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1 TUTELA PENAL DA VIDA HUMANA Gamil Föppel El Hireche Mestre em Direito Público (UFBA) e Especialista em Ciências Criminais (IELF/Juspodivm). Professor-coordenador do curso de Pós-graduação em Ciências Criminais da Unyahna/Juspodivm. Professor dos cursos de Pós-graduação da UFPA, da Fundação Faculdade de Direito da UFBA, Unifacs e IELF/Proomnis. Professor Assistente de Direito Penal da graduação da UFBA e da Unyahna. Advogado. Sócio Fundador e Diretor do IPAN. Membro da ABPCP. E-mail: gfoppel@terra.com.br. Site: www.gamilfoppel.adv.br. 1. Aspectos Introdutórios. Resumo: O texto versa sobre a proteção à vida, ressaltando a sua importância de direito Constitucionalizado, e as implicações jurídico-penais que podem advir da sua violação. O texto cuidará da natureza jurídica deste direito e da revolução introduzida pela ciência, que repercutirá, necessariamente, na dogmática jurídico penal. Finalmente, será feita uma análise de lege lata e de lege ferenda do ordenamento jurídico pátrio. Palavras Chave: Direito Constitucional. Vida. Eutanásia. Disponibilidade de Direitos Fundamentais. “Há uns dez anos, Armin Kaufmann argumentou do seguinte modo a respeito do problema eutanásia-suicídio-homicício a pedido “o indivíduo é devedor da comunidade, porém somente enquanto vive; em compensação, não está obrigado perante a comunidade a viver. Claro que aqui não se pretende pôr em dúvida a indisponibilidade da vida em sua fundamentação religiosa e quiçá até mesmo moral. Mas isso não permite fundamentar uma norma penal estatal. 2 Sobre o suicídio e sobre o consentimento no homicídio, cada pessoa tem de decidir por si mesmo. (...) Isto não é um assunto do Estado”.1 É cediço que o bem jurídico penal mais importante é a vida humana, aquele que tradicionalmente sempre mereceu proteção por parte do Direito, não somente do Direito Punitivo. Trata-se, em verdade, do direito-mor, que viabiliza a realização de todos os demais outros direitos, sem o que se perderia a necessidade de haver um ordenamento jurídico minimamente organizado. Por conta disso, inclusive, pode-se afirmar que a vida é um direito basilar, sobre o qual se erigem outros tantos, daí por que se fala que ela – a vida – é o fundamento dos chamados direitos de primeira dimensão. Em razão disso, os ordenamentos jurídicos dos mais diversos países consagraram a proteção ao direito à vida, a exemplo do que fez o legislador brasileiro no caput do art. 5.º da Lex Legum, o qual dispõe, in literis: “Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:” (omissis). Percebe-se, portanto, até pela dicção do texto legal a importância da vida, colocada como o primeiro dos direitos fundamentais. A marca histórica do art. 5º é a declaração de direitos do homem e do cidadão, conforme observa Orlando Soares.2 O grande problema é que, ainda que pareça paradoxal, os progressos da medicina3 colocam o homem, por vezes, em situações as mais complexas, por envolverem, a um 1 JAKOBS, Günther. Teoria da Pena e Homicídio a Pedido. Barueri: Manole, 2003, v. 3, p. 29/31. 2 “....O fato é que os princípios consagrados pela Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão (1789) e irradiaram universalmente, contribuindo de maneira benfazeja para o avanço democrático dos povos...”. SOARES, Orlando. Comentários à Constituição da República Federativa do Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 101. 3 só tempo, ética, moral, direito, religião4-5- 6, vida... passa-se a se questionar quais seriam os limites – e se é que estes existiriam – do direito à vida. Quando o homem teria de impor a outro a 3 Sobre o assunto, é importante transcrever a elucidativa e clara passagem: “A medicina atual, na medida em que avança na possibilidade de salvar mais vidas, cria inevitavelmente complexos dilemas éticos que permitem maiores dificuldades para um conceito mais ajustado do fim da existência humana. Além disso, "o aumento da eficácia e a segurança das novas modalidades terapêuticas motivam também questionamentos quanto aos aspectos econômicos, éticos e legais resultantes do emprego exagerado de tais medidas e das possíveis indicações inadequadas de sua aplicação". O cenário da morte e a situação de paciente terminal são as condições que ensejam maiores conflitos neste contexto, levando em conta os princípios, às vezes antagônicos, da preservação da vida e do alívio do sofrimento. Desse modo, disfarçada, enfraquecida e desumanizada pelos rigores da moderna tecnologia médica, a morte vai mudando sua face ao longo do tempo. A cada dia que passa maior é a cobrança de que é possível uma morte digna e as famílias já admitem o direito de decidir sobre o destino de seus enfermos insalváveis e torturados pelo sofrimento físico, para os quais os meios terapêuticos disponíveis não conseguem atenuar. O médico vai sendo influenciado a seguir os passos dos moribundos e a agir com mais "sprit de finesse", orientado por uma nova ética fundada em princípios sentimentais e preocupada em entender as dificuldades do final da vida humana; uma ética necessária para suprir uma tecnologia dispensável. Neste instante, é possível que a medicina venha rever seu ideário e suas possibilidades, tendo a "humildade" de não tentar "vencer o invencível". FRANÇA, Genival Veloso de. Eutanásia: Direito de Matar ou Direito de Viver. Disponível em: < http://www.ufrgs.br/HCPA/gppg/eutange.htm>. Acesso em 01/06/2003. 4 Sobre o assunto, cumpre advertir que a Igreja Católica já se posicionou decidida e deliberadamente contra a eutanásia, ao preceituar que: “The rights and values pertaining to the human person occupy an important place among the questions discussed today. In this regard, the Second Vatican Ecumenical Council solemnly reaffirmed the lofty dignity of the human person, and in a special way his or her right to life. The Council therefore condemned crimes against life "such as any type of murder, genocide, abortion, euthanasia, or willful suicide" (Pastoral Constitution GAUDIUM ET SPES, no. 27). DECLARATION ON EUTHANASIA. Prepared by the Sacred Congregation for the Doctrine of the Faith . May 5, 1980. Disponível em <http://www.cin.org/vatcong/euthanas.html>. Acesso em 01/06/2003. 5 I. THE VALUE OF HUMAN LIFE. Human life is the basis of all goods, and is the necessary source and condition of every human activity and of all society. Most people regard life as something sacred and hold that no one may dispose of it at will, but believers see in life something greater, namely, a gift of God's love, which they are called upon to preserve and make fruitful. And it is this latter consideration that gives rise to the following consequences: 1. No one can make an attempt on the life of an innocent person without opposing God's love for that person, without violating a fundamental right, and therefore without committing a crime of the utmost gravity.[4] 2. Everyone has the duty to lead his or her life in accordance with God's plan. That life is entrusted to the individual as a good that must bear fruit already here on earth, but that finds its full perfection only in eternal life. 3. Intentionally causing one's own death, or suicide, is therefore equally as wrong as murder; such an action on the part of a person is to be considered as a rejection of God's sovereignty and loving plan. Furthermore, suicideis also often a refusal of love for self, the denial of a natural instinct to live, a flight from the duties of justice and charity owed to one's neighbor, to various communities or to the whole of society--although, as is generally recognized, at times there are psychological factors present that can diminish responsibility or even completely remove it. However, one must clearly distinguish suicide from that sacrifice of one's life whereby for a higher cause, such as God's glory, the salvation of souls or the service of one's brethren, a person offers his or her own life or puts it in danger (cf. Jn. 15:14). II. EUTHANASIA In order that the question of euthanasia can be properly dealt with, it is first necessary to define the words used. Etymologically speaking, in ancient times EUTHANASIA meant an EASY DEATH without severe suffering. Today one no longer thinks of this original meaning of the word, but rather of some