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Antropologia da mídia - novas possibilidades

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1	
  
Antropologia da Mídia: novas possibilidades de campo1 
 
Bruno Campanella (UFRJ/Brasil) 
Fernanda Martineli (UnB/Brasil) 
 
O presente artigo tem como objetivo refletir sobre as possibilidades de articulação entre 
os campos da comunicação e da antropologia. Mais especificamente, busca-se pensar 
acerca das limitações e dos benefícios da adoção tanto da etnografia, quanto de 
conceitos como religião, mito e ritual nos estudos contemporâneos de comunicação, 
refletindo como a antropologia traz possibilidades analíticas que incorporam novas 
dimensões aos estudos dos produtos e processos comunicacionais e não restringe o 
consumo midiático a estruturas sociais de ordem política ou econômica. Nesse contexto, 
a “antropologia da mídia” emerge como um campo de estudos interdisciplinar que 
permite abordar a comunicação e os meios de comunicação de massa a partir de 
sistemas culturais mais amplos de produção e consumo de sentidos, levando em conta 
sociabilidades e processos de interação mobilizados pelos meios massivos mas que não 
são endógenos, uma vez que reverberam no contexto social mais amplo. 
Simultaneamente serão discutidas algumas críticas comumente feitas ao uso, por vezes 
considerado banalizado, de importantes conceitos e metodologias da antropologia pela 
comunicação. Nesse sentido, cabe apontar a relevância deste debate também pelo fato 
de que a antropologia da mídia ainda é um campo em formação, pouco estudado no 
Brasil, que no entanto se constitui como um lugar privilegiado para investigar algumas 
das manifestações culturais mais representativas da nossa sociedade, qual seja, a cultura 
de massa. 
 
Palavras-chave: comunicação, antropologia, interlocução 
 
Introdução 
 A articulação entre os saberes da antropologia e da comunicação, prática 
comumente aludida pela denominação – pouco específica – antropologia da mídia, 
revela uma arena de debates e perspectivas instigantes para ambos os campos. De modo 
geral, essas discussões apontam para uma mobilização de esforços em função da 
consolidação e do reconhecimento de um saber que, embora desperte cada vez mais 
interesse entre acadêmicos de ambas tradições, parece não ter sido capaz de cristalizar 
um consenso a respeito dos enquadramentos e definições sobre o que é a antropologia 
da mídia, qual o seu escopo; e nem mesmo se tais limitações são desejáveis. 
É possível observar, nos últimos anos, o crescente interesse do meio acadêmico 
em sistematizar os pontos de contato entre as áreas da antropologia e da comunicação, 	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  1	
  Trabalho apresentado na 27ª. Reunião Brasileira de Antropologia, realizada entre os dias 01 e 04 de 
agosto de 2010, Belém, Pará, Brasil.	
  
	
   2	
  
de modo que as mobilizações em prol do reconhecimento dessa interlocução contribuam 
para o enriquecimento das duas tradições. O texto Anthropology and Mass Media, que 
Debra Spitulnik publicou no Annual Review of Anthropology em 1993, se constitui 
como um dos marcos iniciais desta discussão. Nele a autora afirma, logo no início, 
 
There is yet no “anthropology of mass media”. Even the intersection of 
anthropology and mass media appears rather small considering the published 
literature to date. Within the last five or so years, however, as anthropologists 
have increasingly struggled to define what falls within the legitimate realm of 
the study of “a culture” and within the privileged purview of “a discipline” 
(...), there has been a dramatic rise in interest in the study of mass media. 
Indeed, mass media themselves have been a contributing force in these 
processes of cultural and disciplinary deterritorialization. (SPITULNIK, 
1993, p. 293). 
 
