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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA-UNIR Departamento de Ciências Humanas e Sociais-Campus de Ji-Paraná Curso de Pedagogia CAMILA DE FREITAS RODRIGUES A IMPORTÂNCIA DA TEORIA DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS PARA O DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES DOCENTES NAS SÉRIES INICAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DA ESCOLA MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL LUIZ CAPILLA DE PRESIDENTE MÉDICI – RO Ji-Paraná 2015 CAMILA DE FREITAS RODRIGUES A IMPORTÂNCIA DA TEORIA DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS PARA O DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES DOCENTES NAS SÉRIES INICAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DA ESCOLA MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL LUIZ CAPILLA DE PRESIDENTE MÉDICI – RO Monografia apresentada ao Departamento de Ciências Humanas e Sociais da Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR, Campus de Ji-Paraná/RO, como requisito avaliativo de conclusão do Curso de Pedagogia, sob a orientação da professora Neidimar Vieira Lopes Gonzales. Ji-Paraná 2015 Dedicatória Aos inúmeros indivíduos rotulados – no passado ou no presente – como incapazes pelos testes de inteligência, mas que mostraram em suas histórias de vida que são mais do que o que os testes dizem ser. E à minha família. Agradecimentos Ao meu Deus e Pai, que me deu força, saúde e equilíbrio nessa caminhada. À Ele, toda honra, glória e louvor! À minha família que entendeu a minha ausência mesmo estando presente, sendo meus pais Luzia e Lourival que em pequenos e grandes detalhes me fortaleceram, e meus irmãos Lucas, Sabrina e Fabrício, bem como à sua família, Ingrid (minha cunhada) e minha sobrinha, Laura Lissa, que trouxe alegria e paz inexplicável em muitos momentos de tensão no decorrer deste trabalho. Amo vocês! Aos meus amigos, à minha amiga fiel Ana, e ao mesmo tempo, irmãos na fé a quem dou mérito pelo companheirismo, compreensão e preocupação com a minha vida. Vocês são essenciais! À escola e professores que colaboraram para a realização das pesquisas. À todas e todos colegas de sala do curso de Pedagogia. Um agradecimento especial às mais que colegas; Nilcéia, Rita e Yara, que me permitiram colaborar em todos os sentidos de suas vidas, e que colaboraram também de diversas formas para que a jornada não fosse tão árdua. Aos professores e professoras do Curso de Pedagogia, Campus de Ji-Paraná, que em momentos dentro de sala ou fora dela colaboraram para o meu crescimento pessoal e como educadora, com certeza sou uma pessoa melhor hoje. A banca examinadora deste trabalho: Professora Rosiane Ribas de Souza e Professora Mestre Ednéia Maria Azevedo Machado, que deram contribuições valiosas a este trabalho. Em especial à Professora Mestre Neidimar Vieira Lopes Gonzales, minha orientadora, que foi imprescindível para a realização desse trabalho e no meu desenvolvimento pessoal e profissional antes mesmo dessa oportunidade de ser orientada pela mesma. RESUMO Atualmente tem sido grande a preocupação quanto às habilidades e competências apresentadas pelos estudantes e até mesmo pelos profissionais. Após os estudos de Gardner é possível compreender que o ser humano apresenta inteligências múltiplas e que algumas são mais evidentes e permite que a pessoa se destaque ao usá-la. Com a intenção de compreender melhor a teoria de Gardner, este estudo tem como objetivo geral investigar, se na prática, o professor utiliza a teoria das Inteligências Múltiplas para compreender e identificar as habilidades e competências dos alunos que apresentam dificuldades na aprendizagem, e objetivos específicos, verificar, se o professor conhece e qual a concepção que tem acerca da teoria das Inteligências Múltiplas e se acredita que a mesma pode contribuir para identificar as habilidades dos estudantes, verificar se o professor utiliza a teoria das Inteligências Múltiplas e como faz isso; identificar se o professor faz investigações individuais dos alunos que apresentam dificuldades de aprendizagem para conhecer e identificar as habilidades que os mesmos apresentam. Essa pesquisa é do tipo estudo de caso com abordagem qualitativa desenvolvida através de questionários e observação nas salas de aula. Os sujeitos são cinco professores das séries iniciais do ensino fundamental da Escola Municipal de Ensino Fundamental Professor Luiz Capilla do município de Presidente Médici-RO que lidam com diferentes aptidões e dificuldades em sala de aula. O projeto apresenta a seguinte problemática: Qual a concepção do professor acerca da teoria de Gardner (teoria das inteligências múltiplas), e qual a importância que atribui à mesma na hora de planejar as atividades docentes e tratar o aluno que não consegue se desenvolver nas áreas exigidas pelo currículo escolar? Esta pesquisa tem como referencias teóricos: Gardner (1994, 2000, 2001), Armstrong (2001), Campbell, Campbell & Dickinson (2001) e outros. Como resultado é possível perceber que a maioria dos professores sujeitos da pesquisa têm uma concepção superficial acerca das teorias múltiplas, por um momento sabem até dizer como fazer uso da mesma, mas apresentam dificuldades para aplicá-las no seu planejamento e nas aulas, bem como para identificar as habilidades de seus alunos. Palavras- Chave: Inteligências Múltiplas. Diversidade. Planejamento docente. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AEE – Atendimento Educacional Especializado IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica IM – Inteligências Múltiplas LDB – Leis de Diretrizes e Bases MEC – Ministério da Educação PDDE - Programa Dinheiro Direto na Escola PIBID - Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência PNE - Plano Nacional de Educação QI – Quociente de Inteligência LISTA DE FIGURAS Figura 1- Porcentagem dos professores de educação básica com curso superior e porcentagem dos anos finais do Ensino Fundamental que tem licenciatura na área em que atuam de 2013.......................................................................................................................................... 37 Figura 2 – Diferentes recursos lúdicos e espaços da escola......................................................66 Figura 3 – Sala da AEE com diversos recursos........................................................................66 Figura 4 – Espaço de aula criado pelo Professor 04..................................................................68 LISTA DE QUADROS Quadro 1: As inteligências e os respectivos componentes curriculares que atingem o conhecimento............................................................................................................................44 Quadro 2 – Propostas de atividades para as inteligências correspondentes..............................45 Quadro 3- Exemplo de um plano de aula de IM para oito dias................................................49 Quadro 4 –Testagem Padronizada Versus Avaliação Autêntica................................................52 Quadro 5- Formação dos professores pesquisados...................................................................59 Quadro 6 – Planejamento de aula e orientaçãodo planejamento.............................................60 SUMÁRIO INTRODUÇÃO..........................................................................................................................8 I. BREVE HISTÓRICO SOBRE O ESTUDO DA INTELIGÊNCIA......................................10 II. COMPREENDENDO A TEORIA DE GARDNER E SUA IMPORTÂNCIA PARA A EDUCAÇÃO............................................................................................................................20 2.1. A formação e o desenvolvimento profissional docente para um olhar significativo às IM ...............................................................................................................................36 2.2. As Inteligências Múltiplas e currículo escolar .............................................................40 2.3. A teoria das Inteligências Múltiplas como estratégia de ensino em sala de aula..........44 2.4. As Inteligências Múltiplas na avaliação escolar ...........................................................50 III. ANÁLISE DOS DADOS DA PESQUISA REALIZADA NA ESCOLA LUIZ CAPILLA.............................................................................................................................55 3.1 Metodologia da pesquisa ...............................................................................................55 3.2 Observações empíricas ..................................................................................................64 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................70 REFERÊNCIAS........................................................................................................................72 APÊNDICES.............................................................................................................................76 8 Introdução Atualmente há uma preocupação com relação às habilidades e competência do indivíduo, seja no campo profissional ou educacional. Sobre estas habilidades nos indivíduos Gardner apresentou a teoria das inteligências múltiplas e enfatizou que o “ser inteligente”, ou seja, ser capaz de trazer soluções aos