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Mutações Genéticas: Tipos e Consequências

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MUTAÇÕES 
Eduardo Dias 
Embora um dos mais importantes requisitos do material genético seja a sua 
estabilidade, a capacidade de mudança também é necessária. As mutações gênicas são 
importantes para a evolução biológica, pois elas produzem uma diversidade genética que 
pode ser expressa como uma variabilidade de características, as quais serão selecionadas ou 
não pelas condições do ambiente. 
Mas o que é, afinal, uma mutação? Mutação é uma alteração súbita, permanente e 
herdável no material genético de uma célula (que não sejam processos de recombinação), 
podendo conferir mudanças nas características do indivíduo. Estas modificações na 
estrutura do DNA também podem ser prejudiciais às células, uma vez que têm a capacidade 
de alterar processos vitais, como a duplicação do DNA e a transcrição gênica, além de 
contribuir para o desenvolvimento de processos tumorais e morte celular. 
Podem ser classificadas em três categorias: 
• Genômicas: quando afetam o número de cromossomos na célula. Ex: aneuploidias 
• Cromossômicas: alteram a estrutura de cromossomos individuais. Ex: duplicações, 
deleções, inversões, translocações. 
• Gênicas: alteram genes individuais. Ex: mutações de ponto, deleções e inserções de 
base. 
Mesmo uma pequena mutação gênica pode ter grandes efeitos, dependendo local do 
genoma (se é um gene ou não), do gene que foi alterado e de que efeito a alteração tem na 
expressão do gene. Uma mutação gênica que consista na mudança de um único nucleotídeo 
na seqüência codificante de um determinado gene pode levar a uma perda completa de 
expressão do gene ou à formação de uma proteína variante com propriedades alteradas. 
Qualquer célula pode sofrer mutação, tanto as germinativas quanto as somáticas. 
Apenas as mutações da linhagem germinativa são transmitidas de uma geração para a 
seguinte e são responsáveis pelas doenças hereditárias. Mutações nas células somáticas, 
entretanto, são muito mais freqüentes e provocam alterações diretas no indivíduo portador 
da mutação, podendo ser transmitidas para as células filhas daquela que sofreu a mutação. 
Caso a função de um determinado gene seja afetada, este será responsável pelo 
desenvolvimento de doenças, sobretudo o câncer. Do contrário, a mutação na célula 
somática poderá ser uma fonte de variabilidade, o que chamamos de polimorfismos. 
 
 
 