Spitulnik fala da constituição de um campo então incipiente, demonstrando 
acreditar que a antropologia pode contribuir para os debates sobre a mídia porque, em 
sua tradição teórica, percebe os usos dos meios de comunicação de massa inseridos em 
uma dinâmica de realidade social mais ampla (SPITULNIK, 1993; TRAVANCAS, 
2003). A autora lança as bases para o debate sobre a possibilidade de constituição desse 
campo como uma disciplina, e defende que diante das novas tecnologias da 
comunicação e da informação, a questão que se coloca para a antropologia deve 
avançar: agora levando em conta as condições culturais mais amplas que possibilitam a 
emergência das novas mídias, bem como a economia política que impulsiona a 
circulação dos produtos midiáticos nos mais distintos contextos sociais e culturais 
(SPITULNIK, 1993, p. 307). Dessa forma, Spitulnik defende que justamente pelo fato 
dos meios de comunicação serem “de massa”, isso os coloca como um objeto que, pela 
sua própria natureza, desterritorializa qualquer tentativa de disciplinarização. 
As reflexões epistemológicas e disciplinares de Spitulnik ajudam a inaugurar um 
debate que, no entanto, só ganha impulso definitivo já nos anos 2000, quando pesquisas 
e publicações sobre o tema se tornam mais recorrentes. Os livros Media Worlds: 
anthropology on new terrain, de Ginsburg, Abu-Lughod e Larkin (2002); Rothenbhuler 
e Colmer (2005); a série Anthropology of Media, editada pela Berghahn Books e 
organizada por John Postil e Mark Petersen (Arno, 2009; Alia, 2009; Rao, 2010; 
Bräuchler & Postill, 2010); além das discussões lançadas pela European Association of 
Social Anthropology (EASA, 2008) são alguns exemplos de produções que se inserem 
nesse contexto, e dão visibilidade para a mídia como objeto de pesquisa relevante para 
se compreender aspectos sociais e interacionais típicos da atual fase da modernidade. 
	
   3	
  
Ora, uma vez que a vida contemporânea - nas suas mais diversas formas e dentro 
dos mais distintos grupos sociais - é quase que inevitavelmente atravessada pelos 
produtos culturais veiculados nos meios de comunicação de massa, é despertada uma 
atenção especial sobre os modos de produção e consumo desses discursos, formas de 
representação social do mundo e das culturas na mídia. Mas a quem cabe a tarefa de 
investigar esses processos? Como melhor enfrentar esses desafios? 
Neste artigo, procuramos traçar um breve panorama histórico e apontar para 
algumas possibilidades metodológicas de pesquisa. O objetivo aqui é refletir sobre a 
articulação entre os campos da comunicação e da antropologia. Mais especificamente, 
busca-se pensar acerca das limitações e dos benefícios da adoção de metodologias e 
ideias caras à antropologia – como a etnografia e os conceitos de religião, mito e ritual – 
nos estudos contemporâneos de comunicação. Ou seja, deseja-se ponderar sobre as 
possibilidades analíticas trazidas pela antropologia que incorporam novas dimensões 
críticas aos estudos dos produtos e processos comunicacionais, sem restringir, contudo, 
o consumo midiático às estruturas sociais de ordem política ou econômica. Nesse 
contexto, a antropologia da mídia emerge como um campo de estudos interdisciplinar 
que permite abordar a comunicação e os meios de comunicação de massa a partir de 
sistemas culturais mais amplos de produção e consumo de sentidos, levando em conta 
sociabilidades e processos de interação mobilizados pelos meios massivos que 
reverberam no contexto social. Simultaneamente, serão discutidas algumas críticas 
comumente feitas ao uso - para muitos, banalizado - de importantes conceitos e 
metodologias da antropologia pela comunicação. Nesse sentido, cabe mais uma vez 
apontar a relevância deste debate também pelo fato de que a antropologia da mídia 
ainda é um campo em formação,pouco estudado no Brasil e que, no entanto, se 
constitui como um lugar privilegiado para investigar algumas das manifestações 
culturais mais representativas da nossa sociedade. 
 
Um breve histórico 
A proposta de considerar a antropologia da mídia como uma área de contato 
formada por pesquisadores dos dois campos é explorada no trabalho de Osorio (2005). 
Segundo o autor, a antropologia começou a investigar de maneira mais sistemática a 
comunicação, especialmente a comunicação de massa, a partir da segunda metade do 
século XX. Osorio distingue alguns marcos que contribuíram para a constituição dessa 
agenda. O antropólogo chileno cita, por exemplo, o livro The Chrysanthemum and the 
	
