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Pró-Reitoria de Ensino a Distância Coordenação de Atividades Complementares TAREFA 1 – ED 2016 ATIVIDADE DO NED-ED – INFORMAÇÕES GERAIS As informações contidas abaixo servirão como instrumento de apoio para o desenvolvimento de sua Atividade, portanto utilize esses elementos em conjunto com os textos disponibilizados. Procure interpretar as informações apresentadas de forma a contextualizar com a discussão apresentada nos textos, verbais e não verbais (charges, imagens, figuras, gráficos entre outros) tentando entender situações e correlacionando-as. FAÇA A PRODUÇÃO DE UM TEXTO DISSERTATIVO SOBRE A PROPOSTA TEMÁTICA APRESENTADA. Para a realização da sua Atividade do NED ED "Tarefa 1", clique no nome da Atividade que está disponível, será aberta uma segunda página. Clique no link do arquivo e acesse o conteúdo para a leitura e compreensão do texto para a realização da ”Dissertação" solicitada. Você terá duas opções para enviar sua dissertação: 1-Anexar seu arquivo e gravar o envio, e logo abaixo na página clique em enviar. 2-Cole seu texto no espaço destinado na página e grave o envio, logo abaixo na página clique em enviar. Importante!! *Ao realizar as atividades do NED ED no prazo determinado no calendário na página da Tarefa, será liberado em seu Portal o ASE (Atividade Supervisionada de Ensino) que, se validada, pontuará 0,50 (meio ponto) na N2 em todas as disciplinas em que estiver matriculado (a). SEU TEMA – SOCIODIVERSIDADE ETNICO CULTURAL E DIREITOS HUMANOS RAÇA HUMANA DIFERENTES MAIS IGUAIS – DIREITOS HUMANOS Este tema é importante na perspectiva intercultural que não é ingênua do ponto de vista midiático, é consciente de que nas relações entre humanos e humanos e mundo natural, existem não só diferenças, como também desigualdades, conflitos, assimetrias de poder. No entanto, parte-se do pressuposto de que, para construir uma sociedade pluralista e democrática, o diálogo com o outro, entre os diferentes grupos sociais e culturais são fundamentais e nos enriquecem a todos, pessoal e coletivamente, na nossa humanidade, nas nossas identidades, nas nossas maneiras de ver o mundo, a nossa sociedade e a vida em sua totalidade. Algumas palavras importantes podem ser lembradas quando se fala em sociodiversidade etnico cultural e direitos humanos: • DIVERSIDADE • DIREITOS HUMANOS • JUSTIÇA SOCIAL • IGUALDADE • MÍDIA • DEGRADAÇÃO • PRECONCEITO CRITÉRIOS PARA VALIDAÇÃO DA T1: Fique atento a correção desta atividade, que será após o término. • Originalidade (a ferramenta não permite cópia total ou parcial. Seu texto deve ser produzido por você!) • Contextualização com o material disponibilizado • A produção do texto deve contemplar os tópicos importantes abordados pela Atividade. TEXTO 1 Vamos entender alguns pontos de fazermos uma abordagem mais profunda sobre o tema SIGNO, SIGNIFICANTE E SIGNIFICADO O fundador da linguística moderna chama-se Ferdinand de Saussure. Ele trouxe novos caminhos para a linguística, graças ao seu estudo sobre a língua e a fala. Para ele, a língua foi imposta ao indivíduo, enquanto a fala é um ato particular. Língua é um sistema de signos convencionais usado pelos membros de uma mesma comunidade. Em outras palavras: um grupo social convenciona e utiliza um conjunto organizado de elementos representativos. A soma “língua + fala” resulta na linguagem. Outro aspecto básico da doutrina saussuriana é a do signo linguístico: O signo é o resultado de: significante + significado. Signo = significante + significado. Significante: Imagem acústica ou manifestação fônica do signo. Significado: Valor, sentido ou conteúdo semântico de um signo lingüístico. Toda palavra que possui um sentido é considerada um signo linguístico. Um signo linguístico é um elemento representativo com dois aspectos: um significante e um significado, unidos num todo indissolúvel. Ao ouvir a palavra árvore, você reconhece os sons que a formam. Esses sons se identificam com a lembrança deles que está presente em sua memória. Tal lembrança constitui uma verdadeira imagem sonora armazenada - é o significante do signo árvore. Ao ouvir essa palavra, você pensa num "vegetal lenhoso cujo caule, chamado tronco, só se ramifica bem acima do nível do solo, ao contrário do arbusto, que exibe ramos desde junto ao solo". Esse conceito, que não se refere a um vegetal particular, mas engloba uma ampla gama de vegetais, é o significado do signo árvore - e também se encontra armazenado em sua memória. O signo árvore, portanto, relaciona-se com dois dados de sua memória: uma imagem acústica, correspondente à lembrança de uma seqüência de sons - o significante - e um conceito, um dado do conhecimento humano sobre o mundo - o significado. O significado dos signos linguísticos é um conjunto complexo de informações acumuladas ao longo da história das comunidades humanas. Isso quer dizer que utilizar uma determinada palavra da nossa língua é, na verdade, fazer ecoar por meio dela todo um processo histórico de formação de conceitos sobre a vida e sobre o mundo. O significado do signo árvore, por exemplo, vai muito além do conceito de "vegetal lenhoso": há muitos valores simbólicos e ideológicos que se podem associar a esse signo (em várias mitologias, a árvore é símbolo da vida; em tempos de movimentos ambientalistas ativos como os nossos, a árvore é um símbolo da preservação das matas); há também valores que só se conseguem definir na efetiva interlocução (imagine todo o conjunto de sentidos que a palavra árvore assume numa conversa entre donos de madeireiras sobre a extração de mogno). Fonte: http://jeffersonaspas.blogspot.com.br/2010/10/linguistica-signo-significado-e.html http://www.analisedetextos.com.br/2011/01/diferenca-entre-lingua-signo-e.html TEXTO 2 RESPEITO E VALORIZAÇÃO À MULHER NEGRA – Amanda Santos Lemos - Possui graduação em Serviço Social pela Universidade Castelo Branco (2004) e, Mestrado em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2010). Atualmente é Coordenadora do Curso de Serviço Social, da Universidade Castelo Branco. Tem experiência na área de Serviço Social, com ênfase no campo Sócio-Jurídico e na Assistência Social, atuando principalmente nos seguintes temas: Sistema