
Manual de procedimentos de água em vigilância em saúde ambiental.
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as limitações e a complexidade do emprego por completo da metodologia de avaliação e análise de risco, no exercício rotineiro do controle e da vigilância da qualidade da água é possível e recomendável a incorporação das etapas de identificação de fatores de risco (perigo), do gerenciamento e da comu- nicação de risco. 5.2 PERIGOS ASSOCIADOS AO ABASTECIMENTO DE ÁGUA A qualidade da água é um atributo dinâmico no tempo e no espaço. A qua- lidade da água bruta varia de forma sazonal, de acordo com as estações do ano; além disso, é fortemente influenciada pela dinâmica de uso e pela ocupação do 2 Nos EUA, admite-se um risco anual de infecção de 1:10.000 (10-4) para os diversos organismos patogênicos transmissíveis via abastecimento de água para consumo humano (HAAS et al., 1999; MACLER, 1993). Significa dizer que se considera aceitável um caso de infecção em cada 10.000 pessoas dentre uma população consumidora. Para este nível de risco, a concentração, por exem- plo, de cistos de Giardia e oocistos de Cryptosporidium na água tratada teria de ser, no máximo e respectivamente, de 6,9 x 10-6/L e 3,27 x 10-5/L. Entretanto, o monitoramento dessas concentra- ções de microorganismos na água tratada é praticamente impossível. Como alternativa, pode-se recorrer à avaliação da qualidade da água bruta e, ou, à avaliação da remoção dos microorganis- mos por meio do tratamento da água ao nível de risco aceitável, por exemplo com o recurso à remoção de indicadores (Bastos et al., 2001). Manual de procedimentos de vigilância em saúde ambiental relacionada à qualidade da água para consumo humano 118 Secretaria de Vigilância em Saúde solo na respectiva bacia. Na estação de tratamento, a água passa por diversos processos físico-químicos e a ela são introduzidos vários produtos químicos. A qualidade do produto final resulta da qualidade da água bruta, do estado de conservação de equipamentos e instalações da estação e do rigor no con- trole operacional dos processos de tratamento. Do tratamento ao consumo, podem ocorrer as mais variadas interferências e alterações na qualidade da água, decorrentes, por exemplo, de: estado de conservação das unidades de reservação (inclusive predial) e distribuição, subpressões e reparos no sistema de distribuição. Assim, sob a ótica da avaliação e do gerenciamento de riscos, a vigilância da qualidade da água para consumo humano requer uma visão holística que perceba a dinâmica da qualidade da água, do manancial ao consumo. Para tanto, é funda- mental que se identifiquem perigos potenciais, os quais podem comprometer a potabilidade da água. É disto que trata este item, com ênfase nos perigos associados à implantação, à manutenção e à operação das diversas formas de abastecimento e consumo de água. A seguir, são apresentadas situações ou exemplos de perigos que podem impli- car riscos à saúde da população consumidora. Priorizou-se a apresentação segundo os componentes dos sistemas de abastecimento, soluções alternativas coletivas e individuais. Salvo pequenas particularidades, as exemplificações dos perigos são feitas sem distinção da forma de abastecimento de água, uma vez que são comuns à maioria dos casos. MANANCIAIS E CAPTAÇÃO Águas subterrâneas • Fendas ou falhas, naturais ou abertas nas camadas superpostas às for- mações aqüíferas, principalmente quando da descarga de drenagem superficial ou efluentes nas proximidades do manancial. • Infiltrações no revestimento de poços tubulares; revestimento não suficientemente profundo, revestimento não elevado acima do solo ou do piso da sala de bombas ou não fechado na extremidade superior; revestimento impropriamente usado como canalização de sucção. • Poço de captação ou reservatório sujeito a contaminação pelo reflu- xo de água poluída por meio de dreno impróprio ou por efeito de drenagem superficial. Ausência de tampas, dispositivos de inspeção impropriamente construídos, frestas, etc. que