   4	
  
Sword: Patterns of Japanese Culture, de Ruth Benedict (1946), como o pioneiro na 
antropologia moderna a estudar culturas inalcançáveis aos etnógrafos. Este livro foi 
resultado de uma pesquisa encomendada pelo governo norte-americano durante a 
segunda guerra mundial com o propósito de entender diferentes aspectos socioculturais 
da sociedade japonesa. No entanto, pelo fato de os dois países estarem em guerra, os 
antropólogos imbuídos dessa tarefa – Ruth Benedict entre eles – foram obrigados a 
abandonar a etnografia de campo tradicional, adotando, em seu lugar, uma metodologia 
que privilegia o estudo à distância da cultura. Por meio de diários, romances, filmes, 
jornais, programas de rádio, além de entrevistas com membros da comunidade 
diaspórica japonesa nos EUA, os pesquisadores buscavam mapear e entender a cultura 
do “inimigo” americano na guerra. A comunicação de massa teve papel fundamental 
nesse novo tipo de pesquisa. 
Osorio também menciona a influência que a mídia de massa exerceu no projeto 
de implementação do nacionalismo como principal sistema político no século XX. O 
trabalho de Benedict Anderson é bastante ilustrativo deste aspecto. Anderson (1983) 
argumenta que a mídia impressa, em particular os jornais, foi capaz de criar uma noção 
de comunidade imaginada em que seus membros compartilham não somente uma língua 
comum, mas também o conteúdo e o próprio hábito cotidiano dessa leitura. Ou seja, o 
indivíduo começava a se imaginar fazendo parte de uma comunidade nacional, com 
uma história e características culturais comuns – mesmo que ambas tivessem sido 
elaboradas num passado recente. Considerando a predominância do nacionalismo 
enquanto sistema político no século XX, nada mais natural para os antropólogos do que 
analisar os meios de comunicação de massa na formação da estrutura política das 
sociedades em que investigavam. 
Por último, Osorio descreve o crescente uso da antropologia para o estudo do 
desenvolvimento econômico e da difusão de valores e técnicas em diversas partes do 
mundo. Frequentemente ligadas a agências de fomento socioeconômico – tal como a 
Agency for International Development (AID) –, o autor lembra que inúmeras pesquisas 
de antropólogos nos anos 1950 eram dedicadas à difusão de novas tecnologias e à 
mudança de valores, instituições e práticas tradicionais. Já nos anos 1980 e 1990, 
segundo o antropólogo chileno, houve uma retomada dessas iniciativas 
desenvolvimentistas, porém agora com o foco no desenvolvimento ambiental e 
sustentável. Nesse contexto, a utilização de meios massivos de comunicação foi 
considerada instrumental para uma articulação eficiente desses projetos. 
	
   5	
  
Outros autores, contudo, apontam para uma genealogia distinta da que foi 
demarcada por Osorio. Esse é o caso de Rothenbuhler (2008), professor de 
comunicação da universidade do Texas, que oferece sua própria perspectiva acerca dos 
principais momentos de contato entre esses dois campos. O pesquisador norte 
americano avança nas análises de Osorio na tentativa de descrever um outro lado dessa 
equação: as origens do interesse da comunicação pela antropologia. 
Segundo Rothenbuhler, a antropologia começou a ter contato com discussões 
tradicionalmente ligadas à área de comunicação quando se voltou aos estudos do 
consumo midiático, tanto em pequenas localidades, como em grandes centros urbanos. 
A coleção organizada por Ginsburg, Abu-Lughod e Larkin (2002) é um ótimo exemplo. 
Nela, os autores investigam desde o do papel do vídeo na representação, na política e no 
imaginário cultural dos índios Caiapós, conforme apresentado por Terence Turner 
(2002), até os usos das salas de cinema no norte da Nigéria, na análise feita por Brian 
Larkin (2002). Posteriormente, teriam surgido trabalhos desenvolvidos por antropólogos 
interessados em pensar a própria indústria cultural. O autor menciona ainda o 
importante papel da antropologia visual e dos filmes etnográficos na intercessão das 
duas disciplinas. 
No que se refere ao interesse da comunicação pela antropologia, Rothenbuhler 
divide os trabalhos mais representativos em diferentes subgrupos. Um dos mais 
influentes foi o de acadêmicos que começaram a trabalhar, nos anos 70, com conceitos e 
categorias tradicionais da antropologia, tais como ritual, mito, religião e estrutura 
simbólica. Estes eram pesquisadores da área de comunicação e dos estudos culturais que 
buscavam modos alternativos de pensar a sociedade na qual estavam inseridos 
(Couldry, 2003, 2005; Dayan e Katz, 1992; Hall e Jefferson, 1976; Silverstone, 1981). 
A chamada “virada etnográfica”2 dos estudos de audiência, nos anos 1980, foi 
igualmente influente na área de comunicação. A partir de trabalhos de recepção como o 
de David Morley (1980), inspirado no modelo de codificação/decodificação de Stuart 
Hall, as pesquisas qualitativas [de audiência] começaram a incorporar preocupações 
mais amplas no que diz respeito às condições nas quais ocorriam o processo de 
consumo midiático. A prática etnográfica, tradicionalmente associada à antropologia, 	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
2 A “virada etnográfica” é um marco nos estudos de audiência. Tem como ponto de partida os Estudos 
Culturais e sua preocupação crescente em investigar com mais ênfase o papel dos meios de comunicação 
de massa na vida cotidiana do que o próprio conteúdo dos textos midiáticos. A atenção é voltada 
principalmente para os usos e apropriações dos meios pelos diversos grupos sociais. 
 
