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ACORDOS NOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZEND

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ACORDOS NOS JUIZADOS DA FAZENDA PÚBLICA
Erivan Laurentino de Medeiros Junior
Advogado da União. Especialista em Direito Público. Autor do livro Juizados Especiais Federais: Acordos Judiciais com a Administração pública. Campinas: LZN, 2004
Sumário:
1. Introdução. 2. Acordos nos Juizados Especiais da Fazenda Pública e a experiência da AGU junto aos Juizados Especiais Federais. 3. A natureza jurídica do acordo judicial 4. A construção do acordo nos Juizados da Fazenda pública 5. O ato administrativo de proposição do acordo 6. A margem legítima de transação 7. Dos direitos disponíveis do Autor 8. A indisponibilidade do interesse público e a transação legítima 9. Requisitos do ato administrativo na formação do acordo. 10. Conclusões
1 -Introdução
A Lei. 12.153/2009, de 22 de dezembro de 2009, criou os Juizados da Fazenda Pública, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios.
Os Juizados da Fazenda Pública vêm completar o Sistema de Juizados Especiais concebido a partir da Constituição Federal, artigo 98, inciso I, ao lado dos Juizados Especiais Criminais e Cíveis, além dos Juizados Especiais Federais.
O Sistema dos Juizados Especiais guia-se por princípios comuns da simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação, seja nas causas cíveis comuns, criminais ou contra a fazenda pública.
Quando Lei Nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito dos Estados e Distrito Federal, excluiu de sua competência as causas de interesse da Fazenda Pública.[2: Art. 3º O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, assim consideradas:(...)§ 2º Ficam excluídas da competência do Juizado Especial as causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, e também as relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.]
Somente após a adição do Parágrafo Único ao art. 98, da Constituição Federal, por meio da Emenda Constitucional nº 22, de 18 de março de 1999, que previu a criação de juizados especiais no âmbito da Justiça Federal, é que se abriu espaço legislativo para a adoção da sistemática dos Juizados Especiais nas causas de interesse da Fazenda Pública.
Em 12 de julho de 2001, foi promulgada a Lei 10.259 que instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal, competindo aos juizados cíveis julgar as ações em que figurassem como rés, a União, autarquias, fundações e empresas públicas federais, até o limite de 60 salários mínimos, salvo os casos expressamente excluídos pelo artigo 3º, § 1º, da própria Lei.
Como última etapa da instalação do Sistema dos Juizados Especiais, foi promulgada a Lei 12.153, de 22 de dezembro de 2009, que aplicou o Sistema dos Juizados Especiais às ações de Competência da Justiça Estadual, em que figurem como ré a Fazenda Pública dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios. 
A Lei 12.153/2009 adota procedimento quase idêntico ao dos Juizados Especiais Federais, apontando a conciliação como meio prioritário para a solução dos conflitos.
É sobre a previsão da resolução consensual de conflitos com Fazenda Pública que este artigo se dedicará, tendo por parâmetro a experiência e orientações da Advocacia-Geral da União sobre o tema, com o expresso objetivo de indicar subsídios para a atuação das procuradorias dos demais entes federados.
Em seguida, o artigo adentrará no exame científico-doutrinário do acordo a ser realizado nos Juizados da Fazenda Pública, com objetivo de traçar os contornos jurídicos básicos deste contrato, abordando sua natureza jurídica, as etapas do juízo discricionário do representante da Fazenda Pública, a atuação do princípio da supremacia do interesse público, margem de legitimidade de negociação e os requisitos do acordo.
2 -Acordos nos Juizados Especiais da Fazenda Pública e a experiência da AGU junto ao Juizados Especiais Federais
O artigo 8º, da Lei 12.153/2009 prevê a possibilidade de conciliação, transação e desistência por parte dos representantes judiciais dos réus, nos termos e nas hipóteses previstas na lei do respectivo ente da Federação.[3: Art. 8o  Os representantes judiciais dos réus presentes à audiência poderão conciliar, transigir ou desistir nos processos da competência dos Juizados Especiais, nos termos e nas hipóteses previstas na lei do respectivo ente da Federação.]
Este Artigo reproduz a redação central do artigo 10, Parágrafo Único, da Lei no 10.259, de 12 de Julho de 2001.[4: Art. 10. As partes poderão designar, por escrito, representantes para a causa, advogado ou não.Parágrafo único. Os representantes judiciais da União, autarquias, fundações e empresas públicas federais, bem como os indicados na forma do caput, ficam autorizados a conciliar, transigir ou desistir, nos processos da competência dos Juizados Especiais Federais]
Ao dispor que a atividade de conciliação se dará, “nos termos e nas hipóteses previstas na lei do respectivo ente da Federação.”, o artigo 8º não o faz com a intenção de restringir tal atividade, mas sim em obediência à divisão de competências legislativas concorrentes estabelecida na Constituição Federal, preservando o princípio do Estado Federativo.
A Lei 12.153/09 não constitui apenas Lei Federal, mas sim uma Lei Nacional, que impõe a instalação dos Juizados Estaduais da Fazenda Pública. Tal Lei foi editada no exercício da competência exclusiva da União para legislar sobre Direito Processual estabelecida no artigo 22, inciso I da Constituição Federal. Daí porque se afirma que a Lei 12.153/09 não constitui apenas Lei Federal, mas sim uma Lei Nacional, que impõe a instalação dos Juizados Estaduais da Fazenda Pública.[5: Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;]
O artigo 24, inciso X, da Constituição Federal estabelece a competência concorrente, da União, Estados e Distrito Federal sobre a criação, funcionamento e processo dos Juizados Especiais. Desse modo, por tratar-se de competência concorrente, cabe à União o estabelecimento das normas gerais e aos Estados e Distrito Federal a edição da legislação suplementar. Portanto, não poderia a União adentrar a competência dos demais entes federativos, quanto à organização destes para fazer frente aos Juizados Especiais da Fazenda Pública.[6: Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: ... X - criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas;][7: CFRB Artigo 24, §§1º e 2º.][8: MADUREIRA, Claudio Penedo. RAMALHO, Lívio Oliveira. Juizados da Fazenda Pública. Salvador: juspodium, 2010, pag. 31-33]
Em sendo assim, os Estados e o Distrito Federal terão de alterar a Lei de Organização Judiciária, para efetivar a instalação definitiva dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, definitivamente, com estrutura própria de cargos; igualmente será necessária lei do ente federativo dispondo sobre a conciliação, transação e desistência nos processos de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública. 
