204 pág.

Pré-visualização | Página 34 de 50
de Educação, agindo em prol da escola popular. Ao contrário do que fizeram outros teóricos de sua época, Freinet não apoiava um ensino elitista ou classificatório, mas sim um ensino pautado na experiência que pudesse preparar o aluno (de qualquer realidade socioeconômica) para o convívio social, defendendo o trabalho cooperativo como fundamental no alcance desse objetivo. Por esse motivo, Freinet defendia a livre expressão como um princípio pedagógico, ou seja, dizia que a Educação deveria permitir que cada sujeito social pudesse expressar seus sentimentos, acolhendo, ao mesmo tempo, os sentimentos dos “outros” sociais, reforçando ainda mais sua idéia de uma pedagogia solidária e cooperativa. Um outro princípio que liga Freinet à Educação é o trabalho. Para Freinet, o trabalho deve ser visto como um meio de instrumentalizar tecnicamente as reflexões do homem sobre seu mundo, incluindo aí as próprias relações de exploração existentes no mundo do trabalho. Desse modo, Freinet critica o trabalho alienado e defende uma Educação crítica que conduz o homem no caminho contrário ao do trabalho fragmentado e alienador. Vale lembrar que o pensamento pedagógico de Freinet se alia aos pensamentos pedagógicos soviéticos e que, por esse motivo, sua preocupação centra-se na idéia de formação do homem historicamente determinado por suas relações sociais e seus padrões culturais. Cèlestin Freinet e o método natural 107 Assim sendo, algumas considerações são necessárias: deve-se compreender a atividade mental de forma dialética, ou seja, de forma a considerar as implicações sociais. É nesse sentido que Freinet desenvolve as chamadas técnicas de vida; a Educação para Freinet não é um processo autoritário, nem anárquico, mas sim o resultado de numa organização que promove uma racionalização da vida escolar. No entanto, para Freinet, tal organização assim constituída só tem sentido se o trabalho desenvolvido com os alunos ocorrer de forma cooperativa; baseado na psicologia da aprendizagem soviética (como na teoria de Vygotsky, por exemplo), Freinet considera três pontos como sendo de grande relevância para o processo pedagógico: a comunicação, a divisão do trabalho escolar e o desenvolvimento da aprendizagem. Sobre a questão da comunicação, Freinet aponta a dialética como um método fundamental a ser utilizado pelos professores com seus alunos. Sobre a divisão do trabalho escolar, Freinet aponta como saída a questão da cooperação, ou seja, para o trabalho coletivo. No que tange ao desenvolvimento da aprendizagem, aponta para o fato de que esta deve ser realizada em adequação com a realidade concreta dos alunos, incluindo aí a linguagem por eles utilizada; os conceitos que norteiam seu trabalho são: confiança, respeito mútuo, cooperação, coletividade, solidariedade, autonomia e trabalho. O método natural A teoria de Freinet pode ser denominada de método natural, pedagogia do bom senso e educação pelo trabalho. De qualquer maneira, o que todos esses nomes procuram demonstrar é a compreensão de que, para Freinet, o trabalho funciona como ferramenta educativa, bem como a Educação age como ferramenta para o trabalho. Além disso, devemos lembrar ainda que a pedagogia de Freinet se desenvolve a partir da idéia de que, para educar, devemos levar em consideração as ações do homem em sua vida cotidiana. Como vimos no tópico anterior, Freinet preocupava-se com as desigualdades sociais e o domínio de uma classe sobre outra(s), e direcionou seu trabalho às crianças filhas das classes operárias. Ao iniciar seus trabalhos com as crianças “operárias”, Freinet observou que aquelas que eram vistas como ativas, felizes ou mesmo agitadas fora da sala de aula, quando estavam dentro da sala de aula comportavam-se de maneira apática, demonstrando total desinteresse pelo processo educativo. Foram essas observações que levaram Freinet a desenvolver uma teoria pedagógica preocupada em ligar a escola e a vida cotidiana meio do contato (experimentação) da natureza e do contato com o meio social e cultural dos alunos. Teorias da Aprendizagem 108 A experimentação, fundamento básico do método natural, aponta para o aprendizado como algo que ocorre por processos de repetições de ações bem sucedidas no meio onde os alunos estão integrados. Essas repetições e integrações, entendidas como processos, devem ser pensadas dentro das possibilidades de aprendizagem de cada educando. Isso significa dizer que Freinet considera que parte do aprendizado ocorre por meio do “tateamento” experimental, a manipulação do real pelo aprendiz, o que produz, segundo Minicucci (1992, p. 48), novas descobertas, desequilíbrios e adaptações. Assim, ao observar a vida cotidiana das crianças nas escolas, Freinet percebeu o grande interesse delas pelo mundo extra-escolar, e que a melhor maneira de favorecer o conhecimento das crianças sobre esse mundo até então desconhecido por elas era por meio da experimentação ativa, da manipulação. Desse modo, o conhecimento ou aprendizagem, na teoria de Freinet, se faz em vários sentidos. O primeiro está colocado na relação do homem com seu meio, uma vez que é nessa interação que o homem extrai conhecimentos históricos e sociais que o ajudam a compreender a si e ao meio que o cerca. O segundo sentido está colocado na via da experimentação concreta, na qual o aluno constrói seu conhecimento de forma livre e espontânea. O terceiro caminho é o que se faz pela via do trabalho, por meio de técnicas que auxiliam as crianças a ir da ação à reflexão e da reflexão de volta à ação. As técnicas naturais aparecem, nesse contexto, como uma maneira de permitir à criança aprofundar seus conhecimentos de forma prática. Pelo caráter social de sua teoria, Freinet se colocou contrário aos grandes manuais de instrução pedagógica, criando, junto com seus alunos, diferentes materiais pedagógicos que permitiam explorar a vida de maneira ativa, construindo conhecimentos sobre o mundo e sua existência. A seguir citamos algumas das atividades naturais desenvolvidas por Freinet. O livro da vida – material que tem como objetivo o registro das experiências das crianças sobre os conteúdos e conceitos aprendidos nas diferentes disciplinas. A partir desse material, as crianças podem discutir seus dilemas de aprendizagem de maneira ativa e contextualizada. Intercâmbio interescolar – técnica simples que consiste na troca de correspondências entre alunos de diferentes escolas e regiões. A intenção é levar os alunos a conhecerem outras realidades sociais e culturas diferentes das suas. Fichas de estudo – consistem em fichas de auto-avaliação organizadas por temas em fichários, criadas para desenvolver nos alunos o sentido da avaliação. Aulaspasseio – consistem em atividades externas à escola, como passeios a bibliotecas, zoológicos, parques, entre outros, que têm como finalidade levar os alunos a interagir concretamente com os conceitos apresentados em sala de aula. Cèlestin Freinet e o método natural 109 A imprensa escolar – se desenvolveu a partir da experiência do intercâmbio interescolar, que por ganhar grandes dimensões acabou por promover o surgimento da imprensa escolar. Esta última consiste na divulgação das “notícias” reunidas pelos alunos a partir da troca de cartas entre eles. É o que hoje chamaríamos de “jornal escolar”. Por meio da imprensa escolar, os alunos elaboravam jornais cuja leitura era compartilhada por amigos e familiares. A correspondência interescolar abriu ainda mais essas fronteiras. Os alunos enviavam fotos, desenhos, cartas, jornais para colegas distantes. Foi assim que as crianças da montanha passaram a conhecer o mar, a pesca e os costumes de comunidades que viviam em aldeias marítimas. E estes ficavam sabendo das colheitas, da vida dos pastores, dos tecelões,