	
   6	
  
passou a ser frequentemente utilizada em combinação com técnicas anteriormente 
adotadas nos estudos de recepção. Com isso, buscou-se articular “o sempre-em-mutação 
caleidoscópio da vida cotidiana e como as mídias estão integradas e implicadas dentro 
dele” (Radway, 1988, p. 366). Ou seja, ao invés de consignar a análise da audiência à 
segmentação de grupos baseados em sistemas de diferença tradicionais na sociedade, 
tais como raça, idade, classe social e gênero, os novos estudos de audiência tentaram 
entender de que modo as práticas diárias do sujeito, responsáveis por uma densa 
cosmologia simbólica, articulam os signos produzidos pelas mídias dentro de um amplo 
universo cultural. De certo modo, os estudos de audiência começaram a incluir o que 
Clifford Geertz (1971) denomina “descrição densa”3 (thick description) dos dados de 
campo. Como exemplo, pode-se mencionar os trabalhos de Ang (1985); Radway 
(1984); La Pastina (2003); Lull (1990); Morley (1980); Tufte (2000). 
 
Antropologia da mídia: paradigmas de pesquisa e desafios em campo 
Se por um lado os antropólogos possuem uma maior tradição e 
institucionalização; o que frequentemente lhes confere mais capital simbólico enquanto 
pesquisadores, os teóricos da comunicação, por suavez, são estimulados a se pensar 
como “trabalhadores das margens”. Estão sempre tomando saberes “emprestados” de 
outras disciplinas, como a psicologia, a sociologia, a linguística, a história, a filosofia e 
a própria antropologia, problematizada nesse trabalho (Rothenbuhler, 2008, p. 7). Isso 
confere à comunicação um status de campo de natureza interdisciplinar, o que a 
princípio autorizaria o trânsito dos pesquisadores da área por disciplinas diversas e 
conexas. Rothenbuhler resume bem as novas possibilidades que essa interlocução 
metodológica com a antropologia traz para a área da comunicação: 
 
What cultural anthropology introduced when it came to 
communication late in the game, was a way to think about social 
orders that were not material or economic and did not constrain 
individual actions in those ways, but that did, nevertheless, produce 
order. Cultural anthropology provided concepts and methods for 
examining the production of social order through systems of meaning 
– and that, for students of communication, was an exciting moment. 
(ROTHENBUHLER, 2008, p. 14) 	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
3 De acordo com Geertz, (1971) essa seria uma descrição mais detalhada dos dados etnográficos, 
contendo informações capazes de transmitir contextos, intenções e sentidos presentes no objeto de estudo 
– ou seja, uma espécie de abordagem cultural que leve em conta aspectos sociais, econômicos, políticos 
do objeto. 
 
	
   7	
  
 
Contudo, se a apropriação desses conceitos tradicionais da antropologia ilumina 
e estimula o trabalho dos pesquisadores de comunicação, por um lado, por outro é visto 
com reservas por alguns críticos mais conservadores, que consideram haver aí o risco de 
uma prática pouco criteriosa. Desse modo, essa vocação interdisciplinar pode também 
ser por vezes interpretada como o telhado de vidro da comunicação – como se a 
liberdade auto-concedida para uma interlocução com diversas disciplinas adquirisse o 
sentido de uma falta de rigor teórico e metodológico. 
Nesse sentido, alguns autores afirmam que as referências antropológicas 
comumente utilizadas pelos comunicólogos são desatualizadas ou não se aplicam às 
pesquisas sobre os meios de comunicação de massa. Corner (1998), por exemplo, 
sugere que existe um certo abuso no uso do conceito de ritual por acadêmicos da área de 
comunicação, assinalando que 
 
The key problem posed by the use of the term ‘ritual’, either as a general 
perspective or as a classifier of specific media practice, seems to me to be the 
risk of unwarranted supposition about the nature of mediated ‘involvement’, 
about the kinds of self-consciousness implicated in attending to such events 
via broadcasting and therefore about the kinds of solidarity, affirmation or 
perhaps conflict which the events effectively dramatize and narrate. ‘Ritual’ 
offers a seductive short cut to ‘influence’ and use of the term seems to give 
interpretative license to anthropological ‘readings’ which, while their 
categories might be expansive and novel, are as vulnerable as any textual 
analysis on its own when it comes to engaging with the real practices of 
viewing and its uses. (CORNER, 1998, p. 417) 
 