problemas de um determinado cenário cultural, é uma necessidade que caracteriza nossas sociedades e que varia conforme as culturas; provando isto vemos as valorizações de alguns destes cenários culturais, tais como os antigos gregos que atentavam para a agilidade em física, a racionalidade e o comportamento virtuoso, os romanos para a coragem máscula, os chineses valorizavam aqueles que tinham habilidades para a poesia, música, caligrafia, a arte de manejar o arco e o desenho. Hoje, nossa cultura ocidental criou a imagem de uma pessoa inteligente que também varia de cenário, onde em escolas mais tradicionais, a matemática e a linguagem são consideradas prioridades para ser considerado inteligente. (GARDNER, 2001) Considerando este aspecto das culturas, onde a inteligência está subsidiada em alguns fatores superficiais e traduzida, muitas vezes, apenas em testes, a teoria das Inteligências Múltiplas surge na perspectiva de reformular o conceito de inteligência e ampliar as possibilidades de ser inteligente dentro de nossas culturas. Essa perspectiva se tornou possível na medida em que o autor encontrou na neuropsicologia através de experimentos com crianças e adultos que haviam sofrido lesão cerebral, fundamentos para a comprovação de várias estruturas da mente que daria nome ás inteligências múltiplas (linguística, lógico-matemática, espacial, corporal-cinestésica, musical, intrapessoal, interpessoal e naturalista). Sendo assim, este estudo tendo como sujeitos da pesquisa 5 (cinco) professores das séries iniciais do Ensino Fundamental da Escola Municipal Luiz Capilla da cidade de Presidente Médici – RO, e a relação de sua prática pedagógica com os subsídios que a Teoria das Inteligências Múltiplas pode oferecer, tanto para o planejamento das aulas quanto para lidar com as dificuldades de aprendizagem dos alunos. O objetivo é identificar se na prática, o professor utiliza a teoria das Inteligências Múltiplas de Gardner para compreender e identificar as habilidades e competências dos alunos que apresentam dificuldades na aprendizagem. A pesquisa pretende levantar dados, por meio de questionários e observações, para verificar se o professor considera ou não as particularidades e necessidades dos alunos, além 9 dos conhecimentos adquiridos pelo contexto que vivem. Trazer uma reflexão a respeito da intervenção do professor em relação ao desenvolvimento do aluno, mostrando que a Teoria de Gardner é uma aliada e um grande desafio ao docente. 10 I - BREVE HISTÓRICO SOBRE O ESTUDO DA INTELIGÊNCIA A tarefa de compreender o intelecto humano, e como o mesmo se desenvolve começou há um tempo remoto, pois, o desenvolvimento do cérebro e a compreensão de como o ser humano chega ao conhecimento é muito importante para o desenvolvimento também da sociedade. Antes de contemplar os estudos realizados por uma gama de pesquisadores de diferentes ramos sobre a inteligência, destacamos a importância em analisar significados estabelecidos para a palavra. Recorrendo ao significado da palavra inteligência nota-se que a mesma tem sua origem na junção de duas palavras latinas: inter= entre e eligare=escolher. Pode-se entender que inteligência é então a capacidade mental que se têm para escolher corretamente entre diversas opções (ANTUNES, 2008). Ainda segundo o dicionário Aurélio, inteligência pela psicologia, significa: “7 Psicol Capacidade de resolver situações problemáticas novas mediante reestruturação dos dados perceptivos. ” (1999, p. 1.122) Para compreender a profundidade da inteligência na história humana, vejamos o pensamento de Santo Agostinho: O primordial autor e motor do universo é a inteligência. Portanto, a causa final do universo deve ser o bem da inteligência e isto é verdade... De todas as buscas humanas, a busca da sabedoria é a mais perfeita, a mais sublime, a mais útil e a mais agradável. A mais perfeita porque na medida em que o homem entrega-se à busca da sabedoria, nesta extensão ele já desfruta de alguma parcela da verdadeira felicidade. (RANDALL,1940, apud GARDNER, 1994, p. 5) Analisando as citações, pode-se imaginar a complexidade do tema, o tempo e o estudo que se levou para criar definições a respeito, por isso será tratado sobre seu histórico, que é também de suma importância para a compreensão da teoria que aqui será abordada, a Teoria das Inteligências Múltiplas, pois a mesma é resultado de uma série de estudos e delimitações das ideias e pesquisas de diversos estudiosos empenhados em compreender o ser humano em suas capacidades e habilidades. Sabe-se que as discussões sobre funções cerebrais, habilidades do indivíduo e demais estudos do cognitivo, antecedem o século XIX, como quando os egípcios acreditavam que o pensamento estava relacionado ao coração, o julgamento à cabeça ou aos rins, e ainda quando 11 Pitágoras e Platão sustentaram que a mente se encontrava no cérebro e Aristóteles pensava consigo que a sede da vida está no coração ou Descartes colocou a alma na glândula pineal. (GARDNER, 1994). Ainda no final do século XVIII, Franz Joseph Gall, anatomista e fisiologista germânico que foi pioneiro na identificação das funções do cérebro, ainda enquanto estudante: [...] observou um relacionamento entre determinadas características de seus colegas de escola e os formatos de suas cabeças. [...] e alguns anos depois, colocou-a no centrode uma disciplina chamada “frenologia”. [...] A ideia chave da frenologia é simples. Os crânios humanos diferem uns dos outros e suas variações refletem diferenças no tamanho e na forma do cérebro. Diferentes áreas do cérebro, por sua vez, servem a funções distintas; e assim, examinando cuidadosamente as configurações cranianas de um indivíduo, um especialista seria capaz de determinar os pontos fortes, as fraquezas e as idiossincrasias de seu perfil mental. (GARDNER, 1994, p. 10). A observação de Gall alcançou grande popularidade, tanto pelas críticas que recebeu por parte dos líderes religiosos que acreditavam que a mente humana era divina e não poderia ser tratada como um mero assunto anatômico, assim como recebeu o apoio de diversos cientistas da época e com a ajuda especial do seu colega Joseph Spurzheim, que adicionou 10 às 27 faculdades mentais e morais de sua lista como a intelectualidade, percepção, amor, etc., formou- se a frenologia, conforme acima citada. (SABBATTINI, 1997). Como toda teoria, muitas falhas foram encontradas na frenologia, pois o tamanho do cérebro não apresenta qualquer relação nítida com o intelecto do indivíduo, sendo que tanto indivíduos com um cérebro pequeno podem alcançar grande sucesso, como indivíduos com o cérebro pesado podem ser ignorantes. Embasados neste argumento, superficial, mas convincente, juntamente com as experiências feitas com o cérebro de animais, que algumas das proposições de Gall não puderam ser sustentadas. No entanto, nos anos 60 após a demonstração do antropólogo e cirurgião francês Pierre-Paul Broca, foi possível ver a relação indiscutível entre uma lesão cerebral e uma debilitação cognitiva específica, em que essa certa lesão havia prejudicado as funções linguísticas do indivíduo, e foi assim que a teoria da frenologia voltou à evidência. (GARDNER, 1994). Logo após a observação de Gall, depois da segunda metade do século XIX, a psicologia começa a se instituir como ciência tendo como principais estudiosos Wilhelm Wundt na Alemanha e William James nos Estados Unidos, no entanto, como ciência a psicologia, até então, estava mais ligada à Filosofia do que à Medicina, o que diminuía o contato dos profissionais da área da psicologia com os profissionais da medicina responsáveis pelas 12 experiências com o cérebro humano o que dificultou que houvesse um entendimento de que pensassem em conteúdos mentais específicos, ao contrário, pensaram de forma independente de modalidade sensorial daquele domínio apresentado, onde por este motivo a psicologia científica se atentou para as leis mais gerais do conhecimento humano. Uma outra parte da psicologia científica significante foi a que buscou diferenças individuais, ou seja, os diferentes perfis de habilidades e incapacitações do indivíduo (GARDNER, 1994). Quanto a investigação de diferentes habilidades e incapacitações, o britânico psicometrista Francis Galton foi determinante para a mesma, pois foi o responsável por montar o primeiro laboratório antropométrico após as descobertas de Charles Darwin, seu primo, em 1860 sobre a origem e evolução das espécies e sua curiosidade sobre os traços psicológicos, intelectuais e emocionais dos indivíduos (GARDNER, 2001). Essa curiosidade de Darwin levou outros diversos pesquisadores, inclusive em Galton, a se dedicar ao estudo das diferenças intelectuais das pessoas onde levantou diversas considerações a respeito daqueles considerados: [...] ‘gênios’ ou ‘eminências’, e outras formas de sucesso [...] E, desenvolveu métodos estatísticos que possibilitaram classificar os seres humanos em termos dos seus poderes físicos e intelectuais e a correlacionar estas medidas entre si. Estas ferramentas capacitaram-no a verificar a suspeita de uma ligação entre linhagem genealógica e sucesso profissional. (GARDNER, 1994. p. 12) Galton, também acreditava que se os indivíduos considerados gênios fossem identificados, os mesmos poderiam ser cruzados com indivíduos também com grande capacidade intelectual (seleção artificial), para que fosse gerada uma raça humana com grande capacidade intelectual, formulando, com