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ALTHUSSER Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado

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Título original
IDEOLOGIE ET APAREILS IDEOLOGIQUES D'ETAT
© Copyrightby La Pensée
Traduçãode JoaquimJosé de MouraRamos
Reservadostodosos direitos
paraa línguaportuguesaà
EditorialPresença,L.da
Rua AugustoGil, 35-A- 1000LISBOA
li
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I
I!
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IDEOLOGIA E APARelHOS IDEOlóGICOS
DE ESTADO 1
(Notas para uma investigação)
1 O presentetextoéconstituídopor doisextractos
de um estudoem curso.O autor não quis deixar de
os intitular «Notas para uma investigação». As ideias
exposta.<;devemser consideradasapenascomo intro-
duçãoa uma discussão.(N. D. R.).
SOBRE A REPRODUÇÃO DAS CONDiÇÕES
DA PRODUÇÃO
Precisamosagoradedelimitaralgoqueape-
nasentrevimosna nossaanálise,quandofalá-
mos da necessidadede renovaçãodos meios
deproduçãoparaquea produçãosejapossível.
Trata-seapenasdeumaindicaçãodepassagem.
Vamosagoraconsiderá-Iapor si mesma.
ComoMarx dizia,atéumacriançasabeque
se umaformaçãosocialnão reproduzas con-
diçõesdaproduçãoaomesmotempoqueproduz
não conseguirásobreviverum anoqueseja1.
A condiçãoúltima da produçãoé portantoa
reproduçãodas condiçõesda produção.Esta
1 Carta a Kugelmann,11-7-1868,(Lettres sur 1e
le Capital, Ed. Sociales,p. 229),
9
podeser «simples»(reproduzindo'apenasas
condiçõesda ,produçãoanterior)ou «alargada»
(aumentando-as).Por agora,deixemosdeparte
estaúltimadistinção.
Queé entãoa reproduçãodas cOMiçõesda
produção?
Vâmosentrar num domÍinioque nos é ao
mesmotempomuito familiar (a partir do
Liyro II do Capital) esingularmentedesconhe-
cido.As evidênciastenazes(evidênciasideoló-
gicasde tipo empirista)do pontode vistada
produção,isto é, do 'pontode vista da simples
práticaprodutiva (ela própria abstractaem
relaçãoaoprocessodeprodução),estãodeta,l
maneiraembutidasnanossa«,consciência»quo-
tidiana,queé extremamentedifícil, para~_não
dizerquaseimpossível,elevarmo-nosao ponto
de vistada reprodução.No entanto,fora deste
pontodevista,tudopermaneceabstracto(mais
queparcial: deformado)- não só ao nívelda
produçãocomo,e principalmente,da simples
prática.
Tentemosexaminaras coisascommétodo.
Para simplifi.cara nossaeXiposição,e se
considerarmosquetodaa formaçãosocialre-
levadeummododeproduçãodominante,pode-
mosdizerqueo processode produçãopõeem
10
movimentoforças produtivasexistentesem
(dans et 80US)relaçõesde produçãodefinidas.
Dondese segueque,para existir, toda a
formaçãosodaldeve,aomesmotempoquepro-
duz,e parapoderproduzir,reproduzirascondi-
çõesda sua produção.Deve!poisreproduzir:
1) as forças produtivas,
2) as relaçõesde produçãoexistentes.
11
REPRODUÇAO DOS MEIOS DE PRODUÇAO
Hoje, todosreconhecem(inclusiveos eco-
nomistasburguesesquetrabalhamna contabi-
lidadenacionalou os teóri'cos«m8Jcro-econo-
mistas»modernos),porqueMarx impôsesta
demonstraçãono Livro II do Oapital, quenão
há produçãopossívelsemquesejaassegurada
a reproduçãodas condiçõesmateriaisda pro-
dução:a reproduçãodosmeiosdeprodução.
Qualquereconomista,quenestepontonão
se distinguedequalquercapitalista,sabeque,
anoapósano,é precisoprevero quedeveser
substituído,o quesegastaouseusanaprodu-
ção: matéria-prima,instalaçõesfixas (edifí-
cios), instrumentosde produção(máquinas),
etc.Dizemos:qualquereconomista=a qualquer
capitalista,pois queambasexprimemo ponto
devistadaempresa,contentando-secamcomeu-
13
tarsimplesmenteos termosda prática finan-
ceirada empresa.
Mas sabemos,graçasao géniode Quesnay
que foi o primeiro a levantareste problema
que «entrapelosolhosdentro»,e ao géniode
Marx que o resolveu,que não é ao nível da
empresaquea reproduçãodascondiçõesmate-
riais da produçãopodeser pensada,porque
nãoé na empresaqueelaexistenassuascon-
diçõesreais.O quese ,passaao nível da em-
presaé um efeito,que dá apenasa ideia da
ne,cessidadeda reprodução,mas não permite
de modoalgumpensar-lheas condiçõese os
me,canismos.