Penitenciário, Gestão, Envelhecimento e Assistência Social. Com adaptações RESUMO Acreditamos que a mulher tem uma contribuição ímpar na formação de uma sociedade, especialmente, a negra que desde os mais remotos da sociedade brasileira contribui com sua força, seu trabalho e suas crenças, para a formação da mesma. Porém, nunca houve por parte da sociedade o reconhecimento da importância da mulher negra, subjugada e desvalorizada por sua condição de gênero e de raça, na formação da nossa cultura. Entretanto, de uns tempos para cá parece haver um modismo em torno da plástica da figura da mulher negra, cabelos afros e vestidos coloridos parecem ter conquistados espaço entre a elite branca dominante, mas é preciso que se entenda que isso não é moda, é identidade, auto reconhecimento, auto expressão, resistência. A ideia do modismo ou da comercialização dos signos identitários das negras, precisa ser desconstruída e (re)significada, como um movimento de resgate da nossa identidade, roubada há muitos anos, quando fomos forçadas a “embranquecermos” nossas peles e nossas almas. Palavras Chave: Raça – Gênero – Identidade – Construção Social INTRODUÇÃO Eu sou negra, meus pais são negros, meus avós eram negros, meus tios, primos e demais parentes são negros. Mas, eu não tinha consciência disso. Talvez os homens de minha família tenham se reconhecido negros com mais facilidade que as mulheres, ao serem lembrados diariamente(de maneira pejorativa, é claro, mas, lembrados) pela polícia, nas entrevistas de emprego, nas suas ocupações laborais, mas, eu não. Minha mãe sempre fez de tudo para manter meu cabelo impecavelmente alisado, minhas amigas eram brancas, frequentei cursos de idiomas e formação complementar, estudei em boas escolas, sempre trabalhei em grandes empresas, sempre ouvi dizer que as religiões de matriz africana eram malignas. Cresci ao som do “show da Xuxa”, querendo ser “paquita”, sonhava ter uma coleção de Barbies, lânguidas, magras, brancas. Cresci num universo que não me remetia à minha ascendência, ao povo que deu origem a minha família e a nossa história. Cresci com uma ideia destorcida de mundo, de identidade, ganhei minha primeira boneca negra ao completar 33 anos de idade, lutei muito contra a textura do meu cabelo, apesar de parecer estranho, nunca parei para pensar no significado político de ser a única negra em uma sala de aula ou nos espaços de trabalho, parafraseando outra negra, “durante a minha vivência enquanto mulher e negra, não vi apresentados a mim mulheres como eu sendo produtoras de conhecimento, protagonista de espaços de poder. Para mulheres como eu, só restava os subempregos e a clandestinidade”. Esse é um relato pessoal, mas, certamente retrata a realidade de muitas meninas negras. Somos (ou fomos) criadas com uma falsa imagem, buscamos uma aceitação que nunca teremos, pois não somos assim, não nos parecemos e nem pareceremos com a Barbie por uma questão genética, ancestral, histórica, mas, ninguém nos diz porquê. Muitas meninas negras, como eu, tiveram sua identidade forjada sob signos e figuras que não as representavam, que não as remeteram a sua origem, a sua raça e ancestralidade tiveram roubada a sua essência, ao serem submetidas a dolorosas sessões de alisamento e branqueamento. Questionamos então, qual lugar é conferido a mulher e a estética negra? A “casa de família” ou a passarela do samba, mas, podemos ser mais que isso, certamente, somos muito mais do que isso. A mulher negra vem ganhando espaço nas mídias, no mercado, na sociedade, mas, é preciso que se analise criteriosamente esse momento: será que estamos finalmente resgatando e assumindo nossa identidade? As ruas estão cheias de mulheres e homens negros com seus cabelos crespos e volumosos, bonecas negras já, chegam as mãos de meninas negras, roupas, acessórios, turbantes tomam conta dos espaços historicamente ocupados pela cultura e os signos da raça branca, até mesmo o mercado nos enxerga como consumidoras em potencial. Mas, o que parece ser um cenário positivo e promissor, pode acobertar o racismo e sexismo já conhecido de outrora. O presente artigo tem como objetivo refletir sobre o respeito e valorização galgado a séculos pela mulher negra. O CONTEXTO HISTÓRICO A sociedade brasileira constitui-se sobre os pilares do eurocentrismo, do patriarcalismo, do catolicismo e de todos os estereótipos de dominação e superioridade, importados da época da colonização do país. Desde sempre, que a sociedade europeia patriarcal, submete a mulher a um papel de submissão e subalternidade à figura inquestionável e inabalável do homem. Percebe-se que coube, a mulher, na trajetória histórica da sociedade um papel “menos nobre”, “menos político” que o do homem, o papel de reproduzir, cuidar e obedecer, tornando esse público vítima de sua própria condição natural, a sua cor e o seu sexo, considerados fraco e inferiores. Ao implementar-se essa perspectiva no Brasil, uma mera colônia de exploração de Portugal, o jugo do homem sobre a mulher fica mais acentuado, em especial a negra, que além de mulher e negra é vista como mercadoria, a ser comercializada para atendimento de homens brancos. Historicamente, essa mulher estará relegada a uma condição de aviltamento e expropriação de seu corpo e sua identidade ainda mais cruel que a mulher branca. Os homens portugueses, frente à escassez de mulheres portuguesas, mantiveram relações sexuais com as indígenas e mulheres africanas que eram vistas como trabalhadoras e como objetos sexuais. No Brasil Colônia, as mulheres brancas tinham suas vidas restritas à igreja e a casa, eram estereotipadas como fracas, submissas, passivas e sem participação pública. Eram treinadas para o casamento e tolerar as traições do marido com as escravas (...). (BARRETO, p.65) Além de serem usadas como objetos sexuais por senhores de escravos, as escravas também eram usadas como reprodutoras, com o intuito de aumentar, de maneira legal e barata, a mão-de-obra escrava. Para isso, escravos novos, fortes e com boa saúde eram tratados como reprodutores, que forçavam as negras a terem relações sexuais para que gerassem novos escravos, também bem-apanhados e saudáveis, que já nasceriam nas fazendas, acabando com os gastos e riscos da importação e viabilizando que esses fossem mais dóceis e receptivos a dominação. 