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Resenha Daniel Aarão Reis Estado e Trabalhadores O Populismo em questão

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Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas
Departamento de Ciências Sociais
Trabalho de História do Brasil VIII 
Resenha�¹: 
O texto é a transcrição de uma conferência realizada pelo autor para o encerramento do I Simpósio do Laboratório de História Política e Social – 70 Anos do Estado Novo, foi apresentado e aprovado pela revista que o publicou em 2007. Nestas linhas que seguem o autor expõe problemas que pesquisadores enfrentam ao analisar os aspectos do legado do Estado Novo como uma história de conquista dos brasileiros, sobretudo dos trabalhadores. Mostra como o conceito de populismo se abre como uma frente ampla muito variada, argumentando que uma de suas propostas era desqualificar a participação dos brasileiros na construção de todo esse cenário ao desqualificar também este movimento político onde houve grande participação popular em sua construção e debate.
Ao mencionar o Grupo de Trabalho: Partidos e Movimentos de esquerda, Daniel explica que o grupo teve uma grande colaboração desenvolvendo uma obra que trata da Historia do Marxismo no Brasil. A obra considera que apenas pertenciam à esquerda os comunistas brasileiros, com alguma resistência mencionaram os socialistas e anarquistas, porém excluíram as correntes trabalhistas e ainda consideraram-nas populistas, ignorando o trabalhismo como uma vertente da esquerda. O mesmo Grupo demonstrou muita resistência ao admitir a existência de esquerdas no plural, considerando apenas de uma esquerda comunista.
 
O autor afirma que a construção dos momentos históricos do Brasil contou com a participação das esquerdas como a socialista, anarquista, comunista e suas dissidências e a tradição que ele mesmo passou a chamar de nacional-estatista que contribuiu para a  formação histórica do trabalhismo no Brasil até 1964 e retornaria após a Ditadura.
Esta tradição ou trabalhismo, segundo pesquisadores, é uma tendência de esquerda formada pela sociedade e por trabalhadores brasileiros. Daniel afirma que compreender esta tradição como uma corrente de esquerda é fundamental para o entendimento da formação das tradições de esquerda do Brasil e segundo o autor, as tradições trabalhistas enraízam-se no período do Estado Novo.
Analisa o termo populismo a partir de um contexto de transição de Brasil Rural para Urbano partindo do principio de que todos os “populistas” autores que analisam este conceito o desenvolvem através desta lógica. O país passou por um processo de modernização, passando de um ambiente majoritariamente rural para um cenário urbano e industrial, esse processo foi acelerado, sobretudo a partir de 1930. Entre 1930 e 1980 o Brasil compreendeu a maior transformação de Brasil Rural para Urbano, este período consistiu um processo gigantesco de mobilidade social e geográfica. Dentro deste prisma houve uma grande transformação na formação social e política do país, que também acompanhou toda essa lógica de transformação e modernização. No inicio do século XX já se viam lutas de operários e trabalhadores por melhores condições e representatividade. A partir deste processo que surgiram as esquerdas inseridas num cenário de operários e trabalhadores com maior relevo à tradição nacional-estatista.
Em relação ao período de Primeira Republica se observou uma preferência pelo estudo das tendências anarquistas, principalmente no período de 1970 e 1980. Também foi observada uma forte tendência ao estudo dos comunistas e socialistas. Entretanto, não se observou o estudo da tradição nacional-estatista, sendo sub-valorizada e desqualificada pelos anarquistas e comunistas como tradição amarela e apêndice do Estado, os chamados Pelegos.
A tradição nacional-estatista, os chamados amarelos buscavam a definição pelo Estado de uma legislação de amparo ao trabalhador que o protegesse contra as arbitrariedades das empresas privadas. A partir deste eixo, as tradições brasileiras se aproximam das lideranças das classes operárias da Europa Ocidental que do mesmo modo buscavam tecer alianças com o Estado para se protegerem dos capitalistas privados  e neste sentido registraram conquistas muito significativas.
 
