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Gado de Corte Fábio Luiz Buranelo Toral Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho C A P Í T U L O 1 1. Introdução A cadeia produtiva da carne bovina é constantemente desafiada a melhorar a qualidade do produto, seus índices produtivos e sua rentabilidade. Por isso, vá- rias tecnologias podem ser utilizadas para que a atividade seja sustentável nos aspectos econômico, ambiental e social. Entre estas tecnologias, temos aquelas relacionadas ao gerenciamento (ferramentas de controle de estoque, treinamen- to de pessoal, comercialização etc.), à nutrição (intensificação da utilização das pastagens, suplementação estratégica etc.), à sanidade do rebanho (vacinações e outros mecanismos de prevenção de doenças), ao manejo dos animais (insta- lações e equipamentos adequados e manejo racional dos animais, por exemplo) e ao melhoramento genético do rebanho. Existem duas ferramentas básicas para o melhoramento genético dos rebanhos: a seleção e os sistemas de acasalamentos. A seleção é a escolha dos indivíduos que serão pais da próxima geração e deve ser realizada continuamente ao longo de todas as gerações. Após a seleção, os casais são formados e os critérios considerados na formação dos casais são determinados pelo sistema de acasala- mento escolhido. Considerando os animais de um rebanho que estejam aptos à reprodução, três sistemas de acasalamentos podem ser praticados: Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho 14 IEPEC » acasalamento ao acaso: qualquer macho tem a mesma chance de se acasalar com qualquer fêmea e vice-versa. Essa situação acontece quando os reprodutores (machos e fêmeas, independen- temente de suas composições genéticas) são mantidos em um único lote durante a estação de monta; » acasalamento de semelhantes: neste tipo de acasalamento, os casais são formados com base em suas semelhanças (de ordem fe- notípica e, ou, genética), de forma que os melhores machos são aca- salados com as melhores fêmeas e os piores machos são acasalados com as piores fêmeas. Quando esta semelhança é de natureza feno- típica, ela é baseada naquelas características que são medidas nos animais, por exemplo: peso, idade ao primeiro parto, conformação etc. Quando a semelhança é de ordem genética, ela é baseada na composição genética dos animais, ou seja, nos seus valores genéticos para aquelas características consideradas. É claro que os animas não são agrupados “apenas pelos seus fenótipos” ou “apenas pelo seus genótipos” porque, do ponto de vista do melhoramento genético, os animais de melhor genótipo também são aqueles de melhores fenó- tipos, pelo menos numa parcela representativa dos casos. Também é importante ressaltar que “piores machos” e “piores fêmeas” referem- se aos reprodutores que já fazem parte do grupo escolhido para pro- duzir a próxima geração, sem qualquer relação com a necessidade de se escolherem os piores touros e piores vacas para serem pais. Na prática, especialmente quando a inseminação artificial é utilizada como método de reprodução, este sistema de acasalamento acon- tece com bastante frequência porque os criadores preferem usar o sêmen dos touros com melhor fenótipo (geralmente mais caros) em suas melhores vacas (fenotipicamente). Quando a medida de seme- lhança considerada é de natureza genética, ou seja, os casais são for- Capítulo 1 Introdução 15O portal do agroconhecimento mados por animais geneticamente semelhantes, temos um sistema de acasalamento chamado endogamia. A endogamia pode ser uma opção quando há interesse na formação de grupos de animais homo- gêneos (familias ou linhagens). Como consequência da endogamia, há formação de linhagens divergentes (há homogeneidade dentro da linhagem e heterogeneidade entre linhagens) que, dependendo do interesse, poderão ser acasaladas posteriormente. Na prática, os criadores tendem a evitar a endogamia para reduzir a ocorrência de doenças genéticas e principalmente para evitar a redução da perfor- mance reprodutiva do rebanho; » acasalamento de dessemelhantes: nesta situação, os casais são for- mados com base em suas diferenças, ou seja, o melhor macho será acasalado com a pior fêmea e vice-versa. Novamente, esta medida de diferença pode ser baseada nos fenótipos ou nos genótipos dos