1 “A nossa moral, a nossa língua, os nossos direitos, e inúmeras outras coisas nossas, são de origem europeia. A Europa dominou a maior parte do mundo. Em 1922, só o Império Britânico dominava cerca de 458 milhões de pessoas, um quarto da população do mundo na época. E abrangeu mais de 33,7 milhões km². Hoje não temos uma dominação militar como na época, mas temos uma dominação cultural, da qual os costumes, a arte, a moral etc., são todos importados dos países ditos de primeiro mundo, para os nossos. Esse é o chamado Neocolonialismo, uma nova forma de se colonizar. Essa centralização do polo mundial político e econômico é o chamado Eurocentrismo. O nosso mundo tem como o seu centro dominante, a Europa”. Patriarcalismo pode ser definido como uma estrutura sobre as quais se assentam todas as sociedades contemporâneas. É caracterizado por uma autoridade imposta institucionalmente, do homem sobre mulheres e filhos no ambiente familiar, permeando toda organização da sociedade, da produção e do consumo, da política, à legislação e à cultura. Nesse sentido, o patriarcado funda a estrutura da sociedade e recebe reforço institucional, nesse contexto, relacionamentos interpessoais e personalidade, são marcados pela dominação e violência. (BARRETO, p.64) O homem preto foi utilizado como reprodutor, vitimando a mulher preta. Estupro forçado pelos senhores e senhoras brancos cristãos. Não somente escravizados foram usados para a reprodução, muitos senhores violentavam as escravizadas, entre eles, padres. A escravidão não havia a conceituação que temos hoje de estupro ou de violações, para o escravizador, os escravizados eram bens móveis sub-humanos, não possuíam direitos e eram considerados coisas, propriedades. Alguns fatores podem ser pontuados para a prática da reprodução, sendo bom ressaltar que uma mulher escravizada tinha o valor de dois homens escravizados, porque ela além de exercer os trabalhos nas plantações, minas, serviços de ganho nas cidades, o serviço doméstico, prostituição forçada por senhoras de boas famílias e freiras católicas, gerava mão de obra gratuita e lucro para o escravizador. O estudo da história dimensiona o horror a que a mulher negra foi submetida, imaginar tamanha brutalidade e violência é revoltante, causa horror e compaixão. Talvez nos horrores da escravidão encontremos a explicação para a anulação dos elementos constitutivos da identidade negra, o que não significa dizer que as mulheres negras negam sua descendência racial, mas, buscam ser diferente a fim de serem aceitas ou menos violadas. Para mulheres negras, a quem o estupro diz respeito, raça precedeu questões de gênero. Somos ensinadas que nós somos primeiramente negras, e então mulheres (…). Mulheres negras sobreviveram, mantendo silêncio, não apenas por vergonha, mas por uma necessidade de preservar a raça e sua imagem. Desde a época da escravidão há registros sobre a luta da mulher negra porsua emancipação e emponderamento. Quem não conhece Dandara, a guerreira negra, mulher de Zumbi dos Palmares, que guerreou ao seu lado para defender os negros e o Quilombo de Palmares? Pois é, quase ninguém conhece ou ouvi falar sobre Dandara, ícone para a representatividade histórica da mulher negra. Quilombo dos Palmares ainda menina. Não era muito apta só aos serviços domésticos da comunidade, plantava como todos, trabalhava na produção da farinha de mandioca, aprendeu a caçar, mas, também aprendeu a lutar capoeira, empunhar armas e quando adulta liderar as falanges femininas do exército negro palmarino. Dandara foi uma das provas reais da inverdade do conceito de que a mulher é um sexo frágil. (Grifos nossos.) Observamos como a nossa história é subtraída, é omitida, Dandara é uma heroína negra, mas, muitas negras nunca souberam e, talvez, nunca saberão que um dia ela existiu. Toda menina negra tem o direito de conhecer a história de Dandara, de se inspirar nela, de resistir e lutar como ela. Mas, esse direito lhe é negado, quando desconhecemos sua existência, os próprios historiadores afirmam, “não sabemos como era seu rosto, nem como era exatamente”. A abolição da escravatura e, posteriormente, a industrialização do país, obriga a mulher negra a buscar sua inserção no mundo do trabalho, saindo do espaço privado de seu lar. Mas buscar sua inserção no mercado de trabalho, não significou alcançar sua emancipação. Assim como no período da escravidão, os trabalhos disponíveis para as negras são serviçais, subalternos e mal remunerados. Infelizmente, os grilhões da escravidão ainda aprisionam as mulheres negras a submundo de inferioridade e desrespeito, onde precisam comprovar, diariamente, suas capacidades e habilidades. Ser mulher e ser negra no Brasil significa está inserida num ciclo de marginalização e discriminação social. Isso é resultado de todo um contexto histórico, que precisa ser analisado na busca de soluções para antigos estigmas e dogmas. (...) Ascender socialmente é algo muito difícil para a mulher negra, são muitos obstáculos a serem superados. O período escravocrata deixou como herança o pensamento popular, em que, elas só servem para trabalhar como domésticas ou exibindo seus corpos. As que se destacam, tiveram que provar mais vezes do que as mulheres brancas a sua competência, por isso, é que é possível afirmar que a questão de gênero é um complicador, mas se esta for somada a questão de raça, o resultado é maior exclusão e dificuldades. Analisando dados de pesquisas realizadas pelo DIEESE e outros órgãos, é possível verificar que o preconceito resulta em salários mais baixos para os negros em relação aos brancos, incluindo o item gênero, inferi-se que o homem negro ocupa um patamar abaixo do da mulher branca quanto ao rendimento salarial. Mas as mulheres negras se encontram ainda mais abaixo na pirâmide ocupacional. (SANTOS, 2009, p.03) A cor da pele ou a textura do cabelo não deveria em tempo algum e em nenhuma sociedade, ser indicador de competência e habilidade de ninguém, mas, infelizmente é. As estatísticas comprovam que as oportunidades para negros/as são restritas e, claro, que no caso das mulheres, elas (as oportunidades) são ainda mais restritas e direcionadas. Uma sociedade racista