Segundo o artigo 22, da Lei 12.153/09, os Juizados serão instalados no prazo de até 2 (dois) anos da vigência desta Lei, o que implica que as Leis para implantação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública devem ser editadas até 23/06/2012.
A propósito, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, através da Corregedoria Nacional de Justiça, editou o Provimento nº 7, de 7 de maio de 2010, que recomenda medidas de aprimoramento do Sistema dos Juizados Especiais, visando a emprestar um regramento mínimo uniforme e eficiente a todos os juizados dos entes federados. 
O Provimento nº 7 do CNJ traz anexas minutas do Projeto de Lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo do ente federativo, que dispõe sobrea conciliação, transação e desistência nos processos de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, ao lado da minuta da Lei Estadual, de iniciativa do Poder Judiciário, que deve criar os Juizados Especiais da Fazenda Pública.
Em citada minuta de projeto de lei sobre a conciliação, o CNJ, não prevê nenhuma limitação aos procuradores, que não o valor limite de competência dos Juizados, de 60 salários mínimos.
Na edição da Lei do ente federativo que deve regulamentar o poder de transação de seus representantes judiciais, há que se ter a prudência de não se vedar, na prática, a realização dos acordos, o que implicaria em inconstitucionalidade por descumprir a finalidade e o espírito das normas que disciplinam os Juizados Especiais.
O legislador do ente federativo há considerar que já há previsão no artigo 23, da Lei 12.153/09, de que a competência dos Juizados Especiais poderá ser limitada pelos Tribunais de Justiça, por até 5 anos, a partir da entrada em vigor da Lei 12.153/09, ou seja, até 23 de junho de 2015.[9: Art. 23.  Os Tribunais de Justiça poderão limitar, por até 5 (cinco) anos, a partir da entrada em vigor desta Lei, a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, atendendo à necessidade da organização dos serviços judiciários e administrativos.a partir de 23 de junho de 2010, os Tribunais de Justiça podem limitar durante 5 anos a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (de acordo com a necessidade da organização dos serviços judiciários e administrativos), logo, até 23 de junho de 2015.]
A maioria dos Tribunais que já instalaram os Juizados da Fazenda Pública, salvo o de Rondônia, estão restringindo, provisoriamente, a competência, que se ampliará gradualmente no mesmo passo da estruturação física necessária.
O Tribunal de Justiça de São Paulo excluiu da competência dos Juizados da Fazenda Pública as ações que tenham como fundamento qualquer penalidade decorrente de infrações de trânsito (multas, pontuação, apreensão de veículos, etc.); e qualquer demanda envolvendo créditos de natureza fiscal.[10: Tribunal de Justiça de São Paulo- PROVIMENTO Nº 1.768/2010
O CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA, no uso de suas atribuições legais e regimentais,
CONSIDERANDO a necessidade da fixação da competência para julgamento dos feitos de competência da Lei 12.153/2009, enquanto não instalados os Juizados Especiais da Fazenda
Pública,
CONSIDERANDO o decidido nos atos do processo no. 2010/56735,
RESOLVE:
Art. 1º - Para os fins do art. 23, da Lei 12.253/2009, ficam excluídas da competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública as ações que tenham como fundamento qualquer penalidade decorrente de infrações de trânsito (multas, pontuação, apreensão de veículo, etc.) e qualquer demanda envolvendo créditos de natureza fiscal.
]
O Tribunal de Justiça do Paraná limitou a competência não só quanto à matéria, mas também quanto ao valor da causa, estabelecendo que a competência abrangerá causas de até 40 salários mínimos. 
Quanto à matéria, nos Juizados da Fazenda Pública do Paraná, a competência estará reduzida às ações relativas a multas ou penalidades por infrações de trânsito; transferência de propriedade de veículos automotores, quando figurar no pólo passivo o Departamento de Trânsito (Detran); Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços e sobre Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) e Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). [11: Tribunal de Justiça do Paraná - RESOLUÇÃO Nº 10/2010 - Art. 2º. Considerando a necessidade de estudos aprofundados para atendimento da organização e adequação dos serviços judiciários e administrativos para acolhimento integral das matérias de competência estatuídas pela Lei n. 12.153/09, a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública do Estado do Paraná ficará limitada às causas no valor de até 40 (quarenta) salários mínimos relativas a:I – multas ou penalidades por infrações de trânsito;II – transferência de propriedade de veículos automotores, quando figurar no pólo passivo o Departamento de Trânsito (DETRAN).III – imposto sobre circulação de mercadorias e prestação de serviços e sobre transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação – ICMS e imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – IPTU. (http://portal.tjpr.jus.br/c/document_library/get_file?folderId=441513&name=DLFE-21314.pdf)]
Desse modo, os entes federativos lidarão com Juizados Especiais inicialmente mais restritos quanto à competência material matéria, de modo que a ampliação da matéria a ser tratada nos acordos será gradativa, possibilitando regramento razoável e prudente sobre o tema. 
Não pode o ente federativo legislar supletivamente de modo a contrariar a intenção legal e constitucional de que se propicie a resolução consensual de conflitos no âmbito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, o ente detém competência e discricionariedade sobre o tema, mas esta não é ilimitada.
Se assim dispuser estará contrariando um dos fundamentos do Sistema dos Juizados Especiais, previsto na Constituição Federal, que é o da conciliação. 
Quando os Juizados Especiais Federais começaram a funcionar, a audiência de conciliação causava perplexidade para os advogados públicos federais, pois ainda não havia nenhuma orientação oficial sobre a conduta a ser adotada pela Advocacia Pública quanto ao tema e eram ainda mais escassos os estudos doutrinários sobre o tema.
