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ZOOLOGIA DE INVERTEBRADOS I Frederico de Siqueira Neves Magno Augusto Zazá Borges Paulo Henrique Costa Corgosinho Montes Claros - MG, 2010 2010 Proibida a reprodução total ou parcial. Os infratores serão processados na forma da lei. EDITORA UNIMONTES Campus Universitário Professor Darcy Ribeiro s/n - Vila Mauricéia - Montes Claros (MG) Caixa Postal: 126 - CEP: 39041-089 Correio eletrônico: editora@unimontes.br - Telefone: (38) 3229-8214 REITOR Paulo César Gonçalves de Almeida VICE-REITOR João dos Reis Canela DIRETOR DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÕES Giulliano Vieira Mota Andréia Santos Dias Bárbara Cardoso Albuquerque Clésio Robert Almeida Caldeira Débora Tôrres Corrêa Lafetá de Almeida Diego Wander Pereira Nobre Gisele Lopes Soares REVISÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA Jéssica Luiza de Albuquerque Arlete Ribeiro Neponuceno Karina Carvalho de Almeida Rogério Santos Brant REVISÃO TÉCNICA Cláudia de Jesus Maia IMPRESSÃO, MONTAGEM E ACABAMENTO Gráfica Yago PROJETO GRÁFICO E CAPA Alcino Franco de Moura Júnior Andréia Santos Dias EDITORAÇÃO E PRODUÇÃO Alcino Franco de Moura Júnior - Coordenação CONSELHO EDITORIAL Maria Cleonice Souto de Freitas Rosivaldo Antônio Gonçalves Sílvio Fernando Guimarães de Carvalho Wanderlino Arruda Copyright ©: Universidade Estadual de Montes Claros Catalogação: Biblioteca Central Professor Antônio Jorge - Unimontes Ficha Catalográfica: UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES Ministro da Educação Fernando Haddad Secretário de Educação a Distância Carlos Eduardo Bielschowsky Coordenador Geral da Universidade Aberta do Brasil Celso José da Costa Governador do Estado de Minas Gerais Antônio Augusto Junho Anastasia Secretário de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior Alberto Duque Portugal Reitor da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes Paulo César Gonçalves de Almeida Vice-Reitor da Unimontes João dos Reis Canela Pró-Reitora de Ensino Maria Ivete Soares de Almeida Coordenadora da UAB/Unimontes Fábia Magali Santos Vieira Coordenadora Adjunta da UAB/Unimontes Betânia Maria Araújo Passos Diretor do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde - CCBS Maria das Mercês Borém Correa Machado Chefe do Departamento de Ciências Biológicas Marcílio Fagundes Coordenador do Curso de Ciências Biológicas a Distância Frederico de Siqueira Neves AUTORES Frederico de Siqueira Neves Biólogo, Bacharel em Ecologia pela UFMG, Mestre em Entomologia pela UFV, Doutor em Conservação e Manejo da Vida Silvestre pelo Instituto de Ciências Biológicas da UFMG. Professor do curso de Ciências Biológicas da Unimontes. Magno Augusto Zazá Borges Biólogo, Bacharel em Parasitologia pela UFMG, Mestre em Parasitologia pelo Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, Doutor em Ciência Animal pela Escola de Veterinária da UFMG. Professor do curso de Ciências Biológicas da Unimontes. Paulo Henrique Costa Corgosinho Biólogo, Bacharel em Ecologia pela UFMG, Mestre em Zoologia pela UFPR, Doutor em Biologia de Água Doce e Pesca Interior pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA/UFAM. Professor do curso de Ciências Biológicas da Unimontes. SUMÁRIO Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 07 Unidade 1: Introdução à Zoologia e Classificação Zoológica. . . . . . . 09 1.1 Classificação zoológica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 09 1.2 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 Unidade 2: Reino Protista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.1 Sistemática . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.2 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 Unidade 3: Filo Porifera . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 3.2 Filo Porifera . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 3.3 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 Unidade 4: Filos Cnidaria e Ctenophora. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 4.1 Introduçãoa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 4.2 Filo Cnidaria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 4.3 Filo Ctenophora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 4.4. Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 Unidade 5: Platyhelminthes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 5.1 Filo Platyhelminthes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 5.2 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 Unidade 6: Filos Blastocelomados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 6.1 Filo Rotifera. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 6.2 Filo Nematoda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70 6.3 Outros filos menos diversos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 6.4. Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75 Unidade 7: Filo Mollusca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76 7.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76 7.2 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92 Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93 Referências básicas e complementares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99 Atividades de aprendizagem - AA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101 APRESENTAÇÃO 07 Olá futuros biólogos! Estamos iniciando agora o estudo da zoologia, uma das disciplinas mais queridas pelos alunos de biologia. A zoologia é o estudo dos animais (metazoários) e dos protistas (também conhecidos como protozoários). Por questões didáticas, o estudo da zoologia é dividido em zoologia de vertebrados e invertebrados. Neste curso estudaremos a primeira parte do estudo dos invertebrados, englobando os protistas e os metazoários mais simples. Mas a simplicidade estrutural destes organismos não diminui a sua importância nos ecossistemas e até mesmo no dia a dia das pessoas. Entre os metazoários estudados nesta disciplina estão organismos marinhos como os corais, que junto com esponjas e anêmonas formam os recifes de corais, um verdadeiro bercarios da vida marinha. Logo depois comecamos a estudar os platelmintos ou vermes chatos, onde encontramos tanto parasitos como o Schistosoma e a Taenia, bem conhecidos de todos por causarem doencas comuns ao seres humanos, como importantes organismos aquáticos de vida livre (não parasitos) como as planárias. Terminando os platelmintos, começaremos o estudo dos organismos antes conhecidos como pseudocelomados (hoje chamados de blastocelomados), que possuem uma outra cavidade corporal além do tubo digestivo, característica inexistente nos platelmintos. Entre os blastocelomados estudaremos os dois filos maiores, Nematoda e Rotifera. O filo Nematoda, dos vermes “cilíndricos”, abriga o verme mais comum em humanos, o Ascaris lumbricoides, além de outros parasitos e milhares de vida livre, presentes em praticamente todos os tipos de habitats terrestres. Os rotíferos são organismos aquáticos comuns em todos os corpos d'água do mundo, principalmente nos de água doce. São importantes na ciclagem de nutrientes no ecossistemae se destacam por seu sistema de propulsão. O curso se encerra com o estudo de um dos filos mais numerosos da natureza, os moluscos. Os moluscos, encontrados facilmente até no jardim de sua casa, são caracterizados por seu corpo mole e viscoso. O grupo é muito diverso, reunindo organismos bem diferentes, como caramujos, mariscos, polvos e lulas. Além destes bem conhecidos de qualquer um que já foi ao litoral, estudaremos outros bem diferentes, como os quítons. Agora é começar a estudar e explorar este maravilhoso e diverso mundo da zoologia. 09 1UNIDADE 1INTRODUÇÃO À ZOOLOGIA E CLASSIFICAÇÃO ZOOLÓGICAOlá futuros biólogos! Agora é hora de começar a aprender sobre os animais e protistas, organismos estudados pela Zoologia. Nesta unidade, você terá as primeiras noções sobre os principais grupos de seres vivos (reinos) e noções básicas sobre sistemática e nomenclatura zoológica. 1.1 CLASSIFICAÇÃO ZOOLÓGICA Inicialmente, vamos discutir um pouco sobre como os seres vivos podem ser classificados. As primeiras tentativas bem documentadas de classificar os seres vivos foram feitas pelo filósofo grego Aristóteles (384-322 ac). No entanto, o sistema de Aristóteles era bastante simples e os animais eram arbitrariamente agrupados de acordo com similaridades superficiais compartilhadas. Por exemplo, inicialmente os animais eram agrupados de acordo com o meio em que viviam (terra, água e ar), ou de acordo com a forma que reproduziam. Com isso, eram criadas classificações, muitas vezes, artificiais, onde organismos não aparentados evolutivamente eram colocados em um mesmo “grupo taxonômico” devido à convergência de caracteres. As ideias de como as diferentes formas se originavam não incorporavam nenhuma ideia de mutabilidade e evolução, já que Aristóteles acreditava em um universo imutável, que sempre existiu em toda sua complexidade. Mas já nessa época, Aristóteles aplicava o princípio de classificação dicotômica desenvolvido anteriormente por Platão (427-347 ac) e utilizado até hoje, nas chaves de identificação. Vários foram os filósofos e naturalistas que se preocuparam com o método biológico após Aristóteles, mas a classificação era regional, os nomes variavam de país para país e entre regiões em um mesmo país. Não existia um sistema central de referência que pudesse ser aplicado em todo o mundo. Foi Carl Linnaeus (1707-1778) que, em 