TIPOS DE MUTAÇÃO GÊNICA 
Hoje se sabe que qualquer modificação no código genético de um organismo pode 
ser chamada de mutação. Tais modificações podem envolver alterações na seqüência 
codificante ou na forma em que o código genético é organizado. 
Mutações de Ponto 
Simplificadamente, ocorre como resultado de substituições em pares de bases 
envolvendo apenas um ou alguns poucos nucleotídeos. Caracteriza-se transição quando há 
substituição de purina por purina (G• A e A• G) ou de pirimidina por pirimidina (C• T e 
T• C). Transversão ocorre quando uma purina é substituída por pirimidina, e vice-versa. 
De acordo com o código genético, um certo aminoácido pode ser determinado por 
mais de um códon; algumas mutações, portanto, não alteram a seqüência de aminoácidos 
produzida pelo gene modificado e sua função permanece a mesma. Por exemplo: o 
aminoácido Prolina pode ser determinado pelos códons CCA, CCC, CCG e CCU. Portanto, 
uma mutação na terceira base desses códons não provocaria mudança na seqüência de 
aminoácidos da cadeia poliipeptídica. As mutações desse tipo são chamadas “silenciosas” e 
são bastante freqüentes; elas são responsáveis por uma variabilidade genética que é sempre 
maior do que a diversidade de características. 
Existem mutações que alteram a proteína, pois causam a substituição de um 
aminoácido na proteína em formação. As conseqüências podem ser graves, alterando 
completamente a forma espacial e a função da proteína. É o caso da substituição de um 
nucleotídeo no gene responsável pela produção da hemoglobina, em que o códon GAA 
passa a ser GUA. Com isso, há substituição de um aminoácido na cadeia polipeptídica 
(Glutamato • Valina), que resulta na produção de hemoglobina defeituosa, causando uma 
doença chamada anemia falciforme. Estas são mutações com sentido trocado. 
Há casos em que mutações na seqüência de nucleotídeos e de aminoácidos não 
resultam na perda ou alteração da função da proteína. Certas regiões de uma molécula 
podem não ser essenciais ao seu funcionamento. A insulina, por exemplo, é um hormônio 
presente em todos os vertebrados, mas a molécula não é idêntica em todas as espécies. 
Quando comparamos a seqüência de aminoácidos da insulina de duas ou mais espécies 
diferentes, observamos alterações na seqüência que, no entanto, não prejudicam a forma e a 
função dessa proteína. Dizemos então que ocorreram mutações funcionalmente neutras, 
conservadas no genoma dos indivíduos ao longo das gerações. 
Uma mutação que gera um dos três códons de parada (UAA, UAG, UGA) é 
chamada sem sentido. Se o RNAm for suficientemente estável para ser traduzido, o 
produto da tradução em geral será tão instável que sofrerá degradação dentro da célula. Esta 
situação poderá ser tão importante a ponto de levar o indivíduo a uma condição letal. 
Além das regiões codificadoras, outras porções do DNA que podem sofrer mutação 
são sítios de splicing, seqüências regulatórias, genes de fatores de transcrição ou regiões 5’ 
e 3’ não traduzidas. Apesar de não fazerem parte do RNAm, estão diretamente relacionadas 
aos éxons, podendo interferir na expressão gênica, reduzindo ou aumentando-a, além de 
conferir instabilidade ao RNAm quando mutadas. 
Mutações de ponto de um único nucleotídeo nos microssatélites mostraram haver, 
nestes segmentos de DNA repetivivo em tandem, o favorecimento de um tipo de mutação 
em vez de uma substituição espontânea ou aleatória de bases. O excesso de transições 
encontradas pode ser compreendido pelo mecanismo de metilação de citosinas (formando 
5-metilcitosina), que ocorre especificamente quando uma citosina está situada ao lado de 
uma guanina. A desaminação espontânea da 5-metilcitosina formada em timina no par CG 
origina transições C→T ou G→A. Este tipo de mutação é 25 vezes mais freqüente que 
qualquer outra mutação de um único nucleotídeo. Assim, o par CG é chamado de “hot 
spot”, por representar um verdadeiro “ponto quente” para mutação no gemoma humano. 
Inserções e Deleções 
Nem todas as mutações gênicas são substituições de bases. Às vezes um nucleotídeo 
pode ser inserido ou excluído da seqüência de bases do DNA. No processo de síntese 
protéica, cada trinca de bases corresponde a um determinado aminoácido; se uma ou duas 
bases são adicionadas ou excluídas, ocorre deslocamento do módulo de leitura (frameshift 
mutation), o que significa que toda a seqüência de códons será alterada; conseqüentemente, 
a seqüência de aminoácidos também não será mais a mesma. 
 Inserções ou deleções de trincas de nucleotídeos podem apenas acrescentar ou 
excluir um aminoácido da cadeia polipeptídica. Isto significa que a proteína terá um 
determinado aminoácido a mais ou a menos, mas não terá toda a seqüência de aminoácidos 
alterada. 
Grandes inserções e deleções gênicas podem levar a aumentos ou perdas 
consideráveis de material genético. Ocorrendo em determinados locais – como no DNA 
repetitivo em tandem – elas levam a pareamentos errôneos tanto durante a mitose (após a 
replicação, quando as duas cromátides irmãs em geral trocam DNA) quanto durante a 
meiose (quando os cromossomos homólogos ficam pareados e fazem crossing over). O 
mecanismo de crossing over desigual é tido como o responsável pela deleção de um dos 
genes de α-globina na α-talassemia e de genes de pigmentos visuais verdes (provocando 
alterações na percepção e distinção das cores vermelha e verde). 
Uma classe importante descrita de mutações é a repetição de trinucleotídeos, vista 
em distúrbios como a “doença de Huntington”e a “síndrome do X frágil ”. Nestas doenças, 
a expansão trinucleotídica – situada na região codificante (doença de Huntington) ou na 
região transcrita mas não traduzida de um gene (síndrome do X frágil) – pode ampliar e 
interferir na expressão gênica normal, por gerar um produto protéico anormal ou alterar a 
transcrição ou o processamento do RNAm. 
Outro mecanismo responsável por alterações no código genético é a mutagênese de 
inserção. A família L1 de seqüências intercalares repetitivas representa uma classe de 
DNA passível de ser transcrita em RNA que, quando reversamente transcrito, gera uma 
seqüência de DNA capaz de se inserir em pontos diferentes do genoma. Em alguns 
pacientes com hemofilia A, seqüências L1 com vários kb de tamanho foram encontradas 
inseridas em um éxon no gene do fator VIII da coagulação, interrompendo a seqüência 
codificante e inativando o gene. Este achado sugere que pelo menos algumas das 100.000 
cópias da família L1 no genoma humano são capazes de causar doença por mutagênese 
insercional. 
 