Um simplesinstantedereflexãobastapara
nos convencermosdisto: o Sr. X, capitalista
que na sua fiação 'Produztecidosde lã, deve
«reproduzir»a suamatéria-prima,as sua'smá-
quinas,etc.Ora nãoé ele queas produzpara
a suaprodução- masoutroscapitalistas:um
grandecriadorde carneirosaustraliano,o Sr.
Y , o donode umagrandemetalurgia,o Sr.
Z , etc, etc..., os quaisdevempor sua vez,
para produzirestesprodutosquecondicionam
a reproduçãodascondiçõesdaproduçãodoSr.
X ..., reproduziras condiçõesda sua própria
produçãoe assim indefinidamente- em pro-
14
porçõestais que,no mercadonacionalquando
nãoé no mercadomundial,a procuraemmeios
de produção(para a rt;produção)possaser
satisfeita pela oferta.
Para pensarestemecanismoquevai dar a
umaespéciede«fiosemfim»,é precisoseguir
o procesf1o«global»de Marx, e estudarprinci-
palmenteas relaçõesde circulaçãodo capital
entreo Sectorl (produçãodosmeiosde pro-
dução)e o SectorII (produçãodosmeiosde
consumo)e a realizaçãoda mais~valia,nos
Livros II e III do Capital.
Não entraremosna análisedestaquestão.
Basta-noster mencionadoa existênciada ne-
cessidadede reproduçãodas condiçõesmate-
riais da produção.
15
REPRODUÇAO DA FORÇA DE mABALHO
Contudo,há umacoisa quede certomodo
não podeter deixadode espantaro leitor.
Falámosdareproduçãodosmeiosdeprodução,
- mas não da reproduçãodas forças produ-
tivas. Portanto, não falámosda reprodução
daquiloquedistingueas forçasprodutivasdos
meiosde produção,ou seja,da reproduçãoda
força de trabalho.
Sea observaçãodoquesepassanaempresa,
em'particularo exameda práUcafinanceira,
dasprevisõesdeamortização-investimento,nos
pôdedar uma ideiaa.proximadada existência
do processomaterialda reprodução,entramos
agoranumdomíniosobreo quala observação
doquesepassanaempresaé senãototalmente,
,pelomenosquaseinteiramentecega,e poruma
razão de peso: a reproduçãoda força de
2 17
trabalhoiP8.'3S8.-seessenciaLmentefora da em-
presa.
Comoé asseguradaa reproduçãoda força
de traba~ho?
:m asseguradadandoà força de trabalhoo
meio material de se reproduzir: o salário.
O saláriofigura na contabilidadede cadaem-
presa, como «capital mão de obra»1 e de
modo algum como condiçãoda reprodução
materialda força de trabalho.
No entantoé assimqueele«age»,dadoque
o salário representaa.penasa partedo valor
produzidapelodispêndioda forçadetrabalho,
indispensávelà reproduçãodesta:entendamos,
indispensávelà reconstituiçãoda força de
trabalhodo assalariado(ter casapara morar,
roupaparavestir,ter decomer,numapalavra
poderapresentar-seamanhã- cada amanhã
queDeusdá-ao Iportãoda fábrica); Mrescoo-
temos:indispensávelà alimentaçãoe educa-
çãodosfilhos nosquaiso proletáriose repro-
duz (em x exemplares:podendox ser i,gual
a O, 1, 2, etc....) comoforça detrabalho.
1 Marx forneceua estepropósitoumconceitocien-
tífico: o de capital variável.
18
Lembremosque esta quantidadede valor
(o salário), necessárioà reproduçãoda força
de trabalho,é determilIladonãopelasnecessi-
dadesde ~ S.M. I. G. «biológico»,maspelas
cnecessidadesde um mínimo histórico (Marx
sublinhava:é precisocervejapara os operá-
rios inglesese vinhoparaos proletáriosfran-
ceses)-portanto historicamentevariável.
Indiquemostambémqueestemínimoé du-
plamentehistórko pelofactode não ser defi-
nido pelas necessidadeshistóricasda classe
operária«reconhecidas»pelaclassecapitalista,
maspelasnecessidadeshistóricasimpostaspela
luta de classes proletária (luta de classes
dupla: contrao aumentoda duraçãodo tra-
balho8 contraa diminuiçãodossalários).
Porém,nãobastaassegurarà forçadetra-
balho as condiçõesmateriaisda sua reprodu-
ção,paraqueela seja reproduzida comoforça
de trabalho.Dissémosquea forçadetrabalho
disponíveldeviaser «competente»,isto é, apta
a ser postaa funcionarno sistemacomplexo
do processode produção.O desenvolvimento
dasforçasprodutivase o tipo de unidadehis-
toricamenteconstitutivodasforçasprodutivas
Ilummomentodadoproduzemo seguintere~ml-
tado: a força de trabalhodeveser (diversa-
19
mente) qualificada e portanto reproduzida.
comotal. Diversamente:segundoas exigên-
cias da divisãosocial-técnicado trabalho,nos
seusdiferentes«postos»e «empregos».
