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Disciplina de Comunicação – Professor Gilberto Fonseca Intertextualidade Você já parou para pensar de onde vem a inspiração quando elaboramos um texto, criamos uma história, compomos uma música, fazemos um desenho? Já parou para refletir que tudo o que é elaborado se baseia na experiência de vida, nas coisas que você já viu ou já leu? Além disso, é comum nos deparamos com certos trechos de músicas, de filmes, de poemas e termos a sensação de que já vimos algo parecido antes. Será que cabe aqui aquele velho ditado que diz que “Hoje nada se cria, tudo se copia?”. Na verdade, há, muitas vezes, uma recriação, uma releitura de textos e isso não quer dizer que a criatividade não seja explorada. Observe: A campanha publicitária da Rede de hortifrutigranjeiros Hortifruti é um exemplo de como se pode explorar essa relação entre diferentes obras. Famosos filmes serviram de pano de fundo para a campanha, que criou títulos de filmes, a partir de outros já existentes. Note que a função lúdica da propaganda está aliada ao ato de fazer com que o leitor note esse diálogo. A aproximação de “Hollywood” com “Hortifruti”; o nome “E o coentro levou” fazendo referência ao clássico “E o vento levou”; “Limão impossível 3” brincando com o famoso “Missão impossível 3”; “A incrível rúcula” no lugar de “O incrível Hulk”; além da relação estabelecida com filme o Diabo veste Prada e com o sucesso do cinema nacional Tropa de Elite – tudo isso mostra que os anúncios dialogam com os filmes. A esse diálogo damos o nome de intertextualidade. Cultura é fundamental! Muitas vezes, para que uma intertextualidade seja de fato percebida, é importante que o leitor possua um conhecimento prévio de determinadas obras. É muito frequente um texto retomar passagens de outro. Essa intertextualidade pode ser feita de forma implícita, normalmente em textos literários, ou seja, não há necessariamente uma indicação do autor ou da obra de onde foram retiradas determinadas passagens citadas, pois se pressupõe que o leitor compartilhe com o escritor um conjunto de informações a respeito das obras que formam certo universo cultural. Outros exemplos: Provérbios populares Canção de Chico Buarque “Uma boa noite de sono combate os males” “Quem espera sempre alcança” “Faça o que eu digo, não faça o que eu faço" “Pense, antes de agir” “Devagar se vai longe” “Quem semeia vento, colhe tempestade” Bom Conselho Ouça um bom conselho Que eu lhe dou de graça Inútil dormir que a dor não passa Espere sentado Ou você se cansa Está provado, quem espera nunca alcança Venha, meu amigo Deixe esse regaço Brinque com meu fogo Venha se queimar Faça como eu digo Faça como eu faço Aja duas vezes antes de pensar Corro atrás do tempo Vim de não sei onde Devagar é que não se vai longe Eu semeio vento na minha cidade Vou pra rua e bebo a tempestade (Chico Buarque, 1972) Quadrilha Quadrilha da sujeira João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém. João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento, Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia, Joaquim suicidou-se e Lili casou-se com J. Pinto Fernandes que não tinha entrado na história. (Carlos Drummond de Andrade) João joga um palitinho de sorvete na rua de Teresa que joga uma latinha de refrigerante na rua de Raimundo que joga um saquinho plástico na rua de Joaquim que joga uma garrafinha velha na rua de Lili. Lili joga um pedacinho de isopor na rua de João que joga uma embalagenzinha de não sei o quê na rua de Teresa que joga um lencinho de papel na rua de Raimundo que joga uma tampinha de refrigerante na rua de Joaquim que joga um papelzinho de bala na rua de J.Pinto Fernandes que ainda nem tinha entrado na história. Ricardo Azevedo (”Você Diz Que Sabe Muito, Borboleta Sabe Mais”, Fundação Cargill) TIPOS DE INTERTEXTUALIDADE PARÁFRASE O vocábulo “paráfrase” vem do grego “para-phrasis”, que significa a repetição de uma sentença. Esse tipo de relação intertextual consiste em reproduzir um texto ou parte dele explicitamente, com outras palavras, sem que a ideia original seja alterada. Vejam o exemplo a seguir, do poeta Carlos Drummond de Andrade: Canção do exílio Gonçalves Dias Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá; As aves, que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá. Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer eu encontro lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Minha terra tem primores, Que tais não encontro eu cá; Em cismar – sozinho, à noite– Mais prazer eu encontro lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Não permita Deus que eu morra, Sem que eu volte para lá; Sem que desfrute os primores Que não encontro por cá; Sem qu'inda aviste as palmeiras, Onde canta o Sabiá. Nova Canção do Exílio Carlos Drummond de Andrade Um sabiá na palmeira, longe. Estas aves cantam um outro canto. O céu cintila sobre flores úmidas. Vozes na mata, e o maior amor. Só, na noite, seria feliz: um sabiá, na palmeira, longe. Onde é tudo belo e fantástico, só, na noite, seria feliz. (Um sabiá,na palmeira, longe.) Ainda um grito de vida e voltar para onde é tudo belo e fantástico: a palmeira, o sabiá, o longe. Note como há uma semelhança com o texto inicial “Canção do exílio”. O texto de Carlos Drummond de Andrade, intitulado como a “Nova canção do exílio”, retoma a ideia presente no texto de Gonçalves Dias, arrumando-a com outras palavras, porém, sem alterar o sentido original. Dessa forma, podemos afirmar que “Nova canção do exílio” é uma paráfrase do texto “Canção do exílio”. � PARÓDIA No caso da paródia, o texto original é retomado, de forma que seu sentido passa a ser alterado. Normalmente, a paródia apresenta um tom crítico, muitas vezes, marcado por ironia. Tendo como texto-base – a “Canção do exílio”, de Gonçalves Dias, analisemos o texto a seguir, do poeta modernista Murilo Mendes: Repare como a paródia de Murilo Mendes satiriza o texto original de Gonçalves Dias. A intenção não é mais a de exaltação da pátria; o sentido original foi alterado. Dessa forma, podemos dizer que a paródia é a intertextualidade das diferenças. Canção do exílio Murilo Mendes Minha terra tem macieiras da Califórnia onde cantam gaturamos de Veneza. Os poetas da minha terra são pretos que vivem em torres de ametista, os sargentos do exército são monistas, cubistas, os filósofos são polacos vendendo a prestações. A gente não pode dormir com os oradores e os pernilongos. Os sururus em família têm por testemunha a Gioconda. Eu morro sufocado em terra estrangeira. Nossas flores são mais bonitas nossas frutas mais gostosas mas custam cem mil réis a dúzia. Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade e ouvir um sabiá com certidão de idade! “Intertextualidade” diz respeito a uma ideia situada dentro de outra.”
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