
José Afonso da Silva Direito Urbanístico Brasileiro (2010)
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tabelecem diretrizes de atividades urbanísticas dos particulares, as que regulam a aprovação de urbanificação, a outorga de certificado ou certidão de uso do solo, a licença para urbanificar ou para edificar. 7. Sob o enfoque da fonte de sua expressão, as normas urbanísticas são constitucionais e ordinárias. As primeiras são todas aquelas dis posições da Constituição que tratam de matéria urbanística, e são os arte. 21, XX e XXI; 22, IX; 23, HI, VI e IX; 24 ,1, VI e VII, e seus .§§ (que não contêm só matéria urbanística, mas dela também cuidam na sua relação com a competência para legislar sobre direito urbanístico, referida no inciso I); 25, § 3e; 30, VHI e IX; e 182. As normas ordinárias são as que integram as leis ordinárias que disciplinam a matéria urbanística, como é exemplo conspícuo o Estatuto da Cidade. A Constituição não previu lei complementar federal em matéria urbanística, mas refere uma lei com plementar estadual que terá conteúdo urbanístico, que é aquela indicada no art. 25, § 3a, para a criação de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões. & A Constituição, no entanto, admite outros dois tipos de normas urbanísticas: as normas gerais de direito urbanístico e as normas suple mentares de direito urbanístico, que decorrem dos arts. 2 4 ,1, e §§ l fi e 2% e 30, II. 4. Competência para a criação de normas urbanísticas 9. A competência para a criação das normas jurídicas urbanísticas constituiu um problema de difícil solução no regime constitucional ante rior. Mesmo diante da indefinição constitucional de então, a doutrina, a partir de exame sistemático de diversos dispositivos, sustentara que a matéria urbanística caía na competência da União, dos Estados e dos Municípios. DAS NORMAS DE DIREITO URBANÍSTICO 63 10. Essa repartição de competência urbanística resulta mais precisa do Texto Supremo de 1988, de sorte que agora se pode afirmar com propriedade e fiindamento constitucional que à União compete editar normas gerais de urbanismo e estabelecer o plano urbanístico nacio nal e planos urbanísticos macrorregionais (arts. 21, XX e XXI, e 24, I, e § l fi); aos Estados cabe dispor sobre normas urbanísticas regionais (normas de ordenação do território estadual), suplementares das normas gerais estabelecidas pela União (art. 2 4 ,1, e § 2% o plano urbanístico estadual (plano de ordenação do território do Estado) e planos urbanísti cos regionais (planos de ordenação territorial de região estabelecida pelo Estado, que podem ter natureza de planos de coordenação urbanística na área); aos Municípios cabe estabelecer a política de desenvolvimento urbano, com o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das fun ções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes (art. 182), promover o adequado ordenamento dó seu território, mediante o planejamento e o controle do uso, do parcelamento è da ocupação do solo urbano, elaborando e executando, pára tanto,õ plano diretor (art. 30, VIU). A competência municipal não é meramente suplementar de normas gerais federais ou de normas estaduais, pois não são criadas com fundamento no art. 30, II. Trata-se de competência, própria que vem do texto constitucional. 11. Em verdade, as normas urbanísticas municipais são as mais características, porque é nos Municípios que se manifesta a atividade urbanística na sua forma mais concreta e dinâmica. Por isso, as compe tências da União e do Estado esbarram na competência própria que a Constituição reservou aos Municípios, embora estes tenham, por outro lado, que conformar sua atuação urbanística aos ditames, diretrizes e objetivos gerais do desenvolvimento urbano estabelecidos pela União e às regras genéricas de coordenação expedidas pelo Estado. 