.ora,comoé queestareproduçãoda quali-
ficação(diversificada)da força de trabalhoé
asseguradano regimecrupitalista?Diferente-
mentedoqueserpassavanasformaçõessociais
esclavagistase feudais,esta reproduçãoda
qualificaçãoda força de trabalhotende(tra-
ta-sede umalei tendencial)a ser assegurada
não em «cimadas coisas»(aprendizagemna
própriaprodução),mas,e cadavezmais,fora
da produção:atravésdo sistemaescolarcapi-
talista e outrasinstânciase instituições.
Ora, o que se a,prendena Escola? Vai-se
maisoumenoslongenosestudos,masdequal-
quer maneira,aprende-sea ler, a escrever,a
contar,.- portanto algumastécnicas,e ainda
muitomaiscoisas,inclusiveelementos(quepo-
demser rudimentaresou pelocontrárioapro-
fundados)de«culturacientífica»ou «literária»
directamenteutilizáveisnos diferenteslugares
da produção(umai,ustruçãoparaosoperários,
outra para Ü'Stécnicos,umaterceirapara os
engenheiros,umaoutraparaos quadrossupe-
20
riores, eté.). ~rendem...geportanto «.saberes
práticos»(des «savoir loire»).
Mas,por outrolado,e aomesmotempoque
ensinaestas,técnicase estes.conhecimentos,a
Escola ensinatambémas «regras»dos bons
costumes,isto é, o cornvortamentoquetodoo
agenteda divisãodo trabalhodeveobse.rvar,
segundoo lugarqueestádestinadoa ocupar:
regrasda moral,daconsdênciecívka e pro-
fissional,o que significa exactamenteregras
de respeitopela divisãosocial-técnkado tra-
balho,pelasregrasda ordemestabelecidapela
dominaçãode classe.Ensina tambéma «bem
falar»,a «redigirbem»,o quesignificaexacta-
tamente(para os futuros capitalistase para
os seus servidores) a «mandarbem», isto
é, (soluçãoideal) a «falar bem»aos operá-
rios, etc.
Enunciandoestefactonumalinguagemmais
científica,diremosque a reproduçãoda força
de trabalhoexigenão só umareproduçãoda
qualificaçãodesta,mas,aomesmotempo,uma
.reproduçãoda submissãodestaàsregras da
ordemestabelecida,isto é, umareproduçãoda
submissãodestaà ideolÜ'giadominantepara
os Olperáriose umareproduçãoda cap3JC1idaile
(paramanejarbema ideologiadominantepara
21
08 agentesda eJqlloraçãoe da repressão,a
fim de quepOS83Jmassegurartambém,«pela
palavra»,a dominaçãoda classe dominante.
Por outras palavras,a Escola (mas tam-
bém outras instituiçõesde Estado como a
Igreja ou outros aparelhoscomoo Exército)
ensinam«saberespráticos»masemmoldesque
assegurama sujeição à ideologia dominante
ou o manejoda «prática»desta. Todos os
agentesda produção,da exploraçãoe da re-
pressão,nãofalandodos«profissionaisdaideo-
logia» (Marx) devemestar de uma maneira
ou deoutra«penetrados»destaideologia,para
desempenharem«conscienciosamente»a sua
tarefa- quer de explorados(os proletários),
querdeexploradores(oscapitalistas),querde
auxiliares da exploração(os quadros),quer
dep3Jpasdaideologiadominante(osseus«fun-
cionários»),etc....
A reproduçãodaforçadetrabalhotempois
comocondiçãosine qua nonJ não só a repro-
duçãoda «qualificação»destaforça de traba-
lho, mastambéma reproduçãodasuasujeição
à ideologiadominanteou da «prática»desta
ideologia, com tal precisão que não basta
dizer: «nãosó mas também»,pois conclui-se
queé nas formas e sob as /0r-rtW8da sujeição
22
ideológica que é asseguradaa reproduçoo da
qualificação da força de trabalho.
Mas aqui reconhece-sea presençaeficaz
de umanovarealidade:a ideologia.
Aqui vamosintroduzir duas observações.
A primeirapara fazer o balanÇoda nossa
análiseda reprodução.
Acabámosde estudarrapidamenteas for-
masda reproduçãodasforçasprodutivas,isto
é, dos meios de produçãopor um lado, e da
força de trabalhopor outro lado.
Mas ainda não abordámosa questãoda
7'eproduçãodas 7'elaçõesde p7'Odução.Ora esta
questãoé uma questãocrucial da teoriamar-
xista do modode produção.Não a abordaré
umaomissãoteórica- pior, um erro político
grave.