1735, em sua obra Systema Naturae, formalizou o método binomial de classificação de espécies que usamos até hoje. A história da classificação biológica e o papel da evolução na formação das espécies e suas variedades são repletos de simplismos e injustiças. A primeira tentativa de classificação levando em conta uma teoria evolutiva foi Ernst Haeckel (1834-1919) em 1866. Ele divide os seres vivos em três reinos: Plantae, representados pelas plantas (incluindo algas pluricelulares, fungos e briófitas), Protista (microorganismos) e Animalia (animais) (Fig.1). Esse autor baseou grande parte de seu trabalho na revolucionária teoria de Wallace e Darwin, primeiramente divulgada em 1858 com o nome “Sobre a tendência das espécies para formar variedades; e sobre a perpetuação das variedades e espécies por meio de seleção” (On the Tendency of Species to form Varieties; and on the Perpetuation of Varieties 10 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período and Species by Natural Means of Selection). Um ano após, em 1859, Darwin publica seu livro “Sobre a origem das espécies por meio de seleção natural, ou a preservação das raças favorecidas na luta pela vida” (On the Origin of Species by Means of Natural Selection, or the Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life). No entanto, o pensamento evolutivo e a ideia de que os organismos se modificam, adaptando-se ao ambiente em que vivem já tinha aparecido, embora de forma distinta, nos trabalhos e anotações de Erasmus Darwin (1731-1802), Jean-Baptiste Lamarck (1744–1829), Étienne Geoffroy Saint-Hilaire (1772-1844), Robert Knox (1791-1862), Robert Edmond Grant (1793-1874), Robert Jameson (1774-1854), Robert Chambers (1802–1871), dentre outros. 1.1.1 Sistemática e Taxonomia Atualmente, existem cerca de 1.5 milhões de espécies de animais descritas, o que representa apenas cerca de 20% das espécies existentes. Então, como podemos entender toda essa diversidade e como agrupá-la para compreender as relações entre os organismos? Para isso foi criada a Sistemática e um sistema de classificação. A Sistemática é definida como o estudo científico dos organismos em sua diversidade, sua evolução no tempo e no espaço e sua classificação, traduzindo as relações de ancestralidade e parentesco, também é chamada de ciência da Biodiversidade. Figura 1: Árvore da vida de Haeckel. Fonte: domínio público. 11 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes Em 1627 o naturalista John Ray introduziu um sistema de classificação mais abrangente que resultou posteriormente no trabalho do botânico Carolus Linnaeus (Fig. 2) que elaborou o sistema de classificação, o “Systema Naturae”. A ideia de Linnaeus era organizar os organismos e as regras de classificação para padronizar e evitar erros, como dar um mesmo nome para espécies distintas ou nomes diferentes para uma mesma espécie. Para isso, são necessárias regras que são organizadas pela Taxonomia, parte da Sistemática responsável por organizar os princípios a serem usados para comunicar os resultados da análise sistemática. Ou seja, a Taxonomia é responsável pelas regras de nomenclatura, tais como: dar nomes às espécies, gêneros e famílias. Além disso, a Taxonomia é responsável pelas regras para formar coleções taxonômicas, rotulagem e publicações taxonômicas. 1.1.2 Sistema hierárquico de classificação: O sistema de Linnaeus na organização de organismos em séries ascendentes de categorias menores. Ele dividiu o Reino Animal em espécies e deu a cada uma delas um nome particular. Uma espécie era considerada um agrupamento de indivíduos que revelam profundas semelhanças entre si, tanto na estrutura arquitetônica quanto funcional, mostrando grandes similaridades biológicas e capazes de se reproduzirem naturalmente, dando origem a descendentes férteis (Fig. 3). Figura 2: Carl Linnaeus (1707-1778), ou Carolus Linnaeus (forma latinizada por ele próprio), ou ainda Carl Von Linné ou Carl Linné, propositor do sistema taxonômico binomial. Pintura de 1775 feita por Alexander Roslin, atualmente está no Museu Nacional de Estolcomo na Suécia. Fonte: Fig2.jpg 12 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período Entretanto, na Natureza ocorrem espécies que, embora diferentes entre si, guardam grandes aproximações. Assim são reunidas dentro de uma categoria taxonômica comum que é o gênero. Seguindo o mesmo raciocínio, diversos gêneros, muito próximos, são reunidos num grupamento taxonômico comum, conhecido como família. A reunião de famílias semelhantes forma uma ordem. Por sua vez, a reunião de ordens forma uma classe, que reunidas dão origem a um filo. A reunião de todos os filos forma a maior das categorias taxonômicas, o reino. Após a publicação da teoria da evolução, a classificação de Linnaeus foi drasticamente modificada, mas o princípio básico do seu sistema é ainda seguido. A hierarquia das categorias taxonômicas expandiu-se, consideravelmente, desde os dias de Linnaeus (Tab. 1). Ela inclui atualmente sete categorias principais para o reino Metazoa, em ordem decrescente: reino, filo, classe, ordem, família, gênero e espécie. Todos os organismos classificados devem pertencer a pelo menos sete táxons, um para cada categoria principal. Os taxonomistas têm a opção de subdividir ainda mais estas sete categorias e atualmente são conhecidas mais de 30 categorias taxonômicas em grupos mais diversos e complexos como peixes e insetos. , Tabela1: Exemplos de categorias taxonômicas, as quais pertencem alguns representantes dos animais. Categoria Reino Metazoa Metazoa Metazoa Metazoa Filo Arthropoda Chordata Chordata Chordata Classe Insecta Amphibia Mammalia Mammalia Ordem Diptera Anura Primates Primates Família Culicidae Centrolenidae Hominidae Hominidae Gênero Culex Hyalinobatrachium Gorilla Homo Espécie Culex quinquefasciatusHyalinobatrachium eurygnathumGorilla gorilla Homo sapiens Nome popular mosquito perereca-de-vidro gorila homem Taxón Figura 3: Tabela do Reino Animal (Regnum Animale) da primeira edição do Systema Naturae Linnaeus (1735). Fonte: Fig3.jpg 13 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes 1.1.3 Regras de nomenclatura: Considerando-se o imenso número de idiomas e dialetos espalha- dos pelo mundo, torna-se absurdo o número de nomes diferentes pelos quais são chamados os animais e as plantas. Assim, Linnaeus, propôs uma forma de nomenclatura mais simples, em que cada organismo seria conheci- do por dois nomes apenas seguidos e inseparáveis. Assim, surgiu a nomen- clatura binomial que é ainda hoje adotada. Dessa forma, cada espécie animal ou vegetal teria dois nomes: o primeiro, o gênero, deveria refletir as características mais genéricas ou coletivas; o segundo, a espécie, que reflete as características mais específicas, aquelas mais peculiares. A Comissão Internacional de Nomenclatura Zoológica foi criada em 1895 com o intuito de criar um sistema estável, lógico e universal que pudesse ser aplicado à nomenclatura zoológica, além de assegurar que cada nome seja único e distinto. A primeira versão do Código Internacional de Nomenclatura Zoológica foi publicada em 1961, embora algumas tentativas de normatização da taxonomia zoológica datem da metade do século XIX, antes mesmo da fundação da Comissão Internacional de Nomenclatura Zoológica. Atualmente o código está em sua quarta edição, datado em 1999. Exemplos de regras retiradas do Código Internacional de Nomenclatura Zoológica (1999): O nome dos animais deve ser escrito em latim ou idioma latinizado e deve estar em destaque no texto. Exemplo: Canis lupus (lobo); Todo animal deve ter umnome específico binomial composto pelo nome genérico, escrito com primeira letra em maiúscula, seguido pelo epíteto específico todo em minúsculo. Exemplo: Musca domestica (mosca)- Musca (gênero), Musca domestica (espécie); Disponibilidade e Validade- Um nome, para ser disponível deve ser publicado em meios que permitam acesso público e registro permanente e deve ser impresso por meios que garantam reprodução múltipla e fidedig- na. Após 1930, um nome, para ser disponível a um dado táxon, deve satisfazer as provisões citadas acima, além de: Deve ser acompanhado por uma descrição que defina os caráteres diagnósticos para o táxon ao qual é dado o nome, ou ser acompa- nhado de uma referência bibliográfica que contenha os caráteres diagnósti- cos propostos para o novo táxon; Deve ser expressamente designado como um novo táxon (tax nov.; nom. nov; spec. nov, etc); Uma espécie tipo deve ser explicitamente designada. Cada espécie tipo deve ter um fixador do nome específico. Normalmente, esse fixador é um espécime tipo, ou holótipo designado pelo autor, no momento da descrição da espécie e que servirá como padrão para a espécie; ATIVIDADES Classifique cinco animais não citados na figura acima, segundo as sete categorias taxonômicas principais de Linnaeus. Entre no site (http://www.iczn.org/iczn/index .jsp) para encontrar o Código Internacional de Nomenclatura Zoológica. Neste site você poderá entender todos os passos para descrição e nomeação de uma nova espécie (página e código em inglês). Para uma versão menos atualizada, porém didática e em língua portuguesa de algumas normas presentes no ICZN, consultem o livro Fundamentos Práticos de Taxonomia Zoológica, de autoria de Nelson Papavero (2004, Fundação Editora UNESP). DICAS 14 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período Princípio da prioridade - Se vários nomes forem propostos para um mesmo táxon, é o mais antigo que deverá