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Cidades para que(m) ? Blog do João Sette Whitaker

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Cidades para que(m)? 
POLÍTICA, URBANISMO E HABITAÇÃO 
 
Blog do João Sette Whitaker 
 
Terra para todos: um temor que não 
tem mais lugar no séc. XXI 
August 11, 2013 
A ideia apresentada em minha última postagem, de garantir o 
acesso à terra aos segmentos mais pobres em qualquer área 
de cidade, incluindo as mais nobres, pode assustar. 
O temor é compreensível: determinar que certa porcentagem 
da área de qualquer empreendimento de maior porte seja dada 
à prefeitura como contrapartida pelos impactos econômicos 
que o dito empreendimento causa é mexer com gente poderosa. 
Afinal, nos últimos anos foi dado ao mercado imobiliário um 
poder absoluto: fazia o que quisesse e como quisesse, em 
total liberalidade, transfigurando bairros inteiros da 
cidade com mais e mais prédios, todos destinados às classes 
médias e altas. Como já disse, basta uma voltinha pela Lapa 
ou pela Moóca para ver esse processo. 
Esse poder foi conseguido graças a inúmeros subterfúgios, 
bem típicos do nosso sistema político: financiando as 
campanhas da maioria dos vereadores, ou participando de um 
super-esquema de corrupção centralizado no diretor geral de 
aprovações da cidade. 
É evidente que grande parte dos empreendedores (não são 
todos) que atuam no mercado imobiliário da cidade não 
achará a menor graça em ter que doar uma parcela de seus 
terrenos à prefeitura, ainda mais para que ela faça ali 
habitação social. Afinal, na lógica destes senhores, o que 
fazem é um negócio, e como tal, deve dar lucro. Perder 
metros quadrados de terreno significa perder parte de suas 
vendas, e isso é inaceitável. 
Mas esse "problema" não é complicado de resolver. Basta 
"compensar" o empreendedor com o direito de construir um 
pouco a mais do que o limite legal original, como acontece 
nas Operações Urbanas, recuperando assim pelo menos parte 
do que "perderia" ao ter que doar uma parcela do terreno. 
Acredito que a questão de fundo é outra: ter gente mais 
pobre ao lado de um empreendimento de luxo, na visão 
empresarial, desvaloriza o negócio. Isso porque os 
brasileiros mais ricos, reproduzindo uma lógica de 
apartheid urbano que se reproduz há décadas, "detestam ter 
que conviver com pobres". Não vão querer pagar tão bem pelo 
seu luxuoso apartamento se souberem que terão 
obrigatoriamente ao seu lado um conjunto habitacional. 
Afinal, na visão da elite, pobreza traz criminalidade, 
confusão. Lembrem-se do abaixo-assinado de moradores de 
Higienópolis contra a estação de metrô, para que não 
chegasse àquele bairro "gente diferenciada". Ou ainda a 
ação junto ao Ministério Público de moradores de 
condomínios de luxo no Real Parque contra a decisão da 
prefeitura de construir ao seu lado um conjunto 
habitacional. Quem não acredita nessa visão de cidade, 
atente para a capa da Veja abaixo: nela está clara toda a 
rejeição que alguns setores da classe média têm à pobreza e 
a possibilidade de conviver com ela. Sentem-se cercado e 
ameaçados. É uma lógica que caberia perfeitamente na África 
do Sul do Apartheid. 
 
