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2012 1 Nelson Ramos As diferentes nuances da violência na televisão o caráter social da violência texto

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Universidade de São Paulo 
 Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas - FFLCH 
 Departamento de Sociologia 
 Laboratório Didático - USP ensina Sociologia 
__________________________________________________________________________ 
 
1 
 
 
ESTÁGIO SUPERVISIONADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS – FFLCH / USP 
 
 
 
As diferentes nuances da violência na televisão: o caráter social da violência. 
 
Aluno: Nelson Ramos de Oliveira 
2º semestre/2012 
 
 
INTRODUÇÃO 
O objetivo deste trabalho é propor ao professor de Sociologia do Ensino Médio uma 
alternativa à sua reflexão sobre a percepção da violência na televisão brasileira, procurando 
apontar sua permanente transformação seja em aspectos ligados a imagens, conteúdos, 
programas e formas de veiculação. Estas transformações verificadas proporcionaram uma 
reordenação na criação de subjetividades, e uma consequente ressignificação da noção de 
violência, dando a ela uma dimensão superior àquela com a qual nos deparamos em nosso 
cotidiano. Na atual configuração das relações de produção, isto é, no presente estágio do 
capitalismo, a televisão “produz” entretenimento e nós o consumimos a fim de satisfazer 
nossas “necessidades”. Em meio a esta configuração a violência tornou-se um dos produtos 
prediletos da televisão na “briga” pela audiência, o que obrigou especialistas de diversas 
áreas a trabalharem-na nos mesmos moldes de um produto industrializado. 
Como produto construído e consumido pelos homens, a violência tornou-se objeto de 
estudo da sociologia sendo, dessa forma, uma instituição pertencente ao mundo social, 
através do qual agimos e nos relacionamos, sempre condicionados por elemento culturais 
que contribuem na configuração de uma estrutura simbólica capaz de dar significação ao 
ambiente em que vivemos. 
Nesse sentido é preciso pensar não mais em violência, mas em “violências”, pois 
quando a consideramos como subproduto de ações que se desenvolveram no mundo social, 
seja através do Estado ou por meio de indivíduos no decorrer da história, temos de levar em 
conta a peculiaridade que a mesma assumirá tanto quando é realizada por diferentes 
homens – uma vez que cada ação ganha particularidade pelo fato de que as vivências são 
únicas e internalizadas individualmente – quando por homens em diferentes culturas e em 
diferentes momentos. É, entretanto, necessário pensá-la nas suas mais diversas formas de 
se manifestar e de reconfigurar nossas estruturas cognitivas, atendendo a interesses de 
grupos e agindo conforme as dinâmicas e os anseios da vida social. 
 
 
 
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 A partir desta perspectiva, quando se pensa em “banalização da violência” emitida 
pela televisão brasileira nas últimas décadas, precisamos compreender os processos que 
constituíram o conceito de banalização, isto é, temos que considerar o caráter social que a 
violência possui e tentar entender como os conteúdos que hoje adentram os lares do Brasil 
ganharam, paulatinamente, aceitação do público ou são visto atualmente com indiferença, 
insensibilidade, ou seja, passaram por um processo de “naturalização”. 
 
VIOLÊNCIA NA ÉPOCA DA TELEVISÃO 
A mentalidade ancorada em uma economia exclusivamente agrária havia tempos 
deixara de existir. As bases fundacionais que viriam estruturar uma sociedade industrial já 
tinham sido estabelecidas por Getúlio Vargas e seriam continuadas, ainda que em moldes 
transnacionais, por Juscelino Kubitscheck. Nesse contexto é inaugurada no Brasil a 
televisão, que se consolidaria dentro de algumas décadas, no mais importante veículo de 
comunicação de massas. 
O ano de 1954 é para os brasileiros a data inaugural daquilo que se transformaria em 
tempos num veículo de comunicação revolucionário, um meio de comunicação de massas, 
isto é, naquele que ditaria um novo ordenamento no campo das relações sociais, atingindo 
simultaneamente milhões de pessoas. Dessa forma, pensarmos a programação que a 
televisão nos oferece é estar ciente de que novas formas de socialização irão compor 
nossas experiências pessoais, mesmo sabendo que não estamos vivenciando-as na prática, 
ou seja, na relação direta com as pessoas. 
Uma pesquisa1 realizada no ano de 1999 por Nanci Cardia comprovou o intenso uso 
da televisão por pessoas nas mais diferentes faixas etárias. Enquanto dois terços delas 
ficavam em frente à televisão por cerca de 3 horas, os outros dois terços permaneciam 
atentos em torno de 4 a 6 horas. (CARDIA, 1999, p.2). 
Nesse sentido temos de considerar o fenômeno televisivo como sendo de extrema 
importância na criação de subjetividades e na construção significações, pois através das 
informações, imagens, mensagens ou comportamentos apresentados nos diferentes 
 
