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1 TOXICOCINÉTICA (Casarett) INTRODUÇÃO A toxicidade de um agente químico depende da dose, ou seja, quanto maior a dose administrada, maior é a toxicidade observada. Refinando o conceito de dose- resposta, considerando nesse caso não a dose administrada, mas a concentração do agente químico que alcança o órgão alvo de sua toxicidade, essa concentração depende de como o agente tóxico se comporta no organismo, ou seja, de como ocorrem sua absorção, distribuição, biotransformação e eliminação. Sendo assim, a concentração de um agente químico no órgão onde exerce sua ação tóxica depende da quantidade do toxicante com a qual o organismo entra em contato e da velocidade em que se processam sua absorção, distribuição, biotransformação e eliminação. Os processos de absorção, distribuição, biotransformação e eliminação são intimamente relacionados e influem, de modo importante, na toxicidade exercida por um agente químico. Em geral, para produzirem efeitos tóxicos, os agentes químicos precisam ser absorvidos, alcançando a circulação sistêmica. As principais vias pelas quais os toxicantes penetram no organismo são o trato respiratório, trato gastrintestinal e a pele. Alcançando a corrente sangüínea, o agente tóxico está disponível para se distribuir no sítio alvo de sua ação, ou seja, no local onde produz seus efeitos tóxicos. Por exemplo, enquanto que, o mercúrio e o chumbo produzem danos no sistema nervoso central (SNC), rins e sistema hematopoético, o tetracloreto de carbono produz danos no fígado e o benzeno no SNC e sistema hematopoético. Para produzir danos em um órgão, o toxicante deve alcançar esse órgão. Contudo, vários fatores influem na susceptibilidade dos órgãos ao toxicante, e nem sempre o órgão no qual o toxicante encontra-se em concentração mais elevada é aquele onde produz seus efeitos tóxicos. Os inseticidas organoclorados, por exemplo, atingem concentrações mais elevadas no tecido gorduroso, mas não produzem nenhum efeito tóxico nesse local. Um agente químico também pode exercer seu efeito tóxico diretamente na corrente sangüínea como o gás arsina, por exemplo, que produz hemólise. Os agentes tóxicos são retirados do sangue por meio de biotransformação, mecanismos de excreção (eliminação) e acúmulo em vários sítios de armazenamento. Dentre os órgãos envolvidos na eliminação, os rins são os mais importantes, pois respondem pela eliminação da maioria dos toxicantes presentes no organismo. Outros órgãos, no entanto, adquirem importância, no caso de certos compostos; por exemplo, os pulmões são importantes na eliminação do monóxido de carbono e o fígado na excreção biliar do chumbo. Embora o fígado seja o órgão mais ativo na biotransformação de toxicantes, algumas enzimas em outros tecidos, como esterases no plasma e outras presentes nos rins, pulmões e trato gastrintestinal também podem promover a biotransformação de agentes tóxicos. Em geral, a biotransformação é um pré-requisito para a eliminação de toxicantes. 2 ABSORÇÃO Conceito Considerando o organismo, a absorção do toxicante é sua passagem do local de entrada para a circulação sistêmica. O significado da palavra passagem nesse contexto é a transposição de membranas biológicas (membranas celulares e subcelulares). A absorção e eliminação do toxicante nada mais são do que a passagem através das membranas, sendo que a absorção conduz o composto do meio externo para o interior do organismo e a eliminação consiste na sua saída do interior do organismo para o meio externo, conforme o esquema apresentado a seguir: Absorção ---------------------⇒ Exterior Interior ⇐--------------------- Eliminação Passagem de toxicantes através das membranas celulares A passagem de toxicantes através das membranas celulares depende de fatores relacionados com a substância química e fatores relacionados com o organismo, especialmente aqueles associados com a membrana celular. Fatores relacionados com a substância: propriedades físico-químicas, principalmente: solubilidade, grau de ionização e tamanho e forma da molécula. Solubilidade A membrana celular tem natureza lipídica. Por isso, para atravessá-la, uma molécula deve inicialmente dissolver-se nela. A facilidade com que a dissolução ocorre depende da lipossolubilidade da molécula, a qual é determinada pela presença de grupos lipofílicos (hidrofóbicos ou não polares), na molécula. Assim, por exemplo: - radicais alquila são lipofílicos e a lipossolubilidade aumenta com o comprimento da cadeia, como descrito a seguir: CH3- < CH3-CH2- < CH3-CH2-CH2- < CH3-(CH2)n- - substituições na molécula podem determinar o aumento do seu caráter lipofílico, como por exemplo: a substituição de um átomo de oxigênio por um átomo de enxofre; - a adição de halogênios à molécula também aumenta sua lipossolubilidade. A seguir são apresentados os valores dos coeficientes de partição em cloreto de butila/água de compostos (molécula na forma não ionizada) do grupo dos barbitúricos: 3 - fenobarbital = 0,40 - N-metil-fenobarbital = 18,00 - tio-fenobarbital = 14,10 A comparação dos valores, que expressam a lipossolubilidade desses compostos, pode ilustrar os fatos mencionados anteriormente. Por outro lado, quando a molécula contém elementos estruturais que permitem a formação de pontes de hidrogênio com a água, o caráter lipofílico diminui, com o concomitante aumento das propriedades hidrofílicas ou polares. A