Portanto,vamosabordá-Ia.Mas,para isso,
precisamosumavezmais de fazerum grande
desvio.
A segundanotaé que,para fazerestedes-
'Vio,precisamosde mais uma vez levantaro
nossovelhoproblema:que é uma socied3Jde?
f3
INFRAESTRUTURA E SUPERESTRUTURA
Já tivemosocasião1 de insistir sobre o
carácterrevolucionárioda concepçãomarxista
do «todosocial»naquiloque a distingueda
«totalidade»hegel:iana.Dissémos(e estatese
apenasretomavaas proposições,célebresdo
materialismohistórico) que Marx ,concebea
estruturade qualquersociedadecomoconsti-
tuída pelos«níveis»ou «instâncias»,articula-
dos por uma determinaçãoespecífica:a in-
/raestrutura ou b3Jseeconómica(«unidade»
das forçasprodutivase das relaçõesde pro-
dução),e a superestrutura)quecomportaemsi
mesmadois «crlÍveis»ou «instâncias»:o jurÍ-
1 Em Pour Marx e Lire le Capital (Paris. Ed.
Maspero).
25
dico-político(o direitoe o Estado)e a ideolo-
gia (asdiferentesideologias,religiosas,moral,
jurídica,politica,etc.).
Além do interesseteórico-<pedagógico(que
ilustraa diferençaqueseparaMarx deHegel),
estarepresentaçãooferecea vantagemteórica
c3Jpitalseguinte:permiteinscreverno disposi-
tivo teóricodosseusconceitosessenciaisaquilo
a quechamámoso seu índioede eficáciares-
pectivo. Que quer isto dizer?
Qualquerpessoapode compreenderfacil-
mentequeestarepresentaçãoda estruturade
todaa sociedadecomoumedifícioquecomporta
uma base (infraestrutura)sobre a qual se
erguemos dois «andares»da superestrutura,
é umametáfora,muitoprecisamente,umame-
táfora espacial:uma tópica1. Comotodasas
metáforaR,estasugere,convidaa ver alguma
coisa.O quê? Pois bem,precisamosisto: que
os andaressuperioresnão poderiam«man-
1 Tópica, do gregotopos: lugar.Uma tópica repre-
senta,num espaçodefinido,os lugaresrespectivosocu-
padospor estaou aquelarealidade:assimo económico
está em baixo (a base)a superestruturapor .cima.
26
ter-se» (no ar) sozinhosse não assentassem
defa-ctona suabase.
A metáforado edifíciotem,portantocomo
objectivorepresentara «determinaçãoem úl-
tima instância»peloeconómico.Esta metáfora
espacialtempois comoefeito afectara base
deumíndicedeeficáciaconhecidonoscélebres
termos:determinaçãoem última instânciado
que se passa nos «andares»(da superestru-
tura) pelo que se passa na baseeconómica.
A partir desteíndicedeeficácia«emúltima
instância», os «andares»da superestrutura
encontram-seevidentementeafectadospor índi-
Icesde eficáciadiferentes.Quetipo de índice?
Podemosdizerqueos andaresda superes-
trutura nãosão determinantesemúltima ins-
tância,mas quesão determinadospela base;
quesesãodeterminantesà suamaneira(ainda
não definida),são-noenquantodeterminados
pelabase.
O seu índicede efi,cácia(ou de determina-
ção),enquantodeterminadapeladeterminação
em última instânciada base,é pensadona
tradiçãomarxistasobduasformas:1 há uma
«autonomiarelativa» da superestruturaem
relaçãoà base;2 há «umaacçãoemretorno»
da superestruturasobrea base.
,'27
Podemosportantodizerquea ,granc1evan.
tagemteóricada tórpkamarxista,portantoda
metáforaespacialdo edifício (basee superes.
trutura) é simultaneamenteo facto de fazer
ver que as questõesde determinação(ou de
índicesdeeficácia)sãoIcapitais;mostrarque
é a baseque determinaem última instância
todo o edifício; e, por via deconsequência,
obrigara levantaro problemateóricodo tLpo
de eficácia«derivada»própria à superestru-
tura, isto é, obrigara pensaro quea tradição
marxistadesignasobos termos,conjuntosde
autonomIarelativada superestruturae acção
de retornoda superestruturasobrea base.
O inconvenientemaiordestarepresentaçãoda estruturade qualquersociedadepelametá-
fora espacialdo edifício é evidentementeo
facto de ela soeI'metafórica:isto é, de per-
manecerdescritiva.
Mas a partir daqui,parece-nosdesejávele
possívelrepresentaras coisasde outromodo.
Ê precisoquenosentendam:nãorecusamosde
modoalguma metáforaclássica,vistoquepor
si só ela nos obriga a ir alémdela. E não
vamosalémdela,para a rejoeitarcomocaduca.