o auxílio da matemática e da biologia, a teoria da Eugenia ou simplesmente “bem nascido”, como podemos ver em sua declaração sobre Eugenia no artigo de COLT (2008): “A eugenia pode ser definida como a ciência que trata daquelas agências sociais que influenciam, mental ou fisicamente, as qualidades raciais das futuras gerações.” (GALTON, 1906, p. 3, apud. COLT, 2008). Galton também foi um contribuinte para as primeiras ideias dos testes, quando em 1870 começou a elaborar testes mais formais utilizando principalmente a estatística para suas pesquisas. Os testes sondavam em sua maioria, “os modos como os indivíduos distinguiam as diferenças de volume dos sons, de brilho da luz, de peso dos objetos. ” Gardner (1994, p. 12). Talvez por isso, os testes de Galton não obtiveram resultados satisfatórios. Mesmo com as primeiras considerações sobre os testes de inteligência feitos por Galton, o mérito foi dado a 13 Alfred Binet, como veremos adiante. Os primeiros testes de inteligência começaram a surgir no intuito de descobrir os alunos com retardo mental ou aqueles com habilidades altamente desenvolvidas. Estes animaram diversos grupos da sociedade visto que os mesmos poderiam auxiliar no reconhecimento de habilidades necessárias nas escolas, nas empresas e etc. E foi, por exemplo, o caso dos Liceus Parisenses, que eram as escolas de ensino geral ou tecnológico, onde: No início do século XX, as autoridades francesas solicitaram a Alfred Binet que criasse um instrumento pelo qual se pudesse prever quais as crianças que teriam sucesso nos liceus parisenses. O instrumento criado por Binet testava a habilidade das crianças nas áreas verbal e lógica, já que os currículos acadêmicos dos liceus enfatizavam, sobretudo o desenvolvimento da linguagem e da matemática. Este instrumento deu origem ao primeiro teste de inteligência, desenvolvido por Terman, na Universidade de Standford, na Califórnia: o Standford-Binet Intelligence Scale. (GAMA, 1994, p. 01) Binet foi então o principal estudioso da área, e juntamente com Théodore Simon projetou os primeiros testes de inteligência, ou testes de QI (quociente de inteligência) que separavam as crianças com retardo e classificava as crianças nas séries adequadas, (GARDNER, 1994) de onde vem também o conceito de idade mental. Binet, no entanto, deixou bem claro que os testes não poderiam medir a inteligência humana, visto que esta abordagem é mais ampla e que os testes possuíam uma série de limitações que procurou, juntamente com Simon, melhorar. Outro contexto apresentado na criação dos testes de QI seriam os fatores genéticos pensados sobre a inteligência, quando alguns autores colocaram a inteligência como fator inato herdado dos pais e podendo ser pouco influenciado pelo meio. A inteligência, bem como aptidões individuais, seria herdada dos pais e já estaria predeterminada no momento do nascimento da criança. Dessa forma, o comportamento e as habilidades das crianças seguiriam padrões mais ou menos fixos, governados pelos processos de maturação, que seriam independentes da aprendizagem ou da experiência. Para chegar a essa conclusão, desde o início do século pesquisadores que defendem essa posição se dedicaram a observar crianças e constataram que, na maioria das vezes, pessoas com aptidões especiais normalmente tinham familiares que apresentavam os mesmos traços. Diante dessas evidências, concluíram que características psicológicas como o nível de inteligência e habilidades de escrita, leitura, cálculo, entre outras,seriam transmitidas de pai para filho através da herança biológica. O meio social e a educação, portanto, cumpririam apenas o papel de impedir ou de deixar aflorar essas características. (GOULART, 2010, p. 24) 14 Assim, estavam criados os primeiros testes e logo em seguida, em 1912, o psicólogo Wilhelm Stern traria a proposta do nome de quociente de inteligência, e também a medida que era dada pela razão entre a idade mental e idade cronológica do indivíduo, expressa através de um número multiplicado por 100 (GARDNER, 2001). Nesta época, os testes foram tidos como a grande descoberta da psicologia pelos estudiosos da área e fora dela, onde surgiram os psicometristas, causando uma série de discussões entusiasmadas ou críticas sobre o assunto, se falando em crítica, em 1920 o jornalista Walter Lippman levantou algumas questões através de debate com Lewis Terman na revista américa New Republic criticando “a superficialidade e os possíveis preconceitos culturais das perguntas do teste [...]” (GARDNER, 2001, p. 24). Assim como foram feitos discursos entusiasmantes na época de sua descoberta, inúmeras também são as críticas atuais em relação aos testes de QI tanto que não conseguiríamos colocar aqui, como este relatando esta realidade no Brasil: Infelizmente, muitas dessas ferramentas foram usadas para discriminar e excluir socialmente crianças e adolescentes pertencentes às camadas mais pobres da população, especialmente em países como o Brasil, que, em meados do século XX, abria as portas das escolas para esse público. (GOULART, 2010, p. 25) Ainda sobre os debates gerados pela descoberta da testagem de inteligência vale relembrar alguns, como este: De um lado estão alinhados os indivíduos influenciados pelo psicólogo educacional britânico Charles Spearman, em meus termos, um “ouriço” – que acredita na existência de um “g” – um fator geral de inteligência dominante medido por cada tarefa em um teste de inteligência. Do outro lado, encontram- se os partidários do psicometrista americano e “raposa” L. L. Thurstone, que acredita na existência de um pequeno conjunto de faculdades mentais primárias relativamente independentes entre si e medidas por tarefas diferentes. Thurstone, de fato, nomeou sete destes fatores – compreensão verbal, fluência verbal, fluência numérica, visualização espacial, memória associativa, velocidade de percepção e raciocínio. (GARDNER, 1994. p. 13) Ou seja, nesse debate, Spermean, identificou um fator, denominado “g”, que determinaria grande parte da inteligência e do outro lado, Thurstone, identificou outros fatores secundários que também explicariam a inteligência e que deveriam ser considerados. Gardner, em seu livro, Inteligência: um conceito reformulado (2001), também detalha que esta discussão 15 permeou três décadas (até meados de 1930), pois se tratava de teóricos que de um lado acreditavam na singularidade da inteligência, representada por Spermean e sua teoria do fator “g” e de outro na pluralidade da mesma, representada por Thurstone e seu levantamento de sete vetores do intelecto humano. O que pode se dizer ainda sobre os testes de QI é que, após passado todo o entusiasmo de uma descoberta recente, percebeu-se que não eram suficientes para medir ou mensurar a inteligência humana, visto que se ignora o processo que ocorre até que o indivíduo responda a questão do teste, pois o indivíduo se esforça, em uma atividade mental, para responder a questão a ele colocada. Além disso, os testes apresentavam uma série de inadequações e era tendencioso, interferindo na maneira como haveria de ser respondido, principalmente pela falta de conexão, tanto entre as questões como no assunto das mesmas que são em sua maioria fora do contexto do indivíduo, ou seja, exigia do indivíduo uma familiarização com conhecimentos específicos de uma cultura, e não, com conhecimentos globais ou de sua cultura. Nesse contexto não poderíamos deixar de falar de Piaget e sua grandiosa colaboração a cognição humana. Piaget também se trata de um psicólogo insatisfeito com os testes de QI, visto que esteve inserido neste contexto e participou como pesquisador no laboratório de Simon onde “tornou-se particularmente interessado no erro que as crianças cometem quando tentam resolver itens num teste de inteligência” (GARDNER, 1994, p. 14), pois para ele, bem mais importante que as respostas que as crianças davam às questões do teste eram as linhas de raciocínio e o caminho que trilhavam até chegar as mesmas. E apesar de não se opor a ideia dos testes de QI, suas estratégias científicas nos fazem identificar algumas das inadequações do programa Binet-Simon (GARDNER, 1994), como as citadas no parágrafo acima. Dessa forma, Piaget desenvolveu sua concepção sobre o intelecto ao identificar fases de desenvolvimento e as características que definem a busca pelo conhecimento nas mesmas, e, além disso, como os indivíduos agem diante dessa busca. Estas fases de desenvolvimento possibilitam compreender um pouco sobre como o indivíduo interage com a aquisição dos conhecimentos do mundo: Inicialmente o bebê entende o mundo principalmente através dos seus reflexos, suas percepções sensoriais e suas ações físicas sobre o mundo. Após um ano ou dois ele chega a um conhecimento prático ou sensório-motor do mundo dos objetos, conforme eles existem no tempo e no espaço. [...] A seguir, a criança começa a desenvolver ações interiorizadas ou operações mentais. [...] Ao mesmo tempo, a criança também torna-se capaz de utilizar símbolos: agora ele está apto a usar várias imagens ou elementos – como palavras, gestos ou figuras – para significar objetos da “vida real” no mundo e pode tornar-se hábil em entender diversos sistemas de símbolos, como a linguagem ou a 16 desenho. Estas capacidades de interiorização e simbolização em desenvolvimento, atingem um ponto elevado por volta dos sete ou oito anos, quando a criança torna-se capaz de realizar