vigorar. Dois ou mais nomes estão em sinonímia se são aplicados em um mesmo nível taxonômico, para o mesmo táxon. Por exemplo, o gênero Paraforficatocaris (Crustacea da órdem Copepoda) foi proposto por Jakobi em 1972 para incluir a espécie Paraforficatocaris paraensis jakobi, 1972. Antes da publicação desse gênero, também em 1972, o mesmo autor, em um trabalho diferente, propôs o gênero Brasilibathynellocaris para incluir 3 outras espécies relacionadas. Es tudos recentes indicaram que Parafor f icatocar i s é um Brasilibathynellocaris. Portanto, apesar de que ambos os nomes sejam válidos, os dois são sinônimos, sendo Paraforficatocaris um sinônimo júnior. Pelo princípio da prioridade, o nome genérico Brasilibathynellocaris, proposto anteriormente, deve ser adotado. Princípio da homonímia- Quando dois táxons totalmente distintos recebem o mesmo nome, o táxon descrito primeiramente deverá permanecer com o seu nome original, enquanto o táxon descrito posterior- mente, com o mesmo nome, deverá receber um nome diferente. Assim temos homônimos (táxons diferentes com o mesmo nome), onde o mais recente é considerado um homônimo júnior, devendo seu uso ser disconti- nuado em função do homônimo mais velho. Exemplo: Selys, em 1817, descreveu o gênero de uma libélula como Podopteryx. Em 1971, Sharov utilizou o mesmo nome (Podopteryx) para um fóssil de pterossauro. Assim, seguindo o código de nomeclatura o nome Podopteryx deve ser aplicado somente para o gênero proposto por Selys. Em 1981, Cowen propôs um novo nome, Sharovipteryx, em substituição ao homônimo Podopteryx dado ao pterossauro (FIG. 4). Figura 4. O pterossauro Sharovipteryx e uma libélula da subfamília Argiolestinae, a mesma da Podopteryx. Desenho do pterossauro: Arthur Weasley. Foto da libélula: R. A. Nonenmacher. Fonte: fig4.jpg 15 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes Em trabalhos científicos, depois do nome da espécie, coloca-se o nome do autor que o descreveu seguido de vírgula e data (ex: nome de uma espécie de besouro rola-bosta muito comum no norte de Minas Gerais: Deltochilum verruciferum Felsche, 1911). Se o nome entra em sinonímia, autor e ano da descrição original aparecem entre parênteses (ex: Paraforficatocaris paraensis Jakobi, 1972 é sinonímia júnior de Brasilibathynellocaris paraensis (Jakobi, 1972). No caso de homonímia, o novo nome recebe o nome do autor que identificou o problema e propôs o novo nome (Podopteryx Sharov, 1971 é sinônimo sênior de Sharovipteryx Cowen, 1981). 1.1.4 Sistemática filogenética O método de sistemática filogenética proposto pelo entomólogo alemão Willy Hennig em 1950 é um marco no desenvolvimento da sistemá- tica biológica, a partir do momento que ofereceu um sistema lógico, embasado em ideias evolucionistas, que permitiu o teste de hipóteses das relações de parentesco entre as espécies de diferentes grupos taxonômicos. Basicamente, o método proposto por Hennig se baseia na ideia de que organismos mais aparentados compartilharão caracteres comuns somente a eles, herdados de seu ancestral comum mais próximo. Esses caráteres são denominados apomorfias (ver também autapomorfias e sinapomorfias), e definem grupos monofiléticos. São monofiléticos os grupos onde estão representados todos os descendentes de um mesmo ancestral comum. Grupos onde um ou mais descendentes de um mesmo ancestral comum não estão representados são denominados parafiléticos. Grupos parafiléticos são caracterizados por plesiomorfias (ver também simplesiomorfias), sendo plesiomorfias aqueles caráteres ancestrais, que surgiram em etapas anterio- res, ao evento de especiação que leva a um novo grupo monofilético.Já os grupos polifiléticos são constituídos por espécies que não compartilham um mesmo ancestral comum mais próximo. Esses grupos são caracterizados por homoplasias (convergências) (FIG. 5). ATIVIDADES Dê um exemplo de uma espécie animal, que você conhece, que possui mais de um nome popular e tente encontrar na internet o nome específico desse organismo, juntamente com o autor e a data de publicação. Figura 5: Hipótese das relações filogenéticas dentro dos vertebrados e delimitação de alguns grupos monofiléticos, parafiléticos e polifiléticos. Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/User:TotoBaggins. 16 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período Um outro ponto chave no método hennigiano é o reconhecimento de que proximidade filogenética não quer dizer, necessariamente, similari- dade morfológica, como defende os taxonomistas tradicionais. Em outras palavras, o método é biológicamente mais realista, levando em conta que estruturas homólogas (aquelas derivadas de um mesmo ancestral comum) podem divergir grandemente em forma e função, em virtude de pressões seletivas diferenciadas. 1.1.5 Os Reinos da Natureza Como tudo em biologia, ainda hoje existe uma grande controvérsia quanto ao número de reinos da natureza, mas a maioria dos autores concorda que existem 5 ou mais reinos: Com o objetivo de simplificar, nosso objetivo não é introduzir desnecessária discussão sistemática nesse momen- to, iremos adotar a divisão da natureza em cinco reinos: Monera, Fungi, Plantae, Protista e Metazoa. Esses cinco reinos permaneceram com a classificação mais aceita, até o desenvolvimento da sistemática molecular, ao final do século XX, quando ficou aparente que nem os Protistas e nem os Moneras são monofiléticos. Atualmente, muitos autores dividem o reino Monera em dois: Eubacteria e Archaea. Os antigos Protistas são divididos em um número ainda maior de grupos monofiléticos mais próximos de fungos, animais, plantas e alguns “Moneras’’. Vírus não são incluídos dentro dos cinco reinos, havendo uma ampla discussão a respeito da condição de seres vivos proposta para esses “organismos’’. O reino Monera (FIG. 6) engloba os organismos procariotos, isto é, organismos que não possuem células com núcleo ou organelas envoltas por membranas. Dentro deste reino estão as bactérias e cianofíceas (algas azuis ou cianobactérias). Todos os outros reinos são de organismos eucariotos, cujas células que possuem membranas circulando o núcleo e as outras organelas. O estudo destes organismos se encontra inserido na microbiolo- gia, mais especificamente na bacteriologia. ATIVIDADES Diferencie a Taxonomia tradicional da Sistemática Filógenética. DICAS Para entender melhor a classificação moderna dos seres vivos, é muito interessante consultar a página da internet do projeto “Tree of Life” http://www.tolweb.org/Life_on_ Earth/1. Você pode ir navegando através dos “galhos” da árvore e explorar a biodiversidade. É bom lembrar que todas as classificações são hipóteses e que não há verdade absoluta em ciência. Figura 6: Exemplo de organismo do Reino Monera - Helicobacter pylori em microscopia eletrônica. Fonte: Foto Yutaka Tsutsumi. 17 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes O reino Fungi é representado por organismos heterotróficos (não produzem seu próprio alimento), saprofágicos (se alimentam de matéria orgânica em decomposição), que possuem parede celular quitinosa. Aqui se encontram os fungos e cogumelos (FIG.7). O estudo dos organismos deste reino é chamado de micologia. As plantas (FIG.8) multicelulares formam o reino Plantae; são organismos autotróficos (produzem seu próprio alimento) e fotossintetizan- tes. Aqui estão as briófitas e as plantas vasculares. São foco de estudo da Botânica. Em zoologia, por questões históricas e didáticas, estudaremos os dois reinos restantes: Protista e Metazoa. Esta divisão é puramente didática, uma vez que são organismos muito diferentes. O reino Protista é formado por organismos unicelulares ou multice- lulares, porém sem apresentar tecidos verdadeiros ou desenvolvimento embrionário. Abrigam os chamados “protozoários” e as algas. O reino Metazoa, também conhecido como Animallia, é formado Figura 7: Exemplo de organismo do Reino Fungi – O cogumelo Amanita muscaria. Fonte: Foto de Afbeelding Onderwijsgek. Figura 8: Exemplo de organismo do Reino Plantae . Fonte: Foto Magno Borges. 18 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período por organismos heterotróficos, multicelulares e que, na sua maioria, apresentam tecidos verdadeiros (exceto Porifera, Rhombozoa e Orthonectida; ver páginas 227 a 230 do livro Princípios Integrados de Zoologia, escrito por Hickman, Roberts & Larson; 11a edição), além de células reprodutivas, reprodução sexual e divisão celular por meiose. Estima- se que estes animais teriam surgido há 600-900 m.a., nos períodos pré- cambrianos, provavelmente nos fundos dos oceanos e mares, são divididos comumente em Protostomia (invertebrados nos quais o blasóporo origina a boca) e Deuterostômia (composto por alguns invertebrados sem notocorda e Chordata, onde o blastóporo origina o ânus). REFERÊNCIAS DARWIN, C. & Wallace, A. R. On the Tendency of Species to form Varieties; and on the Perpetuation of Varieties and Species by Natural Means of Selection, Journal of the Proceedings of the Linnean Society of London. Zoology 3: 46-50. 1858. DARWIN, C. On the Origin of Species by Means of Natural Selection, or the Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life. London, John Murray, 1859 HAECKEL, E. Generelle Morphologie der Organismen. Vol. 1 e 2, Berlin, Verlag von Georg Reimer, 1866. HENNIG, W. Grundzüge einer Theorie der phylogenetischen Systematik. Berlin, Deutscher Zentralverlag, 1950. HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. International Commission on Zoological Nomenclature. International code of zoological nomenclature online. 