O relato de Corner aponta para uma displicência com o uso de conceitos que 
poderia ocorrer em qualquer disciplina e, nesse sentido, parece estar mais relacionada 
com a forma como o pesquisador conduz o seu trabalho do que em virtude de seu 
pertencimento a uma disciplina propriamente dita. A apropriação de conceitos como 
figura de linguagem, com uma função quase estética no texto ou então de forma pouco 
rigorosa pode acontecer muito mais por falta de conhecimento ou de cuidado do que 
como conseqüência da filiação do pesquisador a determinada área. Nesses termos a 
crítica de Corner, entendida como algo dirigido especificamente aos pesquisadores da 
área de comunicação, soa um tanto parcial. 
Essa crítica se estende ainda às etnografias da comunicação. O menor tempo que 
os comunicólogos supostamente dedicam ao “campo” não costuma ser considerado 
suficiente pelos antropólogos mais puristas. Embora a permanência em campo durante a 
pesquisa possa ser relativamente menor se comparada com uma pesquisa de campo 
	
   8	
  
tradicional feita por um antropólogo, cabe aqui demarcar que a comunicação se ocupa 
em estudar fenômenos intrínsecos à própria sociedade à qual o pesquisador pertence. 
Isso coloca o problema da “entrada e familiarização com o campo” como algo 
experimentado de forma diferente por antropólogos e comunicólogos, uma vez que o 
pesquisador da área de comunicação não é um completo estranho ao fenômeno ou à 
língua estudada – e muitas vezes ele é o próprio “nativo”, sendo desse modo necessário 
exercitar muito mais um estranhamento do que uma familiaridade. As etnografias 
tradicionais, que são feitas em culturas radicalmente distintas daquela que o pesquisador 
conhece, pressupõem um longo tempo em campo justamente para que se aprenda uma 
nova língua, sejam apreendidos novos códigos culturais, para que seja possível alguns 
deslocamentos que exigem viagens longas para lugares geograficamente distantes do 
lugar de origem do pesquisador. Uma vez que nas etnografias da comunicação o 
pesquisador já está familiarizado com o contexto cultural dos informantes, não há 
necessidade de um longo tempo para o aprendizado da língua e de alguns códigos 
culturais. Por exemplo, o trabalho de Campanella (2010) sobre comunidades online de 
discussão de fãs do programa de televisão Big Brother Brasil ilustra com propriedade 
essa questão. Durante alguns meses, foi feita uma etnografia em fóruns e blogs 
dedicados ao programa na internet. Foram duas incursões a campo, com três meses de 
duração cada uma, referentes a duas edições do programa (sendo que três meses é o 
tempo que cada edição do programa fica no ar). Para realizar essa pesquisa não foi 
necessário um deslocamento geográfico, ou sequer um afastamento de casa, uma vez 
que o “campo” era um espaço virtual de interação entre os informantes. Mesmo que em 
certos aspectos a entrada em campo tenha se dado de forma análoga ao que 
tradicionalmente acontece em pesquisas etnográficas – com visitas frequentes e uma 
convivência intensiva para conquistar a confiança dos informantes – o fato de o 
pesquisador já conhecer diversos códigos abreviou o tempo da pesquisa4 (tanto a 	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
4 Alguns pesquisadores do campo da comunicação utilizam o termo netnography (netnografia) quando 
descrevem etnografias realizadas na internet. O neologismo foi originalmente criado por Robert Kozinets 
para descrever técnicas de pesquisa de marketing em comunidades online, posteriormente adotadas de 
modo mais amplo na academia (Kozinets, 2002). Optamos aqui por não utilizar esse conceito, alinhados 
com a perspectiva adotada por Campanella, por considerarmos que o termo netnografia descaracteriza a 
ideia por traz do conceito que o originou. Do grego, etno (povo) grafia (escrita), a etnografia enfatiza o 
ato de descrever aspectos de um povo ou de uma cultura. Já sua versão atualizada para as novas mídias 
privilegia o meio, e não os atores que realizam as interações. Implicitamente, a internet passa a ser vista 
como uma cultura independente do ser humano que a criou, e que nelaatua. Em defesa deste 
posicionamento, diferentes pesquisas etnográficas realizadas a partir de mídias mais tradicionais – assim 
como da própria internet – foram feitas sem mudar o conceito original - por exemplo, duas etnografias 
realizadas com base no estudo de cartas trocadas entre grupos de pessoas (ANG, 1985; THOMAS e 
	