intervention of medicine whereby the suffering of sickness or of the final agony are reduced, sometimes also 4 necessidade de viver, mesmo que uma existência marcada pela dor, pelo sofrimento e pela angústia... Entre uma morte rápida e indolor e uma sobrevivência dolorosa e tormentosa, marcada pelos traumas e angústias, que opção tomar? O Direito se compadeceria com a eutanásia? Em relação à vida, há, assim, aspectos dos mais emblemáticos e tormentosos, notadamente no que diz respeito ao auxílio ao suicídio, à reprodução humana assistida, a manipulação genética dos embriões, clonagem e eutanásia, dentre outros. Em observância aos limites e objetivos deste trabalho, deve ser o leitor esclarecido que somente se cuidará, diretamente, da eutanásia. As observações, contudo, malgrado endereçadas à eutanásia, são with the danger of suppressing life prematurely. Ultimately, the word EUTHANASIA is used in a more particular sense to mean "mercy killing," for the purpose of putting na end to extreme suffering, or having abnormal babies, the mentally ill or the incurably sick from the prolongation, perhaps for many years of a miserable life, which could impose too heavy a burden on theirfamilies or on society. It is, therefore, necessary to state clearly in what sense the word is used in the present document. By euthanasia is understood an action or an omission which of itself or by intention causes death, in order that all suffering may in this way be eliminated. Euthanasia's terms of reference, therefore, are to be found in the intention of the will and in the methods used. It is necessary to state firmly once more that nothing and no one can in any way permit the killing of an innocent human being, whether a fetus or an embryo, an infant or an adult, an old person, or one suffering from an incurable disease, or a person who is dying. Furthermore, no one is permitted to ask for this act of killing, either for himself or herself or for another person entrusted to his or her care, nor can he or she consent to it, either explicitly or implicitly. nor can any authority legitimately recommend or permit such an action. For it is a question of the violation of the divine law, an offense against the dignity of the human person, a crime against life, and na attack on humanity. It may happen that, by reason of prolonged and barely tolerable pain, for deeply personal or other reasons, people may be led to believe that they can legitimately ask for death or obtain it for others. Although in these cases the guilt of the individual may be reduced or completely absent, nevertheless the error of judgment into which the conscience falls, perhaps in good faith, does not change the nature of this act of killing, which will always be in itself something to be rejected. The please of gravely ill people who sometimes ask for death are not to be understood as implying a true desire for euthanasia; in fact, it is almost always a case of an anguished plea for help and love. What a sick person needs, besides medical care, is love, the human and supernatural warmth with which the sick person can and ought to be surrounded by all those close to him or her, parents and children, doctors and nurses. DECLARATION ON EUTHANASIA. Prepared by the Sacred Congregation for the Doctrine of the Faith . May 5, 1980. Disponível em <http://www.cin.org/vatcong/euthanas.html>. Acesso em 01/06/2003. 6 Ainda sobre o aspecto religioso, convém trazer ao lume a seguinte lição: “Os que crêem num Deus pessoal que não só criou o Homem mas que ama cada Homem e prometeu para cada um destino eterno de felicidade. Sendo crente ou não, e afectando a todos, a eutanásia implica matar um Ser querido por Deus que vela sobre a vida e a morte sendo pecado que atente contra o Homem, e por isso contra Deus que o criou, e é ofendido por tudo o que ofende o Ser Humano. Por essa razão Deus ordenou: «Não matarás» (Mateus 5:21:22), sendo um acto injustificado contra a dignidade humana e contra um filho de Deus, este que nos tirou do nada, porque nós por si só não subsistimos. Temos um Ser, porém o Ser não existe por si mas pelo Ser no qual teve princípio. Mesmo para aqueles que não são cristãos admitem na vida social o primado do espiritual devem ser sacrificados aos verdadeiros valores espirituais na projecção para além do tempo. E, esta ressonância eterna confere-lhe méritos de incalculável valor. Com efeito, pelo sofrimento, o Homem pode não somente expiar os próprios pecados mas também, utilizando em união com o sacrifício do redentor. A vocação do Homem sobre o Terra deverá espiritualizar a matéria. Consentir apressar a morte seria proclamar que sofrer é o pior de todos os males e que os benefícios da vida se resumem a não sofrer. Isto é verdade para o animal, porém falso para o Homem, para qual tem toda a dignidade e valor. 5 válidas em relação à vida e aos seus desdobramentos atinentes a todos os outros problemas mencionados. Eis, aqui, o corte deste trabalho: a tutela da vida em relação à eutanásia e seu tratamento pelo legislador brasileiro. Resta saber e questionar, portanto, quais seriam os limites da proteção constitucional à vida, conforme anunciou Bernardo Del Rosal Blasco: “El problema de la punición penal de la participación y el auxilio al suicidio, o el de la punición de determinadas formas de eutanasia, pasa ineludiblemente por una previa reflexión acerca de cuales sean los limites constitucionales a la disponibilidad de la propia vida. De esta forma, si se considera que la vida es un bien indisponible o irrenunciable, y que su protección ha que tener carácter absoluto, al margen del cual sea el interés o la voluntad del propio titular, entonces habrá que aceptar, sin cuestión, que el consentimiento en este terreno es irrelevante y que se sabe castigar cualquier forma de ejecución o de participación en actos tendentes a poner fin a una vida humana, aunque sea con el consentimiento del sujeto pasivo, pudiendo equiparase la penalidad de estos supuestos a la que se impone en los actos de ejecución o de participación en un delito de homicidio non consentido. Sin embargo, si parte de la idea de que la vida es un bien renunciable o disponible por parte de su titular, habrá que se reflexionar acerca de cuál deba ser la naturaleza y eficacia del consentimiento en esta cuestión y de cuales limites a la punición de los comportamientos de ejecución o de participación en actos suicidas o eutanásicos. (...) En resumen, pues, de nuestra constitución, lo que realmente parece es el derecho que toda persona tiene a la libre disposición de la vida”.7 Antes de passar aos pontos de introdução à matéria, esclareça-se ao leitor que muitos dos pontos aqui abordados poderão configurar um objetoinatingível, porquanto os mais céticos poderão redargüir às idéias aqui expostas que são fruto de uma utopia. Não, não o são. As idéias aqui sistematizadas foram todas fundamentadas em matrizes de Direito Constitucional e de 7 BLASCO, Bernardo Del Rosal. Política criminal de los delitos contra la vida humana independiente en el anteprojecto de codigo penal español de 1982. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 1, n.º 4, outubro-dezembro de 1993, p. 7. 6 um novo Direito Penal, teleologicamente e racionalmente funcional, e, ainda que utópicas fossem, não se podem perder as mágicas palavras de GGAALLEEAANNOO: ““EEllaa eessttáá nnoo hhoorriizzoonnttee.. MMee aapprrooxxiimmoo ddooiiss ppaassssooss,, eellaa ssee ddiissttaanncciiaa ddooiiss ppaassssooss.. CCaammiinnhhoo ddeezz ppaassssooss ee oo hhoorriizzoonnttee ccoorrrree ddeezz ppaassssooss aalléémm.. PPoorr mmaaiiss qquuee ccaammiinnhhee,, nnuunnccaa aa aallccaannççaarreeii.. PPaarraa qquuee sseerrvvee aa uuttooppiiaa?? SSeerrvvee ppaarraa iissssoo:: ppaarraa ccaammiinnhhaarr..”” GALEANO, Eduardo. Notas do VII Congresso Internacional do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, ocorrido em São Paulo, em outubro de 2001. Cuidar-se-á, em um primeiro momento, das questões relacionadas às dimensões dos direitos, com ênfase voltada para o direito à vida, mormente os seus limites e finalidades. Em seguida, tratar-se-á dos aspectos éticos e morais da proteção jurídica à vida, de sua correlação com a eutanásia para, finalmente, fazendo uma ponderação de bens e de valores, analisar a problemática e a valoração da eutanásia, bem como do seu regramento legal. 