ao interpretar a norma deve-se levar em consideração a evolução histórica dos fatos que deram origem a ela; • método autêntico: é a interpretação feita pelo próprio legislador, portanto, é também chamada de legal ou legislativa; • método sociológico: ao aplicar a lei, deve-se considerar os fins sociais a que ela se dirige. Embora existam vários métodos interpretativos, uma mesma norma pode comportar diversos sentidos. Por este motivo, cabe ao aplicador utilizar aquele que considere mais apropriado ao caso concreto. Você precisa ficar atento ao fato de que o direito trabalhista, apesar de se submeter às regras gerais de interpretação do direito, apresenta características Capítulo 1 31 Direito Trabalhista e Legislação Social específicas, que lhe são próprias. Estas especificidades existem porque ele nasceu para proteger o sujeito mais fraco da relação jurídica. Assim, diante de mais de uma possibilidade de interpretação da norma, deve-se optar pela mais favorável ao empregado. O art. 620 da CLT demonstra esta tendência de interpretação do direito do trabalho quando afirma que as condições estabelecidas em convenção, se mais favoráveis ao empregado, prevalecerão sobre as estipuladas em acordo: “Art. 620. As condições estabelecidas em Convenção quando mais favoráveis, prevalecerão sobre as estipuladas em Acordo” (BRASIL, 1943). Sendo assim, quando duas normas estiverem tratando do mesmo assunto, aquela que estabelecer condições mais favoráveis ao empregado prevalecerá sobre a outra. Isto acontece independentemente da hierarquia existente entre elas. PRATICANDO Sabemos que a Constituição Federal dispõe em seu artigo 7º, inciso XVII, que as férias anuais devem ser pagas com pelo 1/3 a mais do salário normal. Se uma convenção coletiva vier a estabelecer que determinada categoria deve receber as férias com pelo menos ½ do salário normal, qual das normas prevalecerá? E então, conseguiu responder? Perceba que, conforme estudamos, mesmo sendo a Constituição a lei maior do nosso sistema jurídico, a norma prevista na convenção prevalecerá sobre a estabelecida na Constituição. Assim, os empregados daquela categoria terão direito a receber as férias anuais com no mínimo ½ a mais do salário. Isto ocorre porque o direito do trabalho tem por finalidade proteger o empregado, considerado a parte mais fraca em relação ao empregador. Perceba ainda que nesta situação utilizamos os métodos teleológico e sociológico de interpretação das normas, pois aplicamos a norma mais favorável em razão da finalidade social protetiva das normas trabalhistas. Capítulo 1 32 Direito Trabalhista e Legislação Social É importante ficar claro que além dos métodos elencados, a interpretação das normas jurídicas exige do estudioso ou aplicador nunca perder de mente os princípios gerais do direito. Dentre eles, destacam-se na órbita trabalhista os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho. integração da norma trabalhista Todos os dias ocorrem na sociedade os mais infinitos e complexos fatos. Em razão disso, é impossível ao direito preestabelecer regras para a solução de todos os conflitos que porventura venham surgir. Diante desta impossibilidade, temos as chamadas lacunas normativas, que nada mais são do que “falhas” na legislação. Em outras palavras, são espaços em branco, situações sem solução previamente definidas pelo legislador. Como os conflitos sociais precisam ser resolvidos, o direito criou métodos de integração da norma. Segundo Delgado (2010), integração comporta um conjunto de mecanismos voltados a assegurar o suprimento das lacunas apresentadas pelas fontes principais do sistema jurídico perante determinado caso concreto. Em outras palavras, são técnicas jurídicas com o objetivo de solucionar as falhas deixadas pela lei na solução das hipóteses concretas. O art. 8º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) autoriza o aplicador, na falta de disposição legal ou contratual, fazer uso da analogia, da equidade e dos princípios gerais. Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público (BRASIL, 1943, grifo nosso). Vamos então compreender um pouco melhor o que significam os termos citados na lei e destacados por nós. Capítulo 1 33 Direito Trabalhista e Legislação Social • Jurisprudência consiste na repetida aplicação de determinadas normas a um determinado caso concreto, por parte dos tribunais. São decisões anteriores que orientam decisões futuras. • analogia significa aplicar, para uma situação fática não prevista em lei, uma norma existente para regular outrasituação fática semelhante à primeira. Vale a pena nos determos em um exemplo. Com o avanço da tecnologia digital, a datilografia foi substituída pela digitação. O artigo 72 da CLT estabelece que nos serviços permanentes de mecanografia, incluída aí a datilografia, deve-se fazer um período de repouso de dez minutos a cada 90 minutos trabalhados. Apesar de a lei não incluir na redação do artigo o serviço do datilógrafo, o Tribunal Superior do Trabalho, utilizando a analogia, decidiu aplicar o artigo 72 também aos digitadores. Esse entendimento foi consagrado pelo TST por meio do enunciado de jurisprudência nº 346. tSt enunciado nº 346 - res. 56/1996, dJ 28.06.1996 - Mantida - res. 121/2003, dJ 19, 20 e 21.11.2003 digitador - Serviço de Mecanografia - analogia - Intervalos Intrajornada Os digitadores, por aplicação analógica do Art. 72 da CLT, equiparam- se aos trabalhadores nos serviços de mecanografia (datilografia, escrituração ou cálculo), razão pela qual têm direito a intervalos de descanso de dez (10) minutos a cada noventa (90) de trabalho consecutivo (TST, 1996). • equidade significa decidir de acordo com os critérios de justiça. A CLT prevê expressamente a utilização de equidade nos artigos 766 (trata dos dissídios coletivos) e 852-I, § 1º (que versa sobre o processo sumaríssimo). Vejamos: Art. 766 - Nos dissídios sobre estipulação de salários, serão estabelecidas condições que, assegurando justos salários aos trabalhadores, permitam também justa retribuição às empresas interessadas. [...] Art. 852-I. [...] § 1º O juízo adotará em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime, atendendo aos fins sociais da lei e as exigências do bem comum. Capítulo 1 34 Direito Trabalhista e Legislação Social Os princípios gerais de direito serão conceituados no próximo item, destinado ao exame dos princípios do direito do trabalho. Aplicação das normas trabalhistas Em regra, as leis (em seu sentido amplo) somente podem ser aplicadas quando vigentes. Uma lei é considerada vigente se tiver: • sido elaborada por órgão competente; • seguido fielmente os procedimentos legais de sua elaboração. Com exceção da lei delegada e da medida provisória, que são produzidas pelo presidente da República, as demais leis trabalhistas somente podem ser elaboradas pelo Poder Legislativo. Em suma, lei vigente é aquela que está apta a produzir seus efeitos. Com exceção das leis com vigência temporária, que são editadas para produzirem efeitos por determinado espaço de tempo, as demais leis vigem até que outra a revogue. Revogar significa tirar o efeito da lei, excluí-la do mundo jurídico. SAIBA QUE Para que você entenda melhor a vigência das normas legais trabalhistas, é preciso que compreenda que elas podem produzir efeitos quanto ao tempo e quanto ao espaço. Os efeitos das leis trabalhistas no tempo devem ser entendidos sob o ponto de vista do princípio da irretroatividade e do princípio da aplicação imediata: • em respeito ao princípio da irretroatividade, uma lei nova não pode ser aplicada aos contratos ou atos já finalizados. Esses contratos ou atos são considerados perfeitos sob o enfoque da lei vigente ao tempo em que foram realizados e por esta razão não devem ser modificados na ocasião de nova lei tratando do assunto; Capítulo 1 35 Direito Trabalhista e Legislação Social • de acordo com o princípio da aplicação imediata, uma nova lei deve ser aplicada aos atos e contratos em curso, imediatamente a partir do momento em que entra em vigor. Mas atenção, só se aplica a lei nova quando o ato ou contrato ainda não tiver sido finalizado. Conforme as leis trabalhistas vigentes no país, após um ano de trabalho, o empregado tem direito a 30 dias de férias. Se a partir desse período de um ano, e antes que o empregado goze integralmente do tempo de repouso, entrar em vigor uma nova lei alterando a duração das férias de 30 para 35 dias, ele terá direito a gozar de 35 dias e não mais somente 30 dias. Veja que isto ocorre porque o gozo das férias ainda está em curso (não tinha finalizado), quando da entrada em vigor da nova lei, a qual deve ser aplicada imediatamente. Quanto aos efeitos das leis trabalhistas no espaço, via de regra, em razão do princípio da territorialidade, aplicam-se as leis brasileiras a todos os que prestarem serviços no Brasil. Assim, tanto os estrangeiros quanto as empresas multinacionais devem se sujeitar as leis trabalhistas brasileiras quando executarem serviços no Brasil. 