1
 O survey no qual se baseia esse trabalho abrangeu 10 capitais brasileiras: Porto Alegre, São Paulo, Rio de 
Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Belém, Manaus, Porto Velho, e Goiânia. Foram entrevistadas 1600 
pessoas com 16 anos ou mais, com diferentes graus de escolaridade e condições econômicas. A esses 
entrevistados foi aplicado um questionário com perguntas fechadas (escalas de atitudes) e algumas perguntas 
abertas. Os dados foram coletados entre fins de março e começo de abril de 1999 e permitiram vários 
cruzamentos: por faixa etária, por sexo, por grau de escolaridade, religião, tipo de renda familiar, tempo de 
moradia na cidade e (se migrante) estado de origem, e raça. Para fins desse trabalho os resultados estão sendo 
apresentados privilegiando-se os cruzamentos por faixa etária, pois as diferenças entre faixas etárias aparentam 
ser as mais relevantes e dado que os tratamentos estatísticos mais refinados ainda estão em curso. 
 
 
 
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programas veiculados, os telespectadores estarão sujeitos a uma nova forma de 
socialização. Além disso, as particularidades de cada sociedade mostram-se de reveladoras 
quando queremos interpretar os objetivos perante os quais a violência é veiculada. 
Aquilo que, em dado momento, numa dada sociedade, é 
considerado como violência varia segundo a natureza da sociedade 
considerada, configurando a realidade empírica da violência como um 
fenômeno polissêmico e plural. A rigor não faz sentido falarmos em 
violência no singular, já que estamos confrontados com manifestações 
plurais de violência, realidade que remete à necessidade de pensar a 
violência a partir de suas relações com a cultura. (PORTO, 2002, p.153). 
 
A partir destas considerações, precisamos situar a violência como produto de 
destaque no interior da programação disponibilizada pela televisão, salientando a relevância 
do ambiente histórico-cultural sob o qual esta se desenvolverá. 
 
A VIOLÊNCIA ENQUANTO PRODUTO 
Quando percebemos a violência enquanto elemento constitutivo da sociedade e 
queremos demostrar que sua existência é condicionada por ações, relações e por 
instituições que permeiam o mundo social, ou seja, que sua transformação é oriunda da 
construção social partilhada por e entre estes agentes, precisamos nos concentrarna 
interpretação dos processos históricos, culturais e econômicos, através dos quais este 
elemento ganhou, paulatinamente, a atual configuração. 
É importante lembrar que, ao considerarmos a violência como subproduto de ações 
que se desenvolveram no mundo social, temos de levar em conta a peculiaridade que a 
mesma assumirá tanto quando é realizada por diferentes homens – uma vez que cada ação 
ganha particularidade pelo fato de que as vivências são únicas e internalizadas 
individualmente – quando por homens em diferentes culturas, ou ainda e, principalmente, 
quando produzida em larga escala, por determinados grupos pertencentes a setores 
dominantes da sociedade. 
Com o surgimento da televisão como veículo de comunicação de massas, houve, 
nesse sentido, uma homogeneização na forma de percepção da violência. Aconteceu uma 
espécie de padronização da forma de percepção do mundo que nos cerca, uma vez que as 
experiências que eram vividas pessoalmente por cada indivíduo nas suas relações 
cotidianas passaram a ser selecionadas e codificadas por este aparelho – controlado por um 
 
 
 
 
 