É este mesmo o desafio que agora se põe diante das Advocacias Públicas dos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios. No entanto, estas contam com a experiência de sucesso da Advocacia-Geral da União nos Juizados Especiais Federais, seus atos normativos e de orientação sobre o tema.
A experiência dos acordos nos Juizados Especiais Federais foi avaliada de forma positiva para a União, inclusive do ponto de vista econômico, o que catalisou o processo de atuação pró-ativa e conciliadora da Advocacia Geral da União.
 Tal processo resultou na extensão da competência para realização de acordos além do âmbito dos Juizados Especiais Federais, ampliando-se a previsão de acordos para todas as causas da União, conforme Lei nº 9.469/1997, com redação dada pela Lei nº 11.941/2009; bem como para as causas em que o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS seja parte, de qualquer rito.
A Resolução MPS/CNPS nº 1.303, de 26 de novembro de 2008 prevê que o Membro da Advocacia-Geral da União, com atuação direta na defesa, poderá celebrar acordos nas causas judiciais em que seja parte o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS., de qualquer rito, até o montante equivalente a sessenta salários-mínimos.[12: RESOLUÇÃO MPS/CNPS Nº 1.303, DE 26 DE NOVEMBRO DE 2008 - DOU DE 05/12/2008.]
Também foi criada a Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal - CCAF, órgão da Consultoria-Geral da União, foi criada pelo Ato Regimental nº 05, em 27 de setembro de 2007, para conciliar os interesses divergentes dos diversos órgãos e entidades da Administração Federal, e entre estes e a Administração Pública dos Estados e do Distrito Federal. A CCAF também atua para evitar a judicialização de novas demandas e encerrar processos já judicializados, pela via da conciliação.
Objetivando orientar a atuação dos órgãos da Advocacia Geral da União nas causas de trata a Lei 10.259/2001 o Advogado-Geral da União editou a Portaria nº 505, de 19 de junho de 2002, que foi revogada pela vigente Portaria AGU n° 109, de 30 de janeiro de 2007.
A Procuradoria Federal Especializada do INSS lançou, em 28 de julho de 2009, Manual de Conciliação que traz orientações gerais e específicas para a atuação dos procuradores federais em causa previdenciárias, uniformizando e incentivando a atuação conciliatória.
Até este ponto traçou-se uma visão geral dos Juizados da Fazenda Pública, destacando os temas atinentes à conciliação, buscando fazer referência aos subsídios elaborados pelo CNJ e pela AGU. 
Estabelecido este panorama geral, segue-se a análisedas questões centrais que este trabalho visa a examinar: a natureza dos acordos firmados, as etapas do juízo discricionário do representante da Fazenda Pública, a atuação do princípio da supremacia do interesse público, a margem de legitimidade de negociação e os requisitos do acordo. 
3 - A natureza jurídica do acordo judicial
Segundo a lição de Orlando Gomes dizer a natureza jurídica é determinar a localização de determinado instituto dentro do sistema jurídico.
Logo, quando se busca a natureza jurídica de um determinado instituto jurídico deve-se buscar seus elementos essenciais e como qualificá-lo dentro do Sistema Jurídico.
Como o artigo 8º, da Lei 12.153/09, usa os verbos conciliar, transigir e desistir, tem-se primeiro de buscar a natureza jurídica de conciliação, transação e desistência.
A conciliação, a mediação e a arbitragem são técnicas de resolução do conflito por meio do consenso, pela busca do acordo entre as partes. 
Logo, de modo genérico, o acordo resulta da convergência de interesses que extingue o conflito, podendo dar-se por uma das formas de autocomposição dos conflitos, quais sejam a transação, desistência ou sujeição.
Isto posto, ao dizer conciliar, a Lei 12.153/09 quis estabelecer que o representante da Fazenda Pública poderia chegar ao acordo por qualquer dos meios de autocomposição, convencendo a parte Autora a desistir da ação, submetendo-se à pretensão, ou seja, reconhecendo a procedência do pedido, ou por meio de transação. 
Já o poder de desistir mencionado não só no art. 8º da Lei 12.153/2009, mas igualmente no Artigo 10, da na Lei 10.251/2001, não pode se reportar ao sentido técnico-processual, pois quem desiste é o Autor. 
Tal expressão, dirigida aos representantes da Fazenda Pública, refere-se à desistência de algo que estes têm iniciativa. Por conseqüência, deve ser aplicada a competência para desistir à iniciativa dos Recursos. 
Examina-se agora o caso em que da conciliação resulte um acordo alcançado por meio de transação.
Caberá, mais uma vez, ao Mestre Orlando Gomes esclarecer as noções do Instituto. Segundo o civilista, a transação teria natureza de contrato, visto que este é negócio jurídico bilateral que visa não só a criar, mas também a modificar e extinguir obrigações. E com base nesta natureza conceitua-a da seguinte forma:“A transação é o contrato pelo qual mediante concessões mútuas, os interessados previnem ou terminam litígio, eliminando a incerteza de uma relação jurídica”. [13: GOMES, Orlando. Contratos. 17 ed. Rio de Janeiro: Forense. 1996. p 440. ]
O conceito se amolda magistralmente à transação efetuada perante o Judiciário, pois ao contrário dos outros civilistas, fixados na questão patrimonial, Orlando Gomes, clarifica a função da transação que é eliminar incertezas jurídicas, aduzindo que esta incerteza pode ser subjetiva. Assevera ainda que é essencial para sua caracterização a presença de concessões mútuas, posto que o reconhecimento integral do direito da outra parte não configura transação, como já foi referido.[14: Idem, Ibidem. p. 440]
Assim, quando a Fazenda Pública vai à audiência de conciliação e reconhece integralmente a pretensão do autor, não há que se falar em acordo ou em transação, a relação litigiosa chegou ao fim por reconhecimento integral do pedido, ato unilateral, independente da vontade da parte autora, que já a declarou em sua Petição Inicial. 
Nestes casos não há que se falar em acordo, negócio jurídico bilateral.
Da mesma forma se na Audiência de Conciliação a parte convence-se de que seu pedido não tem guarida legal e desiste da pretensão ajuizada, não há acordo, há uma declaração unilateral.