4. ed. Disponível em http://www.iczn.org/iczn/index.jsp> Acesso em: 18 Nov. 2009. ISBN 0853010064. LINNAEUS, C. Systema naturae per regna tria naturae :secundum classes, ordines, genera, species, cum characteribus, differentiis, synonymis, locis. Holmiae (Laurentii Salvii), 1735. RAY, J. Historia plantarum species, etc. 3 vols. Vol. I. Londini: Clark, 1686. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p. ATIVIDADES Pesquise na internet e descubra quantas espécies de invertebrados e de vertebrados são conhecidas pela ciência. Com base nestes dados, discutir: a divisão em vertebrados ou invertebrados é correta? 19 Os Protistas são um reino grande e diverso, que reúne organismos tão distintos como as amebas intestinais unicelulares e os sargaços, algas marinhas que podem chegar a vários metros. Por essa diversidade de formas, muito além da aparência, os cientistas não conseguem chegar a um consen- so sobre a classificação destes organismos. Vamos aprender sobre eles, para que ao final vocês possam ter sua própria opinião sobre o assunto. Introdução Os protistas são organismos eucariotos unicelulares ou pluricelula- res, mas que não possuem um grau de especialização celular significante, mecanismos de adesão celular ou tecidos verdadeiros. Muitos livros ainda os chamam de “Protozoa” (do grego Proto, “primeiro” e Zoon, “animal”) ou protozoários, mas a maioria dos textos modernos utiliza “Protistas”. Eles realizam todas as suas funções fisiológicas somente com as organelas celulares, variam de 1µm (Micromonas), até uns poucos milímetros (algunsdinoflagelados, amebas e ciliados). Corliss (1999) estima que existam 12.000 a 19.000 protistas conhecidos. 2.1 SISTEMÁTICA A mais tradicional classificação dos Protistas era baseada nas suas organelas de locomoção: Flagelados; se locomovem por flagelos. Sarcodinos; se locomovem por pseudópodos. Ciliados; se locomovem por cílios. Esporozoários; não possuem organelas de locomoção. Essa classificação não mostra a verdadeira diversidade de protistas, nem suas ligações de parentesco, por isso é considerada uma classificação artificial (Fig.9). Isso se deve a ela ser baseada somente em uma característi- ca, as organelas de locomoção. Ela ainda tem a sua utilidade didática, para facilitar o trabalho do professor em sala de aula. Aqui mesmo, usaremos essa classificação algumas vezes. 2UNIDADE 2REINO PROTISTA ATIVIDADES Pesquise a classificação dos Protistas em livros didáticos de biologia. A classificação encontrada corresponde a mais moderna, adotada neste trabalho? São chamados de Protistas ou Protozoários? 20 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período A classificação dos Protistas é muito controversa, não havendo nenhum tipo de consenso até hoje. Em situações como essa a melhor alternativa é escolher uma classificação e segui-la. Para o nosso estudo, utilizaremos a classificação adotada por Brusca & Brusca (2003) e falaremos dos filos mais comuns e representativos de protistas. Filos “Flagelados” Características Gerais Flagelos são estruturas em forma de chicote que algumas células apresentam e têm função de locomoção. Os flagelos das células eucariotas se diferenciam dos presentes nas células procariotas pela sua estrutura peculiar: Nove pares fundidos de microtúbulos envolvendo dois microtúbu- los centrais (Fig. 10 e 11), estes microtúbulos são envolvidos por uma continuação da membrana plasmática e preenchidos pelo citoplasma da célula. Os microtúbulos deslizam entre si e produzem o movimento flagelar, semelhante o produzido por um motor de popa de barco. Figura 9: Diversidade entre os protistas: a – Exemplos de ciliados de vida livre. b – Três flagelados simbióticos não-pigmentados. c – Um euglenóide fotossintetizante. d – dois dinoflagelados de vida livre (a figura acima de água doce, abaixo marinho). e – duas amebas tecadas, com diferentes pseudópodos. f – Um foraminífero. g – Um radiolário, exibindo a complexidade de seu esqueleto. h – Uma gregarina (apicomplexa). i – Dois pseudofungos saprofágicos. j – Duas algas marinhas. k – Um 19TTP191919ia19dio (protista fungal). l – Dois myxosporidios. Fonte: Corliss (2002). 21 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes O que chamamos de “protistas flagelados” aqui é um grupo enorme de organismos de vida livre, comensais ou parasitas. A única característica que vai reuni-los como um todo é possuir flagelo na maior parte de seu ciclo de vida. Eles são frequentemente divididos em fitoflagelados (flagelados fotossintetizantes) e zooflagelados (flagelados heterotróficos). Principais filos: A. “Fitoflagelados” Figura 10: Desenho esquemático do corte de um flagelo eucarioto. Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Eukaryotic_ flagellum.svg. fig10.png DICAS Estudar os protistas é como estudar a própria célula eucariota. É um bom momento para relembrar o que foi aprendido em biologia celular. Use seu material e anotações como auxílio para o estudo dos protistas. Figura 11: Microscopia eletrônica de transmissão do corte longitudinal do flagelo de Chlamydomonas reinhardtii. Fonte: Dartmouth Electron Microscope Facility, Dartmouth College. Autores: Elizabeth Smith, Louisa Howard, Erin Dymek. C F E A B GGLOSSÁRIO Fotossintetizante: Organismos que possuem a capacidade de realizar a fotossíntese, produzindo seu próprio alimento (glicose). São os produtores na cadeia alimentar. Heterotrófico: organismos que não produzem seu próprio alimento e se alimentam de outros organismos. São os consumidores na cadeia alimentar. 22 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período Filo Euglenida Os protistas deste filo são aproximadamente 1.000 espécies, a maioria de água doce e uns poucos marinhos, muito comuns em corpos d’água ricos em matéria orgânica, podendo ser úteis como bioindicadores de qualidade de água. Seu corpo possui um formato relativamente rígido, mantido por uma película formada por fitas de proteínas, abaixo da mem- brana plasmática. Essa película é facilmente visível ao microscópio em algumas espécies (Fig. 12). Eles portam normalmente dois flagelos de tamanho desigual e possuem uma única mitocôndria com cristas discoidais e somente um núcleo. Um terço deles possui cloroplastos e é fotossintetizante, que lhes dá a cor verde. Apresentam clorofila a e b e a sua substância de reserva é o paramilo, diferente das plantas verdes, por exemplo, que estocam amido. Os fotossintetizantes possuem fototropismo positivo (são atraídos por fontes de luz), portanto uma organela fotoreceptora (estigma) pigmentada na base do flagelo (Fig.12). Os outros dois terços não possuem cloroplastos e são heterótrofos, se alimentando basicamente de matéria orgânica dissolvida. Algumas formas fotossintetizantes podem facultativamente se tornarem heterótrofas. Existem algumas formas predadoras (Peranema) e umas poucas parasitas de invertebrados e girinos. Reproduzem-se por divisão binária simples, não havendo fase sexuada. Filo Dinoflagellata São chamados de dinoflagelados (do grego Dinos, girar), por causa de sua maneira peculiar de se movimentar: possuem dois flagelos, um longitudinal e um transversal, que faz com que eles rodem como um pião. Estes flagelos repousam em sulcos próprios: sulco longitudinal e sulco equatorial (Fig.13). Esta é uma característica diagnóstica para este filo. Figura 12 Euglena sp. Fonte: Proyecto Agua. Fonte: www.flickr.com/photos/microagua/ 23 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes Existem aproximadamente 4.000 espécies de dinoflagelados, muitas delas fósseis, uma vez que estes protistas podem portar armaduras de celulose (Fig. 14) que se preser- vam no registro fóssil. São comuns em todos os habitats aquáticos, mas sua maior diversidade é marinha. Pelo menos a metade deles é fotossin- tetizante, possuindo clorofila a e c2, ficobilinas, carotenóides e xantofilas, esta última lhes conferindo a cor dourada ou marrom. As espécies heterotróficas podem ingerir partículas por fagocitose ou são saprofágicas (se alimentam de matéria orgânica em decomposição). Suas substâncias de reserva são gotas lipídicas (óleos) ou amilo. Reproduzem-se por divisão binária oblíqua ou desigual, mas existem espécies que possuem reprodução sexuada. Eles possuem espécies bioluminescen- tes (Fig.15), quando em grande quantidade e à noite, produzindo efeitos luminosos quando a superfície marinha é perturbada. Alguns dinoflagelados, quando em grande quantidade (blooms) podem liberar substâncias tóxicas que podem causar a morte de outros organismos marinhos, como peixes. Este fenômeno é Figura 13: Desenho esquemático de um dinoflagelado, mostrando a localização dos dois flagelos. Fonte: Rebecca Stritch / BIODIDAC. ATIVIDADES Procure imagens de “maré vermelha” no Google imagens (http://images.google.com/). Experimente fazer a busca em inglês (red tide). Figura 14: Ceratium sp., um dinoflagelado planctônico. Fonte: Keisotyo (http://comm ons.wikimedia.org/wiki/User: Keisotyo). Figura 15: Noctiluca scintillans, um dinoflagelado bioluminescente. Fonte: Foto de Maria Antónia Sampayo, Instituto de Oceanografia, Faculdade Ciências da Universidade de Lisboa. 