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Compreender e ensinar a Geografia Sistematizar os procedimentos didáticos que garantam a progressão das noções cotidianas para a aprendizagem dos conceitos científicos. As crianças aprendem em parceria Em nossa última aula vimos que a cidade pode ser considerada um conceito para o ensino da Geografia. Nela é possível encontrar os elementos que são fundamentais para a aprendizagem das noções espaciais e o desenvolvimento do raciocínio geográfico. Para que o aprendizado ocorra é essencial que o professor compreenda qual zona de desenvolvimento de seus alunos está mobilizando para entender como a criança pode aprender. Para ensinar a Geografia é importante compreender, também, como se formam os conceitos científicos. A questão do aprendizado pode ser vista por meio de diversas possibilidades teóricas. Considerando, entretanto, que Vygotsky partiu da discussão de que este acontece antes que a criança entre na escola, vamos tomar essa concepção para pensar que a criança estando no convívio social desde cedo "(...) passa a assimilar os nomes de objetos em seu ambiente, ela está aprendendo" (VYGOTSKY, 1991, p. 94). Para ele, a criança vai atingir um primeiro "nível de desenvolvimento real quando se estabelecerem as funções mentais como resultado de certos ciclos de desenvolvimento já completados" (VYGOTSKY, 1991, p. 95). O autor ainda vai demonstrar que, entretanto, "existem funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação em estado embrionário", (VYGOTSKY, 1991, p. 96), o que vai caracterizar uma zona de desenvolvimento proximal prospectiva, apontada para ciclos e processos em formação. Ressalvo que as citações desse parágrafo são literais da obra Formação Social da Mente. Há, dentre os vigotskyanos, os que evitam as traduções para o português por não corresponderem, segundo dizem, ao que o pesquisador teria de fato pretendido afirmar. Exemplo: maturação é um conceito mais afim com o campo das teorias cognitivistas e corresponderia à concepção de aprendizagem decorrente de estágios de desenvolvimento para os quais os órgãos estariam preparados. Sem pretender entrar nessa polêmica, o fato é que a tradução da obra que utilizei mantém o termo há muitas edições e decidi mantê-lo também. A zona de desenvolvimento proximal, a partir dos processos de aprendizado, transforma-se em nível de desenvolvimento real, posteriormente. O papel fundamental do educador é, justamente, reconhecer a necessidade de criar e atuar nessa zona do desenvolvimento proximal, de forma consciente, intencionalmente, sistematicamente. Para isso, deve criar tais zonas no âmbito das relações que se estabelecem no processo ensino aprendizagem. A mediação escolar deve ter por princípio esse trabalho pedagógico, que não dependerá dos aspectos cognitivos de cada criança, mas das práticas culturais, dentre as quais as escolares, que permitem decidir o que ensinar. Citando a pesquisa de Dorothea MacCarthy, Vygotsky indica que "há funções que as crianças só podem por em ação sob orientação, em grupos, e em colaboração umas com as outras, porque não as dominaram de forma independente." (VYGOTSKY, 1991, p. 100). Para a Educação, este aspecto é decisivo. O aprendizado, a partir do conceito de ZDP, "desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação com seus companheiros" (VYGOTSKY, 1991, p. 101). O conceito vai permitir, ainda, a afirmação de que o: É importante ressaltar que Vygotsky propõe a unidade, mas não a identidade entre os processos de aprendizado e de desenvolvimento interno. Segundo ele, esta forma de compreender altera a visão tradicional de que uma vez dominada uma operação, no âmbito da aprendizagem, as crianças se desenvolvem. Ao contrário, aí é que esses processos se iniciam. A linguagem será fundamental nesse processo enquanto comunicação. Os signos da linguagem devem ser suficientes para expressar e garantir que se comuniquem ideias, sentimentos, vontades, pensamentos. Desta forma, a linguagem vai organizando a realidade por meio de categorias conceituais. Ao organizar a realidade a partir de conceitos faz surgir um pensamento generalizante (OLIVEIRA, 1995, p 43). Pensamento e linguagem, entretanto, não são processos articulados, mas articuláveis. Uma inteligência pragmática, segundo experimentos com primatas estudados por Vygotsky, revelou que estes podem usar instrumentos para atuar e solucionar problemas. Ainda que emitam sons e se expressem por gestos, não estão articulando pensamento e linguagem. O processo de trabalho, que caracteriza a condição humana, levou ao uso de instrumentos destinados à transformação da natureza. Para esse uso ocorreu o processo comunicativo, que permitiu as ações colaborativas de planejamento o que acabou originando o surgimento de significados compartilhados, no bojo dos sistemas comunicativos que foram se construindo. É assim que se constrói o pensamento verbal que recorre a um sistema de