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GONÇALVES, W. Relações Internacionais

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1 
RELAÇÕES INTERNACIONAIS 
 
WILLIAMS GONÇALVES 
Professor dos PPGs. Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do 
Sul e da Universidade Federal Fluminense 
 
 
1 Introdução 
 
 
A análise das relações internacionais passou a ter sua importância reconhecida no 
início do século XX. Até a eclosão da Primeira Guerra Mundial, o estudo das relações 
internacionais estivera a cargo de diplomatas, historiadores e juristas. A partir dessa data a 
situação mudou: notáveis esforços passaram a ser realizados no sentido de fazer, das 
Relações Internacionais, um campo de estudo específico e autônomo. Na prática, isso tem 
se traduzido no trabalho de definir, com alguma precisão, os limites da realidade das 
relações internacionais, bem como de produzir um dispositivo conceptual que resulte em 
análises integradas, as quais, por sua vez, possam permitir ir além das análises parciais 
produzidas pela Economia Internacional, pelo Direito Internacional, pela História 
Diplomática e pela Política Internacional. É cada vez maior o reconhecimento que as 
relações internacionais são extremamente complexas e abrangentes para serem submetidas 
às estreitas medidas estabelecidas por essas disciplinas. Ainda que cada uma delas possa 
iluminar aspectos relevantes da realidade, somente uma análise que combine, de modo 
articulado, conceitos elaborados por esses campos específicos poderá compreender sua 
extensão e sua densidade. Em outras palavras, o grande desafio enfrentado pelas Relações 
Internacionais é o de assumir sua indispensável multidisciplinaridade. 
Pode-se dizer, no entanto, que esse desafio tem sido enfrentado e vencido, 
exclusivamente, pelos acadêmicos do mundo anglo -saxão. Não obstante o conhecimento 
das Relações Internacionais interessar, em toda parte, àqueles que, de alguma forma, 
participam das relações internacionais (nomeadamente estadistas, diplomatas, militares e 
acadêmicos), o fato é que a produção acadêmica do mundo anglo-saxão neste campo, é 
 
 
2 
esmagadoramente superior à produção dos demais centros acadêmicos do mundo, juntos, 
incluindo os países nos quais há tradição de pesquisa universitário -acadêmica na área das 
Ciências Sociais. 
As razões determinantes dessa primazia anglo-saxônica no domínio dos estudos de 
Relações Internacionais são largamente conhecidas e podem ser decompostas, para fins 
analíticos, em três ordens, a saber: econômicas, acadêmicas e de poder. 
Inicialmente, as instituições dos Estados Unidos e da Inglaterra nunca pouparam 
recursos para apoiar a pesquisa e o ensino das Relações Internacionais. A primeira cátedra 
universitária dedicada a este campo de estudo, a Woodrow Wilson, financiada pelo cidadão 
inglês David Davies, foi criada em 1919, na Universidade de Gales. Mais tarde, logo após a 
Segunda Guerra Mundial, o Estado norte-americano, por meio de suas diversas agências 
governamentais, destinou somas fabulosas à pesquisa sobre os mais diversos aspectos das 
relações internacionais. Isso fez com que um grande número de acadêmicos talentosos se 
sentissem motivados a trilhar o caminho do estudo das Relações Internacionais. 
Em segundo lugar, apesar das diferenças existentes entre os mundos acadêmicos 
norte-americano e inglês, ambos assumiram o desafio tanto de definir o objeto específico 
das Relações Internacionais, como o de trabalhá-lo cientificamente. Nos Estados Unidos, a 
ciência das Relações Internacionais nasceu a partir dos estudos de Ciência Política; isso 
significa dizer que ela assumiu, desde o seu nascimento, um caráter eminentemente prático. 
Em sintonia com a tradição acadêmica desse país, na área da Ciência Política, as Relações 
Internacionais foram pensadas para resolver problemas concretos enfrentados pelo Estado, 
em detrimento da especulação puramente teórica. 
Na Inglaterra, por seu turno, o percurso foi diferente. Lá, as Relações Internac ionais 
nasceram da cooperação acadêmica entre os diferentes segmentos universitários e a 
diplomacia. Dessa experiência, formou-se uma tradição de estudo das Relações 
Internacionais que, muito antes de se resumir à defesa dos interesses nacionais britânicos, 
atribuiu significativa importância aos fatores culturais como relevantes aspectos 
componentes das Relações Internacionais. 
Em terceiro e último lugar, estão as razões de poder. Não é por mero acaso que as 
Relações Internacionais tenham se desenvolvido como estudo moderno tanto na Inglaterra 
(potência que exerceu o papel hegemônico durante o século XIX e início do século XX), 
 