 "UM CINTURÃO DE POBREZA E CRIMINALIDADE", VEJA DE JANEIRO 
DE 2001. 
Diante da pressão e do aparente poder dos proprietários de 
terra e dos empreendedores imobiliário,s é compreensível 
então que o Prefeito Haddad fique receoso em adotar uma 
medida com a radicalidade da "Lei da Solidariedade Urbana 
Paulistana", que enfrentaria justamente essa questão. 
Porém, muitos mitos devem ser desfeitos: 
1) enfrentar as oligarquias que "tomaram conta" da cidade 
não deve ser um impedimento. Afinal, os carteis de ônibus, 
já tão denunciados, envolvem também gente poderosa. Ao 
cancelar as licitações de novas linhas, ao abrir as contas 
dos transportes em uma comissão especial, a prefeitura 
mostrou que tem segurança para enfrentá-los. Por que seria 
diferente com o setor imobiliário? 
2) Neste início de séc. XXI, felizmente, pensamentos como 
esse da capa da veja começam a ficar anacrônicos, 
incompatíveis com as novas gerações, com um país que se 
democratiza e busca recuperar o sentido do desenvolvimento, 
ou seja, com uma distribuição social mais justa do seu 
crescimento econômico. As manifestações de junho mostraram 
justamente isso, com um sonoro "chega" da juventude contra 
o arcaísmo do nosso sistema político e dos nossos políticos 
(aliás, não sairão mais às ruas cobrando o fim da enrolação 
parlamentar sobre o plebiscito?). 
3) Por isso mesmo, será mais compreendida hoje a ideia de 
que produzir cidades com segregação só aumenta a 
perspectiva de uma implosão social mais para a frente. Há 
maturidade política da população para compreender que 
regular o mercado imobiliário agora visa construir uma 
cidade melhor no futuro. Que impedir que todos os segmentos 
atraídos por um empreendimento (pelos empregos que ele 
gera) possam morar perto do mesmo só aumentará o caos 
urbano. Que medidas democratizantes do espaço urbano servem 
para reequilibrar aos poucos uma cidade profundamente 
desequilibrada, e por isso refém da sua imobilidade. 
4) Também pela mesma razão, não se pode generalizar nem o 
que chamamos de "classes médias e altas", nem o "mercado 
imobiliário". A capa da Veja não representa a todos: cada 
vez mais gente de mais alta renda assume hoje uma atitude 
mais solidária e compreende o que deve ser uma cidade mais 
harmônica, o que pressupõe democracia social do seu uso. 
Aqueles que cada vez mais usam ônibus ou pegam suas 
bicicletas como alternativa à insustentabilidade do carro, 
os se viram enganados pelo mercado imobiliário vendendo 
seus sobrados achando que lucravam muito e com o valor 
conseguiram pagar por um "apertamento" em um condomínio 
murado que mais parece uma prisão; aqueles que vivem em 
bairros que mais parecem cidades-dormitórios de alta renda, 
cheios de muros e guaritas e sem uma alma viva após o cair 
da noite, e se dão conta da vivacidade dos bairros mistos 
próximos; aqueles que compraram sua casa em um condomínio 
distante cheio de promessas de tranquilidade mas se vêem 
presos horas a fio nos congestionamentos para chegar em 
casa, enfim, cada vez mais gente da classe média percebe 
que isso tudo é um grande engodo, e que a cidade tem que 
ter diversidade para ter vida. Que a lógica da capa da Veja 
prega na verdade uma tragédia social e urbana. 
Da mesma forma, há muita gente no mercado imobiliário que 
gostaria que as coisas fossem diferentes: aqueles que não 
pagam propinas, que não querem construir fortalezas que 
recusam a cidade e o espaço público, e assim por diante. 
Prefeririam um mercado menos liberal, mais regulado, mais 
previsível, ou seja, menos "faroeste" em que somente os 
grandes, maus e corruptos saem ganhando. 
5) se o Prefeito Haddad tiver dúvidas quanto à proposta de 
obrigar a doação de parte da terra de grandes 
empreendimentos à prefeitura para fazer habitação social, 
ele pode ficar tranquilo, pois não será o primeiro. Jaime 
Lerner e seu sucessor Rafael Greca, em 1994, lançaram em 
Curitiba o programa "Parceria com a Iniciativa Privada" (1) 
que, embora bem menos radical quanto ao impacto 
territorial, baseava-se na mesma lógica. Naquele caso, um 
empreendedor que quisesse lotear uma gleba em lotes 
menores de 360m² - tamanho que oficialmente só a 
prefeitura poderia fazer, para habitações sociais -, 
ganhava o direito de fazê-lo e ali construir casas, desde 
que no fim doasse à prefeitura 20% do total construído para 
a prefeitura. As 20% de unidades assim adquiridas pela 
prefeitura eram então ofertadas dentro da política 
habitacional municipal, enquanto que o empreendedor podia 
comercializar as outras 80%pelo preço que quisesse. 
É claro que, naquele caso, tratava-se de oferecer a 
habitação pronta, coisa que, em São Paulo, não seria 
necessário, já que o problema é ter terra, e não construir 
(a prefeitura dispões de meios para isso). Além disso, o 
programa era bem menos radical pois não alavancava a 
produção de habitação em áreas nobres: a política acabava 
tendo efeito somente na periferia, que era o lugar onde os 
empreendedores teriam interesse em fazer lotes pequenos, e 
portanto mais baratos. 
Ainda assim, fica o registro: a lógica já foi 
experimentada, e obteve certo sucesso. A novidade aqui 
seria transpô-la para todos os bairros da cidade, e mais 
especialmente os mais nobres, já que ao contrário do que 
ocorria em Curitiba com lotes pequenos, grandes 
empreendimentos tendem a ser feitos nos bairros mais 
valorizados. 
Vale a pena enviar uma proposta assim para a Câmara. Mesmo 
que seja só para ver se nossos vereadores terão a 
maturidade e a responsabilidade política e aprová-la em 
definitivo. E promover uma das maiores mudanças no cenário 
urbano brasileiro. 
_____________________________________________ 
(1) Nota: sobre o programa curitibano e a promoção da 
"cidade-modelo" na era Lerner, ver a dissertação de 
mestrado de Aline Figueiredo de Albuquerque, "A questão 
habitacional em Curitiba: o enigma da 'cidade-modelo'", 
FAUUSP, 2007. 
http://cidadesparaquem.org/blog/2013/8/11/terra-para-todos-um-temor-que-no-tem-mais-
lugar-no-sc-xxi?rq=terra%20para%20todos (acesso em 15/08/2016)

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