polaridade é alta para moléculas ionizadas e grupamentos funcionais, tais como: hidroxila (-OH), carboxila (-COOH), amina (-NH2) e outros. A relação entre o caráter lipofílico e o caráter hidrofílico de uma molécula determina se esta poderá transpor prontamente as membranas celulares, por simples difusão. Em geral, quanto maior a lipossolubilidade da molécula, mais fácil é sua passagem através das membranas. Grau de ionização Os toxicantes, em sua maioria, são ácidos fracos ou bases fracas, tendo um ou mais grupamentos funcionais capazes de se ionizar. O grau em que a ionização se processa depende do pKa (constante de dissociação) da substância e do pH do meio onde está dissolvida. As membranas biológicas são permeáveis às formas não ionizadas das substâncias químicas, se estas forem suficientemente lipossolúveis. A relação entre o processo de ionização, pKa da substância e pH do meio é dada pelas equações de Handerson-Hasselbach apresentadas a seguir: [não ionizada] - para ácidos: pKa - pH = log --------------------- [ionizada] [ionizada] - para bases: pKa - pH = log ---------------------- [não ionizada] Fatores relacionados com a membrana celular Estrutura básica da membrana celular O agente tóxico deve transpor várias barreiras antes de atingir concentração suficiente para produzir lesões características, no órgão alvo de sua ação. Tais barreiras são as membranas de diversas células, como as do epitélio estratificado da pele, as finas camadas de células dos pulmões ou do trato gastrintestinal, o endotélio capilar e as células do tecido ou órgão onde o toxicante exerce sua ação. As membranas plasmáticas que envolvem todas essas células são notavelmente similares. A membrana celular tem uma estrutura delgada e elástica, formada quase que exclusivamente por lipídios e proteínas, com espessura entre 7,5 e 10 nanômetros (nm). Sua estrutura básica é uma bicamada lipídica, ou seja, uma película delgada de lipídios 4 com a espessura de duas moléculas, contínua por sobre toda a superfície celular. Dispersas nessa película lipídica, existem moléculas de proteínas globulares.A bicamada lipídica é formada quase que inteiramente por fosfolipídios e colesterol. Tanto as moléculas de fosfolipídios como de colesterol, contêm uma parte hidrofílica e outra parte hidrofóbica. O radical fosfato dos fosfolipídios é hidrofílico e os ácidos graxos são hidrofóbicos. O colesterol contém um radical hidroxila que é hidrossolúvel e um núcleo esteróide que é solúvel em gordura. Como as partes hidrofóbicas dessas moléculas são repelidas pela água, mas se atraem mutuamente, essas moléculas possuem tendência natural para se alinharem umas às outras, com suas frações graxas ocupando a região central da membrana e com suas regiões hidrofílicas voltadas para a superfície, em contato com a água que as banha. Os ácidos graxos da membrana não têm uma estrutura cristalina rígida; na verdade, são quase fluidos nas temperaturas fisiológicas. O caráter fluido das membranas é em maior parte determinado pela estrutura e abundância de ácidos graxos poliinssaturados. A bicamada lipídica da membrana representa importante barreira, impermeável às substâncias hidrossolúveis. Por outro lado, as substâncias solúveis em gordura podem atravessar facilmente essa região da membrana. Na membrana celular são encontrados dois tipos de proteínas: as proteínas integrais, que atravessam toda a espessura da membrana e as proteínas periféricas, que ficam presas à superfície da membrana sem atravessá-la. Muitas proteínas integrais formam canais (ou poros) estruturais, pelos quais substâncias hidrossolúveis, especialmente íons, podem se difundir entre os líquidos intracelular e extracelular. Algumas proteínas integrais atuam como proteínas carreadoras para o transporte de substâncias na direção oposta à natural de sua difusão, e outras são enzimas. As proteínas periféricas são encontradas quase que exclusivamente na face interna da membrana e atuam principalmente como enzimas. Usualmente, ficam presas a uma proteína integral. Processos que atuam na passagem de toxicantes através da membrana celular Dependendo de suas propriedades físico químicas, os toxicantes atravessam as membranas celulares por diferentes processos, que podem ser de dois tipos: transporte passivo ou especializado Transporte passivo O transporte passivo depende do gradiente de concentração ou eletroquímico. Não há gasto de energia pela célula, ou seja, a célula não desempenha um papel ativo na transferência. Nesse tipo de transporte se incluem: a simples difusão e filtração. Simples difusão A maioria dos toxicantes atravessa as membranas celulares por simples difusão. Algumas moléculas hidrofílicas, suficientemente pequenas, possivelmente penetram através dos canais (ou poros aquosos), enquanto que moléculas hidrofóbicas se difundem através das porções lipídicas das membranas. Os toxicantes, em sua maioria, são moléculas orgânicas grandes, com lipossolubilidade em grau variável. A velocidade de transporte através das membranas 5 depende da lipossolubilidade, que é freqüentemente expressa como coeficiente de partição em hexano/água ou clorofórmio/água. Muitos agentes tóxicos, bases e ácidos orgânicos fracos, ocorrem tanto na forma ionizada como não ionizada, em solução. A forma ionizada é de difícil penetração na membrana, ao passo que a forma não ionizada pode ser suficientemente lipossolúvel para se difundir