e machista restringe as oportunidades, sentenciando o negro ou a negra a uma determinada ocupação espaço-temporal-cultural submissa e marginal. Hoje, as mulheres negras conseguiram alcançar algumas vitorias, subindo alguns degraus na busca pela igualdade. Fizeram conquistas importantes no que diz respeito a direitos e participação, mesmo assim, ainda é uma parcela mínima de mulheres negras que desfrutam de direitos fundamentais, como educação. Respeito e Valorização à mulher negra Mas, ainda há naturalidade na prática do racismo e do sexismo; a erotização e a estereotipação da mulher negra são muito presentes ainda, rotulando-a sempre. Uma marchinha de carnaval de 1955, já dizia: O teu cabelo não nega, mulata Porque és mulata na cor Mas como a cor não pega, mulata Mulata, eu quero o teu amor Percebe-se claramente o desprezo pela cor da pele da mulata, que só serve para uso do homem, porque sua “cor não pega”. Mais de 50 anos depois, outra música de gosto muito duvido, achincalha com a estima e imagem da mulher negra. Hoje caminhamos na direção da (re)valorização da estética e da mulher negra, da (re)descoberta de sua força e capacidade, do resgate de sua história e identidade. Os paralelos entre sexismo e racismo são nítidos e claros. Cada um deles incorpora falsas suposições sob a forma de mito. E, assim como o racista é aquele que proclama, justifica ou pressupõe a supremacia de uma raça sobre outra, da mesma forma, o sexista é aquele que proclama, justifica ou pressupõe a supremacia de um sexo (adivinha qual) sobre o outro. (KERNER;TAVOLARI: 2012) A INSERÇÃO DA MULHER NEGRA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA A luta da mulher negra é diária, árdua e invisível, uma vez que muitos dizem: “não há racismo no Brasil”. Submetida por longos e tenebrosos anos a cultura branca “superior” e a violações de seu corpo e sua alma, a mulher negra perseverou, buscando espaços, reconhecimento e valorização por parte da sociedade, de outros negros, do Estado. Hoje temos mulheres negras em posições expressivas na sociedade, temos um Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos, comandado por uma mulher negra, temos negras nos meios de comunicação, nas empresas, na moda. Claro que ainda não somos maioria, mas, chegamos lá; virmos gradativamente deixando o lugar de subserviência a que nossa figura vem historicamente associada, retornando ao lugar usurpado pelo tráfico de negros/as para escravidão, pelo racismo, pela ignorância dos que insistem em afirmar que somos inferiores, incapazes. Hoje, nos vemos representadas em mulheres negras em suas carreiras profissionais, reconhecidas sem precisarem escamotear sua ascendência, sua origem, sua negritude e “representatividade importa”! É claro, que esse número ainda é ínfimo, a maioria das negras continuam na invisibilidade, com baixa escolaridade e em empregos subalternizados e mal remunerados, mas, a situação a que a mulher negra esteve relegada trata-se de um problema histórico, cultural, político. Precisaremos de anos de investimento, luta e resistência para efetivamente alcançarmos respeito e a igualdade que nos é devida. Viola Davis é uma atriz norte americana, mundialmente conhecida. Viola é uma mulher de seus 50 e poucos anos, inteligente, vibrante, talentosa. Porque a cito aqui? Porque ela é negra e, essa negra ganhou nos últimos meses uma importante premiação da televisão norte americana, o Emmy Awards7, tornando-se “a 1ª mulher negra a ganhar o prêmio de melhor atriz em série dramática, em 67 anos de existência do prêmio”. . Em seu célebre discurso, a atriz se imortalizou na luta pela valorização da mulher negra ao dizer: ‘Em meus sonhos e visões, eu via uma linha, e do outro lado da linha estavam campos verdes e floridos e lindas e belas mulheres brancas, que estendiam os braços para mim ao longo da linha, mas eu não poderia alcançá-las’, (...) Deixem-me dizer uma coisa: a única coisa que separa as mulheres de cor de qualquer outra pessoa é a oportunidade. Você não pode ganhar um Emmy por papéis que simplesmente não existem. Viola, não poderia ter usado palavra mais apropriada em seu emocionante discurso, a palavra oportunidade, “do latim opportunitate que representa a qualidade de oportuno, significando também uma ocasião favorável, ensejo, conveniência”, essa é a palavra que sintetiza o que acontece com o povo negro, a negação de oportunidades. “Uma oportunidade é vista como um acontecimento oportuno capaz de melhorar o estado atual de um indivíduo, uma situação novaque traga benefícios”. O que falta à mulher negra é oportunidade, oportunidade para ser negra, oportunidade para mostrar suas qualidades, oportunidade para mostrar a todos o quanto é capaz de fazer qualquer coisa que desejar, oportunidade para ser. A luta da mulher negra no Brasil e pelo mundo é para ter oportunidades, oportunidades negadas pela escravidão, pela ignorância e perversidade humana, por uma sociedade excludente e injusta. Historicamente, muitas oportunidades foram roubadas do povo negro, oportunidade de ser negro inclusive. Tendo sempre seus signos, ritos e crenças estereotipados, marginalizados, perseguidos, sendo empurrado para um processo de embranquecimento, de expropriação de seu eu. Quando associamos a questão de raça o gênero a situação fica mais difícil, pois, esse segmento será duplamente estigmatizado por sua raça e sua “fragilidade”. Valdenice Raimundo, negra, jovem, professora do curso de Serviço Social, da Universidade Católica de Pernambuco teve a oportunidade de mostrar suas qualidades e ser reconhecida por tal, recebeu a honraria de integrar a Academia Vitoriense de Letras, Artes e Ciências, em Vitória de Santo Antão. Mais uma vitória para todas as mulheres negras, que podem se ver representadas na conquista de Valdenice, que declarou: Está sendo uma experiência nova para mim e eu fico muito feliz por ter, na minha cidade, conquistado esse espaço, que é novo, e isso me deixa muito feliz. Tem uma coisa muito interessante. Na minha trajetória, eu nunca imaginei que fosse ocupar esses espaços na minha cidade. Eu acho interessante e importante por conta da minha trajetória de vida: a filha de um operário, uma mulher negra com muitas dificuldades para acessar a formação, a acessa