22.. BBRREEVVEE IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO AAOOSS DDIIRREEIITTOOSS FFUUNNDDAAMMEENNTTAAIISS.. EEVVOOLLUUÇÇÃÃOO HHIISSTTÓÓRRIICCAA.. OO DDIIRREEIITTOO ÀÀ VVIIDDAA EENNQQUUAANNTTOO DDIIRREEIITTOO FFUUNNDDAAMMEENNTTAALL.. Inicialmente, é forçoso que se estabeleça qual é a natureza jurídica da vida. A fim de proceder a este estudo mister se faz, ainda que de forma breve, em respeito à limitação imposta pelo tema analisado, que se cuide da evolução dos direitos humanos, é dizer, que se faça um escorço histórico sobre a mencionada evolução. É de se notar que o direito é um fato cultural e, como tal, mutável, susceptível, portanto, de variações, a partir do momento histórico e da localidade, é dizer, sofre condicionantes espaciais e temporais. Pode-se, com acerto, afirmar que a história do Direito é a história da sua evolução, é a história da defesa das classes mais fracas contra a tirania dos dominantes, é, portanto, uma história de luta. O direito passa, portanto, por evoluções, por desenvolvimento diuturno. 7 Assim é que, o Direito – que pode, inclusive, ser fundamento de um ordenamento jurídico – há de ser conquistado em cada sociedade, em cada momento histórico. Esta preocupação foi, como se observa adiante, tratada por NNOORRBBEERRTTOO BBOOBBBBIIOO:8 “Os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de forma gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas”. Semelhantemente, JJOOÃÃOO RRIICCAARRDDOO DDOORRNNEELLLLEESS:9 “Uns entendem serem direitos inerentes à natureza humana; outros afirmam serem a expressão de uma conquista social através de um processo de luta política. Enfim, é um tema como também ocorre com a democracia, a liberdade e a justiça que tem recebido uma série de significados e de interpretações as mais contraditórias possíveis. Trata-se, no entanto, de se fazer uma abordagem que não se restrinja a uma abstrata conceituação generalizada, mas que busque dar conteúdos precisos a esta embalagem utilizada com os recheios diferentes”. Tem-se que, hodiernamente, os Direitos Fundamentais representam o mínimo que deve ser reconhecido a uma pessoa para que se lhe assegure a existência digna, a sobrevivência natural. Veja-se, então, brevemente, a evolução destes direitos. Ressalte-se que, neste trabalho, será utilizada a denominação de dimensões de direitos,10 em lugar da já 8 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro, 1992, p. 5. 9 DORNELLES, João Ricardo. O que são Direitos Humanos? São Paulo: Editora Brasiliense, 1995, Apud COSTA, Marcos Ferreira Guedes da Costa. Moradia: Um Direito Fundamental. Dissertação de Mestrado defendida na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. 2002. Disponível para consulta na Biblioteca da Faculdade de Direito da USP, p. 83. 10 “Os direitos fundamentais, justamente por sua natureza histórica, não nasceram na extensão que conhecemos hodiernamente. Ao contrário, sofreram várias transformações no que diz respeito ao seu conteúdo, titularidade, eficácia e efetivação. Estas variações fizeram com que a doutrina passasse a falar em gerações de direitos fundamentais, MMUUIITTOO EEMMBBOORRAA AA IIDDÉÉIIAA PPRREEDDOOMMIINNAANNTTEE SSEEJJAA DDEE CCUUMMUULLAAÇÇÃÃOO,, EE NNÃÃOO DDEE AALLTTEERRNNÂÂNNCCIIAA EENNTTRREE EELLAASS. Esta é uma das razões pelas quais autores atuais preferem falar em dimensões de direitos fundamentais e não em gerações”. ANJOS FILHO, Robério Nunes. Direitos Fundamentais e Hermenêutica Constitucional. In 8 tradicional geração de direito, por um apego aos valores mais elevados de proteção à pessoa humana. Na realidade, não se pode mais sustentar a noção de geração de direitos, como se, na sucessão, os de geração mais antiga fossem ultrapassados pelos mais novos. Por conta disto, a doutrina mais moderna prefere falar em dimensões de direito, a exemplo do escólio de SSAARRLLEETT:11 “... o reconhecimento progressivo de novos direitos fundamentais tem o caráter de um processo cumulativo, de complementariedade, e não de alternância, de tal sorte que o uso da expressão “gerações” pode ensejar a falsa impressão da substituição gradativa de uma geração por outra...” Do mesmo pensar partilha PPAAUULLOO BBOONNAAVVIIDDEESS:12 “Força é dirimir, a esta altura, um eventual equívoco de linguagem: o vocábulo dimensão substitui, com vantagem lógica e qualitativa, o termo “geração”, caso este último venha a induzir apenas a sucessão cronológica e, portanto, suposta caducidade dos direitos das gerações antecedentes, o que não é verdade. Ao contrário, os Direitos de Primeira Geração, direitos individuais, os de segunda, direitos sociais, e os da terceira, direitos ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e à fraternidade, permanecem eficazes, são infra-estruturais, formam a pirâmide, cujo ápice é a democracia”. Feita esta necessária advertência, passa-se à análise da evolução dos Direitos, porém, há de se reconhecer, com EEDDVVAALLDDOO BBRRIITTOO, que:13 Revista dos Mestrandos em Direito Econômico da UFBA. Hermenêutica Jurídica e outros temas de Direito Econômico. Vol. 7, 1999, p. 297. 11 SARLET, I.W. Eficácia dos Direitos Fundamentais. Apud AINA, Eliane Maria Barreiros. O Fiador e o Direito à Moradia. Direito Fundamental À Moradia Frente à Situação do Fiador Proprietário do Bem de Família. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2002, p. 54. 12 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 525. 13 BRITO, Edvaldo Reflexos Jurídicos da atuação do Estado no Domínio Econômico. São Paulo: Saraiva, 1982, p. 4. 9 “Apesar da variação de padrõesculturais no tempo e no espaço, determinando a diversidade dos desejos humanos e dos métodos utilizados para fazer desaparecer a sensação de falta deles conseqüente, os agentes responsáveis pela realização do processo de satisfação são sempre os homens desempenhando um trabalho, ora individualmente, ora em conjunto, ora coletivamente, motivando, assim, a classificação de tais necessidades, como, por exemplo, a que distingue em individuais, comuns e coletivas”. Em um primeiro momento, a que se poderia denominar de pré-história, a preocupação do homem era, por meio do Direito, assegurar a liberdade dos cidadãos, protegendo contra a vilania e a tirania do Estado. Significativa, a este respeito, foi a Magna Carta de 1215, época em que se procurava diminuir o poderio do Estado em relação às pessoas. Nesta primeira dimensão, ganham vulto dois outros documentos: a Declaração da Virgínia, de 1776 e a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, esta de 1789. Consagraram-se, nesta fase, princípios como o da liberdade e o da igualdade, basilares, portanto, à construção de um Estado que se proclama e que objetiva ser democrático e de Direito. Mas esta primeira dimensão não esgotaria – e nem poderia esgotar – todos os direitos de que o homem precisaria se valer para se proteger do Estado. Por força da influência da revolução industrial14 e, a partir daí, a premente necessidade de se dividirem melhor as riquezas das pessoas, é dizer, aparece uma preocupação de justiça social. Sobre o assunto, é absolutamente obrigatória a transcrição, verbum ad verbum, dos ensinamentos de JJ..JJ.. GGOOMMEESS CCAANNOOTTIILLHHOO:15 “Se o capitalismo mercantil e a luta pela emancipação da sociedade burguesa são inseparáveis da conscientização dos direitos do homem, de feição individualista, a luta de classes trabalhadoras e as teorias socialistas (...) põem 14 Muito à frente do seu tempo, OORRLLAANNDDOO GGOOMMEESS, desde 1951, já advertia que “iniciado o processo de desenvolvimento econômico, as instituições vigentes começam a ser abaladas. Desencadeia-se um movimento reformista que visa a substituí-las ou adapta-las às novas condições, tornando-as compatíveis com o esforço desenvolvimentista. Opera-se, com efeito, uma indiscutível mudança na mentalidade do povo, acirrando-se o conflito entre conservadores e progressistas”. GOMES, Orlando. Direito e Desenvolvimento. Salvador: Publicações da UFBA, 1961, p. 25. 15 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3ª Edição. Coimbra: Livraria Almedina, 1999, p. 361. 