possam permitir con- taminação. • Estruturas de captação sujeitas a inundações. Manual de procedimentos de vigilância em saúde ambiental relacionada à qualidade da água para consumo humano 119 Secretaria de Vigilância em Saúde • Emprego de manilhas de barro ou outros condutos não impermeáveis em lugares onde a água do subsolo pode ser contaminada. • Condutos sob pressão em conexão perigosa com esgoto ou com abas- tecimento de água de qualidade inferior. • Poços situados nas proximidades de sistemas de esgotos, fossas, irri- gação subsuperficial por meio de manilhas; instalações de criação de animais, postos de gasolina, ou outras formas de contaminação. • Bocas e revestimentos de poços, bombas e instalações de recalque e sucção expostos; caixas de válvula em comunicação com canalizações de sucção. • Resíduos industriais e agropecuários lançados na área da bacia de cap- tação, em águas superficiais, na superfície do solo ou em camadas sub- terrâneas, causando contaminação das águas subterrâneas. • Inexistência de medidas de proteção de nascentes e bacias de captação. • Inexistência de medidas de disciplina de usos múltiplos e conflitantes da água e do solo. • Inexistência de restrições ao uso para fins recreativos na área de captação. • Existência de focos de poluição pontuais ou difusos, tais como ocu- pação residencial na bacia de captação, atividades agropecuárias e industriais. Assumem particular importância: (i) os focos de po- luição associados à carga de nutrientes (ex.: atividades agrícolas), que concorrem para a eutrofização de mananciais e as devidas con- seqüências ao tratamento da água e à saúde humana por causa da proliferação de algas e cianobactérias; (ii) as atividades pecuárias como fonte de contaminação de mananciais com organismos pato- gênicos com potencial zoonótico, em especial os protozoários, em razão da reconhecida maior dificuldade de remoção por meio de processos convencionais de tratamento de água; (iii) as atividades agrícolas, industriais e extrativistas (ex.: garimpo) como fontes de contaminação de substâncias químicas refratárias aos processos do tratamento convencional da água, tais como agrotóxicos e me- tais pesados. Manual de procedimentos de vigilância em saúde ambiental relacionada à qualidade da água para consumo humano 120 Secretaria de Vigilância em Saúde Figura 5.1 – Exemplo de identificação de perigo: manancial eutrofizado, proliferação de macrófitas TRATAMENTO • Inadequação do processo de tratamento existente à qualidade da água bruta. • Sobrecarga das estações de tratamento. • Controle operacional deficiente dos processos unitários de tratamento, cobrindo as variações sazonais de qualidade da água bruta e de vazões afluentes à estação de tratamento de água: • negligência no ensaio sistemático de Jar Test, dosagem e aplicação incorretas de coagulante; • negligência no controle rigoroso dos parâmetros de controle da de- sinfecção: dosagem, tempo de contato e pH; • procedimentos inadequados para lavagem de filtros. • Desconhecimento ou negligência em relação aos parâmetros hidráu- licos de controle e operação dos processos unitários de tratamento: gradientes de velocidade, tempos de detenção hidráulica, taxa de Manual de procedimentos de vigilância em saúde ambiental relacionada à qualidade da água para consumo humano 121 Secretaria de Vigilância em Saúde aplicação superficial dos decantadores, taxas de filtração, carreiras de filtração, etc. • Falhas de projeto ou deficiências de instalações e equipamentos: • falhas de projeto que comprometam a hidráulica e o funcionamento das estações de tratamento de água: tempos de detenção de floculação, decantação e desinfecção insuficientes, granulometria inadequada dos leitos filtrantes, etc.; • estado precário de bombas dosadoras de produtos químicos (coa- gulantes e desinfetantes) e equipamentos de medição de vazões; • deterioração dos filtros: leito filtrante, sistema distribuidor de água de lavagem, registros de controle de água de lavagem e água filtrada;