e, num determinado, momento consegue esse espaço. É importante porque é como um anúncio de que outras pessoas, outras mulheres, outros homens, negros, vindos das classes populares com esse histórico, podem futuramente estar nesses espaços, que não têm dono. As oportunidades dadas não passaram incólumes. A ascensão da mulher negra, há de incomodar os retrógados racistas, que não querem que as negrinhas deixem a casa grande. Contrariando todos os prognósticos a jornalista Maria Júlia Coutinho, negra, jovem e talentosa, tornou-se a “moça do tempo”, do maior telejornal do país. Foi alvo de ignorantes marginais que praticaram, contra sua competência e ascensão, crimes motivados por racismo e injúria racial11. A jornalista foi duramente atacada na internet por sua condição de raça e gênero, claramente inferiorizada, por sua condição de raça e gênero. Mesmo diante da indignação e mal-estar causados por atitudes vis como essa, devemos analisar o episódio de maneira crítica. 11 A injúria racial está tipificada no artigo 140, § 3º do Código Penal Brasileiro e consiste em ofender a honra de alguém com a utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem. Nas palavras de Celso Delmanto, “comete o crime do artigo 140, § 3º do CP, e não o delito do artigo 20 da Lei nº 7.716/89, o agente que utiliza palavras depreciativas referentes a raça, cor, religião ou origem, com o intuito de ofender a honra subjetiva da vítima” (Celso Delmanto e outros. Código Penal comentado, 6ª ed., Renovar, p. 305). Já o crime de racismo, previsto na Lei 7.716/89, implica em conduta discriminatória dirigida a um determinado grupo ou coletividade. Considerado mais grave pelo legislador, o crime de racismo é imprescritível e inafiançável, que se procede mediante ação penal pública incondicionada, cabendo também ao Ministério Público a legitimidade para processar o ofensor. Práticas racistas e sexistas, são mais comuns do que possamos mensurar, esse episódio é apenas sintoma da sociedade racista, discriminatória, doente em que vivemos. “Ser mulher e negra no Brasil significa está inserida num ciclo de marginalização e discriminação social”. (SANTOS, 2009) Viola, Valdenice e Maria Júlia não são únicas, porém, ainda são minoria, a minoria que teve acesso a oportunidades. Mas, também são exemplos de que mulheres negras, apesar de todas as desigualdades a que estão submetidas, são capazes de fazer e ser tudo aquilo que desejarem, incluindo terem sucesso e romperem com o ciclo de dominação e inferiorização a que as negras são predestinadas desde seus nascimentos. A articulação entre o sexismo e o racismo incide de forma implacável sobre o significado do que é ser uma mulher negra no Brasil. A partir do racismo e da consequente hierarquia racial construída, ser negra passa a significar assumir uma posição inferior, desqualificada e menor. Já o sexismo atua na desqualificação do feminino. (BRASIL, 2008) A realidade está posta, pense rápido: diga um símbolo social que represente a identidade da mulher negra? Faltam exemplos. As estatísticas estão postas, a realidade diz a mulher negra ganha menos, morre mais, casa menos. Ser mulher e negra, é como carregar uma chaga, uma marca que determina o que você é e o que pode fazer, até onde pode ir. Marias Júlias ou Violas incomodam por que, mesmo negras, conseguiram chegar onde quiseram, onde suas competências (que não de depende da cor da pele) as levaram, tiveram e aproveitaram suas oportunidades, não aceitaram a predestinação imposta pela sociedade. CONSIDERAÇÕES FINAIS É difícil sintetizar as reflexões feitas aqui. Ao falarmos das condições as quais as mulheres negras ao logo dos anos foram submetidas vemos que a questão racial associada a questão de gênero é extremamente perversa. Ser negra é resistir a todo momento, da vida pessoal à profissional, vivenciamos diariamente uma luta. Mas, felizmente nossa luta não tem sido infundada, vimos alcançando vitórias significativas no que diz respeito a nossa identidade, a nossa inserção social, (...) “as mulheres negras e as mulatas que em geral, sofrem de tripla discriminação: sexual, social e racial. Portanto, tudo o que se coloca como problemático para a população negra atinge especialmente as mulheres”. (VALENTE, 1994) Aprendemos que essa é uma questão política, social, cultural, logo, precisa ser enfrentada de maneira coletiva, politizada, organizada para que efetivamente as mulheres negras acessam as oportunidades que tem direitos, enquanto sujeitos sociais, históricos, autônomos. Falar da situação da mulher negra é mais que falar sobre raça ou racismo, é falar sobre uma parcela da população que é estigmatizada em seu nascimento, que reúne em uma só existência, vários elementos perseguidos e discriminados pela sociedade. É preciso estudar essa questão com critérios e criticidade, não devemos vitimizá-las ou subestimá-las, porém devemos analisar a questão exaustiva e criteriosamente. Porém, mesmo tendo muitas oportunidades negadas, estamos aí, galgando e conquistando nosso espaço, o respeito e valorização a que temos direito. Bibliografia CARNEIRO, Sueli. Mulheres em movimento: Estudos Avançados, São Paulo, nº 49.2003,126 p. GIACOMINI, S.M. Mulher e escrava: uma introdução histórica ao estudo da mulher negra no Brasil. Rio de Janeiro, Vozes, 1988.66 VALENTE, Ana Lúcia E. F. Ser Negro No Brasil Hoje. 11 ed. São Paulo: Moderna, 1994. Fonte: em http://cnncba.blogspot.com.br/2014/06/escravidao-e-reproducao-mulher-preta- e.html. Acessado em 30 de set.de 2015. Fonte://blogueirasnegras.org/2014/01/22/para-mulheres-negras-a-quem-o-estupro-diz-respeito- racaprecedeu-questoes-de-genero/. Fonte:(Disponível em: http://www.mpdft.mp.br/portal/index.php/conhecampdft-menu/nucleos- menu/ncleo-de-enfrentamento-discriminao-nedmainmenu-130/3047-injuria-racial-x-racismo. Fonte: 10 Disponível em: http://www.unicap.br/assecom1/?p=55734. Acessado em 04 de out. de 2015. Fonte:www.google.com.br/?gfe_rd=cr&ei=7vAHVtPrEIGk8wekkrzYBg&gws_rd=ssl#q=o+qu e+%C3%A9+Emmy+Awards. Fonte: http://www.geledes.org.br/viola-davis-e-a-primeira-negra-a-ganhar-o-premio-de-melhor-atriz-no-emmy-efaz-discurso-emocionante/#gs.pYgigkc. Fonte:http://www.significados.com.br/oportunidade/. Acessado em 27 de set. de 