operações concretas. [...] Segundo Piaget, um estágio final de desenvolvimento entra em existência no início da adolescência. Agora capaz de operações formais, o jovem pode raciocinar sobre o mundo não apenas através de ações ou de símbolos isolados, mas calculando as implicações consequentes de um conjunto de proposições relacionadas. [...] Com estas habilidades em mãos (ou na cabeça), o jovem atingiu o estado final da cognição humana adulta. Ele é agora capaz de empregar a forma de pensamento lógico-racional valorizada no Ocidente e epitomizada por matemáticos e cientistas. Evidentemente, o indivíduo pode continuar a fazer descobertas, mas não passa mais por mudanças qualitativas em seu pensamento. (GARDNER, 1994. p. 15) Este breve relato sobre sua colaboração já nos permite reconhecer que foi de extrema importância para reconhecer as funções cerebrais e a complexidade da mesma, e também colaborou para que o estudo da inteligência fosse levada adiante em uma nova perspectiva, porém, como citado acima a abordagem sobre o desenvolvimento humano está enquadrada em um contexto do Ocidente, ou seja, para a teoria “supõe relativamente menos importância nos contextos não ocidentais e pré-literários e pode, de fato, ser aplicável apenas a uma minoria dos indivíduos, mesmo no Ocidente” (GARDNER, 1994, p. 16). A grande questão encontrada por Gardner, está na limitação do uso da abordagem de Piaget a um determinado público, não podendo ser utilizada em outras culturas, ou contextos quando se trata do estudo da inteligência. Influenciado por este pensamento está Robert J. Sternberg, um psicólogo contemporâneo de Yale, que publicou seu primeiro escrito sobreinteligência em 1977 e escreveu outros inúmeros trabalhos sobre o assunto, procurou descrever os processamentos de informação nas questões padronizadas dos testes, e considerava os processos mais importantes do que a resposta em si buscando compreender as conexões que o cérebro é capaz de estabelecer com as informações que estão ao dispor de quem responde as questões. Além disso, considerou também a maneira que as pessoas lidam em diferentes contextos; no trabalho, na faculdade, nos relacionamentos, na família, e em diferentes situações, e apontou a realidade de que estas não são ensinadas ou testadas. No entanto, as considerações de Sternberg e seu interesse por uma nova maneira de medir a inteligência não obtiveram êxito pois os psicometristas eram fiéis aos testes anteriormente lançados, e Sternberg era contrário a alguns pontos dos testes anteriores (GARDNER, 2001). Para Gardner, as abordagens de QI, a piagetiana, e a de processamento de informações, focalizam um determinado tipo de resolução de problemas lógico ou linguístico, mas falham juntamente em um ponto muito importante para ele; a biologia e a criatividade em diferentes 17 níveis e desconsideram os inúmeros papéis relevantes na sociedade (GARDNER, 1994). Não poderíamos deixar de falar de alguns outros estudos sobre a inteligência como a Inteligência Artificial que apareceu entre os anos de 1950 e 1960, a princípio com o trabalho de Warren McCulloch e Walter Pitts, anteriormente aos anos 50, onde trouxe uma proposta sobre neurônios artificiais, e mostraram como qualquer função computável podia ser calculada por certa rede de neurônios conectados (RUSSELL; NORVIG, 2013). A inteligência artificial se encontra “no cruzamento da cognição, das neurociências e da informática, buscando compreender o pensamento e o comportamento humano, a fim de reproduzi-los artificialmente” (PASTERNAK, 1993, p. 194). Ou seja, a intenção dessa inteligência era compreender a cognição humana a fim de fazer com que as máquinas reproduzissem as ações humanas inteligentes. Gardner (2001), nos lembra também que a princípio do estudo sobre esta inteligência pensava-se em uma capacidade geral de resolver problemas mesmo dentro do campo tecnológico, mas ao longo dos estudos desenvolvidos percebeu-se que seriam necessários outros tipos específicos de conhecimento para cada programa, e muitos estudiosos da área da informática passaram a desconsiderar esta capacidade geral de resolver problemas. Entre estas teorias da inteligência está este trabalho, a teoria das múltiplas inteligências de Gardner, que surge no ano de 1983 e desafia uma mudança na maneira de lidar com este tema, afirmando “que a nossa cultura definira a inteligência de forma muito limitada” (ARMSTRONG, 2001. p. 13), desta forma ele definiu a princípio a existência de sete inteligências básicas, que dois anos depois se tornaram oito, conhecida como teoria das inteligências múltiplas. Ele confrontou o fato de que a inteligência estivesse ligada a atividades padrões que todos os indivíduos deveriam realizar, quando na realidade para ele a inteligência estivesse mais relacionada a “capacidade de (1) resolver problemas e (2) criar produtos em ambientes com contextos ricos e naturais (ARMSTRONG, 2001. p.13). Mais detalhes sobre a teoria de Gardner será colocada no capítulo a seguir. Outra contribuição relevante veio em 1994, quando mais um livro era escrito sobre a inteligência, o livro The Bell Curve, em português, A Curva Normal de Richard J. Herrnstein e Charles Murray. Muitos autores poderiam ser citados ao se tratar das críticas oriundas desse livro, e os motivos desta polêmica também são inúmeros visto que acreditavam na “inteligência como tendo sua base geneticamente determinada, distribuída de forma diferenciada entre as raças humanas e as posições sociais” (MAGALHÃES, 1999. p. 15). Em poucas palavras, o livro foi tido como preconceituoso e por mais que tenham tentado assumir uma posição neutra, foi possível identificar opiniões equivocadas como as que Gardner observou, onde: 18 Embora não assumissem uma posição explícita em relação aos dados conhecidos, mostrando QIs mais elevados entre brancos em comparação a negros, os autores deram claramente a impressão de que as diferenças eram difíceis de mudar e, portanto, deveriam ser um produto de fatores genéticos. [...] Do mesmo modo, embora não recomendem práticas eugênicas, eles usam repetidamente a seguinte forma de raciocínio: a patologia social deve-se à baixa inteligência, e não se pode modificar significativamente a inteligência por meio de intervenções societais. (GARDNER, 2001, p. 19) Desse modo, polêmico e duvidoso, o livro The Bell Curve foi alvo de inúmeras resenhas negativas e comentado em rodas de conversas e rodas de intelectuais (GARDNER, 2001). Um ano depois, no outro extremo e para um público bem diferente de The Bell Curve, surge um sucesso maior ainda de vendas, o livro Inteligência emocional por Daniel Goleman, que também era repórter do Jornal New York Times, Goleman não foi o criador do conceito, pois antes de seu livro, Peter Salovey, John Mayer e David Caruso já haviam escrito sobre, no entanto, seu conceito de inteligência emocional difere um tanto da teoria a princípio abordada por estes autores (PRIMI, 2003). Neste livro, Goleman escreve como a inteligência tem a ver com outros fatores a mais do que aqueles que os testes de QI estavam lidando, nesta inteligência as emoções eram evidenciadas, como retrata a seguir: A inteligência emocional prevalece sobre o QI apenas naquelas áreas ‘tenras’ mas quais o intelecto é relativamente menos relevante para o sucesso – nas quais, por exemplo, autocontrole emocional e empatia podem ser habilidades mais valiosas do que aptidões meramente cognitivas. Como se sabe, algumas dessas áreas são extremamente importantes em nossas vidas. [...] Aqueles que conseguem gerenciar suas vidas emocionais com mais serenidade e autoconsciência parecem ter uma vantagem clara e considerável na saúde. (GOLEMAN, 2007. p. 13) A inteligência emocional ampliou então a gama de possibilidades sobre inteligência e como Goleman mesmo cita, foi tida pela Harvard Business Review como “uma ideia inovadora, capaz de destruir paradigmas” (GOLEMAN, 2007, p. 11), e também mostrou como o equilíbrio das emoções são importante para o processo adaptativo do indivíduo (PRIMI, 2003). Algumas questões perpetuam até nossos dias sobre a inteligência, sobre ser ou não herdada, sobre a singularidade ou diversidade da mesma, se é única ou há diversas faculdades mentais responsáveis por ela, e ainda há a questão sobre os testes de QI, se são válidos, se são de fato justificáveis e até onde podem responder as perguntas que sempre serão feitas sobre inteligência humana. Queiróz & Néri (2005 apud. Flerck, 2008), diz ainda que as teorias sobre inteligência sempre tiveram três focos: psicométrica, desenvolvimentista e cognitivista. A 19 psicométrica trata basicamente sobre a quantidade de faculdades mentais, a desenvolvimentista não se importa muito com a quantidade de faculdades mentais ou definição de inteligência e sim com os esquemas e estruturas mentais; e por último a cognitivista que lida com o ato de resolução dos problemas. Há muito para se desenvolver sobre inteligência, uma história já foi construída, mas nunca será suficiente estudar sobre a mesma, esta não é mais pertencente a um grupo especifico de pesquisadores, pois profissionais de diferentes áreas buscam contribuir para este tema e muitos outros grupos de interesse ainda participarão de seu uso (GARDNER, 2001), sabemos também que a inteligência é complexapois sua multiplicidade de níveis de organização (biológica e contextual) não podem ser desconsideradas. O que se sabe é que: É de máxima importância reconhecer e estimular todas as variadas inteligências humanas e todas as combinações de inteligências. Nós todos somos tão diferentes em grande parte porque possuímos diferentes combinações de inteligências. Se reconhecermos isso, penso que teremos pelo menos uma chance melhor de lidar adequadamente com os muitos problemas que enfrentamos neste mundo. (GARDNER, 1994, p. 18) Diante da citação acima, abordaremos agora a teoria das inteligências múltiplas e sua contribuição para a educação, e como a mesma pode mudar a maneira de ver o ser humano em si, e sua capacidade intelectual, tendo como base os aspectos biológicos e culturais. 