12. Há setores urbanísticos em que a competência para atuar é comum à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, como no caso da proteção de obras de valor histórico, artístico e cultural e dos monumentos, paisagens notáveis e sítios arqueológicos, assim como na proteção do meio ambiente e combate à poluição (arts, 23, III, IV e VI, e 225). Mas nesses setores a Constituição reserva à União a legislação de normas gerais (art. 24, VI, VH e VHÍ, e § 1\u2122), e aos Estados e Distrito Federal a legislação suplementar (art. 24 ,1, e § 2a). Aqui, sim, a posição dos Municípios é diversa daquela apontada acima em relação às normas urbanísticas em geral, porque nestes setores a atuação legislativa mu nicipal é suplementar da legislação federal e estadual, com aplicação do disposto no art. 30, H, e especialmente ao teor específico do inciso IX desse artigo, que declara caber ao Município promover a proteção 64 DIREITO URBANÍSTICO BRASILEIRO do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual. II - D a s N o rm a s G e r a is de D ereito U r b a n íst ic o 5. Conceito de \u201cnormas gerais\u201d 13. É controvertido o conceito de \u201cnormas gerais\u201d, referidas na Constituição Federal. Para Rubens Gomes de Souza \u201csó será norma geral a regra que se aplique igualmente à União, ao Estado e ao Município\u201d.7 Carvalho Pinto8 e Aliomar Baleeiro9 sustentam que as normas gerais hão de apresentar, além da generalidade da aplicação, a generalidade no conteúdo. Geraldo Ataliba compreende-as como leis nacionais, assim entendidas as que ditam \u201cprincípios gerais e abstratos próprios da lei nacional - sem invasão, portanto, das esferas especificas é privativas das leis federais, estaduais e municipais - para prevenir possíveis conflitos ocorríveis nos pontos de atrito previsíveis ou nas áreas não definidas, não atribuídas explícita ou implicitamente a qualquer pessoa pública política, pelo instrumento apropriado, que é a Constituição\u201d,10 Ao ver de Hely Lopes Meirelles, são normas gerais \u201cimposições de caráter genérico e de aplicação indiscriminada em todo o território nacional\u201d.11 14. Parece-nos falho o conceito de \u201cnorma geral\u201d fundado no crité rio apenas da generalidade da aplicação, por envolver uma petição de princípio, pois só é aplicável igualmente à União, aos Estados e aos Municípios se for norma geral; quer dizer, primeiro é preciso saber se é norma geral para, depois, concluir pela sua aplicação a todas essas esferas. A combinação do estabelecimento de princípios e diretrizes de açãò com o critério da aplicação encaminha a idéia fundamental do conceito, mas ainda é insuficiente, pois é indispensável acrescentar a previsibilidade constitucional específica. Por outro lado, por regra, as normas gerais não 7. \u201cNormas gerais de direito financeiro\u201d, RF155/21. 8. Normas Gerais de Direito Financeiro, 1949. 9. \u201cNormas gerais de direito financeiro\u201d, Finanças em Debate, fase. L 10. \u201cNormas gerais de direito financeiro e tributário e autonomia dos Estados e Municípios\u201d, RDP 10/51; e \u201cLeis nacionais e leis federais no regime constitucional bra sileiro\u201d, Estudos Jurídicos em Homenagem a Vicente Ráo, pp. 1.331 e ss. 11. Direito de Construir, 2a ed., São Paulo, Ed. RT, 1965, p. 107, nota 53 \u2014 sem coiTespondência nas edições posteriores, parecendo que o autor abandonou seu conceito, tanto que em Finanças Municipais (pp. 62-63) aceita o conceito de Rubens Gomes de Souza. Ficamos, data venia, com a posição anterior - a nosso ver, bem melhor - que foi reproduzido no Direito Municipal Brasileiro (cf. 162 ed., p. 532). DAS NORMAS DE DIREITO URBANÍSTICO 65 regulam diretamente situações fáticas, porque se limitam a definir uma normatividade genérica a ser obedecida pela legislação federal, estadual e municipal: direito sobre direito, normas que traçam diretrizes, balizas, quadros, à atuação legislativa da União, dos Estados e dos Municípios. Normas gerais são, portanto, normas de leis, ordinárias ou comple- mentares, produzidas pelo legislador federal nas hipóteses previstas na Constituição,