
Violencia e Armas Joyce Lee Malcolm
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sob a Paz do Rei, com dolo expresso ou implícito, sendo a morte ocorrida dentro do período de um ano e um dia.\u201d Para Coke o dolo significava \u201cintenção de causar a morte, ou de infligir um dano corporal grave que provavelmente causará a morte, da pessoa morta ou de qualquer outra pessoa; ou a intenção de cometer qualquer delito, ao menos se envolver em um ato, tal como um incêndio intencional, sabidamente perigoso à vida humana.\u201d[ 16 ] No entanto, os juízes se sentiam livres para torcer a definição de dolo para adequá-la a crimes que eles particularmente gostariam de punir, tais como a morte de um juiz ou de um oficial de justiça, mesmo quando esta não era intencional. Através da interpretação judicial, a definição legal do termo tornou-se tão artificial que acabou sendo descrita como \u201cum símbolo arbitrário\u201d que se afastou \u201cdo significado natural das palavras\u201d, pois \u201co dolo pode ter em si nada malicioso, e não precisa realmente ser premeditado.\u201d Outro endurecimento da lei de homicídios ocorreu em 1536, quando a maioria dos juízes concordou que se uma pessoa fosse morta, mesmo acidentalmente, por um membro de uma gangue ocupada com atos criminosos, todos os membros da gangue poderiam ser culpados por assassinato.[ 17 ] Em ambos estes casos, a morte de um oficial de justiça e um crime em curso durante a ocorrência de uma morte, a intenção da lei era deter o uso desnecessário da força no cometimento de um crime. O conceito de assassinato foi estendido ainda mais durante o século dezessete pela ampliação da lei do infanticídio, a morte de uma criança com até um ano de idade por sua mãe. Um exame das atitudes e do tratamento dado ao infanticídio demonstra as dificuldades em se confiar acriticamente nos registros. Um \u201caumento do infanticídio\u201d verdadeiro parece ter se iniciado na segunda metade do século dezesseis, continuou durante o século dezessete, e declinou no dezoito. Esse padrão persuadiu Sharpe de que o infanticídio era um crime tão distintivo no período como a bruxaria.[ 18 ] É difícil ter certeza se este ciclo realmente indicou um aumento real no infanticídio ou somente uma determinação maior em investigá-lo e puni-lo.[ 19 ] O que é certo é que a maioria daquelas julgadas pelo crime eram jovens, solteiras e pobres. A vergonha e a penalidade financeira decorrentes de dar à luz a um filho ilegítimo eram enormes. A mãe quase que certamente perderia seu emprego e teria dificuldade em encontrar um trabalho decente novamente. Com tanto em jogo não é surpreendente que esse crime pareça ter sido bastante comum à época. No final do século dezessete havia tantos indiciamentos por infanticídio quanto a soma de todos os outros tipos de homicídio.[ 20 ] O horror da comunidade a esse crime fica claro ao se ver as altas taxas de condenação e execução, incomuns à época. Ainda assim, as atitudes em relação ao infanticídio variaram ao longo dos anos. Uma lei severa aprovada em 1624 tornou o ato de ocultar a morte de um recém-nascido ilegítimo em crime capital. Este estatuto reverteu a presunção tradicional de inocência para a culpa presumida a não ser que a mãe tivesse uma testemunha que atestasse que o bebê já havia nascido morto.[ 21 ] Conforme o século avançava a lei de 1624 parece ter sido aplicada de forma menos rigorosa. No final do século dezoito Blackstone descobriu que ela era aplicada com leniência. Isto não acontecia, aparentemente, por causa da piedade das pessoas para com as mulheres envolvidas, mas pelo descontentamento com a presunção de culpa que o estatuto impunha, que soava como algo não-Inglês.