através da porção lipídica. Desse modo, a difusão do composto através da membrana depende principalmente da lipossolubilidade da sua forma não ionizada. Usando as equações de Handerson-Hasselbach apresentadas a seguir, é possível determinar a porcentagem ou fração do composto que está na forma não ionizada. [não ionizada] - para ácidos: pKa-pH = log --------------------- [ionizada] [ionizada] - para bases: pKa -pH = log --------------------- [não ionizada] Filtração Quando a água flui em grande quantidade através de uma membrana porosa, qualquer soluto, pequeno o bastante para passar através dos poros, flui com ela. A passagem através desses canais é chamada filtração, visto que o fluxo de água em grande quantidade é causado por força hidrostática ou osmótica. Uma das principais diferenças entre as diversas membranas celulares consiste no diâmetro dos poros. Nos glomérulos renais e capilares os poros são relativamente grandes (aproximadamente 70 nm) e permitem a passagem de moléculas menores do que a albumina (peso molecular de 60.000). Na maioria das células os poros são muito menores (< 4 nm) e permitem a passagem de substâncias químicas com peso molecular de no máximo 200. Transporte especializado Existem diversas situações nas quais o movimento de substâncias químicas através da membrana não pode ser explicado por simples difusão ou filtração. É o caso, por exemplo, de compostos que são muito hidrossolúveis para se dissolverem na membrana e também muito grandes para se difundirem através dos poros. Para explicar o movimento desses compostos através das membranas celulares foi postulada a existência de sistemas especializados de transporte, que são: o transporte ativo, difusão facilitada, fagocitose e pinocitose. Os sistemas especializados são responsáveis pelo transporte através das membranas de muitos nutrientes: açúcares, aminoácidos e ácidos nucléicos. Contudo, também podem ser utilizados por alguns xenobióticos. Transporte ativo As seguintes propriedades caracterizam o sistema de transporte ativo: 6 � a substância química move-se contra um gradiente de concentração ou eletroquímico; � com altas concentrações do substrato o sistema pode ser saturado, exibindo um máximo de transporte; � o sistema apresenta uma certa seletividade, com respeito a estrutura química do composto a ser transportado; � pode haver inibição competitiva entre as substâncias a serem transportadas; � o sistema requer gasto de energia da célula, na forma de ATP. As substâncias químicas que são ativamente transportadas provavelmente formam um complexo com um carreador macromolecular antes de transpor a membrana e alcançar o interior da célula. Depois de liberar a substância, o carreador retorna à superficie original, para repetir o ciclo de transporte Avanços significantes no entendimento dos sistemas de transporte ativo de xenobióticos têm ocorrido nos últimos anos. Sabe-se, hoje, que existem diversas famílias de transportadores de xenobióticos. Difusão facilitada A difusão facilitada é um sistema de transporte mediado por carreador, que exibe as mesmas propriedades do transporte ativo, com exceção dos seguintes fatos: a substância química não se move contra um gradiente de concentração ou eletroquímico e esse tipo de transporte não despende energia. A difusão facilitada parece só ter importância no transporte de nutrientes. A glicose, por exemplo, é transportada para os diferentes tecidos do organismo por esse sistema. Fagocitose e pinocitose São processos nos quais a membrana celular flui ao redor de substâncias químicas na forma particulada, englobando-as. Esse tipo de transferência através das membranas celulares é importante para a remoção de material particulado dos alvéolos, por fagócitos e do sangue, pelo sistema reticuloendotelial do fígado e do baço. Absorção no trato gastrintestinal O trato gastrintestinal é uma das mais importantes vias de absorção de agentes tóxicos. Por essa via são absorvidos muitos toxicantes ambientais que entram na cadeia alimentar. Comumente, as tentativas de suicídio envolvem a ingestão de substâncias químicas, em excesso. Essa é também a via responsável, com maior freqüência, pelas intoxicações entre crianças. A absorção de agentes químicos pode se dar ao longo de todo o trato gastrintestinal, desdea boca até o reto. Por essa razão, alguns compostos são administrados por via sub-lingual e outros pela via retal. Entretanto, é mais comum a absorção de toxicantes após sua ingestão. Com respeito aos toxicantes que são bases ou ácidos orgânicos fracos, estes tendem a ser absorvidos por simples difusão no local do trato gastrintestinal, onde estão presentes na forma mais solúvel em lipídios (não ionizada). Como o suco gástrico é 7 ácido, e o conteúdo intestinal é quase neutro, a lipossolubilidade do composto pode diferir, acentuadamente, nessas duas áreas do trato gastrintestinal. Usando as equações de Handerson-Hasselbach é possível determinar a porcentagem do toxicante que está na forma não ionizada (solúvel em lipídios). No caso de um ácido orgânico fraco, como por exemplo o ácido benzóico e conhecendo: [não ionizada] � a equação: pKa - pH = log ---------------------, [ionizada] � o pKa do ácido benzóico = 4, � pH do estômago = 2 e � pH do intestino = 6 é possível determinar a porcentagem do ácido que está na forma não ionizada (lipossolúvel): ⇒ no estômago: [não ionizada] pKa - pH = log ----------------- [ionizada] [não ionizada] 4 - 2 = log ----------------- [ionizada] [não ionizada] 2 = log ----------------- [ionizada] [não ionizada] 102 = ----------------- [ionizada] [não ionizada] 100 = ----------------- [ionizada] ⇒ no intestino: [não ionizada] pKa - pH = log ----------------- [ionizada] 8 [não ionizada] 4 - 6 = log ----------------- [ionizada] [não ionizada] -2 = log ----------------- [ionizada] [não ionizada] 10-2 = ----------------- [ionizada] [não ionizada] 1/100 = ----------------- [ionizada] Conforme demonstrado anteriormente, no estômago, um ácido fraco está na forma não ionizada, sendo, portanto, absorvido em maior quantidade, nesse local do trato gastrintestinal. No caso de uma base orgânica fraca, como por exemplo a anilina e conhecendo: [ionizada] � a equação: pKa - pH = log -----------------, [não ionizada] � o pKa da anilina = 5, � pH do estômago = 2 e � pH do intestino = 6 é possível determinar a porcentagem da base que está na forma não ionizada (lipossolúvel): ⇒ no estômago: [ionizada] pKa - pH = log ----------------- [não ionizada] [ionizada] 5 - 2 = log ----------------- [não ionizada] [ionizada] 3 = log ----------------- [não ionizada] [ionizada] 103 = ----------------- [não ionizada] 9 [ionizada] 1000 = ----------------- [não ionizada] ⇒no intestino [ionizada] pKa - pH = log ----------------- [não ionizada] [ionizada] 5 - 6 = log ----------------- [não ionizada] [ionizada] -1 = log ----------------- [não ionizada] [ionizada] 10-1 = ----------------- [não ionizada] [ionizada] 1/10 = ----------------- [não ionizada] Conforme demonstrado anteriormente, no intestino, uma base fraca está na forma não ionizada (lipossolúvel), sendo, portanto, absorvida em maior quantidade, nesse local do trato gastrintestinal. O trato gastrintestinal dos mamíferos tem sistemas especializados de transporte para a absorção de nutrientes e eletrólitos. Existe um sistema para a absorção de glicose e galactose, três para a absorção de aminoácidos, um para absorção de pirimidinas e sistemas para a absorção de cálcio, ferro e sódio. Alguns toxicantes podem ser absorvidos através desses sistemas. Assim, por exemplo: o tálio é absorvido pelo mesmo sistema que transporta o ferro e o chumbo parece ser absorvido pelo mesmo sistema que transporta o cálcio. Partículas também podem ser absorvidas pelo epitélio gastrintestinal. Foi demonstrado que partículas de um corante azóico, com tamanho variável, tendo em média algumas centenas de nanômetros de diâmetro, foram absorvidas no duodeno. A resistência de substâncias químicas ao pH ácido do estômago, às enzimas do estômago e intestino, e à flora intestinal, se reveste de extrema importância. O toxicante pode ser alterado por qualquer um desses fatores, para formar um novo composto com toxicidade diferente daquele que lhe deu origem. Por exemplo: toxinas de cobras são muito menos tóxicas quando ingeridas, do que quando administradas por via intravenosa, porque são destruídas por enzimas digestivas no trato gastrintestinal. A ingestão de água com alta concentração de nitrato produz metemoglobinemia, que é 10 muito mais freqüente em crianças do que em adultos. Isso acontece porque o pH do trato gastrintestinal no recém-nascido é mais elevado, estando, por isso, associado com a presença de uma flora mais abundante de certas bactérias, especialmente Escherichia coli, que converte o nitrato em nitrito, sendo este o agente metemoglobinizante. Muitos fatores podem alterar a absorção gastrintestinal de toxicantes. Assim, por exemplo, o ácido etilenodiaminotetracético (EDTA) aumenta a absorção de agentes químicos. Parece que ao quelar o cálcio, o EDTA causa aumento da permeabilidade da membrana celular. A alteração da motilidade gastrintestinal também pode afetar a absorção de toxicantes. A quantidade de uma substância química que entra na circulação sistêmica, após sua administração oral, depende de vários fatores. Assim, antes que a substância alcance a circulação sistêmica, ela pode ser biotransformada pelas células do epitélio gastrintestinal, ou pode ser capturada pelo fígado e excretada na bile, com ou sem biotransformação prévia. Esse fenômeno de remoção das substâncias químicas após a administração oral, antes de atingirem a circulação sistêmica, é denominado de eliminação pré-sistêmica ou efeito de primeira passagem. Absorção pulmonar Respostas tóxicas às substâncias químicas podem resultar de sua absorção pelos pulmões. Assim, o monóxido de carbono, que causa com muita freqüência intoxicações fatais, é absorvido ao nível dos alvéolos pulmonares. A silicose, uma das doenças ocupacionais mais importantes, se deve ao acúmulo de silício nos pulmões. A via pulmonar também tem sido usada na guerra química para a absorção de gases tóxicos, tais como: o cloro, fosgênio, levisita, gás mostarda, etc) e na execução de criminosos em câmaras de gás, utilizando o ácido cianídrico. Os toxicantes absorvidos pelos pulmões são usualmente: gases (monóxido de carbono, dióxido de nitrogênio, etc), vapores de líquidos voláteis e volatilizáveis (benzeno, tetracloreto de carbono, etc), e aerossóis, que são partículas sólidas ou líquidas suspensas no ar atmosférico. A região alveolar, onde os toxicantes são absorvidos, é uma área grande (50 a 100 m2) dos pulmões, que age como superfície combinadora entre o sangue e o ar alveolar. O sangue nos capilares está separado do ar nos alvéolos por duas membranas