À vista do que foi exposto, findo o litígio por transação tem-se no respectivo acordo a natureza jurídica, dentro da Teoria Geral do Direito, de negócio jurídico bilateral, constituindo-se em contrato, que poderá ser bilateral ou unilateral quanto aos seus efeitos, ou seja, poderá gerar obrigações para ambas ou apenas para um das partes.
Isto posto, cumpre encontrar sua natureza jurídica dentro do Direito Administrativo.
O acordo que põe um fim consensual à lide nos Juizados Especiais da Fazenda Pública, dentro da classificação doutrinária dos Contratos da Administração, melhor se encaixa na categoria dos Contratos Privados da Administração. 
Isto porque, quando se trava a conciliação no Juizado Especial a Administração não está em posição de supremacia frente ao Autor, não conta com as prerrogativas das cláusulas exorbitantes, o que distancia o acordo nos Juizados dos Contratos Administrativos e o aproxima dos Contratos da Administração regidos predominantemente pelo Direito Privado.
Nos Juizados da Fazenda Pública o interesse público resulta adimplido diretamente do acordo, entretanto, não se admite que a Administração rescinda unilateralmente o Acordo, após sua homologação, por exemplo. 
Desta feita, embora o acordo nos Juizados vise a atender diretamente a interesse público, está regido, predominantemente pelas regras de Direito Privado. Sublinhe-se, que em relação à outra parte, a posição da Administração na conciliação é horizontal e não vertical, como se daria nos Contratos Administrativos propriamente ditos. 
Apesar de a relação negocial das partes ser regida predominante pelo Regime de Direito Privado, está também sujeita às derrogações essenciais de Direito Público, visto que, assim como os contratos de Direito Privado tratados no art. 62 da Lei 8.666/93, o acordo nos Juizado está adstrito à função administrativa, quanto à legalidade, forma, competência e finalidade, como adiante se esmiuçará.
4 – A construção do Acordo nos Juizados da Fazenda pública
A solução consensual do conflito entre particular e Administração Pública no Judiciário se dá por meio de ato jurídico formado complexamente pela atuação de diversos agentes, cujos atos estão sujeitos a regimes jurídicos diferentes e, portanto, apresentam naturezas diversas, as quais se condensam formando um ato único.
A decomposição de um determinado fenômeno em fatores ou momentos é um método lógico aplicado a todas as ciências e que será igualmente útil neste estudo.
Neste caso a formação complexa da solução consensual da lide pode ser dividida nos momentos básicos que seguem adiante descritos. 
No primeiro momento cabe ao procurador da entidade ré analisar o caso e verificar se há possibilidade jurídica de acordo, dentro dos limites do regime de Direito Público, pois sua decisão final de admitir a possibilidade de acordo e em que termos deve se dar dentro dos limites da função administrativa, da legalidade e da moralidade fundamentais a todo ato administrativo. 
Desta feita, o primeiro momento é o do ato administrativo discricionário do representante da Fazenda Pública que deverá, cotejando-se os elementos de prova com as normas aplicáveis ao caso, decidir se há ou não possibilidade de acordo, bem como os limites deste.
Quando o juízo do representante da Fazenda Pública conclui pela possibilidade de acordo e é exposta a proposta dentro dos limites legais, a parte Autora, sob regime de Direito Privado, resguardados os seus direitos indisponíveis, expressará sua vontade de aderir ou não à proposta. 
Caso a Parte Autora concorde com os termos apresentados pelo procurador da entidade-ré, firmar-se-á acordo. Firmado o acordo, após a homologação, este passará a ter a natureza jurídico-processual de sentença, entretanto, no plano do Direito Material, subsiste a natureza de Contrato da Administração.
Nas hipóteses em que a Fazenda Pública conclui que não há possibilidade de acordo ou em que a Parte autora não concorda com os termos propostos, não há solução consensual e a lide segue para a solução heterônoma do Juízo. 
Esta é uma descrição basilar do processo, para fins de estudo, que não exclui o diálogo do processo de conciliação, impondo às partes a avaliação do acordo frente aos argumentos e contra-argumentos lançados em audiência.
A seguir será aprofundado o estudo do processo de exame e decisão do representante da Fazenda Pública.5 - O ato administrativo de proposição do acordo
Quando o representante judicial da Administração Pública analisa os dados do processo judicial para verificar se há ou não possibilidade de acordo, ele está expedindo ato que, embora efetuado no âmbito de procedimento judicial, não deixa de ser um ato administrativo, com efeitos imputados à Administração, guiado em função do interesse público. 
Na lição de Hely Lopes de Meirelles, ato administrativo: 
"é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública, que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria."[15: MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 24 ed. São Paulo: Malheiros. 1999. p. 132.]
Com melhor referência à função do ato administrativo, cumpre buscar complemento do conceito em Celso Antônio Bandeira de Mello que assim o define:
Declaração do Estado, (ou de quem lhe faça as vezes – como, por exemplo, um concessionário de serviço público), no exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante providências jurídicas complementares da lei a título de lhe dar cumprimento, e sujeitas a controle de legitimidade por órgão jurisdicional.[16: BANDEIRA DE MELLO. Op. Cit. 1988. p. 251.]
No exercício de seu juízo discricionário sobre a possibilidade de acordo ou não, o representante judicial da Administração manifesta unilateralmente a decisão sobre a possibilidade ou não de solução consensual da lide, sendo que tal decisão tem por função cumprir a Lei, de modo completamente condicionado ao regime jurídico administrativo.
É relevante sublinhar que o juízo do advogado público ou preposto da Administração deve ser o de analisar se a situação fática exposta pelo Autor, juntamente com o conteúdo probatório, preenchem os requisitos legais, gerando-lhe o direito pretendido. 
Caso o juízo resulte em afirmação da pretensão do autor, há que se verificar, então, se o autor, na pretensão exposta em juízo não está indo além dos limites de seu direito subjetivo. O representante há que estabelecer qual a fronteira legal e legítima da pretensão, para nestes termos propor o acordo. 
Portanto, não há disposição do interesse público, o agente da Administração em juízo atua de forma a adimpli-lo, recompô-lo, seguindo a Lei.
