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IMPEACHMENT ELIVAL DA SLVA RAMOS

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ARTIGOS 
CAPA DEZEMBRO 2015IMPEACHMENT: impossibilidade 
 
02/12/2015 por E l iva l da Si lva Ramos 
 
Manifesto-se sobre o tema em destaque apenas na condição de cidadão e estudioso do Direito 
Constitucional. 
 
Não me parece cabível a submissão da Presidente Dilma a processo de impeachment pelas 
irregularidades constatadas pelo Tribunal de Contas da União e que podem (com razão) implicar na 
rejeição de suas contas anuais de 2014 pelo Congresso Nacional. 
 
Antes de mais nada, é preciso ressaltar que impeachment é a sanção imposta a determinadas 
autoridades públicas, dentre elas o Presidente da República, pela prática de crime de 
responsabilidade. Já o denominado “crime de responsabilidade” constitui ato ilícito de natureza 
político-administrativa, que, eventualmente, pode também constituir crime, no sentido do direito 
penal. 
 
A Constituição vigente estabelece, em seu artigo 85, caput, que são crimes de responsabilidade os 
atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal, especialmente no 
tocante a determinados temas sensíveis, dentre eles os casos de grave descumprimento da 
legislação orçamentária. É importantíssimo notar, contudo, que nenhum crime de responsabilidade 
se caracteriza pelo mero enquadramento nos incisos do artigo 85 da Constituição. Esses 
dispositivos apenas estabelecem, exemplificativamente, situações genéricas de violação da 
Constituição que devem inspirar o legislador ordinário na tipificação dos crimes de 
responsabilidade. Com efeito, o parágrafo único do artigo 85 prevê, expressamente, que esses 
ilícitos são definidos em lei especial, que também deve estabelecer as normas processuais para a 
imposição do impeachment. 
 
No caso, trata-se da Lei Federal n. 1.079, de 10 de abril de 1950, cuja compatibilidade (parcial) com 
a Constituição atual foi reconhecida pelo STF. 
 
Ora, o Capítulo VI, do Título I, da Lei 1.079, que tipifica os crimes de responsabilidade do Presidente 
da República que atentem contra a lei orçamentária não contempla nenhuma hipótese que 
corresponda, com a precisão, às irregularidades que vem de ser reconhecidas pelo TCU, no parecer 
sobre as contas presidenciais de 2014. Ressalvo o conhecimento dos fatos apenas por matérias 
jornalísticas e não pela leitura do relatório em si. 
 
Pelo que me foi dado saber, a irregularidade mais contundente consistiu na utilização de 
instituições financeiras controladas pela União para o pagamento de benefícios a cargo da entidade 
controladora, que não efetuou o repasse desses recursos (que deveria ser prévio), senão depois de 
vários meses (essas seriam as “pedaladas fiscais”). Não há dúvida de que se trata de ilicitude, 
prevista no artigo 36, caput, da Lei Complementar n. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), 
que proíbe a operação de crédito entre uma instituição financeira estatal e o ente da Federação 
que a controle, na qualidade de beneficiário (incidem na vedação as operações de crédito 
“disfarçadas” ou não formalizadas). E, assim sendo, a sua prática pode conduzir à rejeição das 
contas anuais da Presidência. 
 
Na Lei Federal n. 1.079, entretanto, o tipo que mais se aproxima das “pedaladas” é o do artigo 10, 
item 9: “ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de operação de crédito com 
qualquer um dos demais entes da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta, 
ainda que na forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída 
anteriormente”. O dispositivo alude a operações de crédito irregulares envolvendo, de um lado, a 
União (ou suas instituições financeiras) e, de outro, os demais entes da Federação. Não há como 
enquadrar no dispositivo a hipótese do artigo 36, caput, da LRF. 
 
Tem sido dito que o impeachment é questão muito mais política do que jurídica. 
 
A afirmação não encontra respaldo na Constituição brasileira. 
 
O crime de responsabilidade é um ilícito constitucional que exige o enquadramento em tipos legais, 
ainda que menos precisos do que os da legislação criminal. A Câmara dos Deputados (no juízo de 
admissibilidade) e o Senado Federal (no processo e julgamento) devem imputar ao Presidente da 
República a prática de um ato juridicamente ilícito, devidamente comprovado, e tipificado na 
legislação especial. 
 
Não se pune um Presidente com o impeachment por governar mal ou por ter as suas contas 
rejeitadas e sim por haver cometido crime de responsabilidade. 
 
Entendo que não foi esse o caso da Presidente Dilma, ao menos tendo como lastro factual as 
irregularidades apuradas pelo TCU em relação às contas de 2014. 
 
E haveria, ainda, outro impedimento à instauração do processo de impeachment, que se destina a 
apear do cargo a autoridade acusada. A natureza do crime de responsabilidade e a finalidade do 
processo de impeachment indicam a inviabilidade jurídica de se responsabilizar o mandatário por 
fatos anteriores ao mandato em curso, mesmo tendo ocorrido a reeleição para o mesmo cargo. É 
por esse motivo que não se recebe a denúncia quando o Presidente já houver, por qualquer 
motivo, deixado o cargo (art. 15 da Lei Federal n. 1.079). 
 
A hipótese encontra um paralelo na legislação estatutária dos servidores públicos. Um servidor que 
se exonera do cargo ou é dele demitido (rompimento de vínculo funcional), mas que retorna ao 
serviço público da mesma entidade política, mediante novo concurso, não pode ser apenado por 
ato ilícito praticado enquanto ocupante do cargo correspondente ao primeiro provimento. 
 
Não estou a dizer que a crise política, econômica e moral em que se encontra mergulhada a Nação 
não é grave. É gravíssima e sem precedentes. Não pode ser resolvida, entretanto, sem o respeito 
exemplar aos ditames do Estado de Direito. A meu juízo, a crise ora vivenciada é conjuntural no 
plano econômico, mas estrutural nos planos institucional e moral. É preciso buscar no 
aprimoramento das instituições políticas brasileiras a esperança de dias melhores. 
 
Nesse sentido, concluo que a pretensão de, inadequadamente, imputar à Presidente Dilma crime 
de responsabilidade, encobre as soluções insatisfatórias do presidencialismo de coalisão (hoje, de 
“colisão”...) brasileiro. O governante ímprobo deve ser apeado do poder pela jurisdição (por crime 
comum ou de responsabilidade); o governante desastrado, atrabiliário, inconsequente ou sem 
respaldo popular deve ser afastado do cargo pelas engrenagens da responsabilidade política, 
instrumental próprio dos sistemas parlamentaristas.

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