10 em relevo a unidimensionalização dos direitos do homem egoísta e a necessidade de completar (ou de substituir) os tradicionais direitos do cidadão burguês pelos direitos do homem total, o que só seria possível numa nova sociedade”. Aparece, neste instante, a preocupação com os chamados direitos fundamentais de segunda dimensão16, que, dentre outros, são representados pelos direitos sociais e econômicos, simbolizados, dentre outros, pela saúde, trabalho e educação. Esta segunda dimensão é marcada, assim, pelo aparecimento do Estado Social de Direito, ou seja, pela fase histórica em que o homem, preenchidas em Lei as demandas de liberdade e de igualdade, busca mais, ele quer mais e precisa de mais direitos. De nada adiantaria uma liberdade sem trabalho, sem educação, sem escola, sem moradia. Em verdade, pode-se sustentar que estes direitos de segunda geração são instrumentais para que, efetivamente, se defendam valores da primeira dimensão, é dizer, a verdadeira liberdade e a verdadeira igualdade são marcadas por homens que, enquanto livres e iguais, têm residência, emprego, acesso à saúde, ou seja, estas são manifestações concretas de uma sociedade livre e harmônica17. Os marcos deste momento são as a Constituição Mexicana, esta de 1917 e a Constituição de Weimar, da Alemanha, de 1919. Sobre este dois documentos, é importante que se teçam algumas considerações. 16 “...Os Direitos de segunda geração merecem um exame mais amplo. Dominam o século XX do mesmo modo como os Direitos de Primeira Geração dominaram o século passado. São os Direitos Sociais, culturais e econômicos bem como os direitos coletivos e ou das coletividades, introduzidos no Constitucionalismo das distintas formas de estado social, depois que terminaram por obra da ideologia antiliberal deste século. Nasceram abraçados ao princípio da igualdade, do qual não poderiam se separar, pois faze-lo equivaleria a desmembra-los em razão de ser que os ampara e estimula...”. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 518. 17 “Convivem estes elementos modernos com os clássicos configurados no direito à vida, à liberdade, à segurança, à propriedade, verdadeiros gêneros dos direitos e das garantias fundamentais, todos eles, aliás, tendo como vector o direito à igualdade, pois, a cláusula relativa à igualdade, diante da Lei, vem em primeiro lugar na lista dos direitos e garantias, como a constituição assegura, não por acaso ou arbitrariamente, mas porque o princípio da igualdade rege todos os direitos em seguida a ele enumerados.”. BRITO, Edvaldo. Limites da Revisão Constitucional. Porto Alegre: SAFE, 1993, p 32. 11 A Constituição Mexicana, para MMAANNOOEELL GGOONNÇÇAALLVVEESS FFEERRRREEIIRRAA FFIILLHHOO,18 contemplou o nacionalismo, a reforma agrária e a hostilidade em relação ao poder econômico. É, assim, um documento consagrador da nova concepção dos direitos fundamentais. A Constituição Alemã de Weimar conseguiu, por sua vez, maior notoriedade. Criou-se um novo modelo que caracteriza os Direitos Sociais. A partir deste instante, não se pleiteiam liberdades perante o Estado, mas se reclama que o Estado realize uma série de tarefas de modo a poder proporcionar aos cidadãos uma vida digna. Neste passo, há de se ressaltar que o cidadão poderá exigir os direitos, compelindo o Estado à prestação de tais atividades. Sobre o assunto, importante é trazer ao lume a lição de AALLEEXXAANNDDRREE DDEE MMOORRAAEESS:19 “A Constitucionalização dos Direitos fundamentais não significou mera enunciação formal de princípios, mas a plena positivação de direitos, a partir dos quais qualquer indivíduo poderá exigir a sua tutela perante o poder judiciário para a concretização da democracia. Ressalte-se que a proteção individual é absolutamente indispensável para tornar efetiva a aplicabilidade e o respeito aos direitos humanos fundamentais previstos na Constituição Federal e no ordenamento jurídico geral”. Assegurados os Direitos de Segunda Dimensão, também considerados Direitos Sociais, a doutrina avança para classificar os Direitos de Terceira Dimensão, que são, notadamente, aqueles que se consideram difusos ou coletivos, é dizer, inerentes à própria coletividade, que não podem, decorrentemente, ser singularizados para serem apreendidos ou restritos a determinado ou específico grupo, ou a um certo indivíduo. São modalidades dos direitos desta dimensão a proteção que é dispensada ao meio ambiente, ao consumidor, à ordenação da cidade, dentre outros. Ademais, como as necessidades dos homens são intermináveis e – como já se demonstrou, que a história do Direito é a história de sua constante evolução, existem aqueles que, 18 FERREIRA FILHO, Manuel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 46. 19 MORAES, Alexandre. Direitos Humanos Fundamentais, p. 9 12 com PPAAUULLOO BBOONNAAVVIIDDEESS, sustentam a existência de uma quarta dimensão de direitos, representada pela democracia, pelo direito à informação e o direito ao pluralismo.20Elaborada esta breve introdução histórica, apresentando a dimensão e o conteúdo destes direitos, sua evolução e multiplicação21, resta reconhecer, com BBOOBBBBIIOO, que o maior problema não é positivar estes direitos, mas lutar por eles, conferir-lhes eficácia, plena aplicabilidade, ou, como ele sustenta, literalmente: “O problema fundamental dos direitos do homem hoje, não é tanto justifica- los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político”. Cuidar-se-á, doravante, do tratamento jurídico penal que é dispensado à eutanásia, das suas formas de manifestação e de como o direito penal age em casos tais. 20 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 525. 21 “Essa multiplicação (ia dizendo proliferação) ocorreu de três modos: porque aumentou a quantidade de bens merecedores de tutela; porque foi estendida a titularidade de alguns direitos típicos a sujeitos diversos do homem; c) porque o próprio homem não é mais considerado como ente genérico, ou homem em abstrato, mas é visto na especificidade e na concreticidade de suas diversas maneiras de ser em sociedade, como criança, velho, doente, etc. Em substância: mais bens, mais sujeitos, mais status do indivíduo”. BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. São Paulo: Campus, 1992. 13 3. A tutela da vida e a eutanásia: Incompatibilidades? 3.1. Considerações Gerais. Primeiras Impressões. Tradicionalmente, não se admitem interrupções artificiais da vida humana, sendo todos estes atos considerados como homicídio, do latim hominis excidium – a interrupção voluntária da vida humana. O mesmo se diga em relação à eutanásia. Qualquer que fosse a sua finalidade – colaborar com a diminuição de uma dor, mesmo que não houvesse o propósito de prejudicar – o sujeito ativo responderia pelo homicídio., podendo ou não ser objeto do privilégio, tendo em vista a relevância da motivação. Sucede, porém, que não se pode mais falar em direitos absolutos, que não comportam restrições, sob pena de se incidir em um erro por séculos advertido 14 por Cícero: summum ius, summa iuria. Menciona-se, portanto, a necessidade de se mudarem os paradigmas, mesmo aqueles que são relacionados aos direitos fundamentais.22 Trata-se, a bem da verdade, de um dos assuntos mais complexos do Direito Penal, como bem observa, com a maestria de sempre, Claus Roxin: “A apreciação da eutanásia é um dos pontos mais complicados do Direito Penal. Isso tem três motivos: primeiramente, falta um dispositivo legal que dela trate expressamente. (...) Em segundo lugar, os problemas existenciais que surgem em decisões sobre a vida e a morte dificilmente podem ser regulados através de normas abstratas; pois o direito vive de situações cotidianas tipificáveis, nem sempre se conseguindo, em sua necessária conceituação generalizante, dar um tratamento adequando ao processo individual e irrepetível da morte. Em terceiro lugar, o consenso sobre o permitido e o proibido na eutanásia é dificultado por não se tratar de tarefa exclusiva do penalista. Nesta esfera, também médicos, filósofos, teólogos e literatos reclamam para si – e com razão, o direito de ingressar no debate”.23 A fim de se poder atribuir o tratamento correto à eutanásia, mister se faz que se teçam algumas considerações a respeito de sua classificação. De fato, o tratamento a cada espécie de eutanásia varia, o que poderia corresponder desde a exclusão da responsabilidade criminal até mesmo a um aumento de pena ou a uma qualificadora. Por conta disso, em breves linhas, far-se-á uma análise dos diversos modos e modalidades de eutanásia. 