A função administrativa restaria desatendida se o representante judicial, diante da convicção quanto ao direito do autor, da subsunção das provas à hipótese normativa, da existência de erro administrativo, se omitisse, insistindo no prosseguimento da lide, quando seu dever era o de propor a solução pacífica do conflito, dando, enfim, o cumprimento postergado à Lei. 
Não está o Autor obrigado a aceitar a proposta ou os limites que o representante judicial entende legais, mas, então, o dever do agente estará cumprido, visto que não pode compelir a Parte contrária a aceitar o acordo, nem poderá assinar acordo que desborde do Direito.
Na hipótese de o representante judicial da entidade ré entender que o Autor não preenche os requisitos legais para o atendimento da pretensão, aí então o dever administrativo será o de prosseguir na discussão judicial e defesa da legalidade.
6 – a margem legítima de transação
O Código Civil trata da transação estabelecendo em seu art. 840, que “é lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas.” [17: BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União.]
O aspecto da licitude das concessões mútuas é o que traz maior dificuldades ao estudo da transação em que figure a Administração Pública.
Ao comentar os requisitos e pressupostos da transação, Orlando Gomes, explica que não basta à parte ter capacidade de obrigar-se, faz-se necessário ter o poder de disposição sobre o objeto do contrato. [18: GOMES, Op. Cit. P 440 -441.]
Quanto ao objeto, por sua vez, existem os que não são passíveis de transação, como os direitos da personalidade, o estado da pessoa, embora seja possível transigir quanto aos interesses pecuniários vinculados ao estado de uma pessoa.
Sobre a disponibilidade dos direitos objeto da transação, o art. 841 do Código Civil, estabelece que “Só quanto a direitos patrimoniais de caráter privado se permite a transação.”[19: BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União]
No Direito Administrativo, simetricamente, vige o princípio da indisponibilidade do interesse público, que, segundo Celso Antônio:
“significa que sendo interesses qualificados como próprios da coletividade – internos ao setor público - não se encontram à livre disposição de quem quer que seja, por inapropriáveis. O próprio órgão administrativo que os representa não tem disponibilidade sobre eles, no sentido de que lhe incumbe apenas curá-los – o que é um dever – na estrita conformidade do que predispuser a intentio legis. 
... na administração os bens e interesses não se acham entregues à livre disposição da vontade do administrador. Antes, para este, coloca-se a obrigação, o dever de cura-los nos termos da finalidade a que estão adstritos. É a ordem legal que dispõe sobre ela.”[20: BANDEIRA DE MELLO. Op. Cit. 1998. p. 33.]
Pelo exposto, o estudo da conciliação por meio de transação com a Administração Pública passa necessariamente por três questões: pode o Particular dispor de seu direito; pode a Administração dispor de seu dever, e, em resposta afirmativa a qualquer dos casos há que se perquirir em que medida cabe a disposição.
O sistema dos Juizados Especiais tem por critério ontológico emprestar maior celeridade às causas de pequeno valor, que geralmente, são titularizadas por parcela mais carente dos administrados, o que importa em maiores dificuldades para suportar a mora do procedimento ordinário.
Todavia, a Lei não se fixa apenas no valor da causa para definir a competência, em seu art. 2º, § 1o  exclui algumas matérias da competência dos Juizados e o faz porque envolvem deveres fundamentais para a Administração ou direitos indisponíveis para o cidadão, bem como para evitar incompatibilidades procedimentais como se verifica no mandado de segurança, desapropriação e demais hipóteses, previstas nos três incisos do mesmo parágrafo primeiro. [21: Art. 2º, § 1o  Não se incluem na competência do Juizado Especial da Fazenda Pública:I – as ações de mandado de segurança, de desapropriação, de divisão e demarcação, populares, por improbidade administrativa, execuções fiscais e as demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos;II – as causas sobre bens imóveis dos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios, autarquias e fundações públicas a eles vinculadas;III – as causas que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou sanções disciplinares aplicadas a militares.]
Logo, a lista de exclusão de competência visa a garantir que direitos e deveres indisponíveis não sejam tratados no Juizado Especial, além de preservar o devido processo legal, mais hábil a curar estes direitos.
7 - Dos direitos disponíveis do Autor
Na lição de Orlando Gomes, no Direito Civil admite-se transação propriamente dita, quanto a direitos pecuniários vinculados ao estado da pessoa, mas nunca quanto ao direito principal.[22: GOMES, Op. Cit. p. 440-442.]
Basicamente o mesmo raciocínio aplica-se aos direitos públicos subjetivos dos cidadãos em relação à Administração Pública. 
Analisando-se apenas a disponibilidade dos direitos da pessoa de Direito Privado, aqui considerados aqueles que obrigam a Administração Pública, tem-se, em regra, que o direito subjetivo em si é inalienável por disposição de vontade. Todavia, os seus reflexos pecuniários, mesmo que inicialmente tenham caráter irrenunciável, quando se transformam em prestações vencidas, convertem-se em dívida de valor, de cunho econômico plenamente disponível. 
Em situação análoga, quanto ao direito de alimentos reconhece-seque o direito subjetivo in genere de obter alimentos não pode ser objeto de renúncia. No entanto, quando o devedor deixa de cumprir com obrigação alimentar e, após certo período volta a depositar suas prestações, o alimentando não terá outra via judicial, senão a execução por quantia certa genérica do Código de Processo Civil. 
Essa é a posição pacífica da Doutrina e da Jurisprudência, como testemunha Yussef Sahid Cahali: “Em relação aos alimentos pretéritos, é lícita a transação, porque teriam por fim sustentar o necessitado em época que já passou, cessada a razão da lei, a necessidade indeclinável.”[23: CAHALI, Yussef Sahid. Dos Alimentos. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998. p. 118.]
Da mesma maneira se dá nas prestações devidas pelo Poder Público aos indivíduos, com caráter indenizatório ou alimentar, como as de natureza previdenciária, decorrentes de contratos da Administração ou relativas a vencimentos de servidor público, por exemplo.
Pelo exposto, seria ineficaz cláusula de transação em que a parte autora concordasse em receber integralmente as prestações atrasadas e renunciasse ao direito ao benefício com efeitos futuros.