Gostaríamosapenasde tentar p€nsaro que
ela nos dá na sua formadescritiva.
28
Pensamosque é a partir M, reprodução
que é possível e necessáriopensar o que
caracterizao essencialda existênciae natu-
reza da superestrutura.Basta colocarmo-nos
no ponto de vistada reproduçãopara quese
esclareçamalgumasdas questõescuja exis-
tênciaa metáforadoedifícioindicavasemlhes
dar umarespostaconceptual.
A nossatesefundamentaléquesó é possí-
vel colocarestasquestões(e portantorespon-
der-lhes)do pontode vista da reprodução.
Vamos analisar brevementeo Direito, o
Estadoe a ideologiaa partir destepontode
vista.E vamosmostrarsimultaneamenteo que
sepassadopontodevistadapráticae dapro-
duçãopor umlado,epor outro,da reprodução.
29
o ESTADO
A tradiçãomarxistaé peremptória:o Es-
tadoéexplicitamenteconcebidoapartir doMa-
nifesto e do 18 do Brumário (e em todosos
textoscláss1cosulteriores,sobretudode Marx
sobrea Comunade Pavis e de Lenine sobre
o Estado e a Revolução) como aparelho
repressivo.O Estado é uma «máquina»de
repressãoque ,permiteàs classesdominantes
(no séculoXIX à classeburguesae à «classe»
dos proprietáriosde terras) assegurara sua
dominaçãosobre a classe operária para a
submeterao processode extorsãoda mais-
-valia (quer dizer, à exploraçãocrupitalista).
O Estado é entãoe antesde mais aquilo
a que os clássicosdo marxismochamaram
o aparelhode Estado. Este termocompreende:
não só o aparelhoespecializado(no sentido
31
estrita)cuja existênciae necessidadereconhe-
cemosa partir dasexigênciasda rprá.ticajurí-
dica, isto é a policia- os tribunais- as pri-
sões;mastambémo exér0ito,que (o ~raleta-
riadopagouestaeXiperiênciacomoseusangue)
Lntervémdirectamentecomoforça repressiva
de arpodoemúltimainstâmciaquandoa polícia,
e os seusco~posauxiliareseSlpecializados,são
«ultrapR.ssadospelosa;contecimentos»;e acima
desteconjuntoo chefedo Estada,a governoe
a administração.
Apresentadasabestaforma,a teoriamar-
xista-Ieninistado Estado capta o essencial,
semdúvida.O aparelhode Estadoque define
('EstadocomaforçadeexecuçãO'edeinterven-
ção repressiva,«aoser,viçadas classesdomi-
nantes»,na luta de classestravadapelabur-
guesiae pelosseusaliadoscantra a proleta-
rIado é de facto o Estado,e definede facto
a «função»fundamentaldeste.
DA TEORIA DESCRITIVA A TEORIA
No entanto,tambémaqui e à semelhança
do quefiZÉ'masnotara propósitodametáfora
do edifício (infraestruturae superestrutura),
estarupresentaçãoda naturezado Estadaper-
manecedescritiva.
Como vamosempregarvárias veres este
adjectivo(descritivo)e, para evitar qualquer
equívoco,impõe-seuma breveexplicação.
Quandodizemos,falando da metáforado
edifíciO',eu falandoda «teoria»marxistado
Estado,quesão concepçõesou representações
descritivasdo seu objecto,não pretendemos
comisso criticá-Ias.Pelo contrário,pensamos
que as grandesdescobertascientíficas não
podemevitar passarpela fase a que chama-
remosde uma <<teoria»descritiva. Fase essa
que seria a primeirafase de toda a teoria,
pelo menosno domíniO'que nos ocupa(o da
ciência das formações sociais). Como tal,
poder-se-ia- e segundocremosdeve-seaté-
encararesta fase comoumafase transitória,
necessáriaao desenvolvimentoda teoria.Ins-
crevemoso seucaráctertransitóriona nossa
expressão:«teoriadescritiva»assinalando,na
conjunçãodostermosqueempregamos,o equi-
valentea uma espéciede «contradição».Com
efeito,o termodeteoria«briga»decertomodo
com o adjectivo «descritiva»que lhe está
aposto.Muito precisamente,isto quer dizer:
1) quea «teoriadescritiva»é defactO',semdú-
32 3 33
vida.possivel,o começosemretornoda teoria,
mas2) quea forma«descritiva»emquea te0-
ria.seapresentaexige.,precisamentepeloefeito
desta ~contradição»,um desenvolvimentoda
teoriaqueultrapassaa formada «des.crição».
Precisemoso nossopensamento,voltando
ao nossoobjectopresente:o Estado.
Quandodizemosque a «teoria»marxista
do Estado, de que dispomos,permaneceem
parte«descritiva»,isto significaantesdemais
que esta deoria» descritivaé, sem dúvida
possível,o própriocomeçoda teoriamarxista
do Estado,e queestecomeçonos dá o essen-
cial, istoé, o princípiodecisivodetodoodesen-
volvimentoulterior da teoria.