3.2. Eutanásia: Conceito, espécies, classificação e importância. 22 Sobre o assunto, Cañedo: “em um mundo plural – e que tem pretensões de se reconhecer como tal de maneira inclusiva-, não há mais espaços para a construção de sólidos etermos e imutáveis porque elaborados racionalmente. Os valores são voláteis e incapazes de serem reduzidos e solidificados em uma estrutura eterna. A pluaralidade, e o reconhecimento desta pluralidade ética, irradia-se e não mais podem permanecer leituras como a época do bem- estar em que determinado grupo estabeleceria o útil e o bom não só para si, mas para toda a sociedade. O útil e o bom, enquanto referentes a questões éticas, não são capazes de ser impostos ou determinados por outrem...”. CAÑEDO, Carlos Augusto; CHAMON JÚNIOR, Lúcio. Eutanásia e Dogmática Penal: Por uma interpretação paradigmaticamente adequada através de uma teoria da adequabilidade normativa. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 9, n.º 36, outubro-dezembro de 2001, p. 68/88. 23 ROXIN, Claus. A Apreciação Jurídico Penal da Eutanásia. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 8, n.º 32, outubro-dezembro de 2000, p. 11. 15 Tratar corretamente da eutanásia24 exige que se especifique em qual conceito o operador está a se debruçar. Cuida-se de uma palavra que envolve vários significados, significados estes que terão, seguramente, tratamento diferente por conta do direito e da ética. Há aqueles que, num primeiro momento, já se colocam definitivamente contrários à eutanásia, por sustentar que esta se fundaria, na verdade, em um motivo de egoísmo. Com efeito, este é o posicionamento encabeçado e liderado por Nélson Hungria:25 “É sabido que a nossa vigente lei penal de saco lhe a tese de impunibilidade do homicídio eutanásico, isto é, do homicídio praticado para abreviar piedosamente os sofrimentos de um doente incurável. Apenas transige em considerá-lo um homicidium privilegiatum, um delictum exceptum, facultando ao Juiz a imposição de pena minorada, em atenção a que o agente é impelido "por motivo de relevante valor social ou morar'. O nosso legislador de 40 manteve-se fiel ao princípio de que o homem é coisa sagrada para o homem. Homo res homini sacra. A supressão dos momentos de vida que restam ao moribundo é crime de homicídio, pois a vida não deixa de ser respeitável mesmo quando convertida num drama pungente e esteja próxima de seu fim. O sêr humano, aindaque irremediàvelmente apuado pela dôr ou minado por incurável mal físico, não pode ser equiparado à rês pestilenta ou estropiada, que o campeiro abate. Nem mesmo o angustioso sentimento de piedade ante o espetáculo do atroz e irremovível sofrimento alheio, e ainda que preceda a comovente súplica de morte formulada pela própria vítima, pode isentar de pena o homicida eutanásico, cujo gesto, a final, não deixa de ter um fundo egoístico, pois visa também a libertá-lo de sua própria angústia. Nenhum meio artificial pode ser empregado para truncar a existência ao enfêrmo "desenganado" ou apressar a sua extinção iminente. A Parca inexorável deve agir sozinha, sem acólitos e sem cúmplices. O misterioso fio da vida, seja no embrião humano dentro do claustro 24 Apenas para esclarecer, pode-se com Leonard Martin falar-se que a eutanásia é “um ato médico que tem por finalidade acabar com a dor e a indignidade na doença crônica e no morrer, eliminando portador da dor”. 25 HUNGRIA, Nélson. Ortotanásia ou eutanásia por omissão. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, ano 87, junho de 1998, v. 752, p. 749. 16 materno, seja na : plenitude da idade viril, seja nos derradeiros arquejos do moribundo, não pode ser cortado senão pela fiandeira Átropos”. Sucede, porém, que não mais se pode dar um tratamento simplista à matéria, tendo em vista que a especializaçãomédica exige do jurista a necessidade de se adequar às novas realidades. Com acerto, assevera Maria Auxiliadora Minahim: “A própria morte despiu-se dos odores, choros e tormentos que cercavam para acontecer civilizadamente nos ambientes preservados das UTIs. A dor é escamoteada, expulsa, comprimida e travestida com os recursos da moderna indústria química”.2627 26 MINAHIM, Maria Auxiliadora. A vida pode morrer? Reflexões sobre a tutela penal da vida em face da revolução biotecnológica. In Revista dos Mestrandos em Direito Público da Universidade Federal da Bahia. Direito Penal Econômico e outros Estudos de Direito Econômico. Salvador: Press Color Gráficos, n.º 8, jan.-dez. 2000, p. 21. 27 Significativas são as palavras de Alberto Jorge Lima de Barros: “Escreveu Heidegger que o homem é um ser destinado à morte. Em verdade, todos os seres vivos são destinados à morte, esse halo de mistério que, em particular, tanto oprime os humanos. Todavia, será que só oprime, derriba, prosterna, ou por vezes liberta, emancipa, desata as amarras que nos obriga a viver ? Viver não só significa pulsar, existir, ser, mas fruir, gozar, desfrutar. Anotou Mário de Andrade: “pra mim, viver é gastar a vida” e recitou Baudelaire: “para não serdes os eternos martirizados escravos do tempo, embriagai-vos, embriagai-vos sem cessar, de vinho, poesia, virtude, amor, como achardes melhor”. Para uma “vida” de brutal sofrimento, de padecimentos constantes, sem quaisquer esperanças, que consciente e verdadeiramente clama por não mais “viver”, é dado o direito da morte ? A eutanásia, em sentido estrito, revela-se como sendo a conduta pela qual se busca abreviar, para evitar a dor ou sofrimento, a vida de um doente reconhecidamente incurável, aliás, o vocábulo em seu sentido etimológico, encerra, sinteticamente, o significado do fenômeno que abrange. Tem origem no grego, assim eu significa bem, boa, e thanatos quer dizer morte. Traduz-se, pois, como a boa morte, a morte calma, a morte sem dor, sem sofrimentos. Em nossa legislação, é tida como crime de homicídio, não encontrando suporte em qualquer escusa. O Diploma Material Penal vigente deixa-a inserta, tendo em conta, atentem, as caraterísticas de cada caso, como homicídio privilegiado, vale dizer, pode incidir a causa especial de diminuição prevista no art. 121, § 1º. No Brasil, é verdade, o evento eutanásico, chamado também de homicídio compassivo, em tempo algum encontrou isenção de pena para o agente. Também no Direito Comparado, a maioria dos estatutos repressivos não toleram tal prática. É assim com os Códigos italiano, alemão, colombiano e português, dentre outros. Entretanto, o Código soviético, fruto da revolução bolchevique e já revogado, admitia extinção de pena para quem praticasse a eutanásia. Já o Código Penal uruguaio de 1933 prescreve ainda uma espécie de perdão judicial, quando afirma que os juízes têm a faculdade de exonerar do castigo o sujeito de antecedentes honráveis, autor de um homicídio efetuado por motivos de piedade, mediante súplicas da vítima. O Código da Polônia, também admitindo a extinção da punibilidade, exige o consentimento da vítima e o sentimento de compaixão do agente. Recentemente, o parlamento holandês regulamentou a prática eutanásica o que aliás, mesmo antes da legalização, era conduta tolerável”. LIMA, Alberto 17 A eutanásia pode ser considerada sobre o ponto de vista da realidade coletiva ou individual.28 Interessam, sobretudo, as modalidades desta última, porquanto a primeira sempre foi marcada pela mesquinhez do racismo ou dos ideais econômicos, haja vista a ocorrência da mistanásia, em que o sujeito ativo põe termo a uma vida humana antes do tempo, tendo em vista a situação de miséria e de penúria que atinge a vítima. Esta é, em verdade, uma forma torpe e ignóbil de se praticar uma tal conduta, pois nada teria de utilidade em relação a minorar a dor, além de carecer de qualquer respaldo ético. Sobre o assunto, importante é transcrever, mais uma vez, Maria Auxiliadora Minahim: “Ao direito, sobretudo na modernidade contemporânea, quando se pretende concretizar, de forma justa, o princípio da igualdade de todos, cabe garantir, aos seres humanos, independentemente da diversidade da situação pessoal, o direito à vida”.29 Há, destarte, em relação ao aspecto individual, as figuras da eutanásia piedosa ativa (paraeutanásia), marcada pela ocorrência de um não agir, que poderia impedir a efetivação da morte e a eutanásia piedosa ativa, em que o sujeito ativo desempenha uma conduta ativa. Este critério parte, pois, da análise do comportamento do sujeito que a pratica. Fala-se ainda na existência da chamada distanásia, que seria uma prorrogação artificial e, ordinariamente, dolorosa da vida humana. O objetivo aqui é assegurar a sobrevivência, mesmo que isto pareça ilógico ou inumano. Finalmente, trabalha-se com a ortotanásia, que significa passagem sem dor, uma passagem direta para a morte sem que isso viole a dignidade humana, ao contrário, respeitando-a devidamente. Cuidar-se-á com mais cuidado das modalidades de eutanásia que podem e deveriam ser reconhecidas pelo direito, conforme demonstra Roxin: Jorge Correia de Barros. A reforma do Código penal e o “direito de morrer”. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br>. Acesso em 05.06.2002 28 MANTOVANI, Ferrando. Aspectos Jurídicos da eutanásia. In Fascículos de Ciências Penais, v. 4, nº 4, outubro- dezembro de 1991, p. 32/33. 29 MINAHIM, Maria Auxiliadora. A vida pode morrer? Reflexões sobre a tutela penal da vida em face da revolução biotecnológica. In Revista dos Mestrandos em Direito Público da Universidade Federal da Bahia. Direito Penal Econômico e outros Estudos de Direito Econômico. Salvador: Press Color Gráficos, n.º 8, jan.-dez. 2000, p. 20. 18 “Pode-se chamar de eutanásia pura a hipótese que se ministram ao moribundo meios lenitivos que não possuam o efeito de diminuir-lhe o tempo de vida. Tal conduta, se praticada por desejo ou com o consentimento do paciente, é, obviamente, impunível. Na hipótese de não poder mais o moribundo emitir uma declaração de vontade, ou já não estar ele em condições de o fazer de modo responsável, a conduta também não será punível”.30 Expostos brevemente os conceitos de eutanásia – e as suas diversas modalidades – passa-se ao tratamento jurídico da matéria. 3.3. Tratamento Jurídico da eutanásia. Conforme já se assentou, a doutrina e a jurisprudência nacionais entendem que a eutanásia é crime de homicídio, podendo ser privilegiado. Ver-se-á, aqui, como o ordenamento jurídico brasileiro trata do problema e como o projeto de reforma do Código Penal regula a matéria. Para isso, necessário se faz que se proceda a uma interpretação sistemática do Código Penal, conjugando-o com os dispositivos Constitucionais sobre o assunto. Numa primeira perspectiva, tem-se que a Constituição, ao assegurar o direito à vida, teria vedado, peremptoriamente, a aplicação da eutanásia. A este respeito, convém trazer à colação as palavras de Aloysio de Carvalho Filho:31 “A Constituição Brasileira admite o direito de matar? - Não. Pelo menos, desconheço qualquer dispositivo que conceda ao particular o direito de matar. E digo assim, porque, infelizmente, a carta em por attibue ao Estado o uso da pena de morte, contra criminosos políticos e criminosos communs. Ao indivíduo, porém, nem a carta constitucional, nem o código vigente, nem o projecto em estudo conferem, implícita ou expli.... mente, o direito de matar. Nada que se pareça, por exemplo, com aquelle conceito do código penal russo, isentando de penalidade o homicídio commettido30 ROXIN, Claus. A Apreciação Jurídico Penal da Eutanásia. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 8, n.º 32, outubro-dezembro de 2000, p. 12. 31 CARVALHO FILHO, Aloysio de. Em torno da euthanasia. In Revista dos Formandos em Direito da UFBA, volume 2. Salvador: 1997, p. 26. 19 compaixão, a instancias da victima. Mais acertado, sem dúvida, é o rumo do projecto argentino de 1937, não dispensando, mas attenuando a pena do homicídio praticado por sentimento de piedade em face do dor physica da vítima, si for insupportavel, e as circunstâncias do caso evicenciarem a inutilidade de qualquer recurso therapeutico para a salvação do enfermo. Aliás, não outra a orientação das legislações modernas”. Semelhantemente, Renato Marcão: “A eutanásia e a ortotanásia não encontram fundamento nos princípios sociais e morais, tanto que o Anteprojeto cuida do homicídio praticado por motivo de relevante valor social ou moral no § .º do art. 121, e delas em dispositivos outros (§§ 3.º e 4.º). A modernização legislativa pretendida também contraria mandamento religioso e o art. 5º, caput, da CF, conforme acima mencionado”. 32 Gize-se que este entendimento, inclusive, é respaldado pelo código de ética médica, que dispõe: “O médico deve guardar absoluto respeito à vida humana, atuando sempre em benefício do paciente. Jamais utilizará de seus conhecimentos para gerar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano ou para permitir e encobertar a tentativa contra a sua dignidade e integridade”. Ocorre, todavia, que o direito não pode ser concebido de uma forma única, irrefletida. Os ditames jurídicos devem ser interpretados em conjugação com os valores e os 32 MARCÃO, Renato Flávio. Homicídio Eutanásico: Eutanásia e Ortotanásia no Anteprojeto de Código Penal. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br>. Acesso em 05.06.2002. 20 princípios maiores, até porque, com EERROOSS GGRRAAUU, tem-se que o Direito não pode ser interpretado em tiras, como ele mesmo assevera:33 “Não se interpreta o direito em tiras. A interpretação do Direito é a interpretação do Direito, no seu todo, não de textos isolados, desprendidos do Direito. Não se interpreta o Direito em tiras, aos pedaços. A interpretação de qualquer texto de direito impõe ao intérprete sempre, em qualquer circunstância, o caminhar pelo percurso que se projeta a partir dele – do texto – até a Constituição. Um texto de Direito isolado, destacado, desprendido do sistema jurídico, não expressa significado normativo algum”. Em razão disso, doutrinadores há que, conclamando a comunidade jurídica à reflexão da matéria, lecionam que é possível falar-se em eutanásia em conformidade com as normas jurídicas – Constitucionais e Penais – vigentes. E se é verdade que a Constituição assegura o direito à vida, ela mesma resguarda a dignidade da pessoa humana,34 e não se pode falar em dignidade em uma vida dolorida, angustiada e angustiante, que seja imposta – como se fora uma pena – ao indivíduo. Sobre a dignidade da pessoa humana, lapidar é a lição de Cerezo Mir: “A referência ao princípio da dignidade da pessoa humana é transcendental, pois, segundo os jusfilósofos das mais diversas tendências, o respeito à 33 GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 34. 34 Sobre dignidade, Cañedo: “E tal dignidade envolve não só direitos fundamentais sempre lembrados, como direito à saúde, à educação e à alimentação. Refere-se também a questões atinentes ao seu próprio destino e tomadas de decisão acerca de um eventual melhor tratamento médico, sob sua perspectiva, em face de determinado quadro clínico. A garantia da dignidade da pessoa humana aqui se refere tanto à opção de não se submeter a um tratamento, como o caso de Patrícia Diana Trumbull, citado por Dworkin, como também à opção por determinado procedimento médico. O que há de ser levado em conta é a impossibilidade, em momento atual, de se ignorar a vontade expressa, ou às vezes presumida, do paciente capaz de decidir -ou de quem detém essa capacidade – quando do inicio de um tratamento médico”. CAÑEDO, Carlos Augusto; CHAMON JÚNIOR, Lúcio. Eutanásia e Dogmática Penal: Por uma interpretação paradigmaticamente adequada através de uma teoria da adequabilidade normativa. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 9, n.º 36, outubro-dezembro de 2001, p. 70. 