24 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período chamado de “maré vermelha”, porque o trechode mar atingindo costuma apresentar uma cor avermelhada. Pode ser causado por espécies como Alexandrium spp. e Gymnodinium catenatum. Uma espécie, a Pfiesteria piscicida, possui uma toxina mil vezes mais poderosa que o cianeto. Filo Chlorophyta São a chamadas “algas verdes”, motivo de disputas entre botânicos e zoólogos por anos! Isso porque, algumas são unicelulares e possuem todas as características que se espera de um protista (Chlamydomonas) e outras já possuem um nível de diferenciação próximo das plantas (Ulva) (Fig. 16). Seus cloroplastos são muito semelhantes aos das plantas, possuindo clorofila a e b, e estocam nutrientes na forma de amido. Algumas formam colônias, como a Volvox. Filo Stramenopila Formado por um grupo heterogêneo de organismos: Diatomáceas, Crisófitas (algas douradas) e “fungos flagelados” (Oomycota). Caracterizam- se por possuir dois flagelos desiguais que portam pelos tripartidos. Figura 16: As clorófitas Ulva lactuca e Chlamydomonas sp. Fontes: Kristian Peters e Dartmouth Electron Microscope Facility, Dartmouth College. Figura 17: Paraphysomonas butcheri exibindo o flagelo com pelos tripartidos. Fonte: http://starcentral.mbl.edu/microscope/ 25 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes São encontrados em todos os habitats aquáticos, inclusive os glaciais. As mais conhecidas são as diatomáceas, por serem extremamente comuns e numerosas e possuírem belos esqueletos silicosos ou calcários (Fig.17). Em algumas praias, as diatomáceas são tão abundantes que grande parte da areia é composta por elas, formando a chamada “areia de diatomá- ceas”, que é usada na cosmética como esfoliante. Suas características celulares são: mitocôndrias com cristas curtas tubulares, núcleo único, as formas fotossintéticas possuem clorofila a, c1 e c2, xantofilas amarelas e marrons, que lhe dão uma cor marrom-esverdeada, por isso são chamadas por alguns de “algas douradas”. B.“Zooflagelados” Filo Kinetoplastida Os membros deste filo se caracterizam por possuir uma única mitocôndria modificada e alongada chamada cinetoplasto. O cinetoplasto possui um tipo de DNA próprio, chamado kDNA. Esta organela se mostra bem evidente em preparações microscópicas, estando sempre associada ao flagelo (Fig.19). Possuem 1 ou 2 flagelos inseridos numa depressão na região anterior do organismo. Em Leishmania e Trypanosoma da família Trypanosomatidae, o flagelo arrasta-se e conecta-se ao longo dos lados do corpo por meio de uma membrana ondulante. Figura 18: Alguns exemplos de Diatomáceas. Fonte: Fotos: Damián H. Zanette. ATIVIDADES Observação a fresco de protistas. Tragam amostras de água de riachos e lagoas, de preferência coletem de locais ricos em plantas aquáticas. Levem para o laboratório e observem no microscópio os organismos presentes. Vocês conseguem reconhecer alguns dos protistas estudados? 26 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período Existem cerca de 600 espécies descritas de Kinetoplastida, que podem ser divididas em dois grupos: os bodonídeos e os tripanossomatíde- os. Os bodonídeos são de vida livre e vivem em ambientes aquáticos marinhos e de água doce, ricos em matéria orgânica. Os tripanossomatídeos são exclusivamente parasitos, infectando invertebrados, vertebrados e até plantas. Dentro deste grupo temos importantes parasitos humanos, como o Trypanosoma cruzi, causador da doença de Chagas (Fig.20), e as Leishmania spp. causadoras das Leishmanioses. Estas parasitoses serão estudadas a fundo na disciplina Parasitologia. Filo Choanoflagellata Figura 19: Trypanosoma sp., em lâmina de esfregaço sanguíneo. Fonte: Autor: Dr Myron G. Schultz – CDC. Fig19.png Figura 20: Ciclo da Doença de Chagas. Fonte: CDC (www.cdc.gov). 27 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes Conhecidos como coanoflagleados são um pequeno grupo de protistas marinhos e dulcícolas de vida livre, com pouco mais de 125 espécies conhecidas. Podem ser solitários ou coloniais, sésseis ou livre- natantes. As espécies sésseis prendem-se por meio de uma haste, parte de uma teca. Os indivíduos coloniais são unidos por uma matriz gelatinosa ou por seus colares, têm como característica distintiva possuir um colar cilíndri- co de microvilos ao redor da base do flagelo único, formando um sistema filtrador para a captura de bactérias para alimentação (Fig. 21). Para ver uma animação sobre este sistema acesse o site: www.biology.ualberta.- ca/facilities/multimedia/uploads/zoology/choanoflagellate.html. Os coanoflagelados sempre chamaram a atenção dos zoólogos por sua semelhança com células típicas dos poríferos (esponjas), os coanócitos. Estudos de filogenia demonstraram que os coanoflagelados são um grupo irmão dos metazoários, isto é, são os protistas filogeneticamente mais próximos dos metazoários. Filo Parabasilida Formado por protistas anaeróbios endosimbiontes de animais, sendo conhecidas somente 4 espécies de vida livre, todas de ambientes anóxicos (sem oxigênio). Poucos são parasitos, mas o filo engloba parasitos de importância médico-veterinária, como o Trichomonas vaginalis, humano e o Tritrichomonas foetus, bovino. Suas características distintivas são a presença do aparato parabasal (Complexo de Golgi associado com fibras parabasais), ausência de mitocôndrias, substituídas por uma organela Figura 21: Microfotografia do coanoflagelado Desmarella moniliformis Fonte: Foto de Sergey Karpov. 28 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período chamada hidrogenossoma. Uma outra estrutura que facilita o reconheci- mento deste filo é o axóstilo, uma estrutura rígida em forma de agulha que atravessa o citoplasma (Fig. 22). Existem aproximadamente 300 espécies conhecidas de Parabasilida, normalmente divididas em dois grupos os tricomonadidas e os hipermastigotos. Os tricomonadidas são simbiontes ou parasitos no trato digestivo, respiratório e reprodutor de vertebrados. Os hipermastigotos possuem centenas de flagelos e vivem como mutualistas obrigatórios no trato digestivo de insetos, como cupins e baratas. Nestes insetos eles atuam produzindo enzimas que digerem a celulose. Filo Diplomonadida São protistas comensais no trato digestivo de animais, as poucas espécies de vida livre são achadas em águas poluídas. Seu nome vem da organização bilateral de sua célula (Fig.26). Caracteristicamente possuem dois núcleos, um número variável de flagelos, mas o mais comum são oito. Não possuem mitocôndrias. São heterotróficos, se alimentando de substân- cias orgânicas através da fagocitose e da pinocitose. Reproduzem-se por divisão binária longitudinal e podem formar cistos (formas de resistência) durante o seu ciclo de vida. C. Protistas “Sarcodinos” Figura 22: Trichomonas vaginalis. Fonte: Foto: CDC (www.cdc.gov). 29 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes Os protistas conhecidos como “Sarcodinos” (denominação sem valor taxonômico) são por definição aqueles que se locomovem por pseudópodos (Fig.24). Esta definição é falha, uma vez que muitos “sarcodi- nos” podem exibir flagelos temporariamente e alguns “flagelados” podem emitir pseudópodos. Por isso, em alguns livros vocês podem encontrar a denominação “Sarcomastigophora” se referindo a um filo que englobaria os Sarcodinos e os Flagelados. Pseudópodos são extensões citoplasmáticas temporárias, que servem tanto para o movimento do protista como para englobar partículas para sua alimentação. Existem tipos diferentes de pseudópodos: Lobópodos: típicos da maioria das amebas, sendo largos com extremidade arredondada (Fig. 24); Filópodos: Possuem a extremidade afilada, sendo às vezes, ramificado; Reticulópodos: típicos de foraminíferos são filiformes, ramifica- dos e anastomosados, formando uma pequena rede (retículo); Axópodos: típicos de heliozoáriossão pseudópodos finos, em forma de agulha, irradiando da superfície, com um bastonete central axial constituído de feixe de microtúbulos, o que o torna um filamento rígido. Filo Rhizopoda Figura 23: Desenho esquemático de Giardia. Fonte: Modificado de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Franciscosp2 e Giardia intestinalis em montagem corada com tricrômico. 30 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período Conhecidos popularmente por “Amebas”, os membros deste filo possuem corpo de formato irregular e emitem pseudópodos, que podem ser lobópodos ou filópodos. Alguns Rhizopoda têm sua membrana plasmática coberta por uma teca (“concha”), secretada pelo próprio protista (Arcella) ou feita de material coletado no ambiente (Difflugia). Essas amebas são conheci- das como “amebas tecadas” (Fig.25) enquanto as que não possuem tecas são chamadas de “amebas nuas” (Fig. 26). As amebas estão presentes em todos ambientes aquáticos, inclusive no solo úmido. Existem também as amebas comensais e parasitas, algumas Figura 24: Desenho esquemático de um membro do filo Rhizopoda. Fonte: Modificado do original de Pearson Scott Foresman. Figura 25: Nebela tubulosa, uma ameba tecada. Fonte: Foto: de Proyecto Agua (www.flickr.com/photos/microagua/). 31 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes de importância médica como a Entamoeba hystolitica. A maioria delas apresenta duas formas: a forma trofozoítica (ou trofozoíto), que é a forma metabolicamente ativa, isto é, a que alimenta e se reproduz; e a forma cística (cisto), que é a forma de resistência. Filo Actinopoda São protistas de simetria esférica ou ovóide que se destacam por possuírem estruturas esqueléticas, que podem ser orgânicas ou inorgânicas. Estes esqueletos podem ser esteticamente muito bonitos, chamando a atenção para os membros deste grupo sempre que são observados em microscópio. Eles emitem pseudópodos finos e em forma de agulha (Axópo- dos). Cada axópodo contém um bastão axial central, que é recoberto com um citoplasma adesivo e móvel. Algumas espécies podem apresentar filópodos delicados e longos. Seu citoplasma é dividido em duas regiões, o endoplasma e o ectoplasma, que são separados por uma parede composta normalmente de mucoproteínas (Fig. 27). Podem ser divididos em três grupos principais: Os radiolários, os acantários e os heliozoários. Os dois primeiros são exclusivamente mari- Figura 26: Amoeba proteus, uma ameba nua. Fonte: Foto de Proyecto Agua (http://www.flickr.com/photos/microagua/). 