 
3 
como nos Estados Unidos, que despontaram como a grande potência no início do século 
XX, vindo a se transformar em superpotência logo depois da Segunda Guerra Mundial. 
Pelo contrário, o estudo moderno das Relações Internacionais afigurou-se, às elites norte-
americanas e inglesas, como tarefa indispensável ao entendimento do mundo em mudança 
e, desse modo, à manutenção do poder que detinham. Essa conclusão de que o mundo havia 
mudado, fazendo-se necessário conhecê- lo melhor para continuar a exercer o poder e 
realizar seus respectivos interesses nacionais, levou as delegações diplomáticas dos Estados 
Unidos e da Inglaterra, presentes na Conferência de Paz de Paris, a assumirem a 
responsabilidade de criar centros de pesquisa neste campo. Tal compromisso foi honrado 
logo no ano seguinte (1920): foram criados, na Inglaterra, o Royal Institute of International 
Affairs, e, nos Estados Unidos, o Council of Foreign Relations. 
Dessa primazia anglo-saxã, nas Relações Internacionais , decorrem alguns efeitos 
acadêmicos e políticos extraordinariamente importantes, que podem ser sintetizados nas 
idéias de acúmulo de poder e de luta pela conservação da posição hegemônica. Ao se 
dedicar, com grande afinco, ao estudo das Relações Internacionais, os anglo-saxãos 
elaboraram hipóteses, formularam teorias e definiram os conceitos que se universalizaram, 
tais como aqueles que lhe são específicos, ou seja, criaram o léxico das Relações 
Internacionais. Qualquer pessoa que se interesse por este campo de estudo, em qualquer 
parte do mundo, deve, obrigatoriamente, exercer algum domínio sobre esse léxico ; caso 
contrário, não conseguirá estabelecer diálogo com os que se dedicam à pesquisa nessa área. 
Por assim dizer, o conhecimento tanto da língua inglesa, como da produção acadêmica 
norte-americana e inglesa nas Relações Internacionais constitui condição indispensáve l 
para iniciar toda espécie de debate acadêmico. Por outro lado, justamente por terem criado 
o léxico das Relações Internacionais e por reunirem o maior número de centros de pesquisa, 
os acadêmicos anglo-saxãos definem o nível de excelência da análise e impõem os termos 
do debate. Isso significa, enfim, que não dispõem unicamente do poder político para 
satisfazer seus respectivos interesses nacionais, como também, do poder sobre o próprio 
discurso das Relações Internacionais. 
Esse poder de determinar o que é relevante e, assim, impor a direção a ser dada à 
pesquisa, torna-se muito mais visível nos momentos nos quais ocorrem grandes mudanças 
no sistema internacional, tal como aconteceu no início da década de noventa, quando 
 
 
4 
terminou a Guerra Fria e o sistema internacional, de bipolar, passou a ser unipolar. A 
vitória estratégica dos Estados Unidos sobre a União Soviética (e sobre o mundo por ela 
comandado) levou não apenas à mudança da “agenda política internacional”, como 
também, correlativamente, à mudança de enfoque do mundo acadêmico sobre as questões 
internacionais. Imediatamente, por não se ter previsto as grandes modificações ocorridas no 
sistema internacional, passou-se a considerar a teoria Realista como imprestável paraa 
análise. Segundo o novo enfoque dominante, para empreender análises válidas, era 
necessário recuperar o instrumental liberal, com ênfase no livre-comércio, na generalização 
dos princípios liberal-democráticos e no esvaziamento do Estado-providência. Além da 
óbvia idéia de obsolescência do projeto socialista, passou-se, também, a entender que as 
questões de defesa da soberania e de segurança haviam dado lugar às questões econômicas 
globais ; isto é, a problemática geopolítica teria sido substituída pela problemática 
geoeconômica. Considerou-se, igualmente, que o problema das relações econômicas 
assimétricas entre as grandes potências capitalistas e os pequenos Estados, bem como o 
fenômeno da dependência econômica, na verdade, não tinham existência real, uma vez que 
se constituíam em mera manifestação ideológica do tempo da Guerra Fria. Desse modo, por 
considerar que o fim dessa guerra havia apagado todas as diferenças entre os Estados que 
comp unham o sistema internacional, decidiu-se que não havia mais porque falar de 
Terceiro Mundo, de luta pelo desenvolvimento, tampouco de reforma das instituições 
econômicas internacionais. Enfim, em consonância com os novos interesses demonstrados 
pelas grandes potências, especialmente pelos Estados Unidos, o mundo acadêmico desses 
Estados redirecionou a curiosidade intelectual, com vistas a melhor servir a esses novos 
interesses. Ao mesmo tempo, pelo efeito hegemônico, passou a pautar as linhas de pesquisa 
do restante do mundo, especialmente dos países da periferia. 
Isso posto, conscientes dos interesses que cercam o estudo das Relações 
Internacionais, obje tivamos, neste texto, introduzir algumas questões que possam, de 
alguma maneira, contribuir para o melhor entendimento da questão. Pretendemos, pois, 
apresentar a origem e a evolução das Relações Internacionais, o perfil das suas correntes 
teóricas mais importantes, além de discutir os conceitos mais correntes na bibliografia 
especializada. 
 
 
 
5 
 
 
 