Este raciocínio se aplica à maioria das ações contra o Poder Público, no aspecto da disponibilidade do direito do Autor.
Isto posto, há que se analisar a função da Administração Pública frente à indisponibilidade do Direito Público, de modo a encontrar, sob inspiração dos Princípios Constitucionais, a interpretação mais apropriada para as concessões recíprocas que caracterizam a transação.
8 - A indisponibilidade do interesse público e a transação legítima
Historicamente, a indisponibilidade do interesse público já serviu de argumento para impedir o controle do mérito do ato administrativo e aviltar a dignidade humana nos regimes totalitários. 
De igual modo, o dito princípio já serviu para, retoricamente, excluir qualquer solução dialógica, consensual, entre a Administração e os cidadãos.
Como noticia Diogo Moreira Neto, este paradigma começou a ser superado por meio dos pioneiros estudos de Vittorio Emmanuele Orlando, em 1908 e de Francesco Carnelutti, em 1929, admitindo a figura do contrato de Direito Público.[24: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Novos Institutos Consensuais da Administração Pública , in Revista de Direito Administrativo Rio de Janeiro, v.231, p. 129-156, Jan./março 2003.]
A superação doutrinária do paradigma, entretanto, só foi possível por meio da teoria do duplo grau, de origem alemão, segundo a qual o exercício do poder poderia ocorrer em um nível primário (primäre Stufe) ou secundário (sekundäre Stufe), cabendo exclusivamente à esfera pública decisão primária de poder, enquanto a decisão secundária poderia, sob a influência do Direito Privado, ser negociada com vista à melhor atuação
No Direito Italiano, a mesma idéia desenvolveu-se como teoria Del doppio grado, adotada pela Doutrina Pátria, diferenciando interesse público primário de interesse público secundário. De modo que, o Interesse público Primário corresponderia ao interesse coletivo cuja finalidade do Estado é atingir, sendo portanto, absoluto, vinculado, inegociável; enquanto interesse público Secundário corresponderia ao poder estatal secundário, negociável, relativo e discricionário.
Pelo exposto, aplicando-se a distinção entre poder ou interesse público primário à solução consensual de conflitos com a Administração é que se define a possibilidade ou não da própria solução consensual e inicia-se a trilha para definição dos limites do que pode ser pactuado.
Não se pode ignorar, seja tratando-se de interesse público primário ou secundário, que a atuação administrativa é função de um dever constitucional e legalmente especificado.
Dessa forma, nas ações individuais, quando da análise da possibilidade de resolução consensual de uma demanda contra a Administração Pública no Judiciário, há que se perquirir sobre o que é de interesse público. É de interesse público e finalidade administrativa que sejam reconhecidos e outorgados tais direitos em sua exata medida, na forma legal. 
Não é de interesse público que o autor receba o que não lhe é devido. Mas também não é de interesse público que a Administração resista injustificadamente no Judiciário à concretização do direito subjetivo público do autor, que é a outra face do dever Administrativo que tem a função de curar.
A margem de transação da Administração é limitada, frente aos princípios que regem a atividade pública. Isto porque a Administração não pode renunciar a seus deveres, inclusive o de defender em juízo a aplicação do Direito que entende correta.
Também não é lícito que a Administração se aproveite de sua própria incompetência, que gerou a negação indevida do direito pleiteado, aliada à morosidade do Judiciário, para obter vantagens ou descontos no que era legalmente devido. 
Tal conduta violaria os princípios da supremacia do interesse público, da legalidade, da moralidade e à própria função pública, ou seja, não pode a Administração desviar-se de sua finalidade, muito menos em Juízo. 
O regime da legalidade, moralidade e finalidade que regem a atuação administrativa não pode valer apenas fora do Judiciário. Não pode a Administração desrespeitar o regime jurídico administrativo e buscar a vitória judicial a qualquer custo, contestando o incontestável, defendendo o ilegal, maculando sua finalidade pública.
Isto não quer dizer, porém, que não haja possibilidade real de transação, ou seja, de concessões mútuas, porque a Administração estaria sempre obrigada a reconhecer todo o direito devido. 
Na prática, há casos em que persiste uma margem de dúvida ou de divergência, um ponto que na avaliação da Administração o direito do autor não alcança. 
Tome-se, por exemplo, a discussão do valor correspondente aos prejuízos efetivamente sofridos e do custo de desmobilização de empresa que tenha rescindido contrato porque não houve liberação da área para execução do objeto do contrato, por parte da Administração, na forma do artigo 79, § 2º da Lei 8.666/93. 
O fato da não liberação da área pode ser inconteste, bem como o direito do contratado de ser ressarcido dos prejuízos sofridos, no entanto pode haver discussão sobre que prejuízos estão comprovados documentalmente, bem como se todos os danos alegados guardam pertinência com a rescisão.
Há margem de discussão ainda, por exemplo, nos casos em que se discute sobre a existência de mora da Administração, ou sobre o termo inicial da mora; bem como nos casos em que a conduta do autor concorre para o resultado administrativo, como quando traz documentos para a ação que não foram apresentados no procedimento administrativo; quando fez declarações que induziram o agente a erro; quando a fiscalização no local indica uma conclusão administrativa para a qual o interessado não opôs novos documentos ou declarações. 
Em todos estes casos há que se discutir que parcela da responsabilidade pode ser imputada à Administração e ao autor, entre outras hipóteses que a prática revela. 
Nas situações em que a dúvida ou divergência persistem, apesar dos esclarecimentos que o diálogo direto propicia, seja pela impossibilidade de prova, seja pelo custo do adiamento da audiência, cabe aceitar a renúncia pelo autor da porção duvidosa ou divergente, em prol dos princípios da economicidade administrativa e processual, da eficiência e da supremacia do interesse público.
Isso porque não há razoabilidade em exigir a prova de acessório, se a demora para a solução do conflito causaria maior prejuízo ou atraso indesejado pelo autor, não sendo lícito, por outro lado, que a Administração assuma o ônus de reconhecer a parcela do direito sobre a qual não há prova suficiente disponível nos autos.