muito delgadas, constituídas por uma única camada de células. Desse modo, o equilíbrio entre o sangue e o ar alveolar é atingido com muita rapidez. Gases e vapores Os gases e vapores são governados pelos mesmos princípios. Por isso, o uso da palavra gás representará ambos. A absorção de gases inalados ocorre principalmente nos pulmões. Contudo, antes de alcançar os pulmões, o composto deve passar através das fossas nasais,cuja superfície mucosa é coberta por uma camada de fluido, onde moléculas de gases hidrossolúveis e altamente reativos podem ser retidas. A difusão através das membranas celulares não é um fator limitante da velocidade de absorção de gases ao nível pulmonar. Isto se deve, pelo menos em parte, ao fato de que a camada de células epiteliais nos alvéolos é muito fina e os capilares estão em íntimo contato com essas células, de tal modo que o composto terá que se difundir através de um espaço muito estreito. A medida que o gás atinge os alvéolos, 11 suas moléculas se difundem do ar alveolar para o sangue onde se dissolvem e são distribuídas para os tecidos. Após algum tempo, instala-se um equilíbrio dinâmico entre as moléculas do gás no sangue e no ar alveolar; quanto maior for a solubilidade do composto no sangue, mais tempo será necessário para se estabelecer o estado de equilíbrio. No estado de equilíbrio, a razão da concentração do composto no sangue e na fase gasosa é constante. Tal razão de solubilidade, denominada coeficiente de partição sangue/ar, é uma constante única para cada gás. Quando o equilíbrio é alcançado a velocidade de transferência das moléculas do gás do espaço alveolar para o sangue se iguala a velocidade de remoção das moléculas do sangue para o espaço alveolar. Para substâncias com baixa razão de solubilidade sangue/ar, como por exemplo o etileno, apenas uma pequena porcentagem do gás contido nos pulmões é removida pelo sangue durante cada circulação, uma vez que o sangue é logo saturado pelo composto. Conseqüentemente, um aumento na velocidade respiratória ou volume minuto não altera a transferência do gás para o sangue. Ao contrário, a absorção é favorecida por aumento da velocidade do fluxo sangüíneo. Gases com alto coeficiente de partição sangue/ar, como por exemplo o clorfórmio, são transferidos para o sangue quase que na sua totalidade durante cada ciclo respiratório. Nesse caso, a velocidade de absorção pode ser acelerada pelo aumento da velocidade da respiração ou do volume minuto. O aumento da velocidade de fluxo não altera substancialmente a absorção. Aerossóis Na exposição a aerossóis, as características mais importantes, que afetam a absorção pulmonar, são o tamanho das partículas e a hidrossolubilidade do material em questão. A extensão de penetração das partículas no trato respiratório depende largamente do seu tamanho e da anatomia, ou seja, das dimensões e configurações das vias aéreas, que dificultam o acesso de material particulado aos pulmões. Além disso, o sistema respiratório conta com mecanismos de eliminação deste material. Partículas com 5 µm de diâmetro ou maiores usualmente se depositam na região nasofaríngea. Aquelas retidas na porção anterior não ciliada do nariz permanecem nesse local, até que sejam eliminadas pelo espirro ou pela limpeza do nariz. A cobertura mucosa da superfície nasal ciliada propele partículas insolúveis através do movimento dos cílios, sendo estas engolidas em minutos. As partículas podem se dissolver na mucosa, sendo transportadas para a faringe ou podem ser absorvidas através do epitélio nasal. Partículas de 2 a 5 µm se depositam principalmente na região traqueobronquiolar, de onde são removidas pelo movimento retrógrado da camada mucosa, nas porções ciliadas do trato respiratório. O mecanismo de transporte nessa região é geralmente rápido e eficiente. Partículas com 1 µm ou menores penetram nos alvéolos pulmonares, onde podem ser absorvidas ou eliminadas pela via linfática, após a fagocitose por macrófagos. Nesse local, a remoção de partículas não é eficiente; algumas partículas podem permanecer nos alvéolos indefinidamente. 12 Absorção cutânea A pele humana entra em contato com muitos agentes tóxicos. Felizmente, não é muito permeável, ou seja, é uma barreira lipídica relativamente eficiente, que separa o homem do seu ambiente. Todavia, alguns agentes químicos podem ser absorvidos pela pele, em quantidades suficientes para produzir efeitos sistêmicos. O sarin (gás de guerra asfixiante) é prontamente absorvido pela pele intacta. O tetracloreto de carbono pode ser absorvido pela pele, em quantidade suficiente para produzir danos hepáticos. Vários inseticidas tem causado a morte de trabalhadores agrícolas, após serem absorvidos pela pele intacta. Para ser absorvido pela pele, o toxicante deve passar através das células epidérmicas, ou pelas células das glândulas sudoríparas e sebáceas, ou penetrar através dos folículos pilosos. As glândulas sudoríparas e os folículos pilosos estão espalhados, com densidade variável, por toda a pele. Embora a passagem através dos folículos pilosos possibilite a entrada rápida de quantidades pequenas dos toxicantes, estes são absorvidos principalmente através da epiderme, que constitue a maior área de superfície da pele. A absorção percutânea requer a passagem dos toxicantes através de várias camadas de células, antes de entrarem nos pequenos capilares sangüíneos e linfáticos, na derme. A barreira