No movimento civil militar de 1930, que, segundo o autor, foi mal chamado de revolucionário, ocupa o poder o positivismo gaúcho liderado por Getulio Vargas que definiu as legislações sociais para amparar os trabalhadores e ao mesmo tempo criou mecanismos para reprimi-los se não estivessem disciplinados de acordo com as regras estabelecidas. Anarquistas e Comunistas foram duramente reprimidos, ambos resistiram aos sindicatos oficiais ligados ao Ministério do Trabalho. Depois os comunistas passam a integrar os sindicatos com a intenção de combater por dentro suas estruturas sindicais. Este processo se dá entre 1930 e 1945, se acelerando no período do Estado Novo culminando em seu processo mais afirmativo em 1943 com a edição da Consolidação das Leis do Trabalho/CLT.
Houve grande inclusão dos trabalhadores urbanos neste projeto de Nação  alinhada a esta inclusão havia também uma perspectiva de regular o mercado capitalista e distribuição de riqueza social, proposta própria do positivismo gaucho no fim do século XIX e inicio do século XX.
O conceito populista só surge na década de 50, e na perspectiva desta tradição os trabalhadores não passavam de uma massa manipulada deste processo, não participaram ativa e conscientemente deste projeto.  Em contraponto o autor cita a Professora Ângela de Castro Gomes que afirma justamente o contrário em sua pesquisa, os trabalhadores viam com muita simpatia o projeto quando não participavam ativa e conscientemente do mesmo.  Por este motivo Getulio Vargas foi tão admirado sendo eleito em 1950 e após seu suicídio seguiram muitas manifestações confirmando a popularidade de Vargas. Mesmo assim havia seguimentos que não eram a favor de deste projeto e como foi citado anteriormente, fazia parte da dinâmica deste processo a repressão aos que não se disciplinavam de acordo com a regra estabelecida. Em síntese, ao passo que o Estado Novo editou a CLT promovendo direitos e garantias em defesa dos trabalhadores, reprimiu duramente todos os que se opunham a essas propostas.
Massas Manipuladas era o termo por excelência escolhido pelos pensadores populistas em referência à classe trabalhadora. Os trabalhadores eram manipulados por elites super-conscientes e por líderes carismáticos com o poder de antevisão e com grande capacidade de hipnotizar as massas, esta era a proposta da tradição populista.
Após 1945 o Partido Trabalhista Brasileiro foi fundado, e de acordo com os populistas o PTB foi criação da mão esquerda de Getulio  Vargas enquanto que o Partido Social Democrático foi criado pela mão direito de Vargas, dando assim o aspecto superestimado do líder seguindo  a lógica populista. Esta perspectiva configurava ao Getulio uma idéia populista de mãe dos ricos e pai dos pobres. Entretanto, a fundação do PTB contou com a participação de lideranças sociais de trabalhadores que foram cruciais para formação dos primeiros membros do partido.
 
O PTB se expandiu até 1964, este processo de crescimento do partido incomodou as oligarquias que viam as classes trabalhadoras sair do seu controle ao se organizar em torno da nova organização Política e as esquerdas reunidas em Partidos como o PSB, sobretudo o Partido Comunista também se incomodavam, pois lutavam por essa mesma classe trabalhadora. O PTB foi ganhando grande prestigio entre os trabalhadores brasileiros se tornando em um grande partido político entre os anos de 1945 e 1964. As pesquisas do IBOPE revelam notório crescimento do partido acompanhado com a identificação dos trabalhadores com o trabalhismo e com o PTB.
 
O apogeu do Projeto nacional-estatista foi observado entre 1950 e 1954, no último governo de Vargas em um cenário histórico ilustrado por grandes lutas nacionalistas como a luta pela Petrobrás e movimentos sindicais como a greve dos 300 mil trabalhadores de São Paulo em 1953 eprincipalmente a duplicação do salário mínimo em 1954. No entanto, o trabalhismo sofria perseguições tanto das esquerdas representadas pelos socialistas e comunistas quanto das oligarquias tradicionais culminando no suicídio de Vargas em 1954. Após o suicídio de Getulio o Partido Comunista foi surpreendido pela reação desesperada da classe trabalhadora, refletindo uma grande comoção. A partir deste cenário o Partido Comunista passou a buscar alianças com o trabalhismo e com o PTB, porém ainda com rivalidades, esse processo de busca de alianças perdurará até o golpe militar de 1964.
Nesse contexto que vai se formar o conceito de populismo que parte da lógica de transição do Brasil Rural para o Brasil Urbano em que as grandes massas começaram a ser formar nas grandes cidades, ainda não constituindo classes sociais. As classes tradicionais dominantes não seriam capazes de dominar essas massas, por isso a lógica do populismo de atribuir essa liderança a uma figura carismática, denominada populista, com capacidade de controlar as massas. Essas massas não teriam participação ativa e seriam reduzidas a um processo de manipulação.
 