ani- mais. Este sistema de acasalamento acontece quando uma vaca porta- dora de um fenótipo indesejável para uma característica (garupa muito inclinada ou umbigo muito penduloso, por exemplo) é acasalada com um macho portador do fenótipo desejável (garupa menos inclinada ou umbigo menos penduloso) para a mesma. Em alguns casos, este sistema de acasalamento é conhecido com acasalamento corretivo. Se o conceito de diferença genética for levado ao extremo, tem-se o aca- salamento de indivíduos de espécies diferentes, também chamado de hibridação. Se os indivíduos do mesmo casal são de raças, linhagens ou grupos genéticos diferentes, tem-se os cruzamentos. Numa situação comercial, a seleção e os sistemas de acasalamentos devem ser utilizados conjuntamente para que ambos contribuam para aumentar a produti- vidade e a rentabilidade do sistema de produção. Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho 16 IEPEC 1.1 Definição O cruzamento é um dos sistemas de acasalamentos e consiste do acasalamento de indivíduos de raças, grupos genéticos ou linhagens diferentes. 1.2 Objetivo Do ponto de vista econômico, o cruzamento, assim como qualquer outra tecno- logia aplicada à produção animal, tem por objetivo aumentar a lucratividade e garantir a sustentabilidade dos sistemas de produção. 1.3 Vantagens e desvantagens gerais Considerando os aspectos biológicos, o cruzamento de raças permite formar uma base genética ampla para o desenvolvimento de novas raças, combinar carac- terísticas desejáveis de duas ou mais raças, explorar a complementaridade e a heterose (Alencar & Barbosa, 2003). Por outro lado, as exigências nutricionais dos animais cruzados podem ser diferentes das exigências dos animais puros em função de diferenças de desempenhos, os animais cruzados podem necessitar de tratamentos sanitários diferenciados ou podem apresentar problemas de adapta- ção ao clima tropical e, de modo geral, há necessidade de maior capacidade de gerenciamento das atividades nos sistemas de produção que utilizam animais de vários grupos genéticos. As vantagens e desvantagens do cruzamento de raças bovinas dependem muitas vezes das condições ambientais (clima, nutrição, sanidade, manejo, gerencia- mento, etc.) disponíveis para sua aplicação. Então, os aspectos relacionados a seguir devem ser vistos com cautela antes de qualquer generalização. Capítulo 1 Introdução 17O portal do agroconhecimento 1.3.1 Vantagens » O cruzamento de raças permite aumentar a variabilidade genética num rebanho para iniciar um processo de seleção ou formar linha- gens divergentes. » Quando não existe um raça já estabelecida com todas as caracte- rísticas desejáveis para um sistema de produção, é possível utilizar o cruzamento para obter o genótipo desejado. » A utilização de cruzamentos permite aumentar a eficiência pro- dutiva de um sistema por meio da utilização racional de raças maternas e paternas especializadas. Neste caso, raças maternas puras (ou mesmo cruzadas), de tamanho adulto pequeno ou mé- dio e com pequena exigência de mantença e boas características reprodutivas e maternas podem ser acasaladas com machos de raças terminais com taxas elevadas de ganho de peso e boas ca- racterísticas de carcaça. » No cruzamentode raças é possível explorar o fenômeno da hetero- se. Este fenômeno será explicado posteriormente com mais detalhes, mas ele consiste basicamente da diferença nas médias dos desem- penhos da progênie e dos pais, para uma característica específica. » A utilização do cruzamento de bovinos de corte é uma manei- ra rápida e flexível de atender a uma demanda mercadológica específica. Por exemplo: se o mercado precisa de carcaças mais pesadas, é possível aumentar o peso das carcaças produzidas e atender a esta demanda realizando o cruzamento do gado zebu- íno com uma raça europeia de grande porte (Simental, Limousin, Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho 18 IEPEC Charolês, etc.); por outro lado, se o mercado precisa de carcaças com maior quantidade de gordura, de cobertura e de marmoreio, o cruzamento com raças britânicas é uma opção interessante (An- gus, Hereford etc.). 