que determina a velocidade de absorção cutânea dos compostos é a epiderme, mais especificamente o extrato côrneo, que é a camada mais externa da pele, constituída de células queratinizadas, densamente compactadas, as quais perderam seus núcleos e são biologicamente inativas. A passagem através das camadas restantes é muito mais rápida e, dessa maneira, pode se distinguir duas fases na absorção percutânea de xenobióticos. A primeira fase é a de difusão através do extrato côrneo. Em contraste com a complexidade do trato gastrintestinal, a pele é uma barreira mais simples de penetração pelas substâncias químicas, uma vez que a passagem através da camada de células mortas é a etapa limitante da velocidade. É óbvio que todos os toxicantes que podem atravessar o extrato côrneo, o fazem por difusão passiva. A segunda fase da absorção percutânea consiste na difusão do toxicante através das camadas mais internas da epiderme e da derme. Os toxicantes passam através dessa área e entram na circulação sistêmica, através de numerosos capilares sangüíneos e linfáticos da derme. A velocidade de difusão dos toxicantes depende do fluxo sangüíneo, movimento do fluido intersticial, além de outros fatores, inclusive interações com constituintes da derme. Em geral, a quantidade na qual o toxicante é absorvido pela pele depende da dose ou concentração envolvida, do tempo de contato com a pele, do local e área de superfície implicados. Além disso, a absorção de toxicantes varia dependendo das condições da pele. A integridade da pele pode ser alterada por aplicação de agentes químicos que danificam especificamente a camada de superfície, como por exemplo o ácido fórmico. Álcoois metílico e etílico, hexano e acetona quando aplicados podem dissolver os lipídeos normais da pele, o que resulta em moderada alteração da permeabilidade. A absorção percutânea dos toxicantes é largamente determinada por suas propriedades físico-químicas. Todavia, não está claro, até que ponto a lipossubilidade é importante. O inseticida DDT é consideravelmente mais solúvel em lipídeos do que na água e é absorvido de forma menos eficiente pela pele do que no trato gastrintestinal, sendo, portanto, mais tóxico por via oral do que pela via dérmica, para ratos. Ao 13 contrário, o inseticida isolan é completamente solúvel na água e é melhor absorvido pela pele, sendo mais tóxico pela via dérmica do que por via oral, para ratos. Entre os compostos lipossolúveis prontamente absorvidos pela pele destacam- se: o fenol e derivados fenólicos, hormônios (estrógeno, progesterona, testosterona e desoxicorticosterona), vitaminas D e K e bases orgânicas (estricnina e nicotina). Com respeito a polaridade, parece que a absorção percutânea é mais eficientepara compostos apolares do que para compostos iônicos, mas nem sempre. Sais de alguns alcalóides penetram facilmente pela pele. Uma variedade de fatores tais como pH, grau de ionização, peso molecular, lipossolubilidade e hidrossolubilidade influem na absorção de agentes químicos pela pele. DISTRIBUIÇÃO Alcançando a corrente sanguínea, após absorção ou por administração intranvenosa, o toxicante está disponível para sua distribuição no organismo. Desse modo, mais uma vez, o composto deverá atravessar barreiras, ou seja, membranas celulares, para alcançar o sítio alvo de sua ação tóxica no organismo. A distribuição do toxicante depende da sua habilidade de atravessar essas barreiras, da sua afinidade pelos vários tecidos ou órgãos que constituem o organismo e da vascularização e fluxo sangüíneo nos diversos tecidos ou órgãos. A distribuição ocorre por meio de forças que atuam no movimento das substâncias químicas através das membranas biológicas. Assim, a simples difusão, filtração e sistemas especializados de transporte, discutidos anteriormente, são os processos através dos quais os agentes tóxicos atravessam essas barreiras. De acordo com suas características físico-químicas, o toxicante pode apresentar maior ou menor afinidade por certo tecido ou órgão. Quanto a vascularização, é óbvio o papel que representa; haverá uma maior distribuição de toxicantes nos tecidos mais vascularizados. No entanto, isso não implica no acúmulo de toxicantes nesses tecidos. O sangue oferece um maior contato do agente tóxico com os tecidos. Todavia, o acúmulo do toxicante será determinado por sua afinidade pelos tecidos e habilidade de transpor as barreiras biológicas. Em geral, os agentes tóxicos se concentram ou se acumulam em um tecido específico. Alguns toxicantes atingem concentrações mais elevadas nos sítios alvos de suas ações. É o caso, por exemplo, do monóxido de carbono, que tem uma afinidade muito grande pela hemoglobina. Outros se concentram em um sítio que não é aquele no qual produzem seus efeitos tóxicos. O chumbo, por exemplo, é armazenado no tecido ósseo, mas os sintomas da intoxicação por esse composto se devem a sua ação nos tecidos moles. Nesse caso, o compartimento do organismo onde o toxicante se concentra pode ser visto como depósito de armazenamento, já que nele o toxicante se encontra toxicologicamente inativo. Desse modo, os depósitos de armazenamento podem ser considerados como mecanismos de proteção do organismo, uma vez que previnem o acúmulo de altas concentrações de agentes químicos nos sítios alvos de suas ações tóxicas. No depósito de armazenamento, o toxicante está em constante equilíbrio com o toxicante livre no plasma. Assim, será liberado do local de armazenamento, à medida que o composto livre seja biotransformado ou eliminado do organismo. Conseqüentemente, a meia vida biológica dos compostos que são armazenados no organismo pode ser muito longa. 