21 dignidade da pessoa humana é um princípio de justiça material válido a priori”.35 A dignidade da pessoa humana é, assim intransponível, e deve ser concebida em conjunto com o direito à vida. Se o ordenamento jurídico não autoriza lesão à vida dos outros, também não pode impor a um doente que permaneça sobrevivendo e resistindo, dolorosamente, contra a sua vontade. Assim é que, em certos casos, já se reconhece a possibilidade de a eutanásia ser utilizada, sem que isto implique violação ao ordenamento jurídico. Pela preciosidade, transcrevam-se, verbum ad verbum, os argumentos lançados por Luiz Flávio Gomes: “Dono da vida, o homem indiscutivelmente deve ser também, dentro de determinadas circunstâncias e segundo certos limites, o dono da sua morte. Aliás, já o é no suicídio, o que significa, desde logo, uma relativização do “direito à vida” (que equivocadamente é ensinado nas faculdades, em geral, como se fosse algo absolutamente indisponível, o que não é verdade). Vida e morte, em suma, pertencem a Deus, mas não só a ele. O que o Direito Internacional vigente no Brasil (Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, art. 6º, e Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de San Jose -, art. 4º) proclama é o seguinte: o direito à vida é inerente à pessoa humana. Este direito deve ser protegido por lei e ninguém poderá ser arbitrariamente privado da vida. Enfatizando-se: ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente. Em conseqüência, havendo justo motivo, é dizer, razões fundadas, não há como deixar de afastar a ilicitude ou a punibilidade da conduta. Eutanásia, etimologicamente, significa “morte boa” (eu = bom/boa; thánatos = morte) ou “morte sem grandes sofrimentos”. Portanto, e desse modo já começam os limites necessários, só se pode falar em eutanásia quando alguém padece grave sofrimento físico e/ou mental. O que o regime nazista chamou de eutanásia (Lei para a prevenção das enfermidades hereditárias, 1933) era, na verdade, um holocausto, uma técnica autoritária de eliminação de seres 35 CEREZO MIR, José. Direito Penal e Direitos Humanos: Experiência Espanhola e Européia. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 2, n.º 6, abril-junho de 1994, p. 26. 22 humanos. Já não é esse, exatamente, o caso da denominada “morte assistida”, que foi amplamente praticada pelo Doutor Morte (Jack Kevorkian), que se acha condenado nos Estados Unidos por ter ajudado 130 pessoas a morrer desde 1990”. 36 Destarte, resta reconhecer, conjugando-se a proteção a vida e à dignidade da pessoa humana, em quais casos se poderia falar na ocorrência de uma eutanásia irrelevante para o direito penal, e quais seriam os seus fundamentos. 3.4. Eutanásia e Direito Penal A discussão a respeito da eutanásia ganha corpo quando trazida à luz do Direito Penal. Registre-se, ainda uma vez, pela análise aqui esboçada, que se parte da premissa de que a vida não é um bem irrenunciável, absoluto, mesmo porque, o Código Penal Militar vigente, ainda contempla a pena de morte. Tem-se, assim, de fundamentar a possibilidade da adoção da eutanásia, em relação à chamadaeutanásia indireta (figura assim denominada por Claus Roxin) e à figura da ortotanásia. Não fossem todos os argumentos que aqui serão expendidos, é possível, prima facie, em situações limite, aplicar a inexigibilidade de conduta diversa – estado de necessidade exculpante – para aquele que praticasse a ortotanásia. Sem dúvida, não se pode esperar de um parente que, ao ver seu familiar padecendo – algo que em muito se aproxima da tortura – com isso concorde e nada faça para alterar. A irresignação e o instinto de proteção são inerentes às pessoas, fazem parte da estrutura do ser humano. Este, pois, o primeiro argumento. Outros importantes argumentos há, contudo. Antes de os expor, convém invocar a autoridade de Paulo José da Costa Júnior:37 “A ajuda a morrer ativa pura (ou direta) é aquela ministrada durante a fase final da vida, sem que a prestação implique um encurtamento da vida. A ajuda é 36 GOMES, Luiz Flávio. EUTANÁSIA: dono da vida, o homem é também dono da sua própria morte? Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br>. Acesso em : 16.10.2001. 37 COSTA JÚNIOR, Paulo José. Dever do médico diante da Morte. In Estado de São Paulo: 03/07/1991. 23 representada tão-somente pela ministração de medicamentos destinados a aliviar o sofrimento do moribundo. Na ajuda ativa indireta são, igualmente, ministrados analgésicos que se destinam não só a aplacar o sofrimento como a encurtar a vida a vida do paciente. A ajuda a morrer passiva consiste sempre consoante a moderna doutrina alemã, na suspensão de terapias artificiais anteriormente utilizadas. Com semelhante omissão, a vida artificial do moribundo vem a ser encurtada.O mesmo não se pode dizer da ajuda ativa pura, ou da ajuda passiva. Na primeira, a conduta visa apenas a minorar o sofrimento alheio, sem que tal prestação implique um encurtamento da vida. Na ajuda passiva, não possível incriminar a conduta omissiva, não só pela inexistência do dever jurídico de prolongar uma vida irrecuperável e dolorosa, como pela inexistência do dever de viver, por parte do paciente”. Efetivamente, em relação à eutanásia com o consentimento válido da vítima – ou de seus representantes legais – ainda se poderia invocar a adequação social. Vale dizer, esta conduta não traria desvalor para que merecesse a sanção jurídico-criminal, por ser aceita pela comunidade. De fato, a comunidade não mais enxerga o agente da eutanásia como um homicida, vê-lo, em verdade, como alguém que é digno de proteção e de assistência, tendo em vista a problemática situação em que se envolve. A aplicação do instituto – princípio da adequação social – formulado por Welzel, tiraria, a partir da nova interpretação da norma penal, a possibilidade de aplicação de uma sanção criminal ao autor da eutanásia. Além disso, importa ressaltar que, no caso dos médicos, a eles não se poderia imputar a omissão penalmente relevante, como forma de nexo de não-impedimento, porque deles não se poderia exigir uma conduta que, em verdade, contraria a própria profissão que desempenham, é dizer, a medicina não consiste em prorrogar de forma irracional a vida humana, mas, em verdade, de lhe assegurar uma melhor qualidade de vida. Já que não se pode salvar a vida do paciente, pelo menos que se lhe dê o mínimo de conforto no final da vida. Ademais, não podendo salvar a vida do paciente, não se pode falar em omissão penalmente relevante – ad impossibilia nemo tenetur. 24 Releva notar, ainda, que o profissional ou o parente que interrompem a vida artificial da vítima, na eutanásia indireta, não agem com dolo próprio de matar, eis que buscam, em verdade, pôr fim a um sofrimento demasiado e desnecessário. Por tais razões, não se pode considerar que a eutanásia indireta e a ortotanásia sejam consideradas condutas delituosas. 3.5. O projeto de Reforma da Parte Especial do Código Penal. A despeito de toda a doutrina que trata da matéria, o projeto de reforma do Código Penal ainda não regrou como deveria ter feito a eutanásia. Com efeito, a respeito do mencionado projeto de Código, cabe colacionar as lições de Renato Marcão: “O art. 121, dispõe no § 3.º: "Se o autor do crime é cônjuge, companheiro, ascendente, descendente, irmão ou pessoa ligada por estreitos laços de afeição à vítima, e agiu por compaixão, a pedido desta, imputável e maior de dezoito anos, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável, em razão de doença grave e em estado terminal, devidamente diagnosticados: Pena - reclusão, de dois a cinco anos". Já no § 4.º estabelece: "Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se previamente atestada por dois médicos a morte como iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do paciente ou, em sua impossibilidade, de cônjuge, companheiro, ascendente, descendente ou irmão". Regula, assim, a eutanásia e a ortotanásia, respectivamente”.38 Quanto à ortotanásia, nada a opor. A questão é que o Código ainda cuida da eutanásia a pedido como modalidade de ato ilícito, apenas lhe dando uma pena menor. Já se expôs, neste ensaio, que, se se tratar de consentimento válido e emanado de quem de direito, não se pode falar em crime caso alguém proceda à eutanásia, tendo em vista a desnecessidade da tutela pena que representaria, efetivamente, um problema a mais. 38 MARCÃO, Renato Flávio. Homicídio Eutanásico: Eutanásia e Ortotanásia no Anteprojeto de Código Penal. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br>. Acesso em 05.06.2002. 25 Ressalte-se, com Roxin, que:39 “uma regulamentação satisfatória, que é o que nós juristas, noutras esferas temos como meta, e às vezes, inclusive alcançamos, aqui não é possível, mesmo assim, tentar moldar o direito de tal forma que ele, na medida do possível, dê ou ofereça ajuda, ou, pelo menos, somente ou tolere o mal menor. (...). Uma regulamentação legislativa da matéria, tal como a aprovada pelo (...) hoje, porém, bastante passível de correções – poderia trazer maior clareza e segurança jurídica”. Malgrado não se possa esperar que o legislador ressorvesse, de uma vez por todas, o mencionado problema, é possível afirmar-se, com Roxin, que se poderia ter dado melhor tratamento à matéria, gerando maior certeza jurídica. 