20 II - COMPREENDENDO A TEORIA DE GARDNER E SUA IMPORTÂNCIA PARA A EDUCAÇÃO Howard Gardner foi um pesquisador idiossincrático da inteligência, pois é o autor principal da teoria que consta neste trabalho. Após entrar na Universidade Harvard para estudar História e Direito acaba por se aproximar do psicanalista Erick Erikson e muda seus estudos para as áreas de psicologia e educação e passa a estudar a inteligência. E especificamente após sua pós graduação dedicou-se ao estudo do desenvolvimento dos sistemas simbólicos, pela inteligência humana. Após integrar-se ao projeto Harvard Project Zero, passa a desenvolver a teoria das inteligências múltiplas que foi publicada em 1983, (FERRARI, 2008). As pesquisas sobre o histórico da inteligência abordado acima, propõe um novo olhar sobre essa temática. Todo o contexto apresentado no ponto acima levou Gardner a refletir sobre aspectos que deveriam ser aprofundados visto que sua insatisfação não estava simplesmente nos testes de QI, pois o mesmo acreditava que o número gerado a partir dos resultados dos testes de QI, poderiam de fato informar habilidades do indivíduo e com certeza influenciariam na maneira como os professores e todo o contexto escolar veriam ao indivíduo, ao mesmo tempo via nos testes uma superficialidade ao desconsiderarem uma gama de possibilidades visto que os testes potencializavam as questões de lógica e verbal, mas tinham pouco a contribuir ou a dizer no contexto fora da escola. Sobre isso, vejamos a citação de Modernell: Antes da copa do mundo de 1958 o Brasil possuía seu primeiro psicólogo esportivo, João Carvalhaes, que atendia a seleção brasileira de futebol. O psicólogo resolveu aplicar em todos os jogadores testes de QI. Garrincha, que estava no apogeu de sua carreira, após responder os testes ficou sabendo que seu quociente intelectual era irrisório, sendo classificado como débil mental. Por este motivo quase foi impedido de participar da Copa. (MODERNELL, 1992 apud KRUSZIELSKI, 1999, p.1) A habilidade de Garrincha era evidente para todos, no entanto, o teste psicométrico de inteligência apontou que o mesmo não teria grandes chances de ser bem-sucedido na vida. O que podemos entender, é que os testes podem nos dar um respaldo para o que talvez aconteça na vida escolar, mas não tem muito a dizer sobre o sucesso profissional que será conquistado pelo indivíduo como vemos no caso de Garrincha (KRUSZIELSKI, 1999). Observações como estas foram importantes para as ideias de Gardner, mas ainda, de uma forma mais ampla, sua principal insatisfação estava na maneira de se entender o intelecto: O problema está menos na tecnologia da testagem do que nas maneiras 21 pelas quais habitualmente pensamos sobre o intelecto e em nossas concepções arraigadas de inteligências. Apenas quando expandirmos e reformularmos nossa concepção do que conta como intelecto humano seremos capazes de projetar meios mais adequados para avalia-lo e meios mais eficazes para educa-lo. (GARDNER, 1994, p. 4) Ao observarmos suas perspectivas a respeito da inteligência podemos compreender que o mesmo não se limitou a questionar os testes de QI ou a forma como a inteligência era compreendida, mas buscou trazer novas perspectivas para tratar a inteligência e compreender como, em seu cotidiano, as pessoas lidam com as mais variadas situações. A concepção de Gardner sobre inteligência pode ser descrita como “produto de uma operação cerebral e permite ao sujeito resolver problemas e, até mesmo, criar produtos que tenham valor específico dentro de uma cultura” (ANTUNES, 2008. p. 11). E foi a partir de aspectos até então ignorados que chegou a esta conclusão sobre o intelecto humano, e estes aspectos serão abordados a partir de agora. Gardner desafia todas as pesquisas até então realizadas a respeito do intelecto, pois suas fontes se dão por meio de observações no Harvard Project Zero ou Projeto Zero juntamente com um grupo da Harvard Graduate School of education, que a princípio realizava pesquisas sobre a educação artística, com crianças comuns ou superdotadas e observava em geral, a simbologia humana que se tratava de unidades com significados específicos que geravam produtos culturais para um conjunto comum de pessoas. Este projeto levou Gardner a estudar sobre a neuropsicologia, área da neurologia responsável pelas funções psicológicas das áreas neurais, e após ter compreendido um pouco sobre a mesma, ele decidiu se dedicar também ao estudo minucioso no Centro de pesquisa da Afasia da Universidade de Boston com a colaboração de Geschwint e seus colegas, sobre como o cérebro funciona em adultos normais e como ele é prejudicado, e às vezes treinado novamente quando o sistema nervoso sofre uma lesão, onde dentro deste estudo do cérebro ele se dedicou a entender através da observação como ficariam as capacidades artísticas após uma lesão cerebral (GARDNER, 1994). E foi a partir destes estudos que se tornou possível reunir evidências de não apenas uma, mas de outras diversas competências humanas, ou simplesmente, “inteligências humanas ou estruturas da mente”. Ambas as populações com que eu estava trabalhando estavam me dando pistas para a mesma mensagem: a de que se pensa melhor a mente humana como uma série de faculdades relativamente independentes, tendo relações apenas frouxas e não previsíveis umas com as outras, do que como uma máquina 22 única para todas as coisas, com uma capacidade de desempenho constante, independente de conteúdo e contexto. (GARDNER, 1994. p. 45) Nestas pesquisas Gardner também conseguiu levantar considerações mais complexas que não poderiam ser esquecidas quando as pesquisas se tratassem de inteligência. Entre estas considerações estão os fundamentos biológicos dos quais Gardner separou um capítulo exclusivo em seu livro Estruturas da Mente (1994) para tratar sobre o assunto. Em seus embasamentos biológicos a respeito de inteligência, Gardner observou o ponto de encontro entre as ciências do cérebro e a biológicas em duas questões; a primeira na flexibilidade do desenvolvimento humano que se trata da mudança que as intervenções podem ou não efetuar no desenvolvimento do indivíduo, e a identidade ou a natureza das capacidades intelectuais que propõe o uso das capacidades humanas para um ou infinitos usos, ou como estas se desenvolvem mais claramente em uns do que em outros. De uma forma mais ampla essas questões tentam responder, sem considerar as exceções, como funciona a natureza e o desenvolvimento das capacidades humanas; como se organizam, como se utilizam, como se transformam ao longo da vida (GARDNER, 1994). Gardner se posicionou claramente sobre o que pensava a respeito destas questões fundamentando seus argumentos na ordem biológica de que estudos realizados sobre inteligência e cognição mostravamdiferentes pontos intelectuais, e ainda a presença de áreas no cérebro que correspondem a determinadas formas de inteligência (como veremos adiante), ou seja, o cérebro reconhece os diferentes modos de processos de informação. [...] em qualquer momento histórico, pode-se especificar os processos componentes de cada mecanismo computacional ou, se preferir, de cada forma de inteligência. [...] conforme vejo as evidências, tanto os achados de psicólogos sobre o poder de diferentes sistemas simbólicos, quanto os achados de neurocientistas sobre a organização do sistema nervoso humano apoiam o mesmo quadro da mente humana: a mente consiste em alguns mecanismos computacionais bem específicos e bastante independentes. (GARDNER, 1994, p. 43) Juntamente com os aspectos biológicos identificamos a importância da cultura para a definição de uma inteligência pois torna possível examinar a maneira como as capacidades humanas se desenvolvem quando são inseridas em determinado ambiente e as capacidades que uma sociedade irá valorizar. Além do aspecto biológico de inteligência e a interferência da cultura, ele também 23 afirmou alguns pré-requisitos para a definição das sete inteligências básicas de sua teoria, publicadas em 1983, onde: 1. Uma inteligência deve proporcionar um conjunto de habilidades para resolver problemas ou dificuldades, que capacite o indivíduo a criar produtos através das situações problemas; 2. Deve apresentar o potencial para encontrar ou criar problemas que o leve a adquirir conhecimento; Estas duas primeiras representam o esforço de Gardner por considerar o aspecto cultural na qual a inteligência está envolvida, entendendo também que estes produtos que serão produzidos irão diferir grandemente um do outro, já que as culturas humanas são tão diferentes e que o conhecimento produzido em um contexto cultural pode ser pouco importante em outro contexto. Dessa forma, a inteligência também deve ser: 3. Útil e importante em diferentes cenários culturais, ou seja, deve captar