Diremüscomefeitoquea teoriadescritiva
do Estadoé correcta,dadoquepodemosper-
feitamentefazer correS/ponderà definiçãoque
ela dá do seu objeotoa imensamaioriados
f!l;ctosobserváveisno domínioa queela se
refere. Assim, a definiçãodo Estado como
Estado de classe, existenteno aparelhode
Estado repressivo,es.clarecede uma maneira
fulgurantetodosOs fados observáveisnasdi-
versasordensdarepressãosej!l;mosseusdomí-
nios quaisforem:dos massacresde Junho d.e
48 à ComunadeParis, do sangrentoDomingo
34
de Maio de 1905 em petrogrado,da Resi8-
LêIlJcia.deCharonne,etc.... às simples(e rela-
tivamenteanMinas)intervençõesdeuma«cen-
sura» qu~proíbea Religiooa.de Diderot ou
umapeçade Gatti sobreFranco; elaesclarece
todasasforma.sdirectasou indirectasdeeXiplo-
raçãoedeextermíniod!liSmassasípqpulares(as
guerraSimperialistas);ela esclareoea subtil
(/orninaçâoquotidianaemqueestábrutalmente
presente,por exemplonas formas da demo-
(oraciapolítica,aquilo a que Lenme chamou
dt'poisde Marx,a ditaduradaburguesia.
Contudo, a teoria descritivado Estado
rnpresentaumafaseda constituiçãoda teoria
que exije por si mesmaa «superação»desta
fase.Porqueéclaroquesoeadefiniçãoemques-
1:10 nosdáefectivamentemeiosparaidentificar
" reconheceros f3Jctosde opr,essãorelacio-
nando-oscomo Estado,concebidocomoapa-
1"1'lho repressivode Estado, este «pôr em
n'laGão»dá lugar a um génerode evidência
lllllito particular a que mais adiantevamos
"('ferir-nos:«sim,é isso,é verdade!...»1. E a
1 Cf mais adiante:A propósito da ideologia.
35
acumulaçãodos factos sob a definiçãodo
Estado,se mult~plicaa suailustração,nãofaz
avançarrealmentea definiçãodo Estado,isto
é, a suateolliacientífka.Todaa teoriadescri-
tiva ,correpoiso risco de «bloquear»o desen-
volvimento,noentantoindispensável,dateoria.
É porissoquejulgamosindispensável,para
desenvolveresta teoriadescritivaem teoria,
i~to é, para compreendermosmais profunda-
menteos mecanismodo Estadoe do seufun-
cionamento,acrescentaralgumacoisa à defi-
nição clássicado Estado ,comoaparelhode
Estado.
oESSENCIAL DA TEORIA MARXISTA DO ESTADO
Precisemosantesdemaisumpontoimpor-
tante: o Estado (e a sua existênciano seu
aparelho)só temsentidoemfunçãodo poder
de Estado. Todaa lutadeclassespolíticagira
emtornodo Estado.Querdizer: emtornoda
detenção,isto é, da tomadae da conservação
do poderde Estado,por umacertaclasse,ou
por umaaliançade classesou de fracçõesde
classes.Esta primeiraprecisãoobriga-nospor-
tantoa distinguiro ,poderde Estado (conser-
36
vaçãodo poderdeEstadoou tomadado poder
deEstado),objectivodalutadeclassespolítica
IPorum1000,e o ~arelhode Estadopor outro
Indo.
Sabemosque o apa.re1hode Estado pode
lll'rmane.cerintacto,comoo provamas «revolu-
I;ÔCS»burguesasdo século XIX em França
(1830,1848)ou os gol;pesde Estado (o Dois
li;.; Dezembro,Maio de 1958)ou as quedasdo
l':stado(quedado Impérioem 1870,quedada
:\."Repúblicaem1940),ou a ascensãopolítica
da pequenaburguesia(1890-95em França),
dc., semqueo aparelhode Estadoseja afec-
ladooumodificadopor estefacto:podeperma-
']I{'cerintactoapesardos aJcontecimentospolí-
Licos que 8Jfectaana detençãodo poder de
I';cüado.
Mesmoapósuma revoluçãosocialcomoa
di' 1917,uma grandeparte do aparelhode
I':stadopermaneceuintactaapósa tomadado
1")derde Estadopelaaliançado proletariado
('doscamponesespobres:Leninenãosecansoud,' o repetir.
Podemosdizer que esta distinção entre
,poderde Estado e aparelhode EstOOofaz
Il:tr·teda «teoria marxista» do Estado, de
3"1
usuario 1
Nota
maneiraexpllcitaa partir do 18do Brumário
e das Lutasde ClMSC8 emFrançade Marx.