signos chamado linguagem. Foi nesse momento histórico do desenvolvimento da espécie humana que se verificou a transformação dos aspectos biológicos em sócio-histórico. A criança pequena já utiliza instrumentos para relacionar-se, prevalecendo-se de uma inteligência prática, a qual caracterizaria uma fase pré-linguistica. Em termos comunicativos já ocorre, também, a manifestação de risos, gestos, balbucios que favorecem o alívio emocional. Ao participar do contexto social, articulam-se pensamento e linguagem. Em virtude da mediação proporcionada por parceiros que já dominam de forma estruturada a linguagem, vai emergir o pensamento verbal que ao longo do processo de desenvolvimento resultará na linguagem racional. Aprender depende de parceria e mediação. Os estudos desses processos comunicativos, tipicamente humanos, que envolvem os processos psicológicos superiores, foram os responsáveis pela possibilidade de se compreender a condição sócio-histórica do homem. No processo de escolarização essas transformações tornam-se peculiares já que ocorre uma intervenção intencional, por parte do educador, destinada à formação conceitual das crianças. Esse processo de aprendizagem escolar implica que: Ao usar a palavra, seus significados e sentidos diversos, a criança organiza a fala com os outros e aprende a falar consigo mesma. É assim que se constroem raciocínios, referências e decisões internas. A escola tem papel importante para dar sentido a esse processo que a criança vivencia. Na teoria sócio-histórica, proposta por Vigotsky a mediação adequada do professor e dos outros alunos indicarão para a criança os sentidos das práticas e atitudes que estão presentes naquele ambiente. No processo do aprendizado e do desenvolvimento haverá esse momento em que a criança construirá os conceitos. Organizar as atividades que são oferecidas às crianças permite que ela avance de uma zona de desenvolvimento real, que construiu no dia a dia, para uma zona de desenvolvimento potencial. Mas isso só pode ocorrer se a zona do desenvolvimento proximal da criança estiver mobilizada com vivências e experiências relevantes no âmbito do seu desenvolvimento a partir de conteúdos culturais significativos. A aprendizagem é um ato partilhado. Essa formalização da educação em idade tão precoce deve ser objeto de atenção dos educadores. O que se ensina nessa etapa é decisivo para a formação da criança. O processo educativo é determinante para cumprir objetivos cruciais para as relações sociais e para o desenvolvimento mental do individuo. A tomada de consciência do que ainda não se sabe impulsiona o reconhecimento dos limites do que se sabe e faz avançar a busca por novas possibilidades. A escola, onde se realiza a educação formal, tem a "finalidade de alcançar objetivos imediatos e definitivos quando coloca em ação as capacidades potenciais do aluno, e, emconformidade, dirige a sua utilização" (KOSTIUK, 1991, p. 32). O ensino não deve se confundir com a Educação em si. A questão do protagonismo da criança no processo educativo constitui um princípio essencial para que se rompa a força dos valores referentes à produtividade–consumo–competitividade que marcam as experiências. O ensino da Geografia deve articular a linguagem e os atos do conhecimento que acontecem na escola. Não se pode ensinar a Geografia por um discurso verbal. O que se ensina na Geografia deve ter uma dimensão prática: observar, analisar, descrever oralmente, registrar, desenhar, mapear. A linguagem e a ação estabelecem interconexões da criança com seu ambiente; a vida real deve estar presente na escola; os aspectos subjetivos devem ser considerados. A história de vida dos alunos, que é a história de uma coletividade, de uma comunidade, define como os alunos poderão avançar de seu saber cotidiano para a construção dos conceitos científicos. Para que as crianças aprendam o que é ensinado é importante que o professor compreenda como as crianças aprendem. O professor é um mediador do processo e não alguém que controla esse processo. A criança ativa no processo de aprendizado reconstrói os saberes sob seu ponto de vista e é capaz de participar ativamente do processo social a que pertence. Acesse o site a seguir e aprofunde os aspectos de nossa aula, assistindo ao vídeo. Disponível em:1. www.youtube.com. Acesso em: 06 dez. 2013. Aula estudada! Caso fique com dúvidas, leve ao Fórum e divida com seu professor e colegas. Referências NÓBREGA, M. L. S. Geografia e Educação Infantil: os croquis de localização. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, 2007. OLIVEIRA, M. K. Vigotsky, aprendizado e desenvolvimento um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1995. _____; OLIVEIRA, M. B. (Orgs.). Investigações cognitivas: conceitos, linguagem e cultura. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999. VYGOTSKY, L. S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
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