32 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período nhos, enquanto os heliozoários são mais comuns em água doce. Os radiolá- rios possuem esqueletos silicosos, enquanto os acantários possuem esquele- tos de sulfato de estrôncio (Fig. 28). Os heliozoários podem ser nus ou possuírem esqueletos silicosos ou orgânicos (Fig. 29). Filo Granuloreticulosa Mais conhecidos como foraminíferos. Esses protistas possuem uma concha de material orgânico, aglutinado ou calcário, que podem ser de câmara única ou com vários compartimentos (Fig. 23). Estas conchas se preservam bem no registro fóssil, por isso são conhecidas 40.000 espécies de foraminíferos, entre atuais e extintas. São bons indicadores paleoecológicos e bioestratigráficos (ver glossário), sendo usados inclusive por geólogos na prospecção de petróleo. A concha inteira é preenchida com citoplasma contínuo de uma Figura 27: Actinosphaerium, um heliozoário. Foto: Proyecto Agua (www.flickr.com/photos/microagua/). Figura 28: Um acantário à esquerda. Fonte: Micro*scope (http://starcentral.mbl.edu/microscope/) Autor: Dave Caron (University of Southern California, Los Angeles). Dois esqueletos de radiolários coloridos por computador à direita. Autor: Mateus Zica. Fig28.jpg 33 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes câmara para outra. Os pseudópodos (reticulópodos) saem de uma abertura ou de perfurações na parede da concha (Fig. 29). Existem foraminíferos com multicâmaras que se parecem com colônias. No entanto, eles são uma única célula. Muitos são grandes o suficiente para serem visíveis a olho nu e podem ser vistos facilmente entre os grãos de areia marinha com uma lupa (Fig. 29). A maioria é bentônica e marinha, existindo também formas planctônicas e sésseis. D.Filo Ciliophora – “Ciliados” O filo Ciliophora é um dos poucos filos de protistas que pode ser considerado monofilético. Sua característica mais marcante é a presença de cílios pela membrana plasmática, que podem ser usados na locomoção e na captura de alimento. São cerca de 12.000 espécies conhecidas, entre espécies aquáticas de vida livre, comensais e parasitas. Podem ser móveis ou sésseis (Fig. 30), e habitam tanto habitats de água doce, quanto marinhos. C F E A B GGLOSSÁRIO Paleoecologia: Estudo dos ecossistemas de eras geológicas passadas, feitos através de fósseis. Bioestratigrafia: é uma subárea da geologia sedimentar que trata do mapeamento da biota fóssil no tempo e no espaço, para estabelecer a idade de rochas sedimentares entre diferentes localidades. Figura 29: O foraminífero Ammonia tépida, emitindo reticulópodos. Fonte: Foto de Scott Fay. Conchas de foraminíferos e outros invertebrados bentônicos. Fonte: National Oceanic and Atmospheric Administration / USA. Figura 30: Um ciliado séssil, Stentor sp. Notar que os cílios se concentram na parte apical da célula. Fonte: Protist Image Database. 34 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período Eles possuem como os Apicomplexa e Dinoflagellata, um sistema de vesículas logo abaixo da membrana plasmática, chamado sistema alveolar, que contribui para manutenção do formato da célula. Estes filos são conheci- dos como “Alveolados” e provavelmente guardam uma relação filogenética próxima. Além deste sistema, possuem um sistema infraciliar, composto de corpos basais ciliares ou cinetossomos, localizado abaixo da superfície ciliar. Apresentam 2 tipos de núcleos: Macronúcleo (vegetativo) – relacionado com a síntese de RNA e DNA; Micronúcleo (reprodutivo); relacionado primariamente com a síntese de DNA. Os ciliados são os melhores nadadores entre os protistas, se locomovendo com maior rapidez e agilidade e com grande capacidade de manobra. O batimento dos cílios não é aleatório, mas ocorre em ondas por toda a célula do protista, com cada cílio realizando um movimento de força e recuperação semelhante ao que ocorre no remo esportivo (Fig. 32). Figura 31: Um ciliado livrenatante, Paramecium sp. Fonte: Foto de Luis Fernández García. Figura 32: Desenho esquemático do movimento ciliar. Fonte: Modificado de Nonaka et al. (PloS Biol. 2005 August; 3(8): e268. 35 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes O movimento ciliar pode ser invertido, com o indivíduo se moven- do para trás. Em alguns ciliados os cílios podem se juntar formando cirros, que podem funcionar como pequenas “pernas” como em Stylonychia (Fig. 33). Os Ciliados são heterótrofos, podendo ser filtradores, predadores, se alimentam de algas filamentosas e diatomáceas. Independente do tipo de alimentação, ela ocorre em uma estrutura complexa chamada citótosma (boca celular) e a citofaringe (fig.34). Alguns poucos ciliados são parasitos, como o Balantidium coli humano. Outros podem ser simbiontes no intestino de vertebrados como os ungulados. Como a maioria dos ciliados é de vida livre, possuem vacúolos Figura 33: Stylonychia sp., “andando” em uma alga. Fonte: Foto de Keisotyo (http://commons.wikimedia.org /wiki/User:Keisotyo). Figura 34: Desenho esquemático de um ciliado generalizado. Fonte: Modificado de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Franciscosp2. 36 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período contráteis bem desenvolvidos, principalmente nas formas de água doce.Os canais radiais esvaziam seu conteúdo no vacúolo, que contrai e elimina o excesso de água. Possuem dois tipos diferentes de núcleos, com função distinta: um macronúcleo, que controla o funcionamento geral da célula, geralmente poliplóide (com vários grupos de cromossomos) e normalmente grande; um ou mais micronúcleos diplóides, responsáveis pela troca de material genético em um processo conhecido como conjugação. Filo Apicomplexa – “Esporozoários” São um grupo de cerca de 5.000 espécies de protistas, exclusiva- mente parasitas, caracterizados pela presença de uma combinação de organelas exclusiva chamada de complexo apical (Fig. 35). O complexo apical está envolvido no processo de penetração na célula hospedeira; estruturas como o anel polar e o conóide atuam mecanicamente, enquanto as róptrias e micronemas liberam substâncias químicas. Os apicomplexa abrigam importantes parasitos para as medicinas humana e veterinária, como os Plasmodium spp., causadores da malária e o Toxoplasma gondii, causador da toxoplasmose. Entre os parasitos de invertebrados, um gênero muito comum é Gregarina, facilmente encontra- do no intestino de insetos domésticos como, baratas e tenébrios (Fig.36). Os apicomplexas possuem em seu ciclo reprodução sexuada e ATIVIDADES Pesquise o processo de conjugação em Paramecium. Compare o processo descrito em livros didáticos de ensino médio com o descrito nos livros textos desta disciplina. Figura 35: Desenho esquemático de um Apicomplexa generalizado. Fonte: Modificado de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Franciscosp2. 37 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes assexuada. O ciclo geral de um apicomplexa tem três estágios básicos: Gametogonia: A fase sexuada, com formação de macrogametas e microgametas, fecundação e formação do oocisto (fig.37); Esporogonia: Fase de desenvolvimento do oocisto, a forma de resistência do parasito, ocorre à formação de esporozoítos (formas infectan- tes) por fissão múltipla; Fase proliferativa: Corresponde à fase aguda da doença no hospedeiro, caracteriza-se pela intensa reprodução assexuada dos parasitos, podendo ser por divisão binária e/ou múltipla. Figura 36: Esquizonte de Plasmodium falciparum dentro de uma hemácia humana. Fonte: Foto de Ernst Hempelmann.O parasito de invertebrados Gregarina sp. Figura 37: Oocisto de Toxoplasma gondii. Fonte: CDC. 38 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período BRUSCA, R. C.; BRUSCA, G. J. Invertebrados. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. 1098p. CORLISS, J.O. Biodiversity and Biocomplexity of the Protists and an Overview of Their Significant Roles in Maintenance of Our Biosphere. Acta Protozool., v.41, p.199-219, 2002. HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p. REFERÊNCIAS 39 3UNIDADE 3FILO PORIFERA Os Porifera ou como são mais conhecidas, as esponjas, são animais tão peculiares que os primeiros naturalistas nem consideravam como “animais” e sim como plantas. Só depois que descobriram que estes organismos assimétricos e cheios de poros podiam criar correntes de água entre o seu corpo e o meio ambiente, foram por eles considerados animais. Será que vocês poderiam ser enganados como os antigos naturalistas? Vamos conhecer mais sobre estes organismos. 3.1 INTRODUÇÃO As esponjas (Fig.37), são representantes do filo Porífera, são os animais multicelulares mais simples dentre todos os metazoários. O filo possui cerca de 5.500 espécies descritas, destas somente 150 são encontradas em água doce, as demais são todas encontradas em ambientes marinhos. Nesta unidade, conheceremos melhor estes animais, que, apesar de simples, possuem uma estrutura corporal bastante diferente de outros metazoários. Mas, antes de entrar nos detalhes do filo Porífera, vamos discutir um pouco sobre o surgimento dos metazoários. Figura 37: Esponjas de diferentes formatos, representantes do filo Porífera. Fonte: Nick Hobgood. 