Buscar

A Transferência em Psicanálise

Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original

*
*
O trabalho de intervenção no social é possível na medida em que um psicanalista pode sustentar uma função que lhe permita escutar e intervir de uma forma diferenciada do que faz na situação analítica, considerando, porém, essencialmente a transferência e a criação de espaços que favoreçam a fala e a escuta.
A transferência, junto com o inconsciente, a pulsão e a repetição, é um conceito fundamental da psicanálise. Freud o descobriu na clínica com seus pacientes. Entretanto, percebeu também que é um fenômeno responsável pelos laços amorosos, odientos ou de ignorância que ligam as pessoas entre si. Portanto, está presente nas nossas relações familiares, sociais, com os colegas e com aqueles com quem lidamos em nossa tarefa diária. 
*
Freud utilizou pela primeira vez o termo transferência em 1888, em seu artigo sobre a histeria para uma revista médica: designava a mudança do sintoma histérico de um lado para outro do corpo. Foi nos “Estudos sobre a histeria”, em 1895, contudo, que a transferência, comparada a uma falsa ligação, assumiu a acepção que mantêm até hoje, que é a de envolver um analista na psicanálise de um sujeito. 
Freud reconheceu imediatamente o caráter perturbador da transferência, a saber, o surgimento, na análise, do amor que se volta para o analista, desempenhando um papel ao mesmo tempo revelador do passado, mas também de resistência ao relato desse passado.
*
Freud se debate sobre a questão que não deixa de surgir em seguida: o amor de transferência não será a cópia de um amor antigo? Mas ele é, sem dúvida, obrigado a admitir que é próprio de todo enamoramento repetir modelos infantis.
Em sua primeira publicação dedicada explicitamente à transferência, “Intervenção sobre a transferência ”( 1951), Lacan diz: “A transferência não é nada de real do sujeito, senão a aparição, num momento de estagnação da dialética analítica, dos modos permanentes segundo os quais ele constitui seus objetos.”(Escritos).
*
A relação com o tempo permanecerá como um dado importante da teoria lacaniana da transferência; assim, em 1964 ele continuava a afirmar que “a transferência é uma relação essencialmente ligada ao tempo e ao seu manejo” (Escritos).
A transferência se passa entre o eu e o Outro tais como Lacan os situou no esquema Z (ver abaixo) e na medida em que o eu do analista, em a, falta. Na linha a-a’, o imaginário, desempenha ao mesmo tempo um papel de filtro, de obstáculo, mas também um papel constituinte, porque do engano pode surgir a verdade.
*
*
 O analista, segundo Lacan, nos aponta neste esquema , fica por um tempo no lugar do pequeno outro (a’), ideal-de-eu, possibilitando o estabelecimento da transferência imaginária. No entanto, é necessário que caia para o lugar de grande Outro (A), num movimento de báscula, agenciando um endereçamento ao sujeito. 
O analista deverá ser apenas o veículo, o passador do grande Outro (A). Nessa passagem modifica sua posição: torna-se semblant de objeto, na medida em que é arrancado do lugar de ideal-de-eu, por uma barra advinda do grande outro (A), do inconsciente. 
*
Do lado do analisando, o que se opera é uma outra mudança. Diante do encontro ao objeto causa de desejo (a) ele se subtrai da posição do ser, o objeto de preenchimento da demanda do outro, para o não ser. Como resultado, temos o efeito de sujeito. 
Durante o tratamento, há sempre o comparecimento da resistência. Esses momentos são extremamente fecundos e, acima de tudo, vitais no trabalho analítico. O analista é sempre convocado a comparecer, não com sua palavra, mas como falta, deixando falar o analisando. Que quer dizer isto? Ele paga o preço de se abstrair, se destituir de seu ser, de sua pessoa ao significante do campo do Outro, que emerge do inconsciente.
*
O Outro, para Lacan, não é um sujeito, “é um lugar no qual se esforça em transferir o saber do sujeito. O Outro é o depósito dos representantes representativos desta suposição de saber, e é isto que chamamos inconsciente, enquanto que o sujeito perdeu-se a si mesmo nesta suposição de saber.”
Numa situação analítica, é o analista quem encarna imaginariamente este lugar do Outro. O Outro não é um sujeito, mas um lugar. O sujeito entra no jogo transferencial pela suposição de saber em relação ao analista. A tranferência é a repetição em ato do passado do sujeito. O passado é falado no presente com palavras que inscrevem o discurso.
 
*
“Aquilo que surge no efeito de transferência se opõe à revelação. O amor intervém em sua função aqui revelada como essencial. O amor , sem dúvida é efeito de transferência mas em sua face de resistência”.	
Estamos presos, nos diz Lacan, em esperar um efeito de transferência para poder interpretar, e ao mesmo tempo, sabemos que ele fecha o sujeito ao efeito de interpretação.
Por exemplo: quando em determinado tempo da análise o analisando sente pelo analista o mesmo afeto que sente pela mãe, então ele fala com amor, e no momento em que não é atendido reage com raiva, ou mesmo reage mal a alguma intervenção.
 
*
O encontro da falta, instância simbólica, permitirá um novo posicionamento do sujeito frente ao Outro. Para isso é preciso um luto. Vimos, com Freud, que no luto se necessita de tempo para que o domínio do teste da realidade seja levado a efeito em detalhe, e que uma vez realizado o trabalho, o ego consegue libertar sua libido do objeto perdido.
Mas, o que levaria este sujeito a se separar deste objeto a que Freud se refere? E que objeto seria este?
“O luto compele o sujeito a desistir do objeto declarando-o morto, e oferecendo ao sujeito um incentivo a viver”. É preciso uma separação do sujeito do lugar de objeto que ocupa na relação ao Outro parental. Isso só é possível com a castração que impõe um limite ao gozo na relação criança-mãe.
Numa situação analítica é o analista quem agencia o ato que terá como efeito a separação. Isto só é possível se o analista cair deste lugar de idealização para ser suporte do a causa de desejo. Ele não responde à demanda de amor a ele endereçada pelo analisando.

Teste o Premium para desbloquear

Aproveite todos os benefícios por 3 dias sem pagar! 😉
Já tem cadastro?

Outros materiais