   9	
  
respeito do conteúdo de debate nos fóruns, por acompanhar as exibições televisivas do 
Big Brother, quanto em relação ao domínio da língua vernacular nativa e dos códigos 
próprios da linguagem usada tipicamente em chats na internet). 
Mas mesmo diante da familiaridade problematizada acima, alguns desafios se 
impõem ao trabalho do pesquisador de comunicação, notadamente com relação ao 
exercício da relativização. Investigar um fenômeno totalmente despido de seus próprios 
valores e códigos morais é impossível, porém é viável e necessário que o pesquisador 
tenha consciência desse fato e procure dialogar com seus valores e conceitos morais5. 
Fazer pesquisa em seu próprio meio, no ambiente familiar, na própria sociedade da qual 
faz parte, pressupõe um envolvimento inevitável - mas até que ponto? Para lidar com 
essa questão da familiaridade e do distanciamento, um caminho possível para o 
pesquisador talvez seja pensar a relação dos diferentes níveis de produção cultural na 
mídia. 
Além disso, existe uma dimensão de sensorialidade e experimentação própria 
dos produtos culturais dos meios de comunicação de massa, que é um conhecimento por 
parte do informante de lugares e de culturas, bem como a vivência de formas de 
interação que acontecem sem o “estar lá” fisicamente. Esse “viajar” pelo mundo e por 
culturas através da mídia traz um conhecimento e uma propriedade narrativa muito 
peculiares aos informantes. 
Todo esse debate evidencia que, se por um lado a tradição interdisciplinar da 
comunicação traz possíveis riscos metodológicos em suas pesquisas, por outro, ela 
oferece maior liberdade no que se refere ao uso de outras tradições teóricas. Conceitos e 
metodologias não pertencentes à comunicação podem ser adotados de modo mais livre 
do que em outras disciplinas. O uso que Dayan e Katz (1992) e Couldry (2005) fazem 	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
ZNANIECKI, 1920) que, nem por isso, foram rebatizadas de letternographies (cartanografias), ou algo 
semelhante. 
5	
  Nesse aspecto, o exercício da reflexividade etnográfica, também conhecido como autoetnografia, é 
crucial. Embora os estudos de comunicação tenham atentado para sua importância em um período mais 
recente (Amaral, 2008; Hills, 2002; Kozinets 2002), a análise reflexiva do etnógrafo já é bastante 
tradicional na antropologia, especialmente após a chamada virada interpretativa que este campo 
testemunhou nas últimas décadas. As contribuições de Geertz (1971, 1988) e Clifford e Marcus (1986) 
foram particularmente importantes nesse aspecto. Esses autores deram ênfase à impossibilidade de 
apreensão do “real” pelo pesquisador. Os relatos feitos pelo etnógrafo são sempre resultado de sua 
interpretação da realidade, e nunca da descrição pura, asséptica e científica de eventos. Segundo Clifford, 
“poder e história atravessam [o relato etnográfico], de maneiras que seus autores não podem controlar 
completamente. A verdade etnográfica é, portanto, inerentemente parcial – devota e incompleta” (Clifford 
e Marcus, 1986, p. 7). A crescente preocupação com a interferência da subjetividade do pesquisador no 
resultado de seu trabalho – resultante dessa virada interpretativa – fez com que os relatos descritivos de 
campo dessem mais atenção às reflexões biográficas que posicionem esse pesquisador nas questões que o 
mesmo traz em seu objeto. 
	
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do conceito de ritual é um exemplo nesse sentido. Embora as origens dos estudos de 
comunicação estejam vinculadas a uma tradição marxista – que privilegia discussões 
acerca da ideologia capitalista na indústria cultural e do controle dos meios de produção 
na mídia de massa, uma herança frankfurtiana – Dayan e Katz (1992) e Couldry (2005) 
abordam a questão de poder na indústria midiática por um viés distinto. Por meio de 
perspectivas inspiradas em Durkheim, esses autores tentam analisar seus objetos com a 
ajuda de conceitos da antropologia ao invés das teoria de Adorno, Horkheimer ou 
Marcuse. Mesmo que as perspectivas funcionalistas presentes em Durkheim já tenham 
sido extensivamente revistas e criticadas na antropologia, elas ainda são capazes, de 
acordo com esses autores, de oferecer instigantes pontos de partida alternativos para 
analisar questões na comunicação, especialmente em pesquisas relacionadas à televisão 
e às novas tecnologias. 
Dayan e Katz (1992), por exemplo, tentam aprofundar o entendimento da relação 
entre indivíduo, sociedade e televisão quando desenvolvem o conceito de evento 
midiático. A partir deste, investigam a importância daquilo que chamam de “momentos 
liminares” da transmissão televisiva (Dayan e Katz, 1992, p. 15). Com um arcabouço 
teórico ligado à antropologia, Dayan e Katz associam as transmissões feitas “ao vivo” 
de acontecimentos de relevância nacional, ou mesmo mundial, tais como casamentos 
reais, olimpíadas e funerais de estado às cerimônias realizadas em sociedades 
tradicionais. Os pesquisadores partem da perspectiva funcionalista de Durkheim (1995 
[1912]), para afirmar que tais eventos midiáticos (ou cerimônias televisivas) exibem a 
performance de atos simbólicos conectados a valores centrais da sociedade a qual 
pertencem. Por meio da cooperação entre os organizadores desses acontecimentos 
(tipicamente instituições governamentais ou órgãos internacionais) e as empresas de 
mídia responsáveis pela transmissão dos mesmos, o público participa de momentos 
históricos que teriam a função de integrar a sociedade. Couldry (2003, 2005) se inspira 
em trabalhos como o de Dayan e Katz – embora não se restrinja a este (ver também 
Lazarsfeld e Merton, 1969; Carey, 1989) – que lidam com “modos rituais de 
comunicação”, para desenvolver a ideia de ritual midiático. Este é um conceito mais 
amplo do que aquele apresentado por Dayan e Katz, uma vez que abarcaria não somente 
os eventos pontuais descritos acima, mas toda uma gama de situações que incluiriam, 
por exemplo, a transmissão de programas confessionais (talk shows), de conteúdos que 
reivindicam a representação da realidade (reality shows) e a construção de espaços de 
peregrinação (visitas a estúdios, locações, auditórios etc.). Couldry adota uma 
	