1.2.6 princípios do direito do trabalho Iniciamos agora um dos mais relevantes temas de estudo do Direito – os princípios. Fora da técnica jurídica, podemos conceituar princípios como valores, regras morais de conduta que orientam o comportamento das pessoas. Sob o enfoque jurídico, entretanto, os princípios podem ser considerados os alicerces de sustentação das normas legais, postulados valorativos que servem para guiar a aplicação do direito ao caso concreto. Fazendo uma metáfora, seriam os pilares de sustentação de um edifício. De acordo com Martins (2010), os princípios têm várias funções: • informadora; • normativa; • interpretativa. Capítulo 1 36 Direito Trabalhista e Legislação Social Com função informadora, os princípios servem para orientar o legislador, fundamentando as normas legais e dando sustentáculo para o ordenamento jurídico. Na sua função normativa, os princípios oferecem meios para integração das normas em caso de lacunas legais. Quando estudamos sobre integração do direito do trabalho, falamos que uma das formas de suprir as omissões da lei seria a utilização dos princípios gerais do direito. Lembre-se que diante das lacunas legais, o artigo 8º da CLT autoriza o uso da analogia, da equidade, da jurisprudência e ainda dos princípios gerais do direito. SAIBA QUE Por sua vez, a função interpretativa é de fundamental importância para o direito. Os princípios são verdadeiros assistentes do aplicador do direito, pois auxiliam na interpretação e na compreensão das normas legais. Logo, toda vez que tivermos dúvida na aplicação de uma lei, podemos nos valer deles. E o que são os princípios gerais do direito? Princípios gerais do direito são aqueles comuns a todos os ramos do Direito. Entre eles, podemos citar: • o princípio da dignidade da pessoa humana, trazido pela Constituição Federal como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito; • o princípio do valor social do trabalho, que nos informa que o trabalho deve cumprir uma função social; • o princípio do enriquecimento sem causa, pelo qual uma pessoa não poderá locupletar-se de outra, enriquecendo às suas custas; • os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, que definem que as nossas ações devem ser pautadas pelo bom senso, pela ponderação; Capítulo 1 37 Direito Trabalhista e Legislação Social • o princípio da boa-fé, segundo o qual as partes devem cumprir os tratos com lealdade recíproca. Vale ressaltar que os princípios aqui elencados não são os únicos comuns a todo o ordenamento jurídico, existindo também outros que podem ser aplicados de forma geral a diversos ramos do direito. Porém, eles não são objeto do nosso estudo neste momento. Ao lado dos princípios gerais, o direito do trabalho possui princípios próprios, voltados a regular a relação específica existente entre empregado e empregador. Os mais importantes são: • princípio da proteção ou tutelar; • princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas; • princípio da continuidade da relação de emprego; • princípio da primazia da realidade; • princípio da inalterabilidade contratual lesiva; • princípio da intangibilidade salarial.Que tal agora analisarmos um a um os princípios enumerados? princípio da proteção ou tutelar Este princípio surgiu pela necessidade de se atenuar o desequilíbrio existente na relação entre empregado e empregador. Nasceu no intuito de proteger o empregado, considerado parte hipossuficiente na relação de emprego. O Estado, como detentor do poder de editar leis, impõe às partes contratantes regras formais que deverão ser cumpridas em detrimento da sua autonomia em contratar. O princípio da proteção existe como forma de impedir ou evitar a exploração do capital sobre o trabalho humano, possibilitando melhores condições de vida e bem-estar dos trabalhadores. O princípio da proteção deve orientar não só o aplicador do direito na interpretação e aplicação das leis. Deve também orientar o legislador no momento da elaboração das normas jurídicas. Para tanto, as novas leis devem procurar favorecer o obreiro, trazendo a ele melhores condições de vida. Capítulo 1 38 Direito Trabalhista e Legislação Social Este princípio desdobra-se, ainda, em três outros: • o princípio in dubio pro operario; • o princípio da condição mais benéfica; • o princípio da aplicação da norma mais favorável. O princípio In dubio pro operario informa ao aplicador que quando uma norma comportar duas ou mais interpretações, deve-se optar por aquela mais favorável ao empregado. Mas atenção, nunca