Este posicionamento de exclusão das classes trabalhadores na formação deste fenômeno político brasileiro abarca as elites dominantes de direita e esquerda que não toleram a figura de trabalhadores brasileiros serem recebidos por lideranças políticas ou tendo representatividade na política, o autor ilustra esse fenômeno citando a figura do político Lula como alvo de ojeriza das elites por não aceitarem a ascensão dessas massas aos espaços políticos. 
 	Em pleno Século XXI o conceito de populismo sofreu muitos ataques de todos os lados. As elites sempre acharam que o povo não sabe votar e a esquerda começou a corroborar com esse discurso pois começou a perder o controle sobre a massa de operários que herdou do pensamento marxista. 
	Entre 1961-1964 nossa república teve os mais radicais embates sociais. Houve forte impregnação da tradição nacional-estadista com a proposição das reformas de base. Trabalhadores rurais invadindo terras, estudantes e operários realizando greves. O processo contaminou as bases das forças armadas.
	Uma frente social inédita se formou exigindo reformas: reforma eleitoral para que os analfabetos votassem; reforma universitária para que as pesquisas fossem voltadas integralmente aos problemas brasileiros; reforma agrária para a distribuição mais igualitária das terras.
	O autor do referido texto nos apresenta que na época muitos pensadores e ativistas consideravam estas reformas burguesas, que elas só aperfeiçoariam a exploração capitalista sem afetar os interesses da burguesia e das elites conservadoras. Só não explicavam porque os burgueses se uniram contra o processo. 
	O autor ainda critica a visão marxista, dizendo que eles atribuem papéis históricos pré-determinados aos atores sociais e quando esses papéis saem do pré-determinado há um problema. Marx seria um roteirista que “teria elaborado nada menos do que o roteiro da história da humanidade, da cultura primitiva ao comunismo, e os atores sociais todos têm os seus papéis e ai deles quando não cumprem os papéis previstos.” (pág. 101)
	Mas no período histórico que ele trabalha no artigo que estamos resenhando, 1961-1964, havia uma predominância do projeto nacional-estatista. O Partido Comunista e o Partido Socialista se agregaram nesta proposta e quase que dissolveram também suas identidades na construção das propostas deste projeto. No PTB e com os trabalhistas segmentos se radicalizam. Antes de 1964 uma vertente nacionalista revolucionária capitaneada por Leonel Brizola com os Grupos dos 11 e o Movimento Nacionalista Revolucionário / MNR, formado em 1963. Vários grupos inspiravam-se na Revolução Cubana nesta época. Haviam também pequenas organizações: a AP/Ação Popular, entre os católicos; o Movimento Revolucionário Tiradentes / MRT, no âmbito das ligas camponesas; a Organização Revolucionária Marxista-Política Operária, ORM / POLOP, etc. Elas surgem e denunciam a proposta nacional-estatista. Mas uniam-se às outras organizações para somar nas manifestações. 
	Todo o nacional-estatismo rui em 1964 com o golpe militar. Tudo o que foi construído desde 1945, desde antes até do Estado Novo foi por água abaixo. As lideranças do PTB são cassadas mas ele se mantém. Renúncia de Jango e muitas outras pessoas se retiram da luta de resistência ao ataque das alas de direita. Esta fuga do combate desmoralizou muito o projeto nacional-estatista. 
	O populismo teve momento de êxito e apogeu, mas faliu a partir de 1964, com a radicalização da Ditadura, o Brasil sai de um processo dominado pelas massas para um outro caracterizado pelas classes. A Ditadura reprimiu muito os trabalhadores e não houve como construir propostas conciliatórias. Segundo raciocínios da época, aconteceria “um enfrentamento aberto e nesse enfrentamento (...) as classes trabalhadoras deveriam finalmente adquirir consciência de seus interesses históricos, voltando-separa o socialismo e superando as propostas inconseqüentes do nacional-estatismo.” (pág. 102) 
	A ideia das direitas era destruir o legado getulista, por isso eles, os golpistas, se auto intitularam revolucionários. O Estado getulista, o sindicalismo corporativista, etc. Abrir as portas do Brasil para o capitalismo liberal.
	O populismo passa a ser demonizado pela esquerda e pela direita radical, representando tudo o que de mais atrasado existe. Os populistas são corruptos, mentirosos, safados, demagogos, fujões, covardes e outras... 