14 Os principais sítios de armazenamento de toxicantes no organismo são os seguintes: � proteínas do plasma, � fígado e rins, � tecido gorduroso e � tecido ósseo. Proteínas do plasma Diversas proteínas do plasma podem se ligar às substâncias químicas exógenas, tão bem como se ligam a alguns constituintes fisiológicos normais. A albumina, por exemplo, tem a capacidade de se ligar a muitos compostos. A transferrina é importante para o transporte do ferro no organismo e a ceruloplasmina é importante para o transporte do cobre. A quantidade na qual os toxicantes se ligam às proteínas do plasma varia consideravelmente. Assim, a antipirina não se liga à proteinas, o secobarbital se liga numa proporção de 50% e a tiroxina se liga numa proporção de 99,9%. As proteínas do plasma podem se ligar a compostos ácidos como por exemplo a fenilbutazona, a compostos básicos como a imipramina e neutros como a digitoxina. A maioria das substâncias químicas exógenas se liga à albumina, que é a proteína encontrada em maior abundância no plasma e serve como depósito e transporte para numerosos compostos endógenos e exógenos. As interações proteína-toxicante ocorrem principalmente como resultado de forças hidrofóbicas reforçadas por pontes de hidrogênio e forças de Van der Waals. Devido ao seu alto peso molecular, as proteínas e qualquer toxicante a elas ligado não podem atravessar as paredes dos capilares. Conseqüentemente, a fração do toxicante ligada à proteína fica retida no espaço vascular, não estando, por isso, disponível para a distribuição no espaço extravascular ou filtração pelos rins. Todavia, a interação proteína-toxicante é um processo rapidamente reversível. A medida que o toxicante livre no plasma se difunde através das paredes dos capilares, aquele que se encontra ligado se dissocia da proteína, para manter o equilíbrio entre o toxicante livre no plasma e o toxicante livre no espaço extravascular. Do ponto de vista toxicológico, a ligação de agentes químicos com proteínas do plasma é de especial importância, porque reações tóxicas severas podem ocorrer se o composto for deslocado de sua ligação com a proteína. Ligada à proteína a substância não está disponível para atingir o órgão alvo de sua ação tóxica. Foi demonstrado que um agente químico pode deslocar outro, liberando-o de sua ligação com a proteína, tornando-o disponível para se distribuir no sítio alvo de sua ação tóxica. Se, uma sulfonamida, que se liga fortemente às proteínas, for administrada concomitantemente com um fármaco antidiabético, a sulfonamida pode deslocar o farmáco antidiabético e induzir coma hipoglicêmico. Substâncias químicas exógenas podem também competir e deslocar compostos fisiológicos normais que se ligam às proteínas. Foi observado que uma alta taxa de mortalidade resultava do uso da mistura penicilina-sulfonamida, no tratamento de crianças prematuras com infecções bacterianas. Estudos demonstraram que a sulfonamida é capaz de deslocar quantidades consideráveis de bilirrubina, de sua ligação com a albumina. Como a barreira hematoencefálica é pouco desenvolvida em recém-nascidos, a bilirrubina pode se distribuir no cérebro, produzindo danos cerebrais severos. 15 Fígado e rins O fígado e os rins apresentam alta capacidade de reter agentes tóxicos. No organismo, os toxicantes se concentram mais nesses orgãos do que em qualquer outro. Provavelmente, isto se deve ao fato de que o fígado atua na biotransformação e os rins atuam na eliminação de agentes tóxicos. O mecanismo preciso pelo qual o fígado e os rins removem os toxicantes do sangue ainda não foi esclarecido. Possivelmente, nesses casos, estão envolvidos o transporte ativo ou a ligação com componentes do tecido. Assim,uma proteína encontrada no citoplasma das células hepáticas (ligandina) tem alta afinidade por corantes azóicos (carcinogênicos) e corticosteróides. Uma outra proteína, a metalotioneina, que se liga ao cádmio, também foi encontrada no fígado e rins. A ligação de agentes tóxicos com componentes celulares se dá rapidamente, principalmente no fígado. Foi demonstrado que trinta minutos após a administração de chumbo, como dose única, a concentração desse composto encontrada no fígado foi aproximadamente cinqüenta vezes maior do que no plasma. Tecido gorduroso A lipossolubilidade do toxicante determina o seu armazenamento no tecido adiposo. Substâncias químicas suficientemente lipossolúveis se distribuem e se concentram no tecido gorduroso. Isso tem sido demonstrado para vários agentes tóxicos, tais como: o clordane, DDT, bifenilas policloradas e bifenilas polibromadas. Parece que os toxicantes se acumulam no tecido adiposo por simples dissolução física em gorduras neutras. As gorduras neutras constituem cerca de 50% do peso corpóreo de um indivíduo obeso e cerca de 20% do pesocorpóreo de um indivíduo de porte atlético. Desse modo, um toxicante com alto coeficiente de partição lipídeo/água pode ser armazenado em grande quantidade, no tecido adiposo. O armazenamento determinará a ocorrência de uma concentração menor do toxicante no sítio alvo de sua ação, servindo como um mecanismo de proteção do organismo. Face ao exposto, supõe-se que esses compostos