afrontando a vontade da lei. Ele não se aplica quando o assunto é a produção de provas no processo trabalhista, pois cabe ao autor provar que o direito existe (fato constitutivo do direito), e ao réu cabe provar que aquele direito não existe (fato modificativo, extintivo ou impeditivo do direito). O princípio da condição mais benéfica tem a ver com o direito adquirido resguardado na Constituição de 1988, em seu Art.5º, inciso XXXVI, pois garante ao trabalhador que nenhuma norma superveniente que prejudique um direito seu atingirá o que está disposto no contrato de trabalho ou convenção de trabalho que seja mais benéfica, sendo assim autorizada apenas a alteração in mellius que tenha o objetivo de uma condição social melhor para o trabalhador. O princípio da aplicação da norma mais favorável ensina que devemos aplicar a norma mais favorável ao obreiro, independentemente da sua posição na hierarquia das normas. Este princípio deve estar presente no momento da elaboração, na verificação da hierarquia e no momento da interpretação. No momento da elaboração, tem por objetivo orientar o legislador à elaboração de normas que tragam melhores condições sociais ao trabalhador. Havendo mais de uma norma capaz de ser aplicada, deve-se optar por aquela que seja mais favorável ao empregado, não importando sua posição hierárquica. Capítulo 1 39 Direito Trabalhista e Legislação Social LEMBRETE Lembre-se do exemplo dado quando discutimos os métodos de interpretação da norma. Naquela ocasião, trouxemos a seguinte situação prática: se uma convenção coletiva estabelecer que determinada categoria de obreiros deve receber as férias com pelo menos ½ do salário normal, esta norma prevalecerá sobre a regra exposta no artigo 7º, inciso XVII, da Constituição Federal, pois, mesmo sendo a Constituição a lei maior de nosso sistema jurídico, a norma prevista na Convenção é mais favorável aos obreiros. Assim, os empregados daquela categoria terão direito a receber as férias anuais com no mínimo ½ a mais do salário. No momento da interpretação, havendo omissão ou uma situação dúplice (uma norma com dois sentidos), deve-se optar pelo sentido que confira mais direitos ao trabalhador. Mas aqui é preciso ressaltar que mesmo diante da utilização dos subprincípios do princípio da proteção, podem existir situações que demandam uma atenção maior do aplicador. Sendo assim, propomos a você a seguinte reflexão: se, em relação a determinada matéria trabalhista, um acordo coletivo trouxer em seu texto cláusulas favoráveis e desfavoráveis, e ao mesmo tempo existir uma lei contendo igualmente algumas regras favoráveis e outras menos benéficas ao trabalhador, qual delas deve ser aplicada? Para resolver controvérsias assim, o Direito lança mão de duas teorias: a do conglobamento e a da acumulação. Confira. A teoria do conglobamento aplica-se à norma que no conjunto seja mais benéfica ao empregado. Já a teoria da acumulação aplica-se às duas normas, extraindo-se de cada uma delas o que for mais favorável ao empregado. Capítulo 1 40 Direito Trabalhista e Legislação Social Via de regra, os tribunais brasileiros têm adotado a teoria do conglobamento, pois entendem que extrair regras de duas normas diferentes seria o mesmo que criar uma terceira norma, o que é vedado ao Judiciário. princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas Por este princípio, fica vedado qualquer acordo realizado entre as partes que vise à renúncia de quaisquer dos direitos inerentes ao trabalhador. O art. 9º da CLT consagra a aplicação deste princípio dispondo: “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.” (BRASIL, 1943) Em outras palavras, o objetivo deste princípio é evitar que o empregador induza ou obrigue o trabalhador a dispor de seus direitos contra sua vontade. princípio da continuidade da relação de emprego Via de regra, os contratos devem ser pactuados por prazo indeterminado. Somente podem ser celebrados contratos por prazo determinado quando a lei assim autorize, matéria que estudaremos no capítulo 3. Este princípio foi reconhecido pelo Tribunal Superior do Trabalho, por meio da súmula 212: tSt enunciado nº 212 - res. 14/1985, dJ 19.09.1985 Ônus da Prova - término do Contrato de trabalho - Princípio da Continuidade O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado (TST, 1996). princípio da primazia da realidade Mesmo diante da existência de um contrato escrito firmado entre as partes, para os efeitos probatórios mais valerá a verdade real dos fatos do que