2 Definição 
 
Recorrer às definições, não é a melhor forma de apresentar uma disciplina. Além de 
ser difícil encontrar uma que seja capaz de exprimir o conteúdo da disciplina com a 
objetividade e a abrangência necessárias, qualquer uma das definições que venha a ser 
escolhida será, inevitavelmente, alvo das mais diversas contestações. Isso porque as 
definições não são (e jamais poderão ser) neutras. Quem se propõe a definir, o faz à luz de 
alguma teoria. O resultado, desse modo, sempre deverá exprimir uma determinada 
concepção teórica, mesmo que não a explicite. Apesar disso, não se pode deixar de 
apresentá- las, mesmo que seja somente para contestá-las mais adiante. Nesse sentido, o 
objetivo a cumprir, com as definições, a seguir transcritas, não é exatamente o de dizer o 
que são as Relações Internacionais na verdade, mas sim, o de tentar desfazer algumas 
dúvidas que surgem com certa freqüência, quando o assunto envolve questões 
internacionais. Por essa razão, buscar-se-á distinguir Relações Internacionais das outras 
disciplinas que apresentam uma dimensão internacional, tais como a Política Internacional 
e a Política Externa. 
Para iniciar, serão apresentadas determinadas definições, cujos autores são 
conhecidos estudiosos das Relações Internacionais. 
Iniciamos com Phillipe Braillard e Mohamma-Reza Djalili, que afirma que “as 
relações internacionais podem ser definidas como o conjunto de relações e comunicações 
que os grupos sociais estabelecem através das fronteiras.”1 
Para Michael Nicholson, 
amplamente, relações internacionais concerne a relacionamentos e 
interações que não podem ser observados exclusivamente no contexto de 
um Estado tal como Inglaterra ou China. Estritamente, relações 
internacionais estuda interações sociais em contextos onde não existe 
 
1 BRAILLARD, Philippe; DJALILI , Mohammad-Reza. Relations Internationales : Que sais -je? Paris : PUF, 
1988. p. 5. 
 
 
6 
poder soberano para intrometer-se ou mediar e que está fora de qualquer 
jurisdição governamental.2 
Daniel Colard, por sua vez, afirma que “o estudo das relações internacionais 
engloba as relações pacíficas ou belicosas entre Estados, o papel das organizações 
internacionais, a influência das forças transnacionais e o conjunto das trocas ou das 
atividades que cruzam as fronteiras dos Estados.”3 
Joshua Goldstein, por fim, diz que, 
estritamente definido, o campo das relações internacionais concerne aos 
relacionamentos entre aqueles governos do mundo, que são Estados-
membro da ONU. Mas esses relacionamentos não podem ser entendidos 
isoladamente. Eles estão fortemente conectados com outros atores (como 
as organizações internacionais, corporações multinacionais, e indivíduos); 
com outras estruturas sociais (incluindo economia, cultura e política 
doméstica); e com as influências históricas e geográficas.4 
Pode-se constatar que as definições diferem umas das outras; e, justamente por esse 
motivo nem todas contêm os mesmos elementos. Alguns aspectos presentes em uma 
definição já não aparecem em outras. Contudo, é possível perceber que todas têm o mesmo 
sentido o qual é conferido pela idéia de relacionamentos múltiplos. Todos os autores 
citados, de um modo ou de outro, transmitem a idéia de que as relações internacionais 
envolvem numerosos e variados atores atuando em todo o mundo. Vistas dessa forma, as 
Relações Internacionais supõe o estudo do conjunto de interações. É evidente que a melhor 
maneira de decompor o conjunto para proceder à análise, é tarefa que depende do 
instrumental teórico a serviço do analista. A cada dispositivo teórico corresponde uma 
diferente maneira de perceber as relações internacionais. É aqui que reside a importância 
da teoria, qual seja: distinguir o principal do acessório, revelando o que é significativo para, 
assim, conduzir o analista a mais correta interpretação, mediante tal procedimento, produzir 
o esperado conhecimento da realidade das relações internacionais. 
No entanto, antes de seguir adiante, com a apresentação das definições oriundas 
dessas disciplinas aparentadas, seria interessante desfazer, o quanto antes, uma certa 
ambigüidade que, não raro, confunde quem se inicia no estudo das Relações Internacionais. 
 
2 NICHOLSON, Michael. International Relations: A Concise Introduction. London: MacMillan Press, 1998. 
p. 2. 
3 COLARD, Daniel. Les Relations Internationales de 1945 à nos jours . Paris : Armand Colin, 1999. p. 5. 
 
4 GOLDSTEIN, Joshua S. International Relations . New York: Longman, 1999. p. 3. 
 
 
7 
A ambigüidade é que as Relações Internacionais estudam as relações internacionais. Isto é, 
a disciplina e a realidade que essa disciplina busca conhecer têm o mesmo nome. Para 
contornar essa ambigüidade e, dessa forma, possibilitar o entendimento do discurso, os 
estudiosos convencionaram diferenciar o nome da disciplina do nome do objeto mediante o 
uso de iniciais maiúsculas para a primeira (Relações Internacionais) e de iniciais 
minúsculas para o objeto do conhecimento (relações internacionais). 
No próximo passo, para a definição de Política Internacional, surgem problemas de 
outro tipo: verifica-se, neste caso, a existência de evidentes imprecisões. 
Em primeiro lugar, é possível considerar a Política Internacional como o estudo da 
estrutura e funcionamento dos sistemas políticos estrangeiros. Pode-se citar, como 
exemplo , o caso do cientista político brasileiro que se dedica ao estudo da estrutura e do 
funcionamento do sistema político dos Estados Unidos ou, conforme o interesse, de 
qualquer outropaís. Segundo essa idéia a respeito do que é Política Internacional, os 
exemplos podem se multiplicar; porém, o sentido será sempre o mesmo, qual seja, como 
agem e reagem politicamente outros povos diante dos novos desafios que a realidade vai 
apresentando. 
A segunda possibilidade de definição de Política Internacional, abre-se no sentido 
de entendê- la como o estudo da lógica interna e da prática das ideologias políticas. Neste 
caso, podem servir de exemplo os estudos que se fazem sobre formações ideológicas como 
socialismo, neoliberalismo, terceira via, populismo e a aplicação prática dessas ideologias 
sob a forma de programas políticos e regimes políticos em todos os Estados do mundo. 
Desse tipo de estudo de Política Internacional, derivam os estudos comparados, que 
propiciam, ao pesquisador, a oportunidade de refletir sobre a coerência e os efeitos 
produzidos pela prática política. 
As duas definições acima, na verdade, não oferecem problemas de entendimento. 
Os problemas surgem quando determinados autores passam a falar de Política 
Internacional, atribuindo, a esses estudos, o sentido de Relações Internacionais. Essa 
assimilação de uma definição pela outra costuma ser feita, na maior parte das vezes, por 
autores que se apóiam na teoria Realista para analisar as relações internacionais. Tal 
confusão é comum entre esses autores, porque, na concepção deles, o que de fato interessa 
conhecer sobre o meio internacional são as relações políticas que os Estados entretêm. Para 
 