40 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período Desvendar a origem dos animais é uma das maiores questões na Zoologia. Devido à inexistência de um registro fóssil do provável ancestral metazoário foram formuladas várias hipóteses a partir do final do século XIX, com os trabalhos do zoólogo Ernst Haeckel. As diversas hipóteses sobre a origem dos metazoários se diferenciam pelos “atores” envolvidos e pela definição das estruturas para o estabelecimento de homologia, isto é, quais estruturas dos possíveis ancestrais protistas (unicelulares) seriam homólogas a quais estruturas dos metazoários (multicelulares). Vamos discutir três das principais hipóteses: 1. Os metazoários surgiram de um organismo protista ancestral dos ciliados atuais, que apresentava uma forma celular sincicial. Assim, através do surgimento de novas membranas internamente, essa célula protista se dividiu, originando uma massa multicelular única. Segundo essa hipótese, os primeiros metazoários seriam semelhantes aos platelmintes atuais (veja unidade 5), com hábito de vida bentônico, e habitando os fundos marinhos primitivos. O principal problema dessa hipótese é que se o primeiro animal fosse realmente um organismo com características semelhantes as dos platelmintes, como teriam surgido organismos mais simples como os poríferos e cnidários? (veja unidade 4). Além disso, essa hipótese não explica a presença de espermatozóides flagelados em metazoários e a simetria radial nos cnidários. 2. Os metazoários surgiram de uma forma flagelada colonial na qual as células se tornaram gradualmente mais especializadas e independentes. De acordo com essa hipótese, os animais descenderam de ancestrais caracterizados por uma colônia esférica de células flageladas ocas. As células individuais d e n t r o d a c o l ô n i a t o r n a m - s e diferenciadas para papéis funcionais específicos. O ancestral seria um organ i smo f lage lado co lon ia l e semelhante às larvas plânulas de cnidários. Atualmente essa é a hipótese mais aceita devido a várias evidências que a corroboram, como a existência de organismos que seriam bem semelhantes a o s p o s s í v e i s a n c e s t r a i s , a o s Coanoflagelados e às larvas plânulas, à existência de espermatozóides flagelados nos metazoários, os coanócitos (Fig. 38) Figura 38: Célula típica de um Porífero, um Coanócito. Fonte: Desenho de Ivy Livingstone / BIODIDAC. 41 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes em poríferos e mais recentemente evidencias filogenéticas moleculares baseadas no RNA ribossômico e em similaridades de vias bioquímicas complexas. 3. Alguns zoólogos preferem a ideia de que os metazoários tiveram uma origem polifilética, assim os poríferos, os cnidários e os outros animais evoluíram independentemente. Os poríferos teriam surgido a partir de uma colônia de zooflagelados (ver unidade 2). Os cnidários teriam surgido a partir de uma colônia de protistas amebóides, e os demais animais a partir de um protista ciliado mulinucleado. 3.2 CARACTERÍSTICAS GERAIS O nome Porifera significa portador de poros (Fig.39), realmente seus representantes, as esponjas, possuem um grande número de poros e canais que formam um sistema de filtragem/alimentação adequado para seu hábito de vida séssil. São animais que dependem de correntes de água que entram para o interior dos canais e trazem alimento e oxigênio, e levam para fora do corpo os restos metabólicos a as excretas. As esponjas não possuem nenhum órgão ou tecido verdadeiro, eaté mesmo suas células mostram um certo grau de independência, não possuem um sistema nervoso ou órgãos dos sentidos. Por todas essas características, são denominadas como Parazoários, ou seja, um grupo paralelo ao metazoa. As esponjas variam em tamanho desde alguns milímetros até 2 m de diâmetro, podem apresentar formas, cores e diversas (Fig.40). Muitos animais (caranguejos, moluscos, ácaros e peixes) vivem como comensais ou parasitas dentro ou sobre as esponjas, principalmente nas esponjas maiores. C F E A B GGLOSSÁRIO Um organismo sincicial apresenta vários núcleos que não estão separados por uma membrana plasmática. Figura 39: Grupo de esponjas mostrando vários poros de saída (Ósculo) de água e outras partículas. Fonte: Foto de Albert Kok. 42 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período 3.2.1. Estrutura corporal e função O corpo de um porífero é pouco mais que uma massa de células embebidas em uma matriz gelatinosa, enrijecido por um esqueleto de espículas de carbonato de cálcio, sílica ou colágeno. Essa estrutura circunda um sistema peculiar de canais hídricos, no qual as únicas aberturas corpóreas são seus minúsculos poros de entrada conhecidos como óstios, e os poros de saída, chamados de ósculos (Fig. 41). Essas aberturas são conectadas por um sistema de canais que podem apresentar células flageladas com colarinho, denominadas coanócitos (Fig.38). Essas células formam uma corrente de água que entra pelos óstios e saí pelo ósculo. Os coanócitos além de manter a corrente de água, capturam e fagocitam as partículas alimentares que são trazidas pela água. Figura 40: Exemplos de esponjas com diferentes formas e cores. Fonte: Denis Barthel. Figura 41: Estrutura da parede de uma esponja asconóide. As setas indicam a direção da corrente de água. Fonte: Modificado de Xvazquez and Lilyu. 43 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes Dentro do corpo das esponjas, as células são organizadas de uma maneira frouxa em uma matriz gelatinosa denominada mesohilo (Fig.5). Nele são encontradas várias células amebóides, fibrinas e espículas esquelé- ticas. Tipos celulares encontrados no mesohilo (ver Fig.41): Pinacócitos: são células achatadas que cobrem a superfície externa e parte das superfícies inferiores, formando a pinacoderme. As células secretam um material de fixação da esponja no substrato. Alguns pinacócitos são modificados em miócitos contráteis e auxiliam na regulação da entrada de água pelos óstios; Coanócitos: são células ovóides com uma extremidade embebi- da no mesohilo e a outra exposta. A região exposta tem contato com a água e possui um flagelo circundado por um colarinho (Fig. 38). O batimento do flagelo empurra a água através do colarinho em forma de peneira. As partículas que ficam retidas no colarinho são fagocitadas pela célula e posteriormente passadas para células amebócitas vizinhas para que ocorra a digestão intracelular. Os coanócitos revestem os canais e as câmaras flageladas que se ligam com os poros de entrada de água; Arqueócios (amebócitos): células amebóides que se localizam no mesohilo. São responsáveis por uma série de funções como fagocitar partículas na pinacoderme e receber partículas dos coanócitos para diges- tão, substituir e formar outros tipos celulares, como os esclerócitos (que secretam as espículas), os espongiócitos (que secretam as fibras de espongi- na), e os colêncitos (que secretam o colágeno fibrilar). Tipos de estrutura (Fig.42): ASCON — mais simples — forma tubular, espongiocele flagelada; SICON — dobramento da parede do corpo, canais flagelados; LEUCON — alto grau de dobramento da parede do corpo – formas variadas, câmaras flageladas. A superfície da esponja ascon é perfurada por muitas aberturas pequenas, chamadas óstios (ou poros incorrentes), de onde deriva o nome porífera (portador de poros). Esses poros abrem-se dentro da cavidade interior, a espongiocele (Átrio), que por sua vez abre-se para o exterior através do ósculo. Uma grande abertura no topo do tubo. Urna corrente de água constante passa através dos poros para o interior do átrio e sai pelo ósculo. 44 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período FISIOLOGIA Nutrição: filtradores. Os coanócitos estabelecem fluxo de água fagocitando bactérias e outras partículas. As partículas alimentares são transferidas por amebócitos e coanócitos às outras células; Digestão intracelular, os detritos oriundos da digestão e excreção são levados pelo fluxo d’água; Trocas gasosas e excreção: difusão; A osmorregulação é realizada pelos vacúolos contráteis em esponjas de água doce; Não existe sistema nervoso. REPRODUÇÂO Assexuada; Brotamento (externo); Gemulação (brotos internos); Regeneração (fragmentos maiores que 0.4 mm); Sexuada; Formação de gametas através de coanócitos e arqueócitos, organismos normalmente monóicos; Organismos vivíparos ou ovíparos. 3.2.2. Classificação dos Porifera: As esponjas são um grupo antigo, com seu registro fóssil abundante se estendendo desde o Cambriano. Os poríferos atuais são distribuídos em três classes: Calcarea (fig. 43), Hexactinellida (fig. 44) e Demospongiae (fig.45). Para diferenciação entre as classes são utilizadas características esquéticas das espículas, morfologia externa, histologia e dados ecológicos (ver Tab 2). Figura 42: Tipos de estrutura corporal dos Porifera. Fonte: Modificado de Ewan ar Born. 45 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes A classe Demospongiae é a mais comum, representa 95% das esponjas e é a única classe do filo Porífera que conseguiu conquistar o ambiente dulcícola. Na água doce são encontradas fixadas em talos de plantas aquáticas, madeira ou rocha em lagoas e riachos (Fig. 44). As Demospongiae marinhas são bastante variadas possuem cores vivas e formas bem interessantes. Certamente uma razão para o sucesso das esponjas como um Figura 43: Clathrina clathrus, uma esponja da classe Calcarea. Fonte: Foto de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Esculapio. e Figura 44: Esqueleto de uma esponja Hexactinellida não identificada, sobre conchas de cauris. Fonte: Foto de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Malte. Tabela 2: Características distintivas das três classes pertencentes ao filo Porífera; Calcarea, Hexactinellida e Demospongiae. 