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perspectiva foucaultiana quando desenvolve um conceito de ritual que enxerga o poder 
configurado difusamente por todo espaço social, ao invés de restringi-lo somente a 
alguns locais (Couldry, 2005, p. 63). Os rituais midiáticos, conforme apresentados pelo 
autor, acabam naturalizando e, em última instância, legitimando o status especial de 
“representantes do social” professado pelas empresas da área de mídia. Ao invés de ter 
uma função integradora, as instituições midiáticas – redes de televisão, emissoras de 
rádio, jornais etc. – contribuem para a própria construção da sociedade6. Para tanto, os 
rituais midiáticos dependem de algumas “categorias de pensamento” (ibid., p. 65). 
O primeiro e mais importante nível de classificação é aquele que estabelece o que 
está relacionado “à mídia” e o que não está. Assim como a diferenciação feita por 
Durkheim entre o profano e o sagrado, as categorias de ritual midiático abrangem o 
mundo social de maneira completa e, embora seja uma ideia construída, elaeventualmente se naturaliza por meio do seu uso repetido. 
O segundo nível de classificação é diretamente conectado ao anterior, e lida com a 
noção de hierarquia dentro da mídia. O conceito de “ao vivo”, por exemplo, reforça a 
crença de que o que é apresentado pela mídia tem maior relevância do que aquilo que 
não é, devido a uma (supostamente) maior conexão com a realidade. Qualquer 
acontecimento transmitido ao vivo deveria, de acordo com essa proposição, trazer uma 
perspectiva mais exata do mundo do que a reprodução de algo já acontecido, mesmo 
que num passado recente. 
O “comum” (ordinário, usual) é outra categoria explorada por Couldry, e que 
ganha especial importância dentro da análise que faz do programa de reality show Big 
Brother, enquanto ritual midiático. O fato de os participantes geralmente virem de 
contextos pessoais comuns (isto é, não terem conexões com a indústria midiática até a 
entrada no confinamento) é fundamental para a reivindicação de que o Big Brother 
representa o social. Até porque, ainda de acordo com Couldry, uma das premissas 
centrais deste reality show é a de que ele oferece um ponto de acesso privilegiado às 
“realidades da interação humana” (Couldry, 2002, p. 288). 
Entretanto, ao mesmo tempo em que o Big Brother apóia-se no “comum” para se 
apresentar como um tipo de janela para as dinâmicas sociais do cotidiano, ele também 
assegura uma posição singular para o seu produtor na definição do que pertence ao 
mundo midiático. Não é segredo para ninguém, por exemplo, que grande parte dos 	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
6 Fazendo referência ao trabalho de Bourdieu (1991) ligado aos “ritos de instituição”, Couldry (2005) 
considera esta uma posição pós-durkheimiana. 
	