9 - Requisitos do ato ADMINISTRATIVO na formação do acordo
Dentro da proposta deste estudo cumpre analisar, por fim, o acordo do ponto de vista do representante da Fazenda Pública, quanto ao exame de seus requisitos básicos perante o Direito Administrativo, são eles: competência, finalidade,forma, objeto e motivo.
9.1.1 - Competência
Para ser válido exige-se que o ato administrativo seja praticado por sujeito que disponha de competência, de autorização legal para isso. A competência sempre decorre da lei; é inderrogável, pois a competência é conferida em benefício do interesse público; pode ser objeto de delegação ou de avocação, desde que não se trate de competência conferida com exclusividade pela lei.
A Lei 12.153/2009, em seu art. 8º outorga aos representantes judiciais dos réus a competência para, no âmbito dos juizados especiais, conciliar, transigir ou desistir.[25: os Estados, o Distrito Federal, os Territórios e os Municípios, bem como autarquias, fundações e empresas públicas a eles vinculadas.]
Pela redação do 8º, para fins de conciliação, tanto os autores quanto os réus poderão ser representados por advogados ou não, mas para a atuação em atos privativos de advogados, como a interposição de recursos, por exemplo, o Ente haverá que se representar por advogado público.
A Portaria AGU n° 109, de 30 de janeiro de 2007, visando regulamentar a atuação dos advogados públicos no Juizado Especial Federal, dispôs em seu art. 3º:
Art. 3° A transação ou a não interposição ou desistência de recurso poderá ocorrer quando:
I - houver erro administrativo reconhecido pela autoridade competente ou, quando verificável pela simples análise das provas e dos documentos que instruem a ação, pelo advogado ou procurador que atua no feito, mediante motivação adequada; e
II - inexistir controvérsia quanto ao fato e ao direito aplicado.
§ 1° A inexistência de controvérsia quanto ao fato deve ser verificável pelo advogado ou procurador que atua no feito pela simples análise das provas e dos documentos que instruem a ação, e a inexistência de controvérsia quanto ao direito aplicado deve ser reconhecida pelo órgão consultivo competente, mediante motivação adequada em qualquer das situações.
A possibilidade de transação ou não interposição de recurso pode e deve ocorrer quando, após o diálogo entre as partes, inexistir controvérsia sobre fato e direito e/ou diante de reconhecimento de erro administrativo. 
A alternatividade do segundo requisito se impõe, porque verifica-se a possibilidade de a Administração ter indeferido a petição do Autor, sem incorrer em erro, quando a insuficiência de provas ou as declarações contraditórias do requerente, no procedimento administrativo, motivaram o indeferimento do pedido. 
Nestes casos, ante a inexistência de controvérsia, mesmo sem reconhecimento de erro administrativo, viabiliza-se a conciliação pelos esclarecimentos prestados pelo requerente e testemunhas, bem como pelas novas provas que traz aos autos espontaneamente ou mediante requerimento do representante da Fazenda Pública. 
No caso de erro administrativo causado por culpa do autor, cumpre avaliar improcedência da pretensão de pagamento de parcelas vencidas e juros de mora.
Quanto à competência não há que se perquirir sobre conflito de hierarquia administrativa no acordo judicial. 
A lide rompeu os limites administrativos, encontra-se agora sob apreciação do Judiciário, onde novas provas serão produzidas, o próprio ato administrativo está em vias de ser reformado pelo Judiciário, outorgando a lei uma competência ao representante judicial do ente público que não se encontra acima da competência do órgão recursal administrativo, mas depois e fora da instância administrativa, na esfera judicial.
O acordo porventura realizado pelo Advogado Público não substitui ou supre a instância administrativa, ele se dá em outra instância, na qual a atuação é de competência natural do Advogado Público.
O artigo 3º, § 3º, incisos I e II da Portaria AGU n° 109, de 30 de janeiro de 200, recomenda que não sejam realizados acordos nos casos de penalidades aplicadas a servidores públicos e casos de dano moral, salvo se o terceiro causador assumir em juízo a responsabilidade pelo pagamento acordado. 
Já o inciso III, do mesmo artigo, apenas reforça as vinculações legais previstas na Lei complementar 73/1993, que são obrigatórias ao Advogado Público Federal, em quaisquer de suas manifestações jurídicas.
§ 3° Não serão objeto de acordo:
I - as hipóteses em que se discute penalidade aplicada a servidor;
II - os casos de dano moral, salvo se o agente causador do dano for entidade credenciada, contratada ou delegada de órgão de Administração Pública Federal e assuma, em juízo, a responsabilidade pelo pagamento acordado; e
III - o litígio que estiver fundado exclusivamente em matéria de direito e houver a respeito enunciado da Súmula da AGU, parecer aprovado na forma do art. 40 da Lei Complementar 73, de 1993 ou orientação interna adotada pelo Advogado-Geral da União contrários à pretensão.
Quanto às súmulas da Advocacia-Geral da União, observa-se que elas não têm sido editadas para limitar a solução consensual, pelo contrário, a Advocacia-Geral da União tem editado súmulas que visam a reduzir o número de processos ajuizados, principalmente em matéria previdenciária.
9.1.2 - Finalidade 
A finalidade corresponde ao efeito que a Administração pretende alcançar com a consecução do ato. 
Em sentido amplo, o fim do ato administrativo que oferta o acordo, deve ser sempre atender a interesse público, o que se dá quando por meio da conciliação, viabiliza-se o cumprimento da função administrativa ainda não efetivada, mas expressa em Lei.
Em sentido estrito, a finalidade do acordo deve ser o objetivo específico da lei material que se dá execução por meio do pacto, variando então de acordo com o direito subjetivo objeto da pretensão.
Desatendendo-se no acordo a qualquer destas finalidades, estará o ato viciado por desvio de poder.
9.1.3 - Forma 
Existem duas concepções de forma: a restrita, que significa a exteriorização do ato e a ampla, que inclui não só a exteriorização individual de determinado ato, mas também todas as formalidades que antecedem sua formação: o procedimento.
A motivação do ato faz parte do elemento formal do ato, devendo ser, em regra, escrito, como meio de se verificar legitimidade do ato.