46 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período grupo se deve ao fato de possuir poucos inimigos naturais. O que se deve à grande quantidade de compostos químicos impalatáveis secretados por esses animais, além da armação esquelética. Figura 45: Uma demospongiae, a esponja de água doce, Spongilla lacustris, do rio Columbia no estado de Washington, USA. Fonte: Foto de Kirt L. Onthank. REFERÊNCIAS HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p. 47 Os Cnidaria e Ctenophora são animais na sua maioria marinhos e que possuem simetria radial, o que os destaca dentro dos metazoários. Entre eles estão animais bem conhecidos dos banhistas das praias brasileiras, as águas-vivas, que eventualmente “queimam” banhistas desavisados. Além disso, alguns são tão abundantes que formam acidentes geográficos, como os recifes de corais. Vamos entrar no mundo destes animais de uma simplici- dade fascinante. 4.1 INTRODUÇÃO Os Cnidaria e Ctenophora são considerados os filos mais basais dentro dos Eumetazoa. Considera-se Eumetazoa todos os Metazoários que apresentem organização corporal ao menos no níveltecidual. Portanto, ao contrário dos Porifera e outros filos menores como Orthonectida e Rombozoa, a partir de Cnidaria todos os animais apresentarão epitélios e outros tipos de tecidos. Um epitélio é um tecido composto por uma ou mais camadas celulares, onde as células estão intimamente conectadas umas as outras por meio de zonas de aderência, assentando-se e fixando-se sobre uma camada de substância extracelular amorfa denominada lâmina basal. Os epitélios apresentam pouca substância intercelular e revestem as cavidades do corpo e a superfície exterior do animal. Portanto, dois tipos de folhetos embrionários evoluem na base dos Eumetazoa, sendo conservados como tecido único dos Cnidaria e Ctenophora (ambos diblásticos). O ectoderma, que reveste a superfície externa do animal e o endoderma, que reveste a cavidade interna (gastro- derme). Aqui, pela primeira vez, aparece uma cavidade gástrica onde ocorre, primeiramente, digestão extracelular (autapomorfia dos eumeta- zoa). Evolutivamente, o aparecimento dos epitélios permitiu um maior controle e independência do meio interno com relação ao meio externo. Com isso, o aparecimento dos tecidos promoveu um aumento da homeosta- se interna, possibilitando a evolução de outros sistemas teciduais com funções cada vez mais específicas. Uma outra característica marcante dos Eumetazoa é o aparecimen- to de simetria que, na base dos Eumetazoa (Ctenophora e Cnidaria) e em alguns organismos primariamente sésseis, como os Echinoderma (fig.46), é radial. Com as devidas excessões (ver exemplo na fig.46), todos os metazoá- rios mais derivados que os Cnidaria e Ctenophora (que na evolução aparece- ram posteriormente a esses grupos) são triblásticos e apresentam simetria bilateral. 4UNIDADE 4FILOS CNIDARIA E CTENOPHORA 48 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período Alguma discussão existe a respeito da condição presente nos Porifera. Dado que as larvas de Porifera possuem simetria, alguns pesquisa- dores hipotetizaram que eles pudessem ser organismos simétricos degenera- dos (organismos que perderam, secundariamente, a simetria). No entanto, simetria parece estar relacionada intimamente com o aparecimento dos tecidos. Considerar que os Poríferos, além da simetria, perderam a condição tecidual exige muitas explicações (especulações) adicionais (ad hoc). Além do mais, dados morfológicos e moleculares não têm dado suporte a essa hipótese. Em livros nem tão antigos sobre zoologia, não era incomum vermos os filos Cnidaria e Ctenophora agrupados em um superfilum denominado Radiata. Isso devido ao fato de que ambos os filos possuem simetria radial no seu plano basal. No entanto, um grande volume de dados tem questionado a monofilia dos Radiata e suportado hipóteses distintas dessa. Com isso, o nome Radiata vem sendo abandonado pela maioria dos livros texto de zoologia. 4.2 FILO CNIDARIA Os Cnidários são organismos diblásticos, apresentando um ectoderma e um endoderma separados por uma mesogléia acelular ou um mesênquima celular, dependendo do grupo taxonômico em questão. É quase que um consenso geral de que nem a mesogléia, nem o mesênquima sejam homólogos ao mesoderma. Ao redor de um eixo oral-aboral, os Cnidários apresentam simetria primariamente radial, secundariamente birradial ou tetrarradial. Figura 46: Uma estrela do mar, exemplo de animal com simetria radial. Fonte: Foto de Amaury Borneo. 49 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes Uma das características marcantes dos Cnidários (autapomorfia para o grupo) é a presença de estruturas urticantes de defesa, ou captura de alimentos denominados cnidae ou nematocistos, localizados na epiderme e, em alguns grupos, também na gastroderme. Daí o nome dos cnidários. Os nematocistos ou cnidae são produzidos no interior de células denominadas cnidoblastos. Uma vez que a cnida está completamente formada, a célula recebe o nome de cnidócito ou nematócito. É interessante saber que existe a hipótese de que os nematócitos tenham evoluído por associação simbiótica entre protistas e o grupo de metazoários que deu origem aos Cnidários, dado que alguns flagelados, esporozoário e microsporídeos, apresentam estrutu- ras similares às cnidas. Um cnidócito é composto por um cnidocílio sensorial e uma estrutura eversível, contendo o flagelo, no interior de uma cápsula, o nematocisto (fig.47). O estímulo do cnidocílio promove um aumento abrupto da pressão osmótica no interior do nematocisto e a eversão do cnidocílio. Com a descarga do nematocisto, um novo cnidócito deve ser produzido. A musculatura de um Cnidaria é formada por células mioepiteliais, derivadas dos epitélios ectodérmicos e gastrodérmicos. O sistema nervoso é intraepitelial e difuso (não há um único centro nervoso controlador), concentrados em anéis nervosos em pólipos e medusas. Embora, tenha sido observada, em alguns casos, uma sinapse unidirecional, os neurônios são apolares (o impulso ocorre nos dois sentidos da célula) e sem bainha de Figura 47: Esquema do cnidócito carregado e descarregado. Fonte: Ivy Livingstone / Biodidac. 50 Ciências Biológicas Caderno Didático - 3º Período mielina. Os transmissores sinápticos em Cnidaria são: IMRFamida, norepi- nefrina e serotonina. Acetilcolina está presente somente nos Anthozoa (também em Ctenophora e Bilateria) mas, aparentemente, não possui função sináptica. A respiração, excreção e circulação ocorrem por difusão. Células reprodutivas de origem ecto- ou endodérmica são geralmente liberadas no meio externo. A fecundação pode ser interna ou externa. Larva plânula, ciliada, aparece no plano basal do grupo. Basicamente existem dois tipos morfológicos. O polipóide séssil e o meduzóide livre-natante (fig.48). Um pólipo apresenta aspecto de um saco ou tubo cujas paredes são constituídas por ectoderma e endoderma, separadas por uma delicada (nos hidrozoários polipóides) ou espessa (antozoários) camada de mesogléia. Na extremidade basal, encontra-se um disco achatado, ou contendo inúmeras invaginações (nos corais verdadeiros), pelo qual o animal se conecta ao substrato. Na extremidade oposta o tubo cilíndrico sofre atenuação, formando o hipóstomo (onde se abre a boca). Ao redor da boca encontram- se tentáculos sólidos ou ocos (continuação da gastroderme em Anthozoa). Em Anthozoa, um tubo estende-se para o interior da cavidade gastrodérmi- ca, formando uma espécie de faringe. Nesses organismos, a cavidade gastrovascular é dividida por inúmeros septos denominados mesentérios (não homólogo ao mesentério dos organismos celomados). Uma medusa é a forma pelágica dos Cnidaria (fig.49). O corpo apresenta uma margem aboral (oposto à boca) convexa e uma região oral dilatada em um disco côncavo (umbrela) de cujo centro pende um tubo cilíndrico (o manúbrio), na extremidade da qual a boca se abre. Os tentácu- los distribuem-se na margem da umbrela. A região delimitada pelas margens da região oral é denominada cavidade subumbrelar. Em algumas medusas como as da classe Hydrozoa, uma parede muscular e circular, o véu ou Figura 48: As duas formas básicas dos cnidários, o pólipo séssil e a medusa móvel. Fonte: Desenhos de Ivy Livingstone / Biodidac. 51 Zoologia de Invertebrados I UAB/Unimontes velum, estende-se para o interior da cavidade subumbrelar. A mesogléia pode ser delgada e acelular, como nos Hydrozoa, ou espessa e celular, com formas amebóides, nos Scyphozoa. 4.2.1 Evolução Muito, tem-se discutido sobre a forma ancestral dos Cnidários (medusa ou pólipo?). Alguns autores consideram os hidrozoários e scifozoá- rios (ambos primariamente meduzóides) os grupos mais primitivos. Nesses, os pólipos seriam uma especialização larval/juvenil. Outros autores consideram a forma polipóide como sendo o caráter ancestral para os Cnidários, enquanto a forma meduzóide
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