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grupo de pessoas que certamente possui interesses - e difundidas para milhões de lares em 
todo o mundo. 
Nesse sentido, precisamos entender o aparecimento da televisão como veículo de 
massas subjacente à atual configuração do capitalismo. A lógica de sua programação será 
mediada por regras de mercado presentes em todos os setores sociais. A visão dos fatos 
daqueles que a assiste, estará constantemente condicionada pelos interesses daqueles que 
a produzem. Os juízos de valores que emitimos quando diante dos fatos do cotidiano, 
estariam tendo alguma contribuição, em seu processo de constituição, daquilo que a 
televisão nos apresenta diariamente. 
Em seu trabalho “Os impactos da exposição à violência: aceitação da violência ou 
horror continuado? O caso de São Paulo.”, desenvolvido no Núcleo de Estudos da Violência 
da USP (NEV-USP), Nancy Cardia, com base na pesquisa citada anteriormente, observa 
que: 
Há, com maior frequência, indignação contra o crescimento de delitos 
violentos contra a propriedade do que com o crescimento dos crimes contra 
a vida que vitimam, em sua grande maioria, jovens do sexo masculino, 
moradores dos bairros mais pobres. Essa ausência de indignação pode ser 
consequência de vários fatores: pode indicar a existência de uma 
normalização ou aceitação da violência interpessoal desde que praticada 
contra o que se imagina sejam determinados "tipos de pessoas", ou para 
resolver determinados tipos de disputa, por exemplo, do tráfico de drogas. 
(CARDIA, 1999, p.2). 
 
Refletindo sobre a citação presente na pesquisa de Nancy Cardia, podemos 
perceber que grande parte da programação dos telejornais que cobrem fatos ligados à 
violência, possui, como pano de fundo, o problema das drogas ou problemas relacionados a 
crimes contra a propriedade privada e, normalmente, estão associados, na grande maioria 
das vezes, a culpabilização de jovens pobres, do sexo masculino, negros, moradores das 
periferias e subúrbio das grandes cidades, aparecendo quase sempre como inimigos 
maiores da sociedade e das “pessoas de bem”, responsáveis pela violência que assola 
estas grandes cidades. Vemos normalmente, seguidos das cenas de violência apresentadas 
por este tipo de programa, discursos revoltados de jornalistas solicitando às autoridades 
públicas mais rigor na aplicação das leis, uma reformulação no código penal ou mesmo a 
implantação da pena de morte. Depreendemos nas entrelinhas a presença da luta de 
classes e as desigualdades reinantes na estrutura da sociedade capitalista. Enquanto de um 
lado há uma maior aceitação da violência quando esta é praticada contra pobres, sobretudo 
contra os negros, por outro lado, não se tolera crimes contra a propriedade privada. 
 
 
 
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Com isso, internalizamos os exemplos e passamos a valorizar e a justificar, em 
alguma medida, crimes contra a propriedade privada, mesmo que tenhamos a vida como a 
“única propriedade”. Surge a configuração de estereótipos e a ratificação de preconceitos 
construídos a partir das escolhas feitas pelos responsáveis pela programação. As cenas que 
vivenciamos apenas no sofá de nossas casas fazem com que suspeitemos de qualquer 
pessoa que nos pareça estranha. Todavia, como revelou a pesquisa citada, pessoas 
“perigosas” tem cor, gênero, idade, pertence à determinada classe social. 
Além da culpabilização das camadas economicamente menos favorecidas pela 
existência da violência na sociedade, há ainda, consequentemente, indícios de que a 
representação da violência pela televisão tenha contribuído bastante para o aumento da 
indústria de segurança. A quantidade de empresas particulares especializadas em 
segurança cresceu vertiginosamente nos últimos anos. De acordo com o Departamento de 
Polícia Federal, entre os anos de 1998 e 2004 o número de vigilantes cadastrados 
multiplicou-se por quatro, saltando de 280.193 para os atuais 1.148.568.2 A violência tal 
como é retratada desenvolve uma sensação de medo na sociedade influenciando no 
aumento do consumo de produtos para evitá-la. 
Com base em uma pesquisa realizada por André Zanetic, podemos perceber através 
da tabela abaixo, como se relaciona o investimento em recursos de segurança e medo da 
violência. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Os dados apresentados mostra-nos forte incidência entre as variáveis, investimento 
em recursos de segurança e medo da violência. 
De acordo com o autor, 
Ao cruzarmos a variável medo da violência com a propensão em investir 
recursos em recursos de proteção, além de encontrarmos a associação 
 
2
 Departamento de Polícia Federal – Relatório 2004 (disponível em http://www.dpf.gov.br). 
 
 
 
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esperada entre percepção da violência e investimento em segurança, 
observamos que quanto maior a intensidade do medo, maior à propensão 
dos indivíduos em realizar tais investimentos tende a aumentar. (...) tal 
efeito não se presencia apenas na presença direta do crime, mas também 
pela ampla exposição da população a forte presença da violência e do crime 
nos diversos meios de comunicação, seja nos jornais, no rádio e na TV, 
assim como na conversa diária entre os cidadãos, em que o tema está cada 
vez mais presente. (ZANETIC, 2005, p.37-38). 
 