aquilo que foi pactuado pelos contraentes. Vale dizer que o fato concreto terá mais relevância do que as cláusulas previstas explicitamente em contrato escrito. Capítulo 1 41 Direito Trabalhista e Legislação Social Trata-se de um princípio muito usado na seara trabalhista, pois tem a finalidade de impedir procedimentos fraudatórios praticados pelo empregador. Logo, de nada adianta estabelecer cláusulas escritas conferindo direitos e deixar de entregá-los na prática. princípio da intangibilidade do salário Saiba você que o salário tem cunho alimentar. Tem a função de prover o trabalhador e sua família. O princípio da intangibilidade salarial garante ao trabalhador a impenhorabilidade de seu salário, bem como a irredutibilidade salarial. A Constituição Federal de 1988 (art. 7º, inciso VI), no intuito maior de preservar o emprego do obreiro, flexibilizou este princípio, prevendo a possibilidade de redução temporária de salário por meio de acordo ou convenção coletiva. Não obstante a regra da Constituição que permite a redução temporária dos salários por meio de acordo ou convenção coletiva de trabalho, a regra maior continua sendo a da irredutibilidade de salários. Logo, a redução somente é permitida por exceção, e ainda por prazo fixo de tempo, já que as convenções e acordos coletivos têm um prazo máximo de vigência de dois anos, conforme o art. 614, parágrafo 3º da CLT). SAIBA QUE Com isso,encerramos o conteúdo deste nosso primeiro capítulo. Para que você possa fixar melhor tudo aquilo que foi estudado, que tal acompanhar um breve estudo de caso? Veja a seguir. Capítulo 1 42 Direito Trabalhista e Legislação Social 1.3 Aplicando a teoria na prática Segundo o art. 10, inciso II, alínea “b” do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal é garantida à empregada gestante a estabilidade provisória, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Suponhamos que foi firmada uma convenção coletiva, entre o sindicato da categoria profissional X e o sindicato patronal Y, ajustando que a estabilidade provisória da gestante fosse de seis meses após o parto. Maria Rita, empregada pertencente à categoria profissional X, retornou da sua licença maternidade e, completados cinco meses após a realização do parto, foi demitida pela empresa em que trabalha (pertencente à categoria patronal do sindicato patronal Y) sem justa causa. Diante deste caso, Maria Rita procura você e solicita respostas a algumas questões. Você pode ajudá-la? Ela questiona: 1) O que é uma convenção coletiva? Ela é considerada fonte do direito do trabalho? 2) Eu, Maria Rita, posso ingressar com reclamação trabalhista requerendo retorno ao serviço, ou indenização do período correspondente, com fundamento no estabelecido na convenção coletiva mencionada? 3) Qual princípio do direito do trabalho é utilizado para resolução deste caso? Pois bem, para responder às questões práticas colocadas, vamos nos lembrar do que estudamos no decorrer deste primeiro capítulo? A primeira resposta que você deve dar a Maria Rita é que uma convenção coletiva é um acordo realizado entre dois ou mais sindicatos, devendo necessariamente estar presentes pelo menos um sindicato de trabalhadores (categoria profissional) e um sindicato patronal (categoria econômica). Você ainda pode complementar a resposta lembrando que o objetivo da convenção é estipular condições de trabalho aplicáveis aos contratos individuais celebrados pelos sujeitos pertencentes a ambas as categorias. Capítulo 1 43 Direito Trabalhista e Legislação Social Além disso, deixe claro que as convenções coletivas são sim consideradas fontes do direito do trabalho. Mas lembre-se que, conforme você aprendeu, são fontes formais autônomas, porque, diferentemente das fontes heterônomas, têm a participação direta dos sujeitos envolvidos na relação de emprego. Para a segunda resposta, recorde que a Constituição Federal estabeleceu os direitos mínimos assegurados aos trabalhadores. Desde que resguardados estes direitos mínimos, nada impede que uma lei, um acordo ou convenção ou até um contrato particular celebrado entre as partes possa dispor de forma diversa, ampliando esses direitos. Se foi realizada uma convenção coletiva entre o sindicato patronal e sindicato de trabalhadores estabelecendo que a estabilidade da gestante deve ser de seis meses, ela passa a ser obrigatória. Logo, informe que Maria Rita pode sim ingressar com reclamação trabalhista para requerer a reintegração ou indenização do período correspondente. E para responder à última questão, recorra ao que foi tratado acerca dos princípios do direito do trabalho. Fazendo isto, você irá perceber que o princípio do trabalho aplicável à questão de Maria Rita é o da proteção, somado ao subprincípio da norma mais favorável. Estes princípios nos ensinam que, diante de duas normas tratando do mesmo assunto, devemos optar pela aplicação da norma que confira maiores direitos ao trabalhador. 