2015. Fonte:http://veja.abril.com.br/noticia/entretenimento/justica-condena-gravadora-por-racismo- em-musicade-tiririca/. TEXTO 3 A força das mães negras Levantando-se contra a escravidão, o machismo e o preconceito, a negra brasileira encontrou em sua espiritualidade ancestral os mitos, os símbolos e os exemplos que lhe inspiraram insubordinação e lhe permitiram construir uma nova e altiva identidade por Sueli Carneiro A luta das mulheres adquiriu diferentes perfis em nossa história, pois diferentes também eram as inserções sociais e as origens étnicas de suas protagonistas. Em comum, traziam o desejo de liberdade. Para as mulheres brancas, foi a luta contra o domínio patriarcal. Para as negras, a luta contra o jugo colonial, a escravidão e o racismo. Dentre as formas de resistências engendradas pelas mulheres negras brasileiras, destaca-se o exemplo das Yalorixás: uma estirpe de notáveis lideranças espirituais, como Yya Nassô (século XIX), Tia Ciata (1854-1924), Mãe Aninha (1869-1938), Mãe Senhora (1900-1967) e Mãe Menininha do Gantois (1894-1986), entre outras. Essas mulheres traziam para o presente modelos sacralizados de sua ancestralidade, evidenciados na mitologia preservada e na estrutura religiosa que aqui recriaram. A mitologia africana, apontando insistentemente as estratégias mais diversas de insubordinação, simbólicas ou reais, lhes ofereceu a possibilidade de criar mecanismos de defesa para a sobrevivência e a conservação de seus traços culturais de origem. O universo mítico, do qual o candomblé é remanescente, se estrutura, como várias outras mitologias, no princípio da sexualidade. É da interação dinâmica entre pares de contrários que tudo é gerado. Assim, a Terra (aiyé) e o Céu (órun) expressam, respectivamente, os princípios arquetípicos Feminino e Masculino. Sua união, que é a garantia da continuidade de tudo, nem sempre se dá de forma harmoniosa. E os conflitos, que são relatados nos mitos, expressam muitas vezes a luta entre os poderes feminino e masculino, em disputa pelo controle do mundo. Essa disputa expressa também o fato de que, em algumas sociedades africanas, mulheres e homens pertenciam a associações demarcadas pelo gênero: Geledé e Ialodé para as mulheres e Oró para os homens. Segundo a antropóloga Terezinha Bernardo: “Ialodê era uma associação feminina cujo nome significa ‘senhora encarregada dos negócios públicos’. Sua dirigente tivera lugar no conselho supremo dos chefes urbanos e era considerada uma alta funcionária do Estado, responsável pelas questões femininas, representando, especialmente, os interesses das comerciantes. Enquanto a Ialodê se encarregava da troca de bens materiais, a sociedade Gueledé era uma associação mais próxima da troca de bens simbólicos. Sua visibilidade advinha dos rituais de propiciação à fecundidade, à fertilidade — aspectos importantes do poder especificamente feminino”. No Brasil, o culto Geledé desapareceu e Ialodé tornou-se título de mulheres importantes do candomblé. A organização social do candomblé procurará recriar as estruturas hierárquicas das sociedades africanas que a escravidão destruiu, reorganizar a família negra, perpetuar a memória cultural e garantir a sobrevivência do grupo. Ela permitiu que os “terreiros” se tornassem territórios de organização comunitária, de cura aos destituídos do direito à saúde, de resistência cultural e de negociação com a sociedade abrangente e excludente. Leni Silverstein afirma, a propósito do caso baiano, que “a família-de-santo, com mulheres em seus pontos focais, se torna crucial para a perpetuação de um sistema alternativo de valores, costumes e culturas”1. Esse passado de resistência marca profundamente o povo-de-santo, em especial suas mulheres. Matriarcas negras que foram reverenciadas no livro A cidade das mulheres (1932), da antropóloga e pesquisadora norte-americana Ruth Landes. Diz ela que a mulher negra “era, no Brasil, uma influência modernizadora e enobrecedora”. E explica: “Economicamente, tanto na África como durante a escravidão no Brasil, contara consigo mesma. E isso se combinava com a sua eminência no candomblé para dar um tom matriarcal à vida familiar entre os pobres. Era um desejável equilíbrio para o rude domínio dos homens em toda a vida latina”2. Ruth observou que as mulheres do candomblé jamais se prostituíam, mesmo quando pobres, que eram livres no amor, mas não o comercializavam, que eram seres humanos bem desenvolvidos na época em que o feminismo levantava a voz pela primeira vez no Brasil. Suas vidas compõem parcela significativa da história do oprimido deste país e vêm sendo fonte de inspiração para a luta das mulheres negras contemporâneas. A pesquisadora e feminista negra Jurema Werneck compreende suas estratégias como “formas contra-hegemônicas de produção cultural”. E as vê construindo identidades com base em recortes territoriais, lingüísticos ou afetivos. Pela apropriação e atualização desse patrimônio cultural, as mulheres negras vêm conformando organizações inspiradas na mitologia africana e nas histórias de suas antepassadas. Nesse processo de afirmação identitária, buscam, em instituições femininas da tradição religiosa, nas figuras míticas e nas ancestrais coletivas, os valores e modelos de insubordinação para confrontar a ordem patriarcal e racista. Tal processo tem sido objeto da investigação científica de pesquisadoras negras contemporâneas, que buscam iluminar as linhas de continuidade entre a tradição e as estratégias de luta atuais. É o caso, por exemplo, do estudo realizado por Angélica Basti, que demonstra que o processo de rememoração implica em dois movimentos simultâneos: a lembrança do passado e a produção de um novo sentido no presente. E faz do mito “uma poderosa ferramenta para a re- significação da memória coletiva”. Para a pesquisadora, as organizações femininas negras são as novas guardiãs da produção discursiva do grupo. Pois resgatam, registram, arquivam e difundem a história das mulheres negras. E lutam por essa re-significação como instrumento para a transformação do presente. Do interior dos mitos, emergem os símbolos que inspiraram e inspiram o protagonismo religioso e político de parcelas da população feminina negra brasileira e demarcam as especificidades de sua