A violência retratada na televisão é assistida por pessoas de diversas partes do país 
produzindo, praticamente, a mesma sensação de medo na maior parte das pessoas. 
Entretanto, sabemos que as realidadessociais vivenciadas nas diferentes partes do país 
são bastante peculiares. 
Em um artigo escrito por Nara Magalhães (2009), no qual a autora procura abordar a 
multiplicidade de significados da violência apontada pelos estudiosos, e compará-los com 
estudos empíricos realizados numa uma cidade de médio porte do interior do Estado do Rio 
Grande do Sul, a pesquisadora oferece-nos um bom exemplo que relaciona sensação de 
medo com investimento em recursos de segurança. Na pesquisa, a autora se surpreende 
ao saber que moradores desta cidade pequena cidade do Rio Grande do Sul demonstravam 
preocupações e temores, no tocante à violência, muito semelhantes àqueles vistos em 
habitantes de grandes cidades brasileiras - que possuem altos índices de violência -, bem 
como aspiravam morar em residência que apresentavam padrão elevado de segurança. Ao 
realizar pesquisas nos registros das delegacias, analisando boletins de ocorrência, em 
jornais e rádios locais, a autora pode perceber que os crimes violentos e à mão armada 
eram bem mais raros. Segundo a autora, os registros analisados, 
Não apresentavam relatos significativos que ajudassem a explicar a 
percepção de “cidade violenta” expressa pelos moradores. Nos jornais 
locais, as notícias da coluna policial eram, em sua maioria, sobre pequenos 
furtos: roubos de som de carros cuja garagem ficara aberta (e carro idem); 
de roupas de varal e tênis em pátios de casas; de carteiras em painel de 
carro aberto na rua, etc. (MAGALHÃES, 2009, p. 328). 
 
Como pode perceber a autora no decorrer da pesquisa e, com base naquilo que era 
noticiado diariamente pela televisão local (desta pequena cidade), o desespero com o 
excesso de violência revelado pelos moradores e o sonho de ter uma moradia cada vez 
mais cercada de muros e grades, pouco tinha a ver com a experiência por eles vivida no 
cotidiano desta cidade, estando ligados muito mais a “um imaginário resultante da 
interpretação realizada sobre a abordagem televisiva.” (MAGALHÃES, 2009, p.326). 
Todavia, embora não neguemos a existência da violência no “mundo real”, temos de 
salientar que toda essa produção no sentido da dramatização e espetacularização de suas 
 
 
 
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imagens, assim como o agrupamento em um “mesmo pacote” dos crimes mais violentos, e 
aos insistentes apelos sensacionalistas para garantir picos de audiência só contribuem para 
ludibriar ou confundir a percepção que as pessoas tem do grau de violência na sociedade, 
aumentando significativamente a indústria da segurança. Ao nos depararmos com a 
existência de comerciais de empresas que comercializam acessórios para segurança nos 
intervalos de programas jornalísticos reconhecidos como sensacionalista, (Cidade Alerta e 
Brasil Urgente, principalmente) precisamos nos questionar sobre o impacto que a violência 
veiculada pela televisão tem na ressignificação de nossa percepção e, de que forma isto 
produz consequências no nosso consumo. 
 
RESSIGNIFICAÇÃO DA VIOLÊNCIA CONSTRUÍDA NA TELA 
 
Atualmente, a televisão atinge quase que cem por cento dos lares brasileiros (fonte 
IBGE). Nesse sentido, por estar em contato com milhões de brasileiros diariamente, 
podemos considerá-la como um veículo importante na construção de nossas subjetividades. 
Como um dos principais produtos pertencente à grade de sua programação, 
certamente dos que mais atrai audiência, a violência é noticiada diariamente e, através da 
televisão, veiculada para todo o país agindo com indiferença às particularidades de cada 
estado, cidade ou bairro. Dessa forma, ao falarmos em massificação deste veículo, 
precisamos estar cientes de que, ao assistirem a programação televisiva, as pessoas 
passaram a partilhar, de certa forma, as mesmas imagens, sons, mensagens e significações 
que, consequentemente contribuem para uma internalização mais homogênea mesmo que 
estas pessoas que vivenciam diferentes realidades. 
A percepção que tínhamos da violência antes de sua massificação era condicionada, 
sobretudo a partir das experiências pelas quais passávamos em nossas vidas, no nosso dia-
a-dia. Constituíamos nossos valores e, fundamentávamos nossa reflexão sobre a violência 
com base em experiências bastante particulares. Para Maria Rita Kehl, “o processo de 
privatização das questões coletivas é estimulado pela televisão” (KEHL, 1996). Em seu 
texto, Mériti de Souza argumenta que, “as experiências relacionadas ao espaço coletivo 
encontram-se cada vez mais restritas, (...) de que o sujeito participa do mundo público e das 
mais variadas situações reproduzidas no seu instrumento midiático.” (SOUZA, 2003, p. 85). 
Ainda numa reflexão comparativa sobre as relações interpessoais com aquelas vivenciadas 
diante da tela, a autora coloca que: 
 