 
8 
eles, embora as relações entre os Estados comportem interesses muito diversificados 
(econômicos, sociais e culturais), a linguagem que exprime os interesses do Estado é 
sempre a política. Isto é, a política é a linguagem própria do Estado. Conquanto sempre 
esteja se manifestando a respeito dos seus interesses econômicos, sociais e culturais, o 
Estado o faz mediante o uso de políticas orientadas para cada um desses interesses. Nesse 
sentido, todos os interesses estão embutidos nas relações políticas que o Estado sustenta 
com os demais. Assim, de acordo com essa interpretação, Política Internacional nada mais é 
do que as próprias Relações Internacionais. 
Por fim, resta definir Política Externa, a qual, para P. A. Reynolds, pode ser definida 
“como o conjunto de ações de um Estado em suas relações com outras entidades que 
também atuam no cenário internacional, com o objetivo, a princípio, de promover o 
interesse nacional.”5 
Para Marcel Merle, “a Política Externa é [...] a parte da atividade do Estado que é 
voltada para fora, isto é, que trata, em oposição à política interna, dos problemas que 
existem além das fronteiras.”6 
Como o próprio nome indica, de maneira inequívoca, a Política Externa constitui 
um dos fatores que compõem as relações internacionais. É mediante a sua formulação, que 
o Estado define as prioridades, expectativas e alianças para atuar no quadro das relações 
internacionais. 
Ainda que não seja propósito deste texto entrar na discussão sobre o conceito de 
Política Externa, vale assinalar que as definições acima contêm duas questões polêmicas. A 
primeira delas, formulada por P. A. Reynolds, diz respeito à idéia de interesse nacional. 
Esse conceito, exaustivamente examinado por Joseph Frankel7, ocupa posição central na 
teoria Realista de Hans J. Morgenthau8. De maneira simplificada, pode-se dizer que a mais 
séria objeção a esse conceito é a de que as decisões de política externa , tomadas pelos 
governantes, são resultado de um processo decisório do qual participam diversos grupos, os 
quais, por sua vez, procuram fazer com que a sua visão particular dos problemas se 
 
5 REYNOLDS, P. A. Introduccion al Estudio de las Relaciones Internacionales. Madrid : Tecnos, 1977. p. 
46. 
6 MERLE, Marcel. La Politique Étrangère. Paris: Presses Universitaire de France, 1984. p. 7. 
7 FRANKEL, Joseph. National Interest. London: Pall Mall Press, 1970. 
8 MORGENTHAU, Hans J. Politics Among Nations : The Struggle for Power and Peace. New York: Alfred 
A. Knopf, 1985. 
 
 
9 
sobreponha à dos demais grupos que competem no processo de formulação de políticas. 
Isso significa dizer que há rejeição à idéia realista, segundo a qual o Estado funciona no 
meio externo conforme uma racionalidade situada acima das contradições que agitam a 
nação. 
A segunda questão polêmica, contida na definição de Marcel Merle, refere-se à relação 
externo/interno. Neste caso, a discussão gira em torno do tema relativ o à existência de dois 
campos distintos, ou seja, as políticas interna e externa têm autonomia uma face à outra, ou 
uma constitui a simples extensão da outra? Resta, ainda, o questionamento acerca da 
predominância de uma sobre a outra, ou seja, a política externa determina a política interna, 
ou é por ela determinada? 9 
 
3 Relações internacionais como objeto de estudo 
 
Como ocorre em todas as demais Ciências Sociais, parte dos estudiosos das 
Relações Internacionais está permanentemente envolvida na reflexão epistemológica sobre 
a definição do seu objeto de estudo, num exercício absolutamente necessário , uma vez que 
a realidade está em permanente mutação. 
A dinâmica das relações internacionais, constantemente determinando o surgimento de 
novos atores e a abertura da discussão de novas questões internacionais, representa 
contínuo desafio à capacidade analítica das teorias estabelecidas. Daí a razão porque se 
apresenta, como absolutamente necessária, a tarefa de rever os pressupostos e os 
instrumentos conceituais da disciplina, pois, do êxito de la, depende o avanço da ciência e a 
conseqüente elevação do nível de conhecimento sobre a realidade estudada. E o principal 
desafio que se oferece àqueles que se dedicam a esse trabalho, é justamente responder, com 
precisão, à seguinte pergunta: o que é a realidade das relações internacionais? 
Todos aqueles que têm investido nessa reflexão sabem o quanto uma resposta 
categórica e definitiva a essa pergunta é difícil. Difícil, antes de tudo, em virtude da 
imaterialidade do objeto que se deseja conhecer. Ao contrário do que é comum no âmbito 
das ciências naturais, as relações internacionais não tem existência física; elas são, por 
assim dizer, uma abstração; uma vez que só existe como produto do pensamento. Desse 
 