perspectiva. Assim, Oxun, Iansã, Obá, Ewá, Iemanjá, Nanã conformam arquétipos que alargam e complexificam nossa compreensão do feminino. Cada orixá personifica uma linha de força da natureza, um papel na divisão sexual e social do trabalho, um conjunto de características temperamentais e emocionais. A existência de orixás femininos, masculinos e andróginos expressa uma compreensão profunda da própria sexualidade humana. Os indivíduos concretos serão percebidos do ponto de vista de seus caracteres psíquicos básicos, de sua ação concreta sobre o real e das múltiplas possibilidades de combinações desses componentes. Esse sistema de representações, particularmente suas mulheres míticas, oferece vivências que a sociedade machista nega. O conservadorismo cristão, que moldou a moral brasileira passada, impôs às mulheres a escolha entre os estereótipos da Virgem Maria e de Maria Madalena. Do ponto de vista patriarcal, esta última só encontra redenção ao abdicar de sua sexualidade. As deusas africanas legitimaram a transgressão dessa dicotomia maniqueísta. As deusas africanas são mães dedicadas e amantes apaixonadas. A partir do exemplo de Mãe Menininha de Gantois, Ruth Lande nos mostra o tipo de comportamento que essa visão alternativa de mundo ensejou: “Menininha não se casou legalmente […] pelas mesmas razões que as outras mães e sacerdotisas não se casam. Teriaperdido muito. De acordo com as leis daquele país católico e latino, a esposa deve submeter-se inteiramente à autoridade do marido. Quão incompatível é isso com as crenças e a organização do candomblé! Quão inconcebível para a dominadora autoridade feminina! E tão poderosa é a tendência matriarcal, em que as mulheres se submetem apenas aos deuses, que os homens […] nada podem fazer além de enfurecer-se, censurar e brigar com as sacerdotisas que amam”3. Inspiradas nos exemplos dessas precursoras poderosas, as mulheres negras, mestiças e brancas exibem hoje suas saias coloridas e vestem ojás e batas brancas engomadas durante as festas. Trabalham, cantam e dançam noite adentro para seus orixás. Entendem que, apesar de Oxalá ser o grande genitor masculino, ele se curva em adobale (prostração reverencial) diante de Oxum, o poder genitor feminino. Sabem que, embora Oxalá só possa usar a cor branca, ele põe nos cabelos a pena vermelha, o ekodide, em homenagem ao sangue menstrual, símbolo da fertilidade e da concepção. Então, percebem que a dominação masculina não se explica pela natureza inferior da mulher, mas pelo reconhecimento de suas potencialidades e pelo temor que isso inspira. Enfim, descobrem que a Virgem Maria e Maria Madalena são forças vivas em seu interior e que não precisam abdicar da sexualidade para atingir o reino dos céus. Sueli Carneiro é doutora em Filosofia da Educação pela USP, escritora e diretora do Geledés - Instituto da Mulher Negra. Este artigo nasceu da pesquisa realizada por ela na década de 1980, sob o título "O poder feminino no culto aos orixás". 1 Leni Silverstein, “Mãe de Todo Mundo: modos de sobrevivência nas comunidades de candomblé da Bahia”, em Religião e Sociedade, número 4. 2 Ruth Landes, A cidade das mulheres, 2a ed. Rio de Janeiro, Editora da UFRJ, 2002. 3 Idem. 4 Terezinha Bernardo, “O poder feminino no candomblé”, em Revista de Estudos da Religião, no 2, 2005. TEXTO 4 NUNCA FOI CASO DE AMOR: A HIPERSSEXUALIZAÇÃO DOS NOSSOS CORPOS Aline Silveira Como consequência do machismo, historicamente, toda mulher é objetificada e tratada como mercadoria sexual, no entanto, a mulher negra tendo a dupla discriminação, o machismo e o racismo, é desumanizada e tratada como a carne mais barata do mercado. Voltando alguns séculos na história do país, mais precisamente no período do Brasil Colônia, as negras que tinham o tom de pele mais claro e os traços do rosto mais finos, eram escolhidas para trabalhar na Casa Grande e consequentemente ficavam a disposição sexual dos senhores brancos. Do estupro que a história, a literatura e as novelas fantasiaram de amor nasceram os bastardos chamados de mulatos. Mulata ou mulato, é um termo depreciativo (animal híbrido, estéril, produto do cruzamento do cavalo com a jumenta, ou da égua com o jumento), é o resultado da mistura de negro com branco. Para muitos, ainda hoje, a palavra “negro” soa como palavrão e por isso o uso da palavra é evitada por muitas pessoas. Quem nunca ouviu de alguém “Ah, mas você nem é negra. É moreninha”? Ser negra/negro é algo pesado para muitos, afinal, quem quer ser negro no país mais racista do mundo? Sendo assim, os termos mulata, morena, moreninha, da cor do pecado, são usados na intenção de tornar mais suave o fardo de ser negro no Brasil. Descobrir a sua negritude, portanto, é um ato de resiliência, resistência e político. A democracia racial é o mito que a nossa sociedade criou para vender uma imagem positiva que não coincide com a realidade. Nos dias atuais é durante o carnaval que o mito é reformulado. A mulher negra passa de invisível, já que somos rejeitadas frente a mulheres brancas (que são o padrão de beleza e o modelo para casar) e passamos a ser a “mulata”, a exótica desejada e boa de cama, mas não o suficiente para casar. Nossos corpos são hiperssexualizados que é a reprodução machista e racista em que foi construída a imagem da mulher negra historicamente. No carnaval a objetificação das negras é naturalizada e personificada na “Globeleza”. É a imagem que é exportada para o mundo, reproduzindo a ideia de que mulheres negras são libertinas e sempre prontas para o sexo. É a preta tipo exportação, porém a preta exportação é aceita apenas no carnaval (festa do pecado, do profano) onde tudo é permitido. A cor do pecado não poderia ser outra se não a preta. “Quando a mulher negra não é considerada indesejável e repulsiva devido a sua pele, acaba se tornando alvo de objetificação racista, que a exotifica sexualmente. Esses estereótipos acabam naturalizando a violência sexual contra as mulheres negras e limitando sua existência a um limbo de rejeição e indesejabilidade” Jarid Arraes Desde criança aprendemos que nossos corpos não são desejados como o da protagonista da novela, nossos cabelos não são lisos como os da vizinha loira e que nossos traços não são finos como da menina mais popular