1.3.2 Desvantagens » O crescimento de um animal depende de sua composição ge- nética e das condições ambientais disponíveis (nutrição, manejo, sanidade etc). Animais com diferentes composições genéticas po- dem possuir potenciais de crescimento e exigências nutricionais diferenciados. A implicação prática deste fato é a necessidade de condições de criação específicas para cada grupo genético, princi- palmente para aqueles mais divergentes. Por exemplo: bezerros F1, filhos de touros Angus x vacas Nelore ganham mais peso do nascimento à desmama do que bezerros Nelore, mas necessi- tam de maior ingestão de energia metabolizável (Calegare et al., 2009). Portanto, se o sistema de produção não estiver preparado para atender a estas particularidades, a superioridade dos animais cruzados pode ficar comprometida. » Os animais cruzados são mais susceptíveis às infestações naturais de carrapatos (Rhipicephalus (Boophilus) microplus), moscas-dos- chifres (Haematobia irritans) e bernes (larvas de Dermatobia ho- minis) do que o gado Nelore (Silva et al., 2010a). » Num sistema de produção que utiliza animais cruzados (ciclo com- pleto), é comum a existência de mais de dois grupo genéticos. Se o sistema de cruzamento utilizado for o cruzamento industrial (tam- bém conhecido como cruzamento terminal simples), uma parte Capítulo 1 Introdução 19O portal do agroconhecimento das vacas será acasalada com touros de raças zebuínas (monta natural ou inseminação artificial) para a produção dos animais ze- buínos de reposição (especialmente fêmeas) e a outra parte será acasalada com touros de raças europeias (ou mesmo com outra raça zebuína, por meio de monta natural ou inseminação artificial, dependendo da raça escolhida) para a produção dos bezerros cru- zados (F1). Nesse caso, haverá acasalamentos de vacas zebuínas com touros zebuínos e produção de bezerros zebuínos e acasala- mentos de vacas zebuínas com touros europeus e produção de be- zerros cruzados, ou seja, dois tipos de acasalamentos e dois tipos de produtos. Esses produtos possuem potenciais de adaptação e de crescimento diferentes e, portanto, precisam ser criados de ma- neiras diferentes. Agora considere que o produtor tenha interesse em explorar a precocidade sexual das fêmeas F1 e resolva aca- salar estas fêmeas com uma macho de uma terceira raça (cruza- mento terminal clássico), a raça terminal. Este novo acasalamento resultará em produtos “three-cross”, com potenciais de crescimen- to, de adaptação e exigências nutricionais diferenciadas. O mes- mo acontecerá com o grupo de vacas F1, que também exigem condições de criação diferenciadas em relação aquelas das vacas zebuínas. No final das contas, no cruzamento terminal clássico, existirão dois grupos genéticos de vacas (zebuínas e F1), três tipos de acasalamento (vacas zebuínas x touros zebuínos, vacas zebuí- nas x touros europeus ou zebuínos de raça diferente e vacas F1 x touros terminais) e três grupos de produtos (zebuínos, F1 e three- cross). Se a empresa rural não estiver organizada de maneira sa- tisfatória para gerenciar as atividades necessárias (administrativas e de manejo), a superioridade do cruzamento pode ser subapro- veitada e a relação custo x benefício pode se tornar desfavorável. Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho 20 IEPEC 1.4 Heterose O termo heterose foi proposto em 1914 por um geneticista de plantas americano chamado George Harrison Shull (1874 – 1954) (Shull, 1948). De forma objetiva, este termo representa a diferença da média de desempenho, para uma carac- terística qualquer, da progênie cruzada em relação à média das raças parentais, ou seja: H x = X Cruzados - X puros Onde: » Hx representa a heterose para a característica X; » X Cruzados representa a média da característica X no grupo de ani- mais cruzados; » X puros representa a média da característica X no grupo das raças parentais. Da forma apresentada anteriormente, a unidade de me- dida da heterose é a mesma utilizada na mensuração da carate- rística X. Se X for o peso, avaliado em kg, a heterose também será avaliada em kg. Se X for a idade ao primeiro parto, avaliada em dias, a heterose também será avaliada em dias. Também é possível expressar a heterose em percentual, como uma relação da diferença dos grupos cruzados e puros em relação à média das raças parentais: H x% = x 100% X Cruzados - X puros X puros Capítulo 1 Introdução 21O portal do agroconhecimento Isso facilita as comparações dos