uma gama razoavelmente completa dos tipos de competência valorizados pelas culturas humanas. Além dos pré-requisitos, Gardner aponta também oito critérios para a definição de uma inteligência, sendo estes: 1- Ser isolável em casos de lesão cerebral; 2- Deve ser desenvolvida em autistas “eruditos”, prodígios ou indivíduo excepcionais; 3-Basear-se em uma (ou mais) série de operações identificáveis; 4-Atingir níveis diversos de competência identificáveis em todo indivíduo; 5- Ter história evolutiva plausível; 6- Ser apoiada por dados da psicologia experimental; 7- Ser apoiada por provas de psicometria; 8- Ser codificável em um sistema de símbolos. (GARDNER, 2000) Dessa forma, sete inteligências foram identificadas em 1983 e são elas: linguística, musical, lógico-matemática, espacial, corporal-cinestésica, intrapessoal e interpessoal e uma por último inserida, a inteligência naturalista. Deste modo, estas oito inteligências não são colocadas por Gardner como finalizadas pois o mesmo afirma que podem existir outras inteligências: Torna-se necessário dizer, de uma vez por todas, que não há e jamais haverá uma lista única, irrefutável e universalmente aceita de inteligências humanas. Jamais haverá um rol mestre de três, sete ou trezentas inteligências que possam ser endossadas por todos os investigadores. (GARDNER, 1994. p. 7) 24 Gardner estava certo ao evidenciar a existência de outras inteligências, pois atualmente cogita-se a possibilidade da inserção de mais uma inteligência que está sendo discutida e por mais que em diversos livros já se lida com a mesma, o autor das IM não definiu efetivamente como sendo uma inteligência de sua teoria, conforme a citação a seguir: A inteligência existencial ainda não pode ser integralmente acrescentada às oito estudadas por Howard Gardner e sua equipe. Em uma palestra proferida por este cientista em São Paulo, ele a mencionou como uma “meia- inteligência”, não lhe atribuindo um valor menor do que têm as outro oito, mas querendo afirmar que os atributos inerentes às demais inteligências, e que comprovariam sua existência, ainda não haviam sido plenamente alcançados pela pesquisa sobre a inteligência existencial. (ANTUNES, 2008, p. 185) Gardner, após o seu estudo complexo, juntamente com outros pesquisadores da Universidade Harvard definiu uma forma menos mística de tratar a inteligência e por meio do conceito que abordou criou uma espécie de mapa que agrupa as capacidades humanas em oito categorias ou inteligências, onde a maioria dos seres humanos podem desenvolve-las, sejam eles talentosos ou inteiramente normais que não possuem nenhum talento especial em alguma das inteligências. Tendo feito uma breve apresentação sobre a teoria, a partir daqui detalharemos cada uma: 1. Inteligência linguística: Conforme vimos no capítulo 01, as áreas evidenciadas nos testes de QI eram as de linguagem e lógico-matemático, e por muito tempo foram tidas assim. Gardner, não as desconsiderou, pois de fato são as que mais facilmente identificamos em nosso dia a dia. Podemos caracterizar esta inteligência como a capacidade de usar as palavras de forma efetiva, seja oralmente ou por meio da escrita. Vejamos a seguir: [...] vê-se em funcionamento com especial clareza as operações centrais da linguagem. Uma sensibilidade ao significado das palavras, por meio do qual o indivíduo aprecia as sutis nuances de diferença entre derramar tinta “intencionalmente”, “deliberadamente” e “de propósito”. Uma sensibilidade à ordem entre as palavras – a capacidade de seguir regras gramaticais e, em ocasiões cuidadosamente, violá-las. Num nível um tanto mais sensorial – uma sensibilidade aos sons, ritmos, inflexões e metros das palavras – aquela habilidade que pode tornar belo de ouvir até mesmo um poeta em uma língua estrangeira. E uma sensibilidade às diferentes funções da linguagem – seu potencial para entusiasmar, convencer, estimular, transmitir informações ou simplesmente agradar. (GARDNER, 1994, p. 60) Os aspectos centrais do conhecimento linguístico destacados por Gardner e que são 25 muito importantes em nossa sociedade são a capacidade de usar a linguagem para convencer outros indivíduos a tomarem uma decisão diferente da primeiramente pensada, de mesmo modo a capacidade de ajudar a lembrar informações que são importantes em diferentes situações, também o seu papel na explicação que é fundamental às instruções e explicações e por último seu potencial para explicar suas próprias atividades (GARDNER, 1994). Esta inteligência é também a mais ampla e mais democraticamente compartilhada na espécie humana (GARDNER, 1994), entretanto, ela está evidenciada e bem desenvolvida nos contadores de história, oradores, políticos, editores, jornalistas e principalmente nos poetas, como Gardner cita constantemente ao falar desta inteligência. O desenvolvimento desta inteligência se dá da seguinte forma: Os sinais de desenvolvimento da inteligência linguística surgem nos primeiros meses de vida, com o balbucio da criança, por volta do início do segundo ano, a actividade linguística envolve a pronúncia ocasional de certas palavras (como mãe, papa, etc.), e mais tarde de pares de palavras. A criança de três anos pronuncia já sequências mais complexas, incluindo perguntas, negações e frases com orações subordinadas. Por volta dos 4 ou 5 anos, as crianças já corrigem falhas sintáticas menores e são capazes de falar com uma fluência bastante próxima da do adulto. Nesta idade são já capazes de recorrer a figuras de estilo, narrar pequenos contos, inventar personagens, alteraro registo da fala, e praticar análise metalinguística (“o que é X?”). O desenvolvimento desta inteligência ocorre duma forma tão rápida e precisa, e aparentemente com relativa autonomia face ao desenvolvimento de outras habilidades de resolução de problemas, o que parece apontar para uma predisposição genética, para a existência de um esquema a priori de natureza biológica. (RODRIGUES, 2013, p. 19 e 20) A cultura é forte influenciadora da versatilidade que encontraremos, visto que as culturas nos oferecem diferentes modos de vê-la e compreendê-la, aliás, como em todas as inteligências, a cultura é com certeza o ponto principal de Gardner, ou seja, encontraremos nas diferentes culturas do universo, maneiras diferentes de valorização da linguagem. Um exemplo dessa multiforme da linguagem é em casos como no sul dos Estados Unidos ou em diplomados de escolas públicas da Inglaterra, onde são realizados treinamentos para retórica política ainda na infância (GARDNER, 1994). No aspecto da neuropsicologia, profundamente estudada por Gardner, pode-se identificar que a área do cérebro responsável pela linguagem é o Centro de Broca, que recebe este nome pelo neurologista francês Paul Broca que observou em um paciente quase totalmente incapaz de falar e ao mesmo tempo tinha uma lesão nos lobos frontais, o que gerou questionamentos sobre a existência de um centro da linguagem no cérebro, e a área de 26 Wernicke, denominada assim pelo nome do Neurologista Karl Wernicke que foi capaz de identificar que lesões na superfície superior do lobo temporal, entre o córtex auditivo e o giro angular, também prejudicariam a fala (VAZ & RAPOSO, 2002). 2. Inteligência lógico-matemática: Gardner aponta que o desenvolvimento desta capacidade no indivíduo pode ser percebido desde muito cedo como Piaget relatou. Piaget teve o pensamento lógico-matemático como principal objeto de estudo, juntamente com a linguagem, e acreditava que este conhecimento, bem como os demais, vinha através das ações sobre o mundo, por isso seus estudos observavam desde o berço até o completo desenvolvimento das capacidades no indivíduo. Sobre o desenvolvimento do conhecimento lógico-matemático observou fatos que levavam a consolidação da lógica e da matemática como quando o bebê explora seus objetos tais como, chupetas, chocalhos, móbiles ou xícaras, e percebe como cada objeto reage a cada circunstância, porém, o bebê lida com estes objetos no devido momento e quando estes não estão mais a sua vista é como se o objeto não mais existisse para eles, e só após os 18 meses que o bebê passa a adquirir a consciência que Piaget chama de permanência de objeto, onde o mesmo passa a perceber da existência dos objetos longe de sua vista. E logo após essa fase, a criança passa a perceber a similaridade dos objetos e passa então a agrupá-los em seus respectivos grupos; chupetas com chupetas, carrinhos com carrinhos e etc., e mais adiante percebe que além desse agrupamento é necessário dar um aspecto quantitativo a estes objetos, já diferenciando o pequeno do grande, o muito do pouco, e assim por diante. Passada essa fase até os quatro ou cinco anos, a criança aprende a contar mecanicamente e daí em diante é capaz de criar a relação dos números que menciona mecanicamente com uma determinada quantidade de objetos, sabe por exemplo que se apontar para um único objeto, ele corresponderá ao número um. E por fim, a partir dos seis ou sete anos de idade chegou ao nível de jovem futuro matemático de Piaget, pois é capaz de distinguir as classes e a quantidade pertencente a cada uma. (GARDNER, 1994) Resumindo o que essa inteligência significa; ela é a capacidade de utilizar os números de forma efetiva e a capacidade de raciocinar bem. Além disso, essa inteligência torna capaz de identificar os problemas e gerar soluções para eles. Esta inteligência baseia-se na capacidade lógica e matemática, assim como a capacidade de raciocínio científico ou indutivo, embora processos de pensamento dedutivo também estejam envolvidos. Esta inteligência envolve 27 a capacidade de reconhecer padrões, de trabalhar com símbolos abstratos (como números e formas geométricas) assim como discernir relacionamentos ou então ver conexões entre peças separadas ou distintas. Relaciona-se, também, à capacidade de manejar habilmente longas cadeias de raciocínio, elaborar perguntas que ninguém fez, conceber problemas e leva-los a diante. (SOUSA, 2011, p. 10) Diferente do que muitos acreditavam e continuam a acreditar, Gardner não apontou o conhecimento lógico-matemático como superior e reconheceu inclusive que ela deve ser considerada uma, entre as diversas inteligência e quanto a presença da lógica nas outras inteligências, explicou que essa lógica presente nas demais inteligências operam sobre suas próprias regras. Esta é geralmente uma inteligência típica dos matemáticos, contadores, estatísticos, cientistas ou programadores de computador e a área do cérebro responsável pela inteligência lógico-matemático é o Centro de Broca. (TRAVASSOS, 2001), hemisfério direito do cérebro onde é responsável pela categorização e pelas relações espaciais quantitativas (LENT in: APOSO & VAZ, 2002). 