exerçem sua toxicidade de forma menos severa em indivíduos obesos. Entretanto, deve ser considerada a possibilidade de um repentino aumento da concentração do toxicante no sangue e no seu sítio de ação, como resultado de rápida mobilização de gorduras armazenadas, para obtenção de energia. Vários estudos tem mostrado que o jejum, por um curto período de tempo, de animais experimentais previamente expostos aos persistentes inseticidas organoclorados pode resultar na ocorrência de sinais de intoxicação nesses animais. Tecido ósseo O tecido ósseo pode servir como um reservatório para compostos, como o fluoreto, chumbo e estrôncio. O tecido ósseo é o principal sítio de armazenamento para alguns toxicantes. Assim, por exemplo, aproximadamente 90% do chumbo presente no organismo está no esqueleto. O acúmulo e armazenamento de toxicantes no tecido ósseo pode ou não ser nocivo. O chumbo não é tóxico para os ossos, mas os efeitos crônicos que resultam do acúmulo de fluoreto nos ossos (fluorose óssea) são bem conhecidos. Os toxicantes que se depositam no tecido ósseo não são irreversivelmente seqüestrados por esse tecido, podendo ser liberados, alcançando a circulação sistêmica. Dessa forma, um aumento da atividade osteolítica, tal como aquele visto após a 16 administração de paratormônio, determina um aumento da concentração dos toxicantes no plasma. Barreira hematoencefálica A barreira hematoencefálica não é uma barreira absoluta para a entrada de toxicantes no cérebro. Na verdade, ela é menos permeável do que outras áreas do organismo e, por isso, muitos toxicantes não entram no cérebro, em quantidades apreciáveis. Existem pelo menos quatro razões anatômicas e funcionais que explicam a reduzida capacidade de penetração dos toxicantes, no sistema nervoso central. São elas: � as células do endotélio capilar do SNC são firmemente compactadas, o que determina a ocorrência de poucos poros entre as células, se é que eles existem. � os capilares do SNC são, em alto grau, circundados por células da glia, os astrócitos. � no cérebro, as células do endotélio capilar contém um carreador dependente de ATP, a proteína resistente a multidrogas (mdr), que transporta alguns agentes químicos de volta para o sangue. � a concentração de proteínas no fluido intersticial do SNC é muito mais baixa do que em qualquer outra parte do organismo. Esses fatores oferecem alguma proteção, reduzindo a distribuição de toxicantes e conseqüentemente a toxicidade exercida por eles ao nível do SNC. A eficiência da barreira hematoencefálica varia de uma área para outra, no cérebro. Não foi esclarecido se isso ocorre devido a variação no suprimento sangüíneo ou diferenças de permeabilidade da barreira nas várias áreas ou a ambos os fatores. Em geral, a penetração de toxicantes no cérebro segue os mesmos princípios que regem a passagem destes através de outras células, no organismo. Dessa forma, apenas toxicantes na forma livre entram no cérebro. A lipossolubilidade e o grau de ionização determinam a velocidade de entrada do toxicante no cérebro. Em geral, quanto maior a lipossolubilidade, maior é a velocidade de penetração e esta diminui de forma acentuada com a ionização. A barreira hematoecefálica não está completamente desenvolvida logo após o nascimento. Por isso, alguns agentes químicos são mais tóxicos para os recém-nascidos do que para os adultos. A morfina, por exemplo, é mais tóxica (de 3 a 10 vezes) para ratos recém-nascidos do que para adultos. Isto ocorre devido a maior permeabilidade do cérebro de recém-nascidos para a morfina. O chumbo produz encefalopatia em ratos recém-nascidos, mas não a produz em adultos. Passagem através da placenta A expressão barreira placentária esteve durante muitos anos associada com a idéia de que a placenta tinha como principal função a proteção do feto contra a passagem de substâncias nocivas da mãe para o feto. Hoje, sabe-se que a placenta tem outras funções, como: � nutrir o feto, � promover a troca de gases (oxigênio e gás carbônico) entre o sangue materno e fetal, 17 � dispor do material de excreção do feto e � manter a gravidez através de complexa regulação hormonal. A maioria dos nutrientes necessários para o desenvolvimento do feto são carreados por sistemas de transporte ativo, acoplados a energia. Por exemplo: vitaminas, aminoácidos, açúcares essenciais e íons (cálcio e ferro) são transportados da mãe para o feto contra um gradiente de concentração. Ao contrário, a maioria dos toxicantes atravessa a placenta por simples difusão. Anatomicamente, a barreira placentária consiste em várias camadas de células situadas entre as circulações materna e fetal. O número de camadas varia entre as diferentes espécies de animais e considerando a mesma espécie, a placenta se altera dependendo do tempo de gestação. Como a simples difusão parece ser o mecanismo pelo qual a maioria dos agentes tóxicos atravessa a placenta, os fatores já mencionados, especialmente a lipossolubilidade, determinam a transferência desses compotos através da placenta. Quanto ao fato de a placenta ter um papel ativo na prevenção da passagem de substâncias nocivas da mãe para o feto, foi demonstrado, recentemente, que a placenta contém sistemas de transporte ativo que protegem o feto de alguns xenobióticos. Além disso, ela promove a biotransformação de alguns toxicantes, evitando que atinjam o feto.
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