efeitos dos cruzamentos sobre diferentes ca- racterísticas porque permite a expressão das heteroses observadas para várias características em uma única unidade, o percentual. Existem três tipos de heterose, definidas das seguintes maneiras por Pereira (2008): » heterose individual: alteração na performance em um animal in- dividualmente (em relação à média das raças parentais) que não é atribuível aos efeitos maternos, ou paternos, ou ainda ligados ao sexo. É função das combinações alélicas presentes na geração corrente; » heterose materna: refere-se à heterose na população atribuível à utilização de fêmeas cruzadas ao invés de puras, (como, por exemplo, a produção de leite, melhoria do ambiente pré-natal etc); » heterose paterna: refere-se a qualquer vantagem na utilização de touros cruzados versus touros puros sobre a performance da progênie. Tanto a heterose materna como a paterna são funções de combinações alélicas presentes na geração anterior. Na bovinocultura de corte há mais interesse no aproveitamento das heteroses in- dividual e materna. Para exemplificar o cálculo da heterose individual, considere os dados apresentados na tabela 1.1. Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho 22 IEPEC Tabela 1.1 - Médias ajustadas para o peso de carcaça de novilhos (em quilogramas), de acordo com as raças parentais Raça do pai Raça da mãe Charolês Nelore Charolês 241 251 Nelore 250 208 Fonte: adaptado de Vaz & Restle (2001). A heterose individual para peso de carcaça (PC) pode ser calculada como: H = = 250,5 - 224,5 = 26kg- 251 + 250 2 241 + 208 2 I PC H = x 100% = 11,6% 250,5 + 224,5 224,5 I PC% Naturalmente, a heterose pode ser positiva quando a média dos animais cruzados é numericamente maior que a média dos animais puros, ou negativa quando acontece o contrário. O fato da heterose positiva ser favorável ou desfavorável depende da característica em questão. Se o interesse for aumentar a média da característica, é desejável que a heterose seja positiva (para alguns pesos, ganhos em peso,rendi- mento de carcaça e taxas de fertilidade, por exemplo). Se o interesse for reduzir a média da característica, é desejável que a heterose seja negativa (idade ao primeiro parto, intervalo de partos e conversão alimentar, por exemplo). A heterose materna pode ser estimada a partir da diferença das médias dos desempenhos das progênies de vacas cruzadas e vacas puras. Para estimar este tipo de heterose é necessário que alguns grupos genéticos específicos sejam produzidos, conforme apresentado na tabela 1.2. Capítulo 1 Introdução 23O portal do agroconhecimento Tabela 1.2 - Médias ajustadas para o peso aos 8 meses de idade (em quilogramas), de acordo com o as raças parentais. Raça do pai Raça da mãe Charolês Nelore ½ Charolês + ½ Nelore Charolês 140 132 157 Nelore 155 114 126 Fonte: adaptado de Pereira et al. (2000). A heterose materna para peso aos 8 meses de idade (P8) pode ser calculada como: H = = 141,5 - 135,25 = 6,25kg- 157 + 126 2 140 + 114 + 132 + 155 2 M P8 H = x 100% = 4,6% 141,5 - 135,5 135,5 M P8% Se houvesse interesse em calcular a heterose paterna para alguma característica, seria necessário delinear um trabalho com a utilização de touros F1. O número de trabalhos realizados para cálculo de heterose paterna em bovinos de corte é muito pequeno já que este tipo de heterose é pouco explorado nos sistemas de cruzamento utilizados no Brasil porque a utilização de touros F1 não é rotineira. A heterose, quantificada com base nos dados fenotípicos, é o resultado da ação gênica não aditiva e pode ser explicada, pelo menos parcialmente, pela existência de dominância, sobredominância e epistasia (Pereira, 2008). Em função de ser o resultado da ação gênica não aditiva, a heterose geralmente é maior para aque- las características de menor herdabilidade, que sofrem mais influencia dos efeitos genéticos não aditivos e do meio ambiente, como as características de fertilidade, sobrevivência e outras relacionadas com a reprodução. Isto pode ser verificado a partir Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho 24 IEPEC de uma análise dos resultados apresentados nas tabelas 1.3. e 1.4. Tabela 1.3 - Heteroses individual e materna (em %) para caracterís- ticas economicamente importantes de bovinos de corte. Referência Característica