4. Um breve apanhado histórico e localizado: O caso da Holanda. Apenas a título de ilustração, deve-se ter em mente a realidade da Holanda, país pioneiro na legalização da eutanásia. Pode-se constatar que “Em 1990, na Holanda ocorreram 11.800 mortes por eutanásia, suicídio assistido e overdose de morfina, perfazendo uma participação de 9% na mortalidade do país”.40-41 39 ROXIN, Claus. A Apreciação Jurídico Penal da Eutanásia. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 8, n.º 32, outubro-dezembro de 2000, p. 38. 40 Disponível <http://www.ufrgs.br/HCPA/gppg/eutmorho.htm>. Acesso em 01/06/2003. 41 A Holanda pode, efetivamente, servir de paradigma para a nova política criminal mundial. A respeito da eutanásia, foi o primeiro país a legaliza-la, conforme noticiou o jornal Zero Hora: “A Holanda tornou-se ontem o primeiro país do mundo a legalizar a eutanásia. Por 46 votos a favor e 28 contra, o Senado aprovou a lei que permitirá aos médicos abreviar a vida de doentes terminais. Do lado de fora do parlamento, com sede em Haia, cerca de 10 26 mil manifestantes protestaram contra a aprovação da lei, que já havia passado pela Câmara dos Deputados em novembro de 2000. Eles cantavam hinos religiosos e liam passagensda Bíblia. Apesar dos protestos, pesquisas indicam que cerca de 90% dos holandeses apóiam a eutanásia. A nova legislação, que deverá entrar em vigor em meados do ano, formalizará uma prática que já vinha sendo adotada há décadas em hospitais holandeses. – Isso permitirá que as pessoas façam suas próprias escolhas – elogiou Tamora Langley, da Voluntary Euthanasia Society, uma organização britânica pró-eutanásia. Os médicos terão que obedecer regras rigorosas para praticar a eutanásia (veja no quadro abaixo). O caso também deve ser submetido ao controle de comissões regionais encarregadas de fiscalizar se os requisitos foram cumpridos. As comissões serão integradas por um médico, um jurista e um especialista em ética. Os menores de idade, entre 12 e 16 anos, também poderão recorrer à eutanásia, desde que tenham o consentimento de seus pais. Segundo a nova lei, a prática só poderá ser realizada por médicos que acompanhem de perto – e há muito tempo – a saúde de seus pacientes. A nova lei também permite que pacientes deixem um pedido por escrito. Isso dará aos médicos o direito de usar seus próprios critérios quando seus pacientes não puderem mais decidir por eles mesmos por conta de doenças. O texto da lei foi aprovado oficialmente ontem, mas, na prática, a eutanásia já era tolerada sob condições especiais desde 1997. Apenas no ano passado, houve 2.123 casos oficiais de eutanásia na Holanda – 1.893 doentes de câncer pediram a um médico que terminasse com suas vidas, o que representa 89% do total das eutanásias realizadas no país em 2000. Depois, aparecem pacientes com doenças neurológicas, pulmonares e cardiovasculares. Nas semanas que precederam o debate da lei, o Senado recebeu mais de 60 mil cartas, a maioria delas pedindo que os parlamentares votassem contra a aprovação da lei. O grupo contrário à eutanásia Cry for Life, por exemplo, juntou 25 mil assinaturas em um abaixo-assinado. Egbert Schuurman, parlamentar da União Cristã, classificou a aprovação da lei de “erro histórico”. – Ser o primeiro país a legalizar a eutanásia é algo para se ter vergonha – disse Schuurman. As organizações contrárias à prática alegam motivos religiosos e éticos. Ontem, cerca de 8 mil pessoas se reuniram em frente ao Senado, em um protesto silencioso contra a aprovação da medida. A manifestação foi convocada por uma organização que agrupa 30 associações religiosas. – Somos contra o assassinato deliberado de pacientes – disse Alex van Vuren, do grupo Cry For Life. Requisitos A eutanásia será permitida na Holanda se forem cumpridos os seguintes requisitos: • Quando o paciente tiver uma doença incurável e estiver com dores insuportáveis; o paciente deve ter pedido; voluntariamente, para morrer. Depois que um segundo médico tiver emitido sua opinião sobre o caso. O que diz o padre Augusto Dalvit: “... A eutanásia é o ato através do qual as pessoas se julgam com autoridade para terminar com a vida dos outros. É uma intromissão no direito à vida. Fere a lei de Deus, o mandamento “Não matarás.” O que diz o médico Oly Lobato: “Em determinadas circunstâncias, sou a favor da eutanásia passiva. Ativa, jamais. Quando um paciente está praticamente morto, mantido vivo por recursos artificiais, acho que, se a família quer e consentir, o médico pode desligar.” O que diz José Roberto Goldin, professor de Bioética da UFRGS e da PUC- RS: “Como foi aprovada na Holanda, sou contra, porque pode abrir precedente para que a eutanásia seja feita de maneira involuntária. A equipe médica poderia tomar as decisões sem a participação do paciente.” Holanda legaliza a eutanásia. Prática é considerada crime no Brasil A prática da eutanásia é considerada crime no Brasil. A atual Constituição, de 1988, estabelece entre os direitos fundamentais do homem o direito à vida, impedindo, em princípio, qualquer tentativa de tornar legal o suicídio assistido sem que antes a Carta seja modificada. O Código Penal brasileiro não fala em eutanásia explicitamente, mas em “homicídio privilegiado”. Os médicos dividem a prática da morte assistida em dois tipos: ativa (com o uso de medicamentos que induzam à morte) e passiva ou ortotanásia (a omissão ou a interrupção do tratamento). Atualmente, no caso de um médico realizar eutanásia, o profissional pode ser condenado por crime de homicídio – com pena de prisão de 12 a 30 anos – ou auxílio ao suicídio – prisão de dois a seis anos. No anteprojeto de reformulação do Código Penal brasileiro, que está tramitando no Congresso, a eutanásia passiva pode ser permitida. Fernando Weber Matos, 2º secretário do Conselho Regional de Medicina do Estado (Cremers), explica que, segundo o novo código, o médico poderia omitir ou interromper a terapia do paciente, desde que a “morte iminente e inevitável” seja atestada por dois outros profissionais. Seria preciso também o consentimento da família e uma autorização judicial. De acordo com o anteprojeto, a pena de prisão por prática da eutanásia ativa seria reduzida em um terço ou à metade. Artigo disponível em <http://www.ufrgs.br/HCPA/gppg/eut2001.htm>. Acesso em 01/06/2003. 27 Tipo com consentimento sem consentimento Total Eutanasia Ativa 2300 1000 3300 Suicídio Assistido 400 400 Eutanásia por duplo-efeito 3159 4941 8100 Total 5859 5941 11800 O quadro acima exposto pode servir de base e de parâmetro para uma possível adoção da eutanásia no Brasil. 5. Considerações finais. À vista de tudo quanto foi analisado, pode-se asseverar que: • Não há, por mais importantes que sejam, bens jurídicos absolutos e irrenunciáveis, cabendo ao moderno aplicador do direito despir-se de um puritanismo e de pruridos no que diz respeito à análise da proteção à vida e às diversas modalidades de eutanásia; 28 • Para que se enfrente a problemática do direito a vida, não se pode olvidar que se trata do direito mais importante, e que este é o direito que viabiliza a realização de outros direitos; • A despeito disso, não pode ser interpretado com um rigor absoluto, pois isto conduziria a soluções injustas, summun jus, summa injuria; • Por conta disso, necessário se faz a análise cuidadosa do tema eutanásia, e de suas diversas implicações, bem como das conseqüências jurídicas das diversas modalidades de eutanásia; • A solução para a questão aqui analisada passa, necessariamente, pela análise da dignidade da pessoa humana; • Ainda que não se pudessem invocar outros argumentos, a inexigibilidade de conduta diversa teria de ser levada em consideração quando do tratamento da eutanásia; • Quando se trata de eutanásia indireta, dever-se-ia excluir a responsabilidade criminal do agente; • O Projeto de reforma do Código Penal, ao tratar da eutanásia, foi muito aquém do que poderia ter ido, ainda contemplando a eutanásia indireta como crime. 29 5. 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