[ 22 ] Em Commentaries on the Laws of England [ vii ] Blackstone escreveu o seguinte sobre a lei de 1624: esta lei, que tem um gosto muito forte de severidade, ao tornar a ocultação da morte praticamente prova conclusiva de que a criança foi assassinada por sua mãe, não obstante encontra leis similares em códigos criminais de muitas outras nações da Europa [...] mas eu percebo que nos últimos anos tem sido comum entre nós, na Inglaterra, em julgamentos desse tipo de delito, requerer algum tipo de evidência presumível de que a criança nasceu com vida, antes que a outra presunção, esta quase que forçada (de que a criança, cuja morte foi ocultada, foi na verdade morta por sua mãe), seja admitida para condenar o réu.[ 23 ] Quando, depois de dois séculos, o estatuto de 1624 foi revogado, o preâmbulo da nova lei admitiu que o estatuto havia sido inexeqüível por algum tempo.[ 24 ] Uma vez que as estatísticas do governo começaram a ser publicadas, o infanticídio foi incluído com outros homicídios, onde geralmente igualava ou ultrapassava o total do restante. Esta pode ter sido a razão pela qual ele foi retirado, em 1879, da categoria geral de homicídios e colocado em uma categoria distinta.[ 25 ] Claramente, o modo em que esse homicídio comum era calculado, junto à sua subnotificação, teve um efeito marcante na tabulação do total de homicídios. O homicídio era, e ainda é, o crime mais precisamente registrado de todos. A prontidão com que todas as classes recorriam à força letal para assegurar seus direitos ou para vingar-se de algum insulto, real ou imaginário, deram às cortes do início dos tempos modernos oportunidades abundantes para refinar as distinções legais entre os diversos tipos de homicídio, em particular entre o assassinato e o homicídio involuntário. Por exemplo, em 1553 uma corte julgou que se A atacasse B com intenção de matá-lo e C interviesse no combate e também atacasse B, com B vindo a morrer, seria um assassinato para A mas somente um homicídio não intencional para C. Porém, se palavras ofensivas levassem as duas partes a brigar, e um matasse o outro, seria algo a ser tratado como homicídio involuntário, \u201cpois é um combate entre duas partes no calor repentino do momento.\u201d[ 26 ] Mas a situação era complexa. Um caso de 1600 em que um cliente provocou um proprietário de uma loja, que então revidou com uma pancada, matando-o acidentalmente, foi primeiramente julgado como homicídio involuntário. Durante a apelação ele foi mudado para assassinato porque \u201cnão havia causa suficiente para iniciar tal discussão.\u201d J. H. Baker descobriu que, como resultado, a doutrina do dolo desapareceu e a condição para homicídio involuntário veio a ser \u201cnão o calor do momento, mas a presença ou ausência de \u2018provocação\u2019.\u201d[ 27 ] A provocação era a fonte do duelo, o qual, opostamente a meras brigas espontâneas, se tornou mais comum nos séculos dezesseis e dezessete. Neste caso as armas de fogo desempenhavam um certo papel, como um dos vários instrumentos que os duelistas podiam escolher. O duelo é uma forma de vingança, mesmo que apenas de certa forma camuflada, e por isso a lei tinha uma resposta clara. Como argumentou Clarke, a essência da ordem legal significava que a vingança \u201cpertencia ao magistrado.\u201d[ 28 ] A lembrança de Coke, não obstante, é de que a inclinação pelo duelo acabou sendo muito difícil de se suprimir. As chamadas classes governantes eram especialmente inclinadas ao uso desse método e no caso de uma questão de honra não se mostravam desejosos ou capazes de levar suas disputas às cortes. A lei, no entanto, simplesmente encaixou o duelo em sua visão existente de homicídio. A não ser que o duelo fosse travado \u201cno calor do momento\u201d, de acordo com William Holdsworth, o homem que matava seu oponente era culpado de assassinato. Todos aqueles que ajudassem no duelo, os defensores, eram considerados cúmplices. Se uma terceira pessoa tentasse parar a briga e fosse morta, ambos os duelistas eram culpados de seu assassinato. Se um ou ambos os duelistas fossem feridos, ambos seriam culpados de ataque ou tumulto. Se nenhum dos dois saísse ferido ambos seriam culpados de tumulto. O ponto complicado era como intervir para deter um duelo antes que o mesmo começasse. As proclamações reais e a própria Star Chamber[ viii ] tentaram fazê-lo ao tornar a preparação para um duelo um crime em si, punível