1.4 para saber mais Filme: Daens, um grito de justiça Direção: Stijn Coninx Ano: 1994 O cenário do filme é a cidade belga de Aalst no final do século 11, para a qual o padre Daens é designado e onde se depara com todas as agruras da Revolução Industrial europeia, como o trabalho infantil, sem quaisquer medidas de higiene e segurança e com uma jornada extenuante. A morte de uma criança, durante o seu horário de trabalho, e outras situações relacionadas às referidas condições de trabalho levam o padre a buscar soluções, inclusive ingressando na política. Capítulo 1 44 Direito Trabalhista e Legislação Social Filme: Germinal Direção: Claude Berri Ano: 1993 Germinal se passa no norte da França no século 19 e caracteriza perfeitamente o processo de produção do trabalho do modelo capitalista, a expansão do chamado capital, mostrando de forma muito clara os opostos entre as necessidades humanas e as matérias. Retrata o processo de gestação e maturação de movimentos grevistas e de uma atitude mais ofensiva por parte dos trabalhadores das minas de carvão na França em relação à exploração de seus patrões. Mostra um cotidiano de miséria, maus-tratos, alcoolismo e uma rebelião que acaba em tragédia. 1.5 Relembrando Neste capítulo, você aprendeu que: • o direito do trabalho teve origem durante a Revolução Industrial, quando os operadores das máquinas se uniram para pleitear condições mínimas de trabalho e proteção social em caso de acidentes. Até então, os trabalhadores laboravam durante longas jornadas, sem qualquer garantia social ou direito; • o direito do trabalho é o ramo do Direito que disciplina as relações de trabalho subordinado e tem por objetivo conferir ao trabalhador, considerado parte hipossuficiente, medidas de proteção e direitos sociais; • prevalece o entendimento de que o direito do trabalho tem natureza jurídica de direito privado; • estudar as fontes do direito do trabalho significa investigar de onde se originam os direitos trabalhistas; • as fontes do direito do trabalho podem ser materiais ou formais; • interpretar uma norma consiste em buscar o seu significado; • as lacunas do direito são omissões existentes no ordenamento jruídico. Para suprir essas omissões, podemos nos valer da analogia, da equidade e dos princípios gerais do direito; Capítulo 1 45 Direito Trabalhista e Legislação Social • os princípios são postulados valorativos que servem para auxiliar a aplicação do direito ao caso concreto; • os princípios gerais do direito são aqueles comuns a todos os ramos do Direito; • ao lado dos princípios gerais, aplicam-se ao direito do trabalho princípios que lhe são próprios, voltados a regular a relação específica existente entre empregado e empregador; • os mais importantes princípios do direito do trabalho são: o da proteção ou tutelar, da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, continuidade da relação de emprego, da primazia da realidade, da inalterabilidade contratual lesiva, intangibilidade salarial; • o princípio da proteção ou tutelar se desdobra em três outros princípios – o do in dubio pro operario, da condição mais benéfica e da aplicação da norma mais favorável. 1.6 testando os seus conhecimentos 1) A primeira Constituição brasileira a tratar explicitamente de direitos trabalhistas foi a de: a) 1822 b) 1891 c) 1934 d) 1988 2) São fontes formais autônomas do direito do trabalho: a) as convenções coletivas. b) as leis. c) a Constituição Federal. d) os costumes. Capítulo 1 46 Direito Trabalhista e Legislação Social 3) Sobre os métodos de interpretação das normas trabalhistas, marque a alternativa incorreta. a) Método autêntico é aquele que leva em consideração a interpretação feita pelo próprio legislador. b) Método gramatical é aquele que verifica o sentido literal das palavras colocadas no texto. c) Método teleológico é aquele que se preocupa em descobrir a finalidade pretendida pelo legislador quando da elaboração da norma. d) Método sistemático é aquele que leva em consideração a evolução histórica dos fatos que deram
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