9 MERLE, op. cit. 
 
 
10 
modo, por não constituírem uma realidade sensível, sua definição acaba por ser arbitrária, 
tendo em vista que, cada qual se julga capaz de determinar, com maior correção, os 
contornos das relações internacionais como objeto de conhecimento. 
Convém, no entanto, ter cautela. Afirmar que a definição de relações internacionais, 
como objeto de conhecimento, é arbitrária, não significa dizer que ela é aleatória. A 
definição é arbitrária, porque o objeto não se auto-evidencia. Ele requer que se o destaque e 
o separe de tudo o mais que o cerca e possa, com ele, se confundir. Nesse aspecto, a 
situação do estudioso das relações internacionais não é confortável como a do biólogo 
dedicado ao estudo dos seres marinhos: este não precisa dispender muito esforço para 
apresentar o peixe como seu objeto de conhecimento. Porque, apesar dessa denominação 
ter- lhe sido atribuída pelos homens e não por eles próprios, os peixes são imediatamente 
reconhecidos, sem suscitar controvérsias. Por mais que o tamanho, a forma e a cor possam 
variar, o fato é que as características básicas identificadoras do animal como peixe , estão 
sempre evidentes. 
Por outro lado, a definição das relações internacionais como objeto de estudo não é 
aleatória porque, independentementeda orientação seguida, alguns elementos 
característicos impõem-se como obrigatórios a qualquer uma das definições que venha a ser 
elaborada. Por essa razão, elas guardam muitas semelhanças entre si e, no mais das vezes, 
apresentam distinções sutis. Por exemplo, por mais ampla e inclusivamente que se queira 
definir o objeto das relações internacionais, não há como deixar de considerar as relações 
políticas entre os Estados como seu componente importante. Entretanto, a afirmação que o 
cidadão comum, não investido de qualquer função oficial de seu Estado, possa ser ator das 
relações internacionais, já não goza mais da mesma aceitação entre as linhas teóricas que 
compõem o universo da disciplina. 
Essas variadas definições da realidade das relações internacionais podem ser 
sintetizadas em dois grandes grupos: o primeiro deles é aquele cujas definições 
compreendem os fenômenos paz e guerra; armas nucleares e desarmamento; imperialismo e 
nacionalismo; as relações assimétricas entre sociedades ricas e sociedades pobres; 
preservação do meio ambiente; combate ao narcotráfico; combate ao terrorismo 
internacional; defesa dos direitos humanos; influência das instituições religiosas; 
organizações internacionais, processos de integração regional; formação e fragmentação 
 
 
11 
dos Estados; comércio e ação das corporações multinacionais; raça e gênero em todo o 
mundo; desenvolvimento e transferência de tecnologia; globalização. 
O segundo grupo apresenta as relações internacionais como o resultado das relações 
entre os Estados. Enquanto, no primeiro grupo de definições, a realidade das relações 
internacionais é apresentada como extremamente ampla, incluindo fenômenos que dizem 
respeito a diversos domínios da vida em sociedade e relativos a situações tanto de conflito 
como de cooperação, no segundo grupo, essa realidade é apresentada como, 
fundamentalmente, constituída por conflitos entre os interesses respectivos a cada Estado. 
No primeiro grupo, qualquer um dos fenômenos citados pode assumir a condição de objeto 
de análise das Relações Internacionais; no segundo, por sua vez, tais fenômenos são 
concebidos como produto das relações diplomáticas, militares e estratégicas que os Estados 
(China, Bélgica, Venezuela, Alemanha, Japão, Estados Unidos, p. e.) estabelecem entre si. 
As disparidades apresentadas por esses conjuntos das possíveis características das 
definições possíveis de relações internacionais são, contudo, mais aparentes do que reais. E 
o que faz com que as diferenças sejam apenas aparentes é a idéia de anarquia – a qual, de 
fato, passa a ser o elemento unificador de todas as variadas concepções da realidade das 
relações internacionais. Para esse efeito, anarquia significa a inexistência de uma 
autoridade central, com legitimidade para criar leis e dispor de poder para fazer com que 
essas leis sejam obedecidas. Em virtude dessa ausência de algo como um governo mundial, 
que centralize as decisões, as relações e interações internacionais assumem uma 
importância fundamental para o conhecimento da realidade internacional. Embora, como 
será visto mais adiante, haja dive rgências entre as correntes teóricas, o aspecto mais 
importante é que as principais delas encaram a figura jurídico-política do Estado como a 
referência principal. A ausência de um poder que desempenhe, em escala internacional, o 
papel que o Estado desempenha em escala nacional constitui, para as diversas orientações 
teóricas, a pedra angular das Relações Internacionais. Essa característica específica permite 
afirmar não só a existência do objeto de conhecimento denominado relações internacionais, 
mas, também, que esse objeto não se confunde com outros objetos de conhecimento que 
contêm algumas características iguais. 
As possibilidades de uso de diversas definições da realidade das relações 
internacionais, entretanto, não se apresentam, para o estudioso da matéria, como mera 
 
 
12 
questão de conveniência. Pelo contrário, a opção por qualquer uma das definições 
determina um correspondente conjunto de conseqüências, as quais, vale dizer, são de ordem 
teórica e metodológica, pois a maneira como definimos a realidade é a mesma maneira 
como a entendemos, de tal modo que, entre a realidade e sua definição, encontra-se sempre 
presente a teoria. 
 