!Pararesumirmossobreestepontoa deoria
marxistado Estado»,podemosdizer que os
c1ássi,cosdo marxismo sempre afirmaram:
1) o Estadoé o aparelhorepressivodeEstado;
2) é precisodistinguiro poderde Estadodo
a.parelhode Estado; 3) o objectivodas lutas
de classesvisa o ,poderde Estado e, cons€-
quentemente,a utilizaçãofeitapela.sclasses(ou
aliançade classesou de fracçÕ€sdeclasses),
detentorasdo poderde Estado,do aparelho
de Estado em funçãodos seus objectivosde
classe;e 4) o proletariadodevetomaro poder
de Estadopara destruiro aparelhode Estado
burguêsexistente,e,numaprimeirafase,subs-
tituÍ-Io por um lliparelbode EstaAlocompleta-
mentediferente,proletário,depois em fases
ulteriores,ini.ciarum processoradical,o da
destruiçãodo Estado (fim dorpoderdeEstado
e de todoo poderde Estado).
Destepontode vista, e por conseguinteo
quenósnosproporíamosacrescentarà «teoria
marxista» do Estado, já figura nela. Mas
parece-nosque estateoria,assimcompletada,
permaneceainda em parte descritivaembora
38
comportejá elementoscomplexose diferen-
ciais cujo funcionamentoe jO'gO'só podemser
compreendidosmedianteo recursoa um arro-
fundamentoteóricosuplementar.
39
OS APARELHOS IDEOLóGICOS DE ESTADO
o queé ,precisoacrescentarà «teoriamar-
xista» do Estadoé pois outra coisa.
Devemosagora avançar com prudência
num terreno onde,de facto, os clássicosdo
marxismonos precederamhá longo tempo,
mas sem t€r sistematizado,sob uma forma
teórica,os progressosdecisivosque as suas
experiênciase os seusmétodose processos
(démarches) implicaram.As suasexperiências
(~métodospermaneceramde factono terreno
da práticapolítica.
De facto,na sua 'práticapolítica,os clás-
sicosdo marxismotrataramo Estado como
umarealidademaiscomplexadoquea defini-
<Jioque dele se dá na «teoria marxista do
Estado»,mesmocompletadacomoa apresen-
bmos. Na suapráticareconheceramestacom-
41
plexidade,masnão a exprimiramnumateoria
correspondente'.
Gostaríamosdetentaresboçarmuitoesque-
maticamenteesta teoriacorrespondente.Para
essefim, prcpomosa teseseguinte.
Para se avançarna teoria do Estado,é
indispensávelter emconta,nãosó a distinção
entrepoder de Estado e aparelho de Estado)
mas tambémoutra realidadeque se situa
manifestamentedo lado do ruparelho(repres-
sivo) deEstado,masnãoseconfundecomele.
Designaremosestarealidadepeloseuconceito:
os aparelhos ideológicos de Estado.
Quesãoos 8JparelhosideológicosdeEstado
(AlE) ?
Não seconfundemcomo aparelho(repres-
sivo) de Estado. Lembremosque na teoria
1 S;ogundoo que conhecemos,Gramsci foi o único
que se aventurou nesta via. Teve a ideia «singular» de
que o Estado não se reduzia ao aparelho (repressivo)
de Estado, mas compreendia, como ele dizia, certo nú-
mero de insti tuições da «sociedade civil»: a Igreja, as
Escolas, os sindicatos, etc. Gramsci não chegou infeliz-
mente a siBtematizar estas instituições que permanece-
ram no estado de notas perspicazes, mas parciais (cf.
Gramsci: Oeuvres Coisies, Ed. Sociales, pp. 290-291
(nota 3), 293,295,436. Cf. LettresdePrison, Ed. Socia-
les, p. 313.
42
marxista,o Aparelhode Estado(AE) com-
preende:o Governo,a Administração,o Exér-
cito, a Polícia, os Tribunais, as Prisões,etc.,
que constituemaquilo a que chamaremosa
partir de agora o AiparelhoRe:pressivode
Estado.Repressivoindicaqueo Aparelhode
Estadoem questão«funcionapela violência»,
- .pelomenosno limite (porquea repressão,
por exemploadministrativa,poderevestirfor-
masnão físicas).
DesLgn3JmOSpor AparelhosIdeológicosde
Estadoum certonúmeroderealidadesquese
3Jpresentaillaoobservadorimediatosoba forma
de instituiçõesdistintase especializadas.Pro-
pomosuma lista empíricadestasrealidades
que,é iClaro,necessitaráde serexaminadapor-
menorizadametllte,posta à prova, rectificada
e reelaborada.Comtodasas reservasqueesta
exigênciaimplica,podemosdesdejá considerar
comoAparelhosIdeológicosde Estadoas ins-
tituiçõess~guintes(a ordempelaqualasenun-
ciamos não tem qualquer significadoparti-
cular):
- O AlE religioso(O sistemadasdiferentes
Igrejas),
1;3
- o AlE escolar (o sistemadasdiferentes
~()Ilas públicase particulares),
- o AlE familiar1,
- o ALE jurídico2,
- o AlE polLtico (o sistemaiPOlíticode
que fazemparte os diferentespartidos),
- o ALE sindical,
- o AlE da informação(imprensa,rádio-
-televisão,etc.),
- o ALE ,cultural (Letras, Belas Artes,
desportos,etc.).