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participantes do programa tem como principal objetivo ascender ao nível de celebridade 
midiática assim que deixarem a casa. 
Com efeito, as reflexões de Couldry sobre as formas midiatizadas de 
experimentação do cotidiano “comum” transitam dentro de um eixo que conecta teorias 
informadas por perspectivas que relacionam indivíduo, sociedade e ritual (Douglas, 
1984; Durkheim, 1995; Turner, 1974), com trabalhos que exploram formas de 
naturalização e legitimação de poder (Barthes, 1973; Bourdieu, 1990; Foucault, 1988). 
A ambiguidade resultante dessa mistura mostra-se clara quando o sociólogo afirma que 
os “eventos midiáticos [o que também se aplica aos rituais midiáticos] são processos 
nos quais a sociedade ‘toma conhecimento de si mesma’ (Turner, 1974, p. 239), ou, 
pelo menos, assim o parece7” (Couldry, 2002, p. 285). A parte final da citação acima é a 
chave para se entender a preocupação central de Couldry com respeito às implicações 
do cada vez mais importante papel dos meios de comunicação enquanto mediadores da 
relação do indivíduo com a sociedade. É possível observar nas reflexões do sociólogo 
um uso, no mínimo inovador, de conceitos ligados à antropologia para lidar com 
questões tradicionalmente pensadas dentro das discussões de ideologia e economia 
política. 
Diferentemente de Couldry, Spitulnik (1993) sugere eixos mais amplos ao 
demarcar a importância da integração dos estudos sobre os meios de comunicação de 
massa ao fato social total da vida contemporânea. A antropóloga destaca como os meios 
de comunicação de massa representam e atuam sobre valores culturais em uma dada 
sociedade. Ainda nessa lógica, Spitulnik menciona a relevância de se buscar um 
entendimento sobre como os meios de comunicação de massa influenciam a 
constituição das relações e das identidades sociais, além dos modos como podem 
estruturar noções de tempo e espaço para as pessoas. Outro ponto destacado por 
Spitulnik diz respeito ao papel dos meios de comunicação na formação de comunidades 
ou grupos sociais (incluindo desde subculturas até culturas nacionais), bem como nos 
processos de transformações sociais, econômicas e culturais globais. 
As perspectivas de Couldry e Spitulnik, contudo, não são divergentes, mas antes 
encontram-se inseridas em campos distintos, que no entanto possuem pontos de contato 
e possibilidades de diálogos e conexões. 
 	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
7 Itálico do autor. 
	
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Considerações Finais 
Em grande parte, este artigo focou nas contribuições da antropologia para as 
pesquisas de comunicação; entretanto a recíproca deve ser igualmente delimitada. 
Conforme apontado anteriormente, para Rothenbulher (2008) a comunicação também 
pode oferecer à antropologia importantes aportes. Conceitos ligados à escolha 
individual, ação e variabilidade começaram a ser privilegiados (Rothenbuhler, 2008) 
nos estudos dos meios de comunicação de massa, de tal modo que é possível 
considerarmos que esses trabalhos realizam uma espécie de retomada de uma questão 
clássica da antropologia na sociedade contemporânea: a do individualismo. Numa 
etnografia de audiência, por exemplo, investiga-se a recepção de um produto da cultura 
de massa, mas há que se considerar também aspectos relacionados à fruição desses 
produtos num nível individual. Mesmo que os códigos sejam coletivamente 
compartilhados, as pessoas assistem televisão, lêem jornais, navegam na internet, 
ouvem programas de rádio frequentemente sozinhas, na intimidade de seus lares, 
quartos, carros e escritórios, muitas vezes não compartilhando a audiência com outros 
membros da família ou colegas. Pode-se então considerar que a antropologia encontrou 
nas interpretações desses “atores” individuais da audiência uma área bastante fértil de 
estudo. Além disso, a crescente preocupação da antropologia com sociedades urbanas 
contemporâneas também encontra material fecundo nas teorias mais recentes da 
comunicação e dos estudos culturais e suas abordagens da cultura como campo de 
disputa por hegemonia e poder, por exemplo. 
Se usadas adequadamente, as referências teóricas e metodológicas tão caras à 
antropologia podem ser de muita utilidade para as pesquisas em comunicação e mesmo 
frutíferas para a interlocução entre os dois campos. Embora autores como Turner, 
Durkheim ou Douglas já não sejam tão centrais em discussões mais contemporâneas 
dentro da antropologia, eles ainda são capazes de fornecer importantes alternativas nos 
modos de abordagem de problemas da comunicação, como por exemplo a influência de 
Durkheim no trabalho de Nick Couldry citado acima. Além disso, cabe assinalar que as 
questões da comunicação são diferentes daquelas da antropologia, e ainda que 
pesquisadores das duas áreas tenham interesse em investigar um mesmo objeto de 
estudo, o olhar sempre será diferente e contextualizado. 
Finalmente, por mais sutilezas e nuances que metodologias da antropologia e da 
comunicação possam apreender, é sempre importante nunca perder de vista que uma 
antropologia da mídia diz respeito às condições culturais de produção e uso que as 
	
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pessoas fazem dos produtos midiáticos, e as pessoas são sempre mais complexas do que 
a forma como aparecem retratadas em nossas pesquisas. 
 
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