4 Relações Internacionais como disciplina 
 
A disciplina Relações Internacionais é jovem, tendo em vista que o seu nascimento 
se deu logo após a Primeira Guerra Mundial,** um acontecimento que constituiu a razão 
fundamental para o seu surgimento. Em virtude do novo caráter industrial e tecnológico, 
que a revestia, a Primeira Guerra Mundial foi a primeira guerra total, onde já não distinguia 
mais, com clareza, frente e retaguarda, combatentes e civis. Ao findar, deixou um rastro de 
devastação sem precedentes. Enquanto todas as guerras européias, entre 1802 e 1913, 
haviam produzido o total de 4,5 milhões de mortos, a Primeira Guerra Mundial, sozinha, foi 
responsável por cerca de 10 milhões de homens mortos, a maioria com menos de 40 anos 
de idade; 10 milhões de refugiados; 5 milhões de viúvas; e 9 milhões de órfãos. Somente na 
famosa batalha do Somme, franceses, ingleses e alemães perderam, juntos, quase um 
milhão de homens. No plano material, a destruição resultou, em 1920, numa significativa 
redução da produção industrial (de 1/4 ), em relação a 1913.10 Por essa razão, quando o 
conflito chegou ao fim, os líderes das potências vencedoras foram fortemente pressionados, 
pela opinião pública de seus respectivos países, para punir, duramente, os responsáveis pela 
guerra e, também, para tomar as providências necessárias a fim de que outra guerra como 
aquela não voltasse a acontecer. Assim, em função da enorme capacidade bélica decorrente 
das conquistas tecnológicas do capitalismo oligopolista, como também o alcance 
geográfico mundial do conflito, percebeu-se a necessidade de ser promovido o 
 
** Essa data de nascimento é contestada por Brian C. Schmidt (The Political Discourse of Anarchy: A 
Disciplinary History of International Relations. Albany: State University of New York Press, 1998), Esse 
autor considera que a disciplina nasceu bem antes da Primeira Guerra, como derivação da discussão 
acadêmica dos cientistas políticos norte-americanos sobre a Teoria do Estado. 
10 LOWE, Norman.Guía Ilustrada de la Historia Moderna.Mexico: Fondo de Cultura Económica, 1995. p. 
44. 
 
 
 
 
13 
conhecimento da realidade das relações internacionais, particularmente dos mecanismos 
que engendram as guerras. 
Para cumprir essa finalidade, como já foi dito nas linhas iniciais do presente texto, 
foi criada, em 1919, na Universidade de Gales (Aberyswyth), a Cátedra Woodrow Wilson 
de Política Internacional, a primeira cátedra de Relações Internacionais do mundo, a qual 
foi financiada pelo filantropo David Davies e ocupada por Alfred Zimmern (1879 – 1957) 
e, mais tarde, em 1936, por Edward Hallett Carr (1892 – 1982). No ano seguinte (1920), 
cumprindo compromisso assumido pelas duas delegações presentes à Conferência de Paz 
de Paris de “levar a efeito o estudo sistemático das relações internacionais”, foram criados, 
na Inglaterra, o Royal Institute of International Affairs e, nos Estados Unidos, o Council of 
Foreign Relations.11 
As relações internacionais, na verdade, sempre foram estudadas. Melhor dizendo, 
desde que o sistema europeu de Estados formou-se, a partir da Paz de Westphalia (1648), 
estadistas e intelectuais em geral passaram a se dedicar à reflexão sobre os fenômenos da 
paz e da guerra entre os Estados. 
Pensadores da estatura intelectual de Nicolau Maquiavel,Immanuel Kant, Jean-Jacques 
Rousseau, como tantos outros mais, demonstraram a grande importância desses fenômenos 
para a definição das instit uições políticas. Portanto, o fato para o qual se procura, aqui, 
chamar a atenção, é o de que a decisão das elites intelectuais européia e norte-americana de 
fazer, ao fim da Primeira Guerra Mundial, das relações internacionais, um objeto de 
ciência, não constituiu algo rigorosamente inovador. O que se considera digno de registro é 
a nova maneira como estudiosos e estadistas passaram a encarar o estudo das relações 
internacionais. Antes da guerra, as respostas para os problemas internacionais eram 
elaboradas segundo a ótica do Direito Internacional, da Diplomacia e da História 
Diplomática. A Primeira Guerra Mundial, em virtude de sua abrangência, serviu para 
mostrar que essas abordagens estavam inteiramente superadas, uma vez que já não eram 
mais capazes de produzir respostas satisfatórias. Para dar conta dos novos problemas 
internacionais, suscitados pela expansão da rede de trocas e de fluxos de capitais da 
economia internacional, bem como pelo surgimento de novas potências, fora do perímetro 
europeu, com ambições de virem a desempenhar papel de destaque no cenário 
 