Dissémos:os AlE não se Iconfundemcom
o A!parelho(repressivo)de Estado. Em que
consistea diferença?
Num primeiromomentopodemosobservar
que, se existe,um Acparelho(repressivo)de
Estado,existe uma pluralidade de Aparelhos
ideológicosde Estado.Supondoqueela existe,
1 A Família desempenhamanifestamenteoutras
funçõespara alémdas de um AlE. Intervémna repro-
dução da força de trabalho.E, segundoos modosde
produção, unidade de produção e (ou) unidade de
consumo.
2 O «Direito»pertencesimultaneamenteaoApare-
lho (repressivo)de Estado e ao sistemados AlE.
44
aunidadequeCOQlstituiestapLuralidadedeALE
numcorpoúniconãoé imediatamentevisível.
Num segtlJ11domomento,podemosconstatar
queenquantoo aparelho(repressivo)de Es-
tado,unificado,pertenceinteiraanenteaodomí-
nio público, a maioria dos AparelhosIdeoló-
gicOSde Estado (na sua dispersãoaparente)
relevapelocontráriodo domínioprivado. Pri-
vadassãoasIgrejas,osPartidos,ossindicatos,
as famílias, algumasescolas,a maioria dos
jornais, as empresasculturais,etc.,etc....
Por agoradeixemosde partea nossapri-
meira observação.Mas o leitor 'nãodeixará
de relevara segundapara nosperguntarcom
que direito podemosconsiderar,comoApare-
lhos IdeológicosdeEstado instituiçõesque,na
sua grande maioria, não possuemestatuto
público,e sãopurae simplesmenteinstituições
privadas. ComoMarxista conscienteque era,
Gramscijá salientaraestaobjecção.A distin-
çãoentreo públicoe o privadoéumadistinção
interiorao direitoburguês,e válidanosdomí-
nios (subordinados)emqueo direitoburguês
exerceos seus«poderes».O domíniodo Estado
escapa-lheporqueestá«paraalémdoDireito»:
o Estado,queé o Estadoda classedominaJllte,
não é nem públiconemprivado,é pelo con-
45
trário a co.ndiçãode toda a distinçãoentre
públ1coe privado. Podemosdizer a mesma
coisapartindoagoradosnossosAparelhosIdeo-
lógicosde Estado.P01lJCOimportaque as ins-
tituiçõesqueos realizamsejam«públicas»ou
«;privadas».O que importaé o seu funciona-
mento.Instituiçõesrprivadaspodemperfeita-
mente«funcionar»comoAparelhosIdeológicos
de Estado.Uma análiseU!Il1 poucomais pro-
funda de qualquerdos AlE seria suficiente
paraprovaro queacabámosdedizer.
Mas vamosao essendal.O que distingue
os AlE do Aparelho (repressivo)de Estado,
é a diferençafundamentalseguinte:o Aparelho
repressivodeEstado«funcionapelaviolência»,
enquantoos AparelhosIdeológicosde Estado
funcionam «pew,ideologia».
Podemosprecisar rectificaoooesta distin-
ção.Diremosde facto quequalquer.A:parelho
de Estado, seja de rep:-essivoou ideoló.5"ico,
«funciona»simultaneamentepela violênciae
pela ideologia,mas comumadiferençamuito
importantequeimpedea confusãodosApare-
lhos IdeológÍ'Cosde Estado com o Aparelho
(repre~sivo)de Estado.
Ê queemsi mesmoo Aparelho(represlsivo)
de Estadofuncionade umamameiramass,iva-
46
m€'Ilteprevalentepelarepressão(inclusivefí-
ska), emborafuncionesecundariamentepela
ideologia.(Nãohá 81parelhorpuramenterepres-
sivo).Exemplos:o Exércitoe a Políoiafuncio-
nam tambémpela ideologia,simultaneamente
para assegurara·sua própriacoesãoe repro-
duçãoepelosvaloresqueprojeetamnoexterior.
Damesmamaneira,masinversamente,deve-
mos dizer que,em si mesmos,os .A:parelhos
Ideológicosde Estadofuncionamde um modo
massivamenteprevalentepelaideologia) em-
bora funcionandosecundariamentepela re-
Ipressão,mE'smoqueno limite,masapenasno
Emite, esta seja bastanteatenuada,dissimu-
ladaou atésimbólica.(Não há aparelhopura-
menteideológico).