	Esquerdas revolucionárias, armadas ou não, se lançaram de forma catastrófica na luta contra a Ditadura. Não conseguiram mobilizar a população. A revolução não aconteceu e nosso capitalismo deu um passo pra frente com muitas desigualdades. As propostas revolucionárias ficaram isoladas. As esquerdas revolucionárias foram liquidadas física e politicamente. 
	A direita percebeu que algumas instituições getulistas poderiam ser preservadas e as preservou para auxiliar no processo de desenvolvimento econômico capitalista antipopular da época. Sindicatos poderiam ser usados para disciplinar e enquadrar as classes trabalhadoras. Houve logo no governo Castelo Branco uma tentativa de privatizar a economia mas ela logo foi barrada. No governo Geisel mais se criaram e se potencializaram empresas estatais no Brasil, só perdendo pra Getúlio Vargas. 
	Nacional-estatismo, populismo e trabalhismo são braços de vertentes políticas que formaram grandes movimentações e implementaram instituições consolidadas até hoje em nossa sociedade. Em 1970 muitas lideranças surgem do que foi feito pelo nacional-estatismo, da estrutura corporativista fundada em 1930 e 1940 e consolidada pela C.L.T. “Quase todos os líderes sindicais do ABC, e das outras letras do alfabeto, que surgem no final dos anos 1970, são produtos das estruturas sindicais tradicionais do getulismo. Muitas pessoas viam na capacidade de lotar estádios de futebol que essas lideranças tinham, uma nova visão do sindicalismo. Nascia um novo sindicalismo. Tradição de nosso país chamar algo de novo em seu surgimento. 
	Ali começa a surgir o fato de que homens afeitos à barganha, à negociação, ao diálogo foram chamados de revolucionários e considerados os novos capitães de uma transformação socialista no Brasil. Houve curiosa aliança entre intelectuais radicais e sindicalistas moderados fundando partidos como o PT. 
	Na aliança medrou a ilusão de que se estava diante de uma novidade radical no Brasil. Não quero negar os aspectos originais, seria fazer uma história retrospectiva. Contudo, a seqüência dos acontecimentos iria evidenciar uma força que, gradativamente, foi vencendo o Verbo, chegando ao de cima, como dizem os portugueses, e esta força foi chegando imperceptível e silenciosa, e tinha o peso das tradições bem ancoradas, e não haveria outro nome para designá-la senão aquele com o qual estamos trabalhando, as tradições nacional-estatistas.Há sindicatos na Europa cujos ganhos só se aplicam aos que são filiados ao sindicato e não aos demais. No Brasil se o sindicato ganha alguma coisa é para toda a categoria, sindicalizados ou não. Então, já que qualquer trabalhador ganha, todos devem pagar, um dia de trabalho para a estrutura sindical, para que possa lutar por todos.
	Durante muitos anos, muitas décadas, conformou a análise do processo da social-democracia na Europa, o que acabaria conduzindo alguns críticos a fazer um questionamento básico. Como é que uma classe considerada a mais revolucionária do mundo, destinada a emancipar a humanidade, pode ser assim tão estúpida para votar sempre em traidores, algo está errado nesse arcabouço teórico. E realmente o que se viu foi que, cada vez que o PT ia se popularizando, incorporando o elemento popular, vai adotando posições reformistas moderadas, que o aproximam muito das tradições nacional-estatistas em suas versões mais moderadas.
	Em certo momento, pareceu que ia conhecer uma nova morte, em 2005, no auge dos escândalos de corrupção, a sociedade brasileira viveu uma terrível vaga moralista. Mas houve a reviravolta que todos conhecem e as eleições de 2006 voltaram consagrar não apenas o Lula, mas o PT. Foi um momento em que se disse: o Lula pode se salvar, mas o PT não vai se salvar.
querer atribuir a força do fenômeno à capacidade de prestidigitação de alguns líderes, que se destacariam pela capacidade manipulatória, é um grosso equívoco que nos impede de compreender a história do Brasil, das suas esquerdas e das suas grandes lutas sociais. Se isso pode ser compreensível até os anos 1960, hoje, a meu ver, só pode ser explicado à luz do ressentimento, sempre um mal conselheiro, ou das rivalidades políticas.
UERJ
Ciências Sociais
Trabalho de
História do Brasil VIII
2013/2
Professor:
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Alunos:
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Rio de Janeiro, _____ de novembro de 2013.
� Reis, Daniel Aarão. Estado e Trabalhadores: O Populismo em questão. 2007.

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