Ra- ças Tipo de heterose Individual Materna Roso & Fries (2000) Ganho do nascimento à desmama N e A 9,1 15,5 Restle et al. (1999) Peso de bezerras aos 7 meses N e C 13,0 - Pereira et al. (2000) Peso de bezerros aos 8 meses N e C 12,6 4,6 Pereira et al. (2000) Ganho do nascimento aos 24 meses N e C 22,2 3,1 Restle et al. (1999) Peso de novilhas aos 28 meses N e C 13,5 - Restle et al. (1999) Peso de novilhas à puberdade N e C 6,1 - Restle et al. (1999) Idade de novilhas à puberdade N e C -12,9 - Restle et al. (1999) Percentagem de prenhez N e C 33,3 - Restle et al. (2005) Produção diária de leite N e C 44,2 - Raças: A = Angus; C = Charolês; e N = Nelore. Capítulo 1 Introdução 25O portal do agroconhecimento Tabela 1.4 - Médias do desempenho de animais zebuínos e cru- zados (de vários grupos genéticos e sistemas) para características economicamente importantes na bovinocultura de corte. Característica Zebuínos Cruzados Diferença (%) Peso de carcaça (kg) 225,1 238,6 6,0 Idade de abate (meses) 29,8 25,9 -13,1 Espessura de gordura na carcaça (mm) 4,53 3,41 -24,7 Idade das fêmeas à puberdade (meses) 31,9 23,0 -27,9 Peso das fêmeas à puberdade (kg) 272,8 294,7 8,0 Idade ao primeiro parto (meses) 44,2 39,7 -10,2 Peso ao primeiro parto (kg) 405,0 432,5 6,8 Intervalo de partos (meses) 15,9 15,7 -1,3 Taxa de gestação (%) 66,5 75,4 13,4 Fonte: Adaptado de Barbosa (2010). De modo geral, a heterose é inversamente proporcional à herdabilidade da ca- racterística (Pereira, 2008). Portanto, o cruzamento é a ferramenta mais eficiente para melhorar aquelas características relacionadas à reprodução e sobrevivência. Para aquelas características relacionadas ao crescimento, que geralmente pos- suem herdabilidades maiores e são menos influenciadas pelos efeitos genéticos não aditivos, o processo de seleção é eficiente para promover alterações em suas médias. A heterose também depende das raças envolvidas no cruzamento, como pode ser observado na tabela 1.5. Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho 26 IEPEC Tabela 1.5 - Diferenças para ganho em peso do nascimento à desmama (GND) e peso à desmama (PD) de bezerros cruzados em relação ao Nelore (em %). Referência Grupo gené- tico GND PD Cubas et al. (2001) F1 GU x N 5,6 4,6 Cubas et al. (2001) F1 RA x N 22,9 18,5 Cubas et al. (2001) F1 M x N 14,3 14,6 Muniz & Queiroz (1998) F1 AA x N 4,4 4,3 Muniz & Queiroz (1998) F1 B x N 2,4 2,5 Muniz & Queiroz (1998) F1 CA x N 6,1 5,6 Muniz & Queiroz (1998) F1 GE x N 9,0 8,3 Muniz & Queiroz (1998) F1 S x N 7,2 6,6 Raças: AA = Aberdeen Angus; B = Brangus; CA = Canchim; GE = Gelbvieh; GU = Guzerá; M = Marchigiana; N = Nelore; RA = Red Angus; e S = Simental. A heterose é maior quanto maior for a diferença das raças envolvidas. Os dados de Cubas et al. (2001) demonstram que as superioridades dos animais F1 Red Angus x Nelore e F1 Marchigiana x Nelore, em relação ao Nelore, são maiores que a superioridade dos animais F1 Guzerá x Nelore, em relação ao Nelore, para as características pré-desmama consideradas (tabela 1.5.). Essa tendência tam- bém pode ser observada para características pós-desmama, conforme os dados apresnetados na tabela 1.6. Capítulo 1 Introdução 27O portal do agroconhecimento Tabela 1.6 - Diferenças para ganho médio diário da desmama aos 12 meses (GMDD12) e peso aos 12 meses (P12) de bezerros cruzados em relação ao Nelore (em %). Grupo genético GMDD12 P12 F1 GU x N 16,2 7,8 F1 RA x N 48,2 26,3 F1 M x N 42,5 21,1 Fonte: Adaptado de Perotto et al. (2001). Raças: GU = Guzerá; M = Marchigiana; N = Nelore; e RA = Red Angus. Em geral, quanto mais divergentes forem as raças, maior será o valor da hetero- se. Uma explicação para este fato é que à medida que as raças se diferenciam, aumenta a proporção de loci fixados com alelos diferentes nas raças parentais e maior será o número de loci em heterozigose na progênie resultante do cru- zamento (Simm, 2000). Então, seria mais viável realizar o cruzamento de raças zebuínas com raças europeias do que cruzar raças zebuínas com raças zebuínas e raças europeias com raças europeias. Contudo, quando houver limitação de ordem nutricional ou ambiental (clima), o cruzamento de raças zebuínas (Nelore x Guzerá, Nelore x Tabapuã, Nelore x Brahman, por exemplo) pode ser a única op- ção viável, já que os cruzamentos de raças zebuínas com raças europeias podem resultar em animais com maiores exigências nutricionais e menos adaptados às condições de criação. Em algumas situações, os resultados dos cruzamentos só serão favoráveis se as condições nutrionais forem adequadas, conforme apresentado na tabela 1.7. Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho 28 IEPEC Tabela 1.7 - Diferenças para consumo de matéria seca (CMS), ga- nho médio diário (GMD) e conversão alimentar (CA) dos 11 meses ao abate de animais cruzados em relação ao Nelore (em %), de acordo com a dieta. Feno de tanzânia + 0,6 kg de soja Feno de tanzânia + concentrado Grupo gené- tico CMS GMD CA CMS GMD CA F1 AA x N 26,5 15,8 5,8 18,9 14,9 3,5 F1 S x N 29,5 26,3 2,6 15,7 20,3 -3,8 Raças: AA = Aberdeen Angus; N = Nelore; e S = Simental. Fonte: adaptado de Euclides Filho et al.(2001). Os animais cruzados que receberam a dieta composta por feno de tanzânia e 0,6 kg de soja consumiram mais matéria seca que os animais Nelore (26,5 a 29,5%), mas o ganho médio diário não aumentou na mesma proporção do consumo (15,8 a 26,3%), uma vez que as médias das conversões alimentares dos animais cruzados foram piores que a conversão alimentar dos animais Nelore (Euclides Filho et al., 2001). Se a conversão alimentar for considerada como uma medida de eficiência nutricional (quantidade de alimento necessária para o ganho de um quilo de peso corporal), pode-se inferir que o ganho médio diário dos animais cruzados é mais caro do que o ganho dos animais zebuínos. Por outro lado, quando a dieta oferecida foi de melhor qualidade (feno de tanzânia e concen- trado), os animais F1 Simental x Nelore tiveram maior ingestão de matéria seca (15,7%), ganharam mais peso (20,3%) e foram mais eficientes na transformação do alimento ingerido em peso corporal (Euclides Filho et al., 2001). Para os animais criados predominantemente em pastagens, também é importan- te considerar as características regionais (temperatura, umidade, pluviosidade, tipo de solo, intensificação da utilização das pastagens etc.) no planejamento Capítulo 1 Introdução 29O portal do agroconhecimento dos cruzamentos, uma vez que as diferenças entre grupos genéticos dependem das regiões de criação (Teixeira et al., 2006). Na prática isto significa que o cruzamento recomendado para uma região (ou fazenda) pode não ser a melhor opção para outra (região, ou fazenda da mesma região). O ambiente de criação pode influenciar as heteroses individual e materna e as decisões sobre o sistema de cruzamento e sobre as raças utilizadas devem ser tomadas mediante uma análise criteriosa dos objetivos e das condições impostas pelo sistema de produção. Cruzamentos e raças sintéticas em gado de corte Melhoramento genético para seu rebanho 30 IEPEC Material Complementar .pdf Efeitos de Raça e Heterose na Composição Física da Carcaça e na Qualidade da Carne de Novilhos da Primeira Geração de Cruzamento entre Charolês e Nelore capitulo-1-arquivo-1.pdf Grupo Genético e Heterose na Produção de Leite de Vacas de Corte Submetidas a Diferentes Sistemas de Alimentação capitulo-1-arquivo-2.pdf Efeito de Raça e Heterose para Características de Carcaça de Novilhos da Primeira Geração de Cruzamento entre Charolês e Nelore capitulo-1-arquivo-3.pdf Desenvolvimento Ponderal de Bovinos de Corte de Diferentes Grupos Genéticos de Charolês X Nelore Inteiros ou Castrados aos Oito Meses capitulo-1-arquivo-4.pdf Efeito de Grupo Genético e Heterose Sobre a Idade e Peso à Puberdade e Sobre o Desempenho Reprodutivo de Novilhas de Corte capitulo-1-arquivo-5.pdf www. i e p e c . c om O Instituto de Estudos Pecuários é um portal que busca difundir o agroconhecimento, realizando cursos e palestras tanto presenciais quanto online. Mas este não é nosso único foco. Com o objetivo principal de levar conhecimento à comunidade do agronegócio, disponibilizamos conteúdos gratuitos, como notícias, artigos, entrevistas entre outras informações e ferramentas para o setor. Através dos cursos on-line, o IEPEC oferece a oportunidade de atualização constante aos participantes, fazendo com que atualizem e adquiram novos conhecimentos sem ter que gastar com deslocamento ou interromper suas atividades profissionais. capa capitulo-1 contra
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