3.Inteligência espacial: Essa inteligência implica-se a ser capaz de criar um mundo visual e espacial e, além disso, poder manobrá-lo. Quanto as capacidades centrais desta inteligência, estão: As capacidades de perceber o mundo visual com precisão, efetuar transformações e modificações sobre as percepções iniciais e ser capaz de recriar aspectos da experiência visual, mesmo na ausência de estímulos físicos relevantes. (GARNDER, 2001, p. 135) Semelhantemente à inteligência lógico-matemática, Piaget também falou do desenvolvimento da noção de espaço em crianças, relatando sobre a compreensão sensório- motor do espaço que é evidente na primeira infância. Dentre o desenvolvimento dois fatores são centrais: a apreciação inicial das trajetórias observadas em objetos e a capacidade de se orientar em várias localidades (GARDNER, 1994). Esta é uma inteligência dos marinheiros, engenheiros, cirurgiões e no sentido visual os designers de interiores. A área do cérebro onde está localizada a inteligência espacial é o Hemisfério direito, onde se orienta em determinado local, se reconhece os rostos e cenas etc. (GARDNER, 1994). 4. Inteligência Corporal Cinestésica: É a capacidade de utilizar o corpo para expressão de sentimentos ou ideias, e está relacionada ao movimento físico e ao conhecimento do corpo, 28 sendo esta uma característica marcante dos atores, dançarinos, atletas ou mímicos. Sobre as características dessa inteligência podemos ver que; Característica dessa inteligência é a capacidade de usar o próprio corpo de maneiras altamente diferenciadas e hábeis para propósitos expressivos assim como voltados a objetivos: estes que vemos quando Marceu – o mímico – finge correr, subir no trem ou carregar uma maleta pesada. Igualmente característica é a capacidade de trabalhar habilmente com objetos, tanto os que envolvem movimentos motores finos dos dedos e mãos quanto os que exploram movimentos motores grosseiros do corpo [...]. (GARDNER, 1994, p. 161) No desenvolvimento desta inteligência é preciso pensar que desde a infância ela precisa ser trabalhada, e ainda que “cada cultura possui seu jeito próprio de preservar esses recursos expressivos do movimento, havendo variações na importância dada às expressões faciais, aos gestos e às posturas corporais, bem como nos significados atribuídos a eles” (BRASIL, 1998, p. 20). O domínio dessa inteligência está localizadono hemisfério esquerdo (TRAVASSOS, 2001). As crianças dotadas desta capacidade se desenvolvem com facilidade nas áreas de esportes, danças e rapidamente se envolvem quando o assunto são atividades que precisam se movimentar. 5. Inteligência Musical: Essa capacidade se caracteriza por saber distinguir, transformar, e expressar formas musicais, ou seja, há uma grande sensibilidade em relação a tudo que envolve música. “Trata-se de um potencial que revela a capacidade do indivíduo de aprender sons e ritmos e de interpretá-los, concebendo novos contornos melódicos com arranjos musicais.” (BRENNAND & VASCONCELOS, 2005, p. 31) Os componentes centrais da música são precisamente o tom, o ritmo e o timbre. Estes componentes trouxeram a seguinte indagação: Qual o papel da audição na definição da música? A resposta é clara quanto a dois componentes destes; o tom e o timbre, onde a audição é imprescindível para estes componentes, mas o componente rítmico foi o acesso encontrado por aqueles que perderam sua audição para contemplarem a música. Nestes componentes percebemos também a cultura como evidência [...] o tom que é mais central em determinadas culturas – por exemplo, as sociedades orientais que fazem uso de pequenos intervalos de quarto de tom, enquanto o ritmo é correlativamente enfatizado na África do Sul onde as 29 proporções rítmicas podem atingir uma complexidade métrica vertiginosa. (GARDNER, 1994, p. 82) Ou quando encontramos a música sendo valorizada em diferentes formas e representada de diferentes maneiras como as culturas que variam tanto em nosso globo. Para a maioria dos contextos a música é a representação de seus gostos, suas comidas, sua religião, e sua forma de viver, ou seja, é comunicadora importante de sua cultura. Outro aspecto dessa inteligência é o encontro das emoções que é capaz de transmitir, dentre as inúmeras relações que a mesmo pode ter com outros contextos de estudo as implicações emocionais são com certeza a forma mais marcante identificada, pois qualquer um que se envolva com a música, seja como músico, compositor ou apenas ouvinte da música, pode nos contar uma experiência que teve com a mesmo se tratando de suas emoções. Talvez em um momento de tristeza profunda onde uma música foi capaz de animar, ou de trazer ainda mais intensidade ao sentimento de tristeza, ou em um filme onde a música foi capaz de intensificar a cena, mas além disso, a música por si só é capaz de trazer sentimentos sem que não estivéssemos nem mesmo pensando naquele determinado sentimento. Ao tentarmos identificar essa inteligência logo percebemos que a música é presente na vida de todas as pessoas e em diferentes formas, não é preciso olhar para um indivíduo superdotado na área da música para percebê-la pois, qualquer indivíduo é capaz de perceber um elemento da estrutura musical, ou quando algo saiu fora do campo rítmico, melódico ou harmônico que se imaginava. Basta olhar para as pessoas presentes em um evento em que a banda toca e de repente um componente da banda deixa escapar um acorde errado, as pessoas rapidamente olharão atônitas entendendo que algo saiu errado. A música tem ainda uma relação entre a linguagem, muito discutida por outros autores, seja a linguagem escrita e falada, ou a linguagem corporal; a relação da linguagem escrita ou falada deve-se ao fato de que da mesma forma a música não necessita de objetos físicos no mundo, havendo apenas uma exploração dos canais oral e auditivo, quanto a linguagem corporal basta apenas tentar imaginar uma dança sem a presença da música, não tentando considerar que esta não seja possível, mas que com certeza identificaríamos a falta de algum elemento e certamente será a música (GARDNER, 1994). Gardner (1994) usou o compositor como expressão eficiente do desenvolvimento da música, mas a encontramos também nos cantores, músicos e maestros. Para falarmos do desenvolvimento desta inteligência nos seres humanos é preciso pensar desde o bebê e sua propensão a música até depois do amadurecimento para o autor, as crianças “normais” quando 30 ainda bebês, cantam e balbuciam emitindo sons individualmente, produz padrões ondulantes e são capazes de imitar padrões prosódicos e sons cantados por outros com precisão melhor do que aleatória. Os bebês têm predisposição para captar estes aspectos da música – sendo mais sensíveis às propriedades centrais da fala – podem também engajar-se em brincadeiras com som com propriedades generativas ou criativas. A partir de meados do segundo ano de vida as crianças são capazes de efetuar uma transição em suas vidas musicais, pois começam, por conta própria, primeira vez a emitir uma seriação de sons pontilhados explorando diversos intervalos pequenos. Inventam músicas de forma espontânea e começam a produzir pequenas ações (“trechos característicos”) de músicas familiares ouvidas em torno delas. Quanto a isso, Gardner afirma ainda que: Durante um ano aproximadamente, há uma tensão entre as músicas espontâneas e a produção de “trechos característicos” de melodias familiares; mas por volta da idade de três ou quatro anos as melodias da cultura dominante vencem e a produção de músicas espontâneas e brincadeiras de sons exploratórios em geral desaparece. [...] Exceto entre crianças com talento musical incomum ou oportunidades excepcionais, há pouco desenvolvimento musical adicional após o início dos anos escolares. Certamente, o repertório musical expande e os indivíduos podem cantar músicas com maior precisão e expressividade. Há também um conhecimento sobre música, pois muitos indivíduos tornam-se capazes de ler música, de comentar criticamente interpretações e de empregar categorias musicais-críticas. [...] Pode-se postular um padrão do crescimento para o jovem