No aspecto formal da conciliação e do acordo firmados no Juizado Especial da Fazenda Pública, podem ser citados alguns requisitos formais. 
Primeiro: o contraditório, em seu caráter dialógico, ou seja que diante das razões expostas na conciliação por uma das partes possa a outra argumentar sobre o aduzido, sendo justamente este o processo que produz os esclarecimentos de fatos mal-interpretados no procedimento administrativo.
Neste ponto a exteriorização do procedimento será oral, sem necessidade de registro material, como é característico dos Juizados Especiais.
Cabe a todas as partes envolvidas na conciliação, mas, principalmente ao conciliador, conduzir o diálogo pelos caminhos da urbanidade, garantindo ainda ausência de qualquer coação ou indução a erro por qualquer das partes, alertando para os fatos do processo que por acaso venham a passar desapercebidos, enfim, tudo para o bom e justo andamento do diálogo.
Quanto à formalização do acordo, este deverá ser obrigatoriamente registrado por escrito em ata de audiência, que relatará atos como a apresentação de novos documentos, ouvida de testemunhas e registrará, além das condições do pacto, a motivação do acordo.
A motivação é a parte mais importante das formalidades que envolvem o ato bilateral de consenso. Neste momento, deve ser aberto ao procurador ou preposto, oportunidade para expor os motivos que o convenceram e definiram os limites do acordo, referindo-se a testemunhos, documentos, depoimento do autor, esclarecimentos relevantes. Isto porque a motivação do acordo vai servir de base de aferição de sua legitimidade para a Administração, o Judiciário e a Sociedade.
Os acordos conterão obrigatoriamente cláusula de renúncia a eventuais direitos decorrentes do mesmo fato ou fundamento jurídico que deu origem à ação judicial.[26: Portaria AGU nº 109/97, art. 3º, § 4º.]
Por fim, assinado o acordo este seguirá para homologação judicial,que, em regra tem por finalidade apenas observar se as formalidades processuais foram seguidas.
9.1.4 - Objeto
Objeto do ato é o efeito imediato que ele produz, é seu conteúdo, o que ele enuncia, prescreve, dispõe. Como ensina Di Pietro, o objeto do ato administrativo de pactuar, deve ser lícito, possível, certo e moral, e, no caso dos Juizados Especiais, deve ser também líquido. [27: DI PIETRO. Op. Cit. p. 198.]
A exigência de que as sentenças de mérito sejam sempre líquidas aplica-se ao acordo que terá efeito de sentença após a homologação e serve justamente para por fim ao conflito, de modo que devem ser estabelecidas de forma definitiva as obrigações dos pactuantes.[28: Lei 9.099/99, art. 38, Parágrafo Único.]
O representante da Fazenda Pública deve ter especial atenção para que fique registrado no acordo, de maneira clara e detalhada, todo o conteúdo das obrigações assumidas.
9.1.5 - Motivo
É o feixe de fatos e de normas que logicamente interligados entre si serve de fundamento antecedente ao ato administrativo.
A ausência de motivo ou indicação de motivo falso invalidam o ato administrativo, mesmo que a lei não exija a motivação dos atos, o que resume a teoria dos motivos determinantes, aplicáveis aos acordos no Juizado. 
Desse modo, se dentre os motivos do ato está, por exemplo, a idade do autor, o nascimento de um filho, a demissão; demonstrada a falsidade de tal motivo, com má-fé ou não, haverá, em princípio, nulidade do acordo.
Por fim, não será legítimo travar acordo contra jurisprudência favorável à tese do ente federativo.
10 - Conclusões
A Lei. 12.153/2009, de 22 de dezembro de 2009, criou os Juizados da Fazenda Pública, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios.
Os Juizados da Fazenda Pública adotam procedimento quase idêntico ao dos Juizados Especiais Federais, apontando a conciliação como meio prioritário para a solução dos conflitos.
Ao dispor que a atividade de conciliação se dará, “nos termos e nas hipóteses previstas na lei do respectivo ente da Federação.”, o artigo 8º não o faz com a intenção de restringir tal atividade, mas sim em obediência à divisão de competências legislativas concorrentes estabelecida na Constituição Federal, preservando o princípio do Estado Federativo.
A experiência dos acordos nos Juizados Especiais Federais foi avaliada de forma positiva para a União, inclusive do ponto de vista econômico, o que catalisou o processo de atuação pró-ativa e conciliadora da Advocacia Geral da União.
A solução consensual do conflito entre particular e Administração Pública no Judiciário se dá por meio de ato jurídico formado complexamente pela atuação de diversos agentes, cujos atos estão sujeitos a regimes jurídicos diferentes e, portanto, apresentam naturezas diversas, as quais se condensam formando um ato único
O acordo que põe um fim consensual à lide nos Juizados Especiais da Fazenda Pública, dentro da classificação doutrinária dos Contratos da Administração, melhor se encaixa na categoria dos Contratos Privados da Administração. 
Apesar de a relação negocial das partes ser regida predominante pelo Regime de Direito Privado, está também sujeita às derrogações essenciais de Direito Público, visto que, assim como os contratos de Direito Privado tratados no art. 62 da Lei 8.666/93, o acordo nos Juizado está adstrito à função administrativa, quanto à legalidade, forma, competência, motivo e finalidade.
No exercício de seu juízo discricionário sobre a possibilidade de acordo ou não, o representante judicial da Administração manifesta unilateralmente a decisão sobre a possibilidade ou não de solução consensual da lide, sendo que tal decisão tem por função cumprir a Lei, de modo completamente condicionado ao regime jurídico administrativo.
Nos acordos travados pela Fazenda Pública o representante da Administração em juízo deve realizar o pacto de forma a adimplir o interesse público, recompô-lo, seguindo a Lei.
A função administrativa restaria desatendida se o representante judicial, diante da convicção quanto ao direito do autor, da subsunção das provas à hipótese normativa, da existência de erro administrativo, se omitisse, insistindo no prosseguimento da lide, quando seu dever era o de propor a solução pacífica do conflito, dando, enfim, o cumprimento postergado à Lei.
11. - BIBLIOGRAFIA
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