 
 
ORIGEM DAS MUTAÇÕES: 
As mutações podem ser espontâneas (determinadas por fatores endógenos) ou 
induzidas (quando decorrem de agentes exógenos). 
Espontâneas: promovidas por modificações químicas das bases. 
 Tautomerização: As purinas e pirimidinas no DNA e RNA podem existir sob 
várias formas alternativa, ou tautômeros. A tautomerização ocorre pelo rearranjo de 
elétrons e prótons na molécula. Tautômeros incomuns de adenina, citosina, guanina e 
timina diferem das formas comuns na posição em que se liga um átomo de H. Como 
resultado, algumas. ligações simples tornam-se duplas, e vice-versa. A figura abaixo mostra 
um exemplo de tautômeros de Timina. O grande problema deste tipo de alteração é que, nas 
formas raras, as bases fazem pareamentos não usuais (ex: T-G). 
 
 
 
 
 
 
 
. 
 
 
 
 
 
 
Desaminação: alterações nas bases do DNA por substituir um grupamento amina (-
NH2) por uma hidroxila (-OH). Da mesma forma que na tautomerização, as bases 
desaminadas comportam-se como bases não usuais e fazem pareamentos errôneos (ex: H – 
C). 
 
 
 
 
 
Depurinação: erro na replicação do DNA forma sítios sem a presença purinas. 
Induzidas: promovidas pela ação de agentes físicos e químicos 
 Radiações ionizantes: raios X, α, β, gama. Induzem a formação de íons reativos e 
radicais livres, bem como provocam alterações nas bases e quebras na cadeia do DNA (de 
uma ou ambas as fitas) 
 Radiações não-ionizantes: raios ultravioleta. Embora não possuam energia 
suficiente para ionizar o DNA, carregam energia suficiente para alterar a molécula. A mais 
conhecida ação da radiação UV no DNA é a indução de dímeros de pirimidina. Trata-se da 
indução de ligações carbono-carbono entre pirimidinas adjacentes, sendo mais comum com 
a timina. Isto resulta na distorção da molécula ou ligações entre moléculas adjacentes, o que 
temporariamente pára a replicação do DNA. 
 
 Grupo amina Hidroxila 
 
 
 
 
Análogos de bases: Algumas substâncias têm estruturas moleculares tão similares a 
bases comuns que tais análogos podem ser incorporados caso estejam presentes no 
filamento de DNA em replicação. Ex: o 5-bromouracil em sua forma comum irá substituir a 
timina, com quem se assemelha estruturalmente. Outro análogo é a 2-aminopurina, que se 
assemelha à adenina. 
Agentes desaminantes: ácido nitroso e bissulfito sódico. Substituem grupamento 
amina (-NH2) por hidroxila (-OH), provocando as mesmas alterações que ocorrem na 
desaminação espontânea. 
Agentes alquilantes: nitrosaminas e metil-nitrosoguanidina. Reagem com o DNA 
adicionando grupamentos etil ou metil às bases. Isto resulta no mau pareamento da base 
afetada ou em sua total perda, criando uma falha. A base primariamente afetada pelos 
agentes alquilantes é a guanina, embora outras bases também possam ser alquiladas. As 
mostardas e enxofre nitrogenados, identificados como mutágenos por Auerbach, são 
agentes alquilantes. 
Agentes intercalantes: corantes de acridina e proflaminas. Os corantes acridínicos 
são uma classe de substâncias químicas que se intercalam entre as bases do DNA, 
distorcendo a molécula e rompendo o alinhamento e pareamento das bases. Tal distorção 
resulta em deleção ou adição de pares de bases durante a replicação. 
 
 
 
REFERÊNCIAS 
BURNS GW, BOTTINO PJ. Genética. 6a. edição, Editora Guanabara Koogan S.A. 1991. 
HARTL DL. Essential genetics. Jones and Bartlett Publishers Inc.1996. 
SNUSTAD DP, SIMMONS MJ, JENKINS JB. Principles of genetics. John Wiley & Sons 
Inc.1997. 
SUZUKI. DT, GRIFFITHS AJF, MILLER JH, LEWONTIN RC. Introdução à Genética. 4a. 
edição. Editora Guanabara Koogan S.A. 1991. 
WEAVER RS, HEDRICK PW. Genetics. 3th edition. The McGraw-Hill Companies Inc. 
1997. 
NUSSBAUM RL, McINNES RR, WILLARD HF. Thompson & Thompson: Genética 
Médica. 6ª edição. Guanabara Koogan S.ª 2002

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