 
 
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Acreditamos que o contato direto do sujeito com novas pessoas e novas 
experiências possibilita-lhe confrontar suas representações sobre o mundo 
e questionar os significados por ele construídos sobre a realidade que o 
cerca e sobre si mesmo. À medida que grande parcela de situações novas 
acontece no espaço coletivo e nas relações interpessoais, a mediatização 
do espaço público e o estímulo às experiências virtuais produzidas pela 
televisão restringem a capacidade do sujeito em atribuir novos sentidos às 
suas vivências. Essa situação acontece porque, além de a televisão 
instaurar a experiência virtual, oferecendo ao telespectador o acesso 
indireto a situações e eventos, ela também oferta uma interpretação única 
dessas situações, estimulando o telespectador a assumir como seu o 
discurso proferido (SOUZA, 2003, p. 85). 
 
Percebemos com isso que a televisão tornou-se um importante espaço público por 
estar presente na vida de milhões de pessoas, contudo, embora a população possa assistir 
simultaneamente a mesma programação, não existe a possibilidade de interferência de cada 
indivíduo, ou seja, não é oferecida ao telespectador condições através das quais o mesmo 
possa deglutir as informações apresentadas e partilhar com todos os outros expectadores 
suas indagações e conclusões (a internet já permite melhor troca de informação entre seus 
usuários, porém ainda não percentual elevado da população brasileira). Além disso, 
velocidade com que são passadas as informações não é possibilita sequer pensar sobre as 
mesmas. Internalizamos as situações mais salientes, mas não há tempo de discutirmos 
soluções, pois, na sequência, somo surpreendidos com outro caso. 
Diante disso, percebemos como os conteúdos que nas últimas décadas adentraram 
os lares do Brasil ganharam, paulatinamente, aceitação do público ou são visto com 
indiferença, insensibilidade. Torna-se “normal” ou “natural” quando, em detrimento dos 
interesses dos meios de comunicação, as mensagens ou imagens são banalizadas 
(repetidas insistentemente) e tratadas como se “sempre tivesse sido assim”, sendo 
dramatizadas à maneira de uma produção cinematográfica sensacionalista, fazendo com 
que percamos a prática de deglutir a informação e processá-la com alguma racionalidade 
diante dos fatos que presenciamos. Segundo Maria Stela Grossi Porto: 
 (...) as imagensda violência contribuem de modo não desprezível para 
mostrá-la, como mais normal menos terrível do que ela é em suma, (...) a 
realidade da violência não é estética: as fotografias do local de um atentado, 
(...) a estilização que encena artisticamente as imagens e as transforma em 
clichês, a banalização induzida pela repetição, (...) se a experiência 
contemporânea da violência passa pelas imagens, tal experiência só pode 
ser suavizada e banalizada” (PORTO, 1989, p 192.). 
 
É nesse sentido que a percepção da violência ganha uma nova ressignificação, pois 
sua espetacularização promovida pela televisão, assim como sua impressionante forma de 
atingir simultaneamente milhões de pessoas fez com que sua nova roupagem fosse 
 
 
 