11 BROWN, Chris . Understanding International Relations . London: MacMillan Press, 1997. p. 24. 
 
 
14 
internacional, fazia-se, então, necessária a criação de nova disciplina, a qual deveria, por 
assim dizer, exprimir, em sua abordagem, a amplitude que passara a caracterizar a nova 
realidade das re lações internacionais. 
Desde que o projeto de construção da disciplina de Relações Internacionais foi 
lançado, os estudiosos têm procurado definir, com o maior rigor possível, os limites de seu 
objeto de estudo. Além disso, têm procurado elaborar os instrumentos teórico-conceituais 
que tornem possível a análise desse mesmo objeto. Não há dúvida de que a grande 
dificuldade enfrentada nessa tarefa de configuração da nova disciplina é assegurar- lhe o 
indispensável caráter interdisciplinar. Ou seja, definir os contornos de uma disciplina capaz 
de produzir uma visão integrada do meio internacional; uma disciplina cujo alcance vá 
além das visões parciais da Economia Internacional, do Direito Internacional, da História 
Internacional e da Política Internacional. Es se desafio, vale assinalar, tem se renovado à 
medida que as relações internacionais têm evoluído, tornando-se a cada dia mais 
complexas. Assim o foi, depois da Segunda Guerra Mundial, ocasião em que os estudiosos 
tiveram que passar a levar em conta o advento das armas nucleares e a luta iniciada pelos 
povos colonizados em favor de sua independência face às metrópoles européias. Assim tem 
sido, a partir da última década do século XX, com os estudiosos tentando elucidar a nova 
estrutura do sistema internacional e, ao mesmo tempo, decifrar o fenômeno da globalização 
e de seus surpreendentes efeitos gerais. 
Essa procura do perfil teórico-conceitual ideal das Relações Internacionais, com 
vistas à obtenção das mais confiáveis análises da realidade, tem ocasionado grande disputa 
intelectual que, por sua vez, tem levado o campo teórico da disciplina à situação de 
fragmentação. Tantas são as propostas teóricas que vêm sendo apresentadas, que se torna 
até difícil classificá-las. A maneira que aqueles dedicados ao estudo da evolução teórica da 
disciplina, encontraram para mapear esse campo teórico, foi utilizar o conceito de 
paradigma. Tomado de empréstimo do filósofo da ciência Thomas Kuhn12, esse conceito 
tem servido para classificar as teorias segundo seu vínculo a determinados modos de 
perceber a constituição e a dinâmica do meio internacional.*** 
 
12 KUHN, Thomas S . A Estrutura das Revoluções Científicas . São Paulo: Perspectiva, 1982. 
*** Barry Buzan, p. e., assim define paradigma: “Paradigmas são escolas de pensamento que têm sido 
constituídas mediante abordagens no estudo das relações internacionais que exploram alguns níveis, setores e 
normas em detrimento de outros. Cada paradigma é um tipo de lente compósita, que possibilita uma visão 
 
 
15 
Apesar das dúvidas a respeito da adequação do conceito à realidade teórica das 
Relações Internacionais, uma vez que foi elaborado em função de outra realidade científica, 
seu uso, segundo alguns autores13, estaria plenamente justificado face à 
incomensurabilidade de cada uma das diferentes correntes teóricas. Isto é, se cada corrente 
teórica delimita o objeto ‘relações internacionais ’ de maneira a valorizar certos 
componentes, os quais, por seu turno, são desvalorizados por outra corrente, que dá 
prioridade a outros componentes, as análises resultantes do uso dessas teorias serão 
diferentes uma das outras e, enfim, não haverá como compará-las em sua validade, tendo 
em vista o fato de os focos da análise não terem sido os mesmos. Para simplificar: 
diferentes teorias produzem diferentes análises e, como não existe linguagem neutra para 
julgar a superioridade de uma teoria sobre a outra, a escolha da melhor só pode ser 
determinada pelo livre arbítrio do analista. Assim, conquanto Thomas Kuhn tenha 
formulado o conceito paradigma para explicar a ascensão e queda das grandes formulações 
teóricas, seu uso, no âmbito das Relações Internacionais, estaria justificado em função 
dessa realidade de fragmentada constituição. 
O uso do conceito paradigma não é suficiente, contudo, para resolver a questão do 
mapeamento do campo teórico das Relações Internacionais: se, de um lado, o conceito 
ajuda, ao agrupar as teorias assemelhadas, de outro, cria algumas dificuldades, à medida 
que há muitas divergências quanto aos próprios paradigmas. Por exemplo, Ole Waever14 
considera a existência de três paradigmas: Realismo, Pluralismo/Interdependência e 
Marxismo/Radicalismo. Graham Evans e Jeffrey Newham15 consideram os sete paradigmas 
seguintes: Realismo, Behaviorismo, Neorealismo, Neoliberalismo, Teoria do Sistema 
Mundial, Teoria Crítica e Pós-Modernismo. Charles W. Kegley, Jr. e Eugene R. Wittkopf16 
enumeram seis paradigmas: História Imediata (Current History), Liberal Idealismo, 
Realismo, Behaviorismo, Neorealismo e Neoliberalismo. Robert Jackson e Georg 
 
seletiva das relações internacionais. Igual a qualquer outra lente, a leitura através dela permite que 
determinadas características apareçam mais fortemente, enquanto outras características quase desapareçam”. 
13 WAEVER, Ole . The rise and fall of the inter-paradigm debate. In: SMITH, Steve; BOOTH, Ken; 
ZALEWSKI, Marysia (Eds.).Interntional theory: positivism & beyond. Cambridge: Cambridge University 
Press, 1996. p. 149-185. 
14 Ibidem. 
15 EVANS, Graham ; NEWHAM, Jeffrey.The Penguin Dictionary of International Relations .London: 
Penguin Books, 1998. p. 275. 
16 KEGLEY, Charles W. ; WITTKOPF, Eugene R. World Politics : Trend and Transformation. New York: 
St. Martin’s Press, 1997. p. 18. 
 