músico. Até a idade de oito ou nove anos, a criança procede com base em puro talento e energia: ela aprende peças prontamente devido ao seu ouvido musical sensível e memória, é aplaudida por sua habilidade técnica, mas essencialmente não dispende esforço indevido. Um período de construção de habilidade mais sustentada inicia por volta dos nove anos aproximadamente, quando a criança deve começar a praticar com seriedade, até mesmo na medida em que isto pode interferir no seu desempenho escolar e nas suas amizades; Isso pode, de fato, ocasionar uma “crise” inicial quando a criança começa a perceber que outros valores terão que ser suspensos caso ela deseje seguir sua carreira musical. A segunda e mais central crise ocorre no início da adolescência. Além de confrontar o choque entre maneiras figurativas e formais de conhecer, o jovem deve perguntar se ele realmente deseja dedicar sua vida à música. (GARDNER, 1994, p. 87) O desenvolvimento da habilidade musical acontece no decorrer da vida de cada pessoa, como vimos acima. O incentivo e a inserção do indivíduo em um contexto musical desde a infância, sejam de estudo ou de uma família voltada para a música, são importantes mas, há uma fase na vida de cada pessoa que irá requerer uma decisão pessoal quanto ao envolvimento mais sério com a música e o amadurecimento desta habilidade como uma opção profissional ou não. 31 A localização da habilidade musical no cérebro humano está normalmente no hemisfério direito mais especificamente nos lóbulos temporal. (GARDNER, 1994). Agora vamos conhecer a sexta Inteligência da teoria de Gardner. 6. Inteligência Interpessoal: A capacidade de perceber e saber diferenciar as intenções humanas, seus sentimentos, suas motivações, ou seja, a capacidade de compreender o ser humano. A inteligência Interpessoal também permite a comunicação unscom os outros de maneira eficaz, criando relacionamentos saudáveis e liderando grupos por essa característica de se importar com o outro. A inteligência interpessoal está baseada numa capacidade nuclear de perceber distinções entre os outros; em especial, contrastes em seus estados de ânimo, temperamentos, motivações e intenções. Em formas mais avançadas, esta inteligência permite que um adulto experiente perceba as intenções e desejos de outras pessoas, mesmo que elas os escondam. (GARDNER, 2000, p. 27) Em pesquisas sobre o cérebro, os lobos frontais parecem desempenhar um papel muito importante na inteligência interpessoal (GARDNER, 2000). Ao olharmos na sociedade, podemos notar essa inteligência evidente em líderes políticos ou religiosos, líderes de projetos sociais, professores, terapeutas ou conselheiros. Nas crianças é possível perceber que se envolvem com liderança naturalmente em sala de aula, além de organizar e se relacionar com facilidade. 7. Inteligência Intrapessoal: Essa inteligência é muito característica de pessoas tímidas, que basicamente estão voltadas para si, e tem uma autoimagem muito precisa de si mesmo, ou seja, ela conhece seus próprios sentimentos, humores, intenções e motivações, é exatamente o contrário da inteligência interpessoal. Mais explicitamente relatando, a inteligência intrapessoal é: [...] o conhecimento dos aspectos internos de uma pessoa: o acesso ao sentimento da própria vida, a gama das próprias emoções, à capacidade de discriminar essas emoções e eventualmente rotulá-las e utilizá-las como uma maneira de entender e orientar o próprio comportamento. A pessoa com boa inteligência intrapessoal possui um modelo viável e efetivo de si mesma. (GARDNER, 2000, p. 28) Quanto à localização no cérebro, os lóbulos frontais desempenham um papel central semelhantemente a inteligência interpessoal. Quando se trata do senso do eu, há uma fusão das inteligências pessoais; inter e intrapessoal que representa “um símbolo que representa todos 32 tipos de informações sobre uma pessoa e é, ao mesmo tempo uma invenção que todos os indivíduos constroem para si mesmos” (GARDNER, 2000, p. 29) 8. Inteligência Naturalista: Esta foi inserida em 1995 por último e podemos dizer que grande parte das crianças tem esta bem desenvolvida em si, pois elas têm imenso prazer em desvendar a natureza e sua numerosa classificação. Sendo assim, ficam claras as atividades que as crianças desta inteligência têm o desejo de se envolver, atividades como; passeio no campo, acampamentos e analogias a animais. Esta inteligência passou a ser considerada inteligência propriamente dita por Gardner, com base nas experiências de sobrevivência vividas pelos primeiros humanos, da qual dependia do reconhecimento das plantas nocivas ou não, clima, e recursos alimentares (CAMPBELL, CAMPBELL & DICKINSON, 2000). Atualmente, identificamos o super desenvolvimento desta inteligência nos biólogos, botânicos, zoológicos ou entomologistas. Após discussão acerca das oito inteligências, é importante ressaltar que a Inteligência existencial foi recentemente cogitada como inteligência, mas ainda não adicionada por Gardner a esta teoria, porém para que compreendamos um pouco sobre o que se trata e a importância que teria se fosse inserida nesta teoria é preciso abordar um pouco mais. Não foi possível obter detalhes sobre o progresso de inserção desta inteligência, mas está disponível em revistas, artigos e livros eletrônicos ou não, esta é ainda tratada como “meia inteligência”, porém foi bem discutida em vários países por meio do livro “As Inteligências Múltiplas ao redor do mundo” que reuniu diversos autores falando da colaboração das IM em diferentes países.1 Zhilong Shen, um dos autores ao falar sobre as inteligências múltiplas na China, diz que “até agora, Gardner mantém suas oito inteligências e meia. As oito são bem conhecidas, mas a ‘meia’, a inteligência existencial, quase foi esquecida por várias pessoas em todo o mundo, inclusive os chineses. Contudo, eu a considero uma séria candidata a inteligência. ” (SHEN apud GARDNER, 2010, p. 76) Esta inteligência se trata dos questionamentos do ser humano em relação a sua própria existência; o significado da vida e da morte, qual o destino dado após a morte, de onde viemos, ou simplesmente a busca por respostas sobre o impacto forte que recebemos quando sentimos 1 O livro “As Inteligências Múltiplas ao redor do mundo” (2010), é organizado por Gardner e investiga de que maneira as ideias do mesmo são utilizadas em diferentes lugares do mundo da Ásia á Europa e que significados elas produzem em diferentes contextos culturais, principalmente na área da educação. Este livro reúne 41 autores, relatando as experiências de diferentes lugares do mundo constatando a importância da teoria. 33 cada sentimento. Ou seja, trata-se da indagação interna que cada um de nós possui e que com certeza, após os estudos desenvolvidos a respeito desta inteligência os trabalhos e intervenções ocorrerão na educação ou fora dela. Embora as oito inteligências não possam ser determinadas como únicas, as mesmas foram suficientes para que uma nova teoria a respeito da inteligência fosse adotada, trazendo um sentido mais amplo sobre o cognitivo humano, refletindo também sobre os equívocos considerados nas teorias anteriores e como os mesmos interferiam no desenvolvimento melhor das capacidades do indivíduo, visto que os mesmos nem sempre se encaixarão no padrão colocado pelos representantes políticos e/ou pela escola, consequentemente pela sociedade, onde a família se apropria e torna o indivíduo uma vítima do significado deturpado de inteligência. Sobre isso, Gardner declarou em seu livro como o estímulo às inteligências de cada ser humano e a combinação que pode existir entre elas são tão importantes, e tem tanto a ver com o desenvolvimento da sociedade já que o ser humano se capacita, melhora ou desenvolve para si e para a própria sociedade, como em sua citação a seguir: Se reconhecermos isso, penso que teremos pelo menos uma chance melhor de lidar adequadamente com os muitos problemas que enfrentamos neste mundo. Se pudermos mobilizar o espectro das capacidades humanas, as pessoas não apenas se sentirão melhores em relação a si mesmas e mais competentes; é possível, inclusive, que elas também se sintam mais comprometidas e mais capazes de reunir-se ao restante da comunidade mundial para trabalhar pelo bem comum. Se pudermos mobilizar toda a gama das inteligências humanas e aliá-las a um sentido ético, talvez possamos ajudar a aumentar a probabilidade da nossa sobrevivência neste planeta, e talvez inclusive contribuir para a nossa prosperidade. (GARDNER, 2000, p. 18) Sobre a teoria das inteligências múltiplas, Gardner afirma que: Esta teoria desafia a visão clássica da inteligência que a maioria de nós assimilou explicitamente (vivendo numa cultura com uma concepção forte, mas possivelmente circunscrita, de inteligência) [...] quer ou não a defesa das inteligências múltiplas específicas prove ser persuasiva, terei pelo menos reunido entre duas capas diversos corpos de conhecimento que até então viveram em relativa segregação. (GARDNER, 1994. p. 4-7). De modo ainda mais amplo o mesmo propõe que sua teoria ajude os representantes educacionais a compreender aquilo que os testes de QI não puderem identificar, e em outros contextos como aos antropólogos, políticos e demais profissionais Gardner desejou contribuir para que haja um interesse em estudar como estas competências agem em diferentes contextos culturais
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