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compartilhada por todos, criando certa homogeneização na construção das subjetividades. 
Dessa forma, a violência preconizada pela televisão, que certamente é remontada seguindo 
os anseios e aspirações de pessoas ligadas a grupos influentes na sociedade que almejam 
lucrar com a audiência, condicionaria, em alguma medida, a internalização de uma 
determinada percepção de mundo. 
Em meio à programação que passou a fazer parte do nosso cotidiano chamo a 
atenção para um aumento significativo de programas que exploram o tema da violência em 
suas mais diferentes facetas. Muitos programas3 assistidos dentro dessa elevada 
quantidade de horas possuem um elevado teor de violência, onde vemos como são 
exploradas diferentes situações cotidianas nas quais ao atribuir sentido busca-se uma 
enviesada tentativa de representar o mundo. 
Da mesma maneira, verificamos uma transformação significativa na população, em 
seu modo de perceber e de vivenciar casos de violência em suas vidas. O produto no qual 
se transformou a violência e que é vendido para a população dentro de seus próprios lares 
trouxe-nos a reflexão sobre uma nova ressignificação. Esta nova ressignificação produzida 
pela lógica televisiva é subjacente a uma estrutura maior inerente aos interesses 
mercadológicos. A violência como um produto que garante a audiência, necessita ser 
mantida e frequentemente reelaborada e por isso, muitas vezes, transcende àquela com a 
qual no deparamos na “vida real”. 
De acordo com estudos realizados por Michaud, a “violência é muito mais difundida e 
considerada muito mais normal do que se pensa”. Além disso, “(...) a realidade cotidiana da 
violência difere sensivelmente das representações que fazemos dela e dos discursos 
ideológicos ou míticos que sustentamos sobre ela” (MICHAUD, 1989, p.98). 
Portanto o aparecimento da televisão como veículo de comunicação de massas deve 
ser entendido historicamente dentro do sistema capitalista. É importante salientarmos que 
os programas veiculados são vendidos como produtos de uma vitrine de uma loja, cujo 
objetivo é lucrar o máximo possível (no caso, atingir o maior número de pontos na audiência 
e aumentar o investimento recebido de patrocinadores). Como objeto que atinge milhões de 
pessoas temos neste veículo um ente socializador e produtor de novos significados o que 
contribui para uma reordenação de nossa visão de mundo e percepção da violência. 
 
 
 
 
 
 
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 Referências: 
 
CARDIA, N.(1999). Os impactos da exposição à violência: aceitação da violência ou horror 
continuado? O caso de São Paulo. In: Culture, Citizenship and Urban Violence Seminary, 
Cuernavaca. 
 
MAGALHÃES, N. (2009). Significados de violência em abordagens da mensagem televisiva. 
In: Sociologias, Porto Alegre, ano 11, nº 21, jan./jun. 2009, p. 318-343. 
 
MICHAUD, Y. Violência. (1989). São Paulo: Editora Ática. 
 
PORTO, M.S.G. (2000). A violência entre a inclusão e a exclusão social. In: Tempo Social 
Rev. Sociologia. USP, v. 12, n. 1, São Paulo, Maio de 2000. p. 187-200. 
 
_____________. (2002). Violência e meios de comunicação de massa na sociedade 
contemporânea. In Sociologias, Porto Alegre. Dez. de 2002, p. 152-171. 
 
SOUZA, M. (2003). Televisão, Violência e Efeitos Midiáticos. In: Psicologia Ciência e 
profissão Brasília, Dez. 2003, p. 82-87. 
 
ZANETIC, A. (2005). A questão da segurança privada: estudos do marco regulatório dos 
serviços particulares de segurança. 118 f. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia 
Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. 
 
Bibliografia complementar: 
 
ADORNO, S. (1997). Violência e o mundo da recepção televisiva (entrevista com Sérgio 
Adorno). In: Revista Novos Olhares ECA/USP, São Paulo, 1999, p. 32-37. 
 
ADORNO, T. (1978) A indústria cultural. In. COHN, Gabriel (Org.). Comunicação e indústria 
cultural. São Paulo: Editora Nacional. 
 
BELLONI, M.L. (1998). A estética da violência. In: Comunicação e Educação, São Paulo, 
Mai/Ago. 1998, p. 43-48. 
 
BERGER, P.; LUCKMANN, T. (2010). A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes. 
 
BOURDIEU, P. (1997). Sobre a Televisão. Rio de Janeiro: Zahar. 
 
BUCCI, E. (1997). Brasil em tempo de TV. São Paulo: Boitempo. 
 
 
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 Destaque, sobretudo para os programas de cunho jornalístico como o Brasil Urgente e o Cidade Alerta. 
 
 
 
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______________. (2000-2001). Como a violência na TV alimenta a violência real da polícia. 
In: Revista USP, São Paulo, Dez/Fev. 2000-2001, n.48, p. 68-73. 
 
______________. (2000). Linha direta com quem? In: Comunicação e Educação, São 
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