 
16 
Sorensen17 destacam quatro paradigmas: Realismo, Liberalismo, Sociedade Internacional e 
Economia Política Internacional. E, por último, Hedley Bull18 indica apenas três 
paradigmas: Hobbesiano ou Realista, Kantiano ou Universalista e Grotiano ou 
Internacionalista. 
Como a classificação desses autores deixa transparecer, há paradigmas cuja 
nomeação é unânime, como é o caso do Realismo; há outros que recebem nomes diferentes, 
tais como Liberalismo/Liberal Idealismo/Pluralismo/Interdependência; e, ainda,há aqueles 
que só aparecem em uma classificação, como são os casos de Teoria do Sistema Mundial, 
de Sociedade Internacional e de Economia Política Internacional. Vale observar, enfim, que 
essa lista poderia ser aumentada e tornada ainda mais confusa, se outros autores fossem 
arrolados. 
Ainda que haja um interesse crescente, por toda a parte, em relação às Relações 
Internacionais, a discussão teórica, tal como o quadro acima revela, permanece como uma 
discussão entre acadêmicos norte-americanos e ingleses, confirmando as palavras de 
Stanley Hoffmann, no sentido de que Relações Internacionais é uma disciplina norte-
americana .19 
Como já foi visto, esse interesse dedicado, pela academia norte-americana, às 
Relações Internacionais deve-se, em grande medida, aos esforços iniciados depois da 
Primeira Guerra Mundial e, sobretudo, ao assombroso investimento realizado pelo Governo 
dos EUA em pesquisas, publicações e viagens, logo depois da Segunda Guerra Mundial.20 
Na ocasião, aquele governo buscou estimular a formação de especialistas em todas as áreas 
(conhecimento de regiões, de países e de questões internacionais), de modo que o 
conhecimento, por eles produzido, se configurasse na base para a ação externa e, 
naturalmente, para a execução do projeto hegemônico do Estado. Nesse sentido, a 
discussão teórica na qual estão envolvidos os estudiosos norte-americanos não deve ser 
 
17 JACKSON , Robert; SORENSEN, Georg. Introduction to International Relations .Oxford: Oxford 
University Press, 1999. p. 34. 
18 BULL, Hedley. The Anarchical Society: A Study of Order in World Politics. London: MacMillan Press, 
1977. p. 24. 
19 HOFFMANN, Stanley. An American Social Science: International Relations. In: DER DERIAN, James 
(Eds.). International Theory: Critical Investigations. London: MacMillan Press, 1995. p. 212-241. 
20 PLATIG, E. Raymond. International Relations as a Field of Inquiry. In: ROSENAU, James N. (Ed.). 
International Politics and Foreign Policy: a reader in research and theory. New York: The Free Press, 1969. 
p. 6-19. Neste artigo, o autor apresenta o volume de recursos investidos e discrimina as áreas de pesquisa 
beneficiadas. 
 
 
17 
interpretada como mera disputa de preferências pessoais e de rivalidades de grupos 
universitários. Essa contenda, na verdade, tem um pano-de-fundo político: o trabalho de 
preservação do status quo internacional. Subjacente à polêmica sobre os paradigmas e 
sobre a validade do uso de conceitos como equilíbrio de poder, governabilidade 
internacional e globalização, encontra-se a questão fundamental, relativa ao substantivo 
apoio da Academia à luta pela conservação da posição hegemônica por parte do Estado 
norte-americano. 
Por tais motivos, a primazia norte-americana , no estudo das Relações 
Internacionais, faz com que a história da disciplina coincida com sua história no ambiente 
acadêmico norte-americano. 
 
5 A evolução teórica das Relações Internacionais 
 
A evolução teórica das Relações Internacionais tem sido marcada por “Grandes 
Debates”21 – os quais registram o confronto das teorias emergentes com as teorias 
dominantes. Não por coincidência, o confronto entre novas e antigas teorias tem se seguido 
a mudanças significativas na estrutura e no funcionamento do sistema internacional. Por 
entender que a teoria dominante não é capaz de dar conta de elementos novos, que se 
destacam no curso das relações internacionais, os pesquisadores buscam aprofundar suas 
reflexões com a finalidade de obter formulações teóricas mais ricas, que abram o caminho 
para o conhecimento mais verdadeiro da realidade das relações internacionais. 
O primeiro desses “Grandes Debates” aconteceu ao longo da década de 1930, 
opondo a corrente dominante Liberal- idealista à corrente emergente do Realismo. A 
primeira corrente acredita na perfectibilidade humana, no Direito Internacional e nas 
possibilidades de haver paz entre os Estados. Para os Idealistas, a realização desses ideais 
depende do aperfeiçoamento das instituições internacionais, o qual, por sua vez, deve 
resultar da cooperação entre os estadistas. Para a corrente Realista, por outro lado, as 
 
21 GROOM, A. J. R.; LIGHT, Margot. Contemporary International Relations : A Guide of Theory. London: 
Pinter Publishers, 1994. 
 DEL ARENAL, Celestino. Introducción a las Relaciones Internacionales . Madrid: Tecnos, 1990. 
 MERLE, Marcel. Sociologia das Relações Internacionais . Brasilia, UNB, 1981. 
 BRAILLARD, Philippe. Teoria das Relações Internacionais . Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 
1990.

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