da escola. Vamos crescendo e aceitando (mesmo sem perceber) a sermos desprezadas, a não termos confiança ou autoestima e aceitar a solidão que é submetida para toda mulher negra. Aceitamos relacionamentos abusivos, e muitas vezes nem sabemos que são abusivos, afinal o amor nos foi negado sempre e quando estamos em um relacionamento não podemos simplesmente abandonar, porque ter alguém ao nosso lado nos torna sortudas. Isso tudo é uma violência muito forte, é uma forma de genocídio (que não se caracteriza apenas com arma do PM na nossa cara). Em síntese, nós mulheres negras sofremos violência desde a infância e isso é genocídio também. A hiperssexualização do corpo negro feminino promove uma falsa valorização de que deixamos de ser rejeitadas para nos tornarmos aceitas. Muitas mulheres negras não entendem, inclusive, quando uma pessoa branca a convida para sair ou tem algum tipo de interesse afetivo. A neura (ou não) de que a pessoa branca está contigo porque te acha exótica, afinal “ser preta tá na moda” ou porque tem quem queira pagar de “humildão da esquerda”, e isso sempre foi o teto que escuto de muitas irmãs negras. Cria-se a ideia que somos apenas objetos sexuais exóticos para o consumo alheio. “Isso traz grandes obstáculos para que as mulheres negras consigam conquistar algum crescimento profissional e ocupar lugares de relevância em sociedade. As mulheres negras precisam lutar para serem reconhecidas como seres humanos tridimensionais, com gostos, personalidades e características individuais, e não somente seres excêntricos para serem usadas sexualmente por quem quer ‘experimentar algo diferente’.” Jarid Arraes Recentemente a Revista “Azmina – para mulheres de A a Z”, foi até New Orleans, nos Estados Unidos, que tem um dos carnavais mais famosos do mundo, saber opiniões sobre a exposição da Globeleza e a pergunta mais frequente foi o “Porque sempre tem ser uma mulher negra a ser exposta de forma depreciativa?” e “Porque não um casal sambando? Porque não um homem sambando nú?” indagou uma moradora de New Orleans. A resposta é simples: vivemos ainda resquícios da escravidão no Brasil. As mulheres negras eram constantemente estupradas pelo senhor branco e carregava o estigma daquela que deveria servir sexualmente aos homens. Hoje nós negras continuamos atreladas a visão racista secular que dizia que só servimos para o sexo sujo e selvagem. Não se trata, portanto, de uma escolha deliberada ou livre, vivemos numa sociedade em que o corpo feminino foi e é associado a objeto de prazer do homem. Portanto, para além da objetificação, nós negras queremos inclusão e visibilidade, não de forma depreciativa, estereotipada ou subalterna que nos foi imposta desde o período colonial. Nós negras não aceitamos mais e estamos cansadas de ser a carne mais barata do mercado. Referência:http://blogueirasnegras.org/2016/01/28/nunca-foi-caso-de-amor-a-hiperssexualizacao-dos-nossos-corpos/MATERIAL DE APOIO E COMPLEMENTAR Analise as mensagens visuais abaixo de acordo com os conceitos de: SIGNO, SIGNIFICANTE E SIGNIFICADO: Imagem 1 Fonte: http://artenarede.com.br/blog/index.php/tag/portinari/ Imagem 2 Fonte: http://pt.slideshare.net/WagnerLouza/frida-kalho-e-tarsila-do-amaral Imagem 3 Fonte: http://www.dezenovevinte.net/obras/negro_representacoes.htm Imagem 4 http://www.mcnadv.com.br/noticias/migalhas-com-br/nao-e-ofensiva-propaganda-da-devassa- com-referencia-ao-corpo-da-mulher-negra Imagem 5 Fonte: http://memoriaglobo.globo.com/mostras/carnaval-na-globo/carnaval-na-globo/carnaval- na-globo-globeleza.htm MÚSICA Mulheres Negras Yzalú Enquanto o couro do chicote cortava a carne, A dor metabolizada fortificava o caráter; A colônia produziu muito mais que cativos, Fez heroínas que pra não gerar escravos matavam os filhos; Não fomos vencidas pela anulação social, Sobrevivemos à ausência na novela, no comercial; O sistema pode até me transformar em empregada, Mas não pode me fazer raciocinar como criada; Enquanto mulheres convencionais lutam contra o machismo, As negras duelam pra vencer o machismo, O preconceito, o racismo; Lutam pra reverter o processo de aniquilação Que encarcera afros descendentes em cubículos na prisão; Não existe lei maria da penha que nos proteja, Da violência de nos submeter aos cargos de limpeza; De ler nos banheiros das faculdades hitleristas, Fora macacos cotistas; Pelo processo branqueador não sou a beleza padrão, Mas na lei dos justos sou a personificação da determinação; Navios negreiros e apelidos dados pelo escravizador Falharam na missão de me dar complexo de inferior; Não sou a subalterna que o senhorio crê que construiu, Meu lugar não é nos calvários do brasil; Se um dia eu tiver que me alistar no tráfico do morro, É porque a lei áurea não passa de um texto morto; Não precisa se esconder segurança, Sei que cê tá me seguindo, pela minha feição, minha trança; Sei que no seu curso de protetor de dono praia, Ensinaram que as negras saem do mercado Com produtos em baixo da saia; Não quero um pote de manteiga ou um shampoo, Quero frear o maquinário que me dá rodo e uru; Fazer o meu povo entender que é inadmissível, Se contentar com as bolsas estudantis do péssimo ensino; Cansei de ver a minha gente nas estatísticas, Das mães solteiras, detentas, diaristas. O aço das novas correntes não aprisiona minha mente, Não me compra e não me faz mostrar os dentes; Mulher negra não se acostume com termo depreciativo, Não é melhor ter cabelo liso, nariz fino; Nossos traços faciais são como letras de um documento, Que mantém vivo o maior crime de todos os tempos; Fique de pé pelos que no mar foram jogados, Pelos corpos que nos pelourinhos foram descarnados. Não deixe que te façam pensar que o nosso papel na pátria É atrair gringo turista interpretando mulata; Podem pagar menos pelos os mesmos serviços, Atacar nossas religiões, acusar de feitiços; Menosprezar a nossa contribuição para cultura brasileira, Mas não podem arrancar o orgulho de nossa pele negra; Refrão: Mulheres negras são como mantas kevlar, Preparadas pela vida para suportar; O machismo, os tiros, o eurocentrismo, Abalam mas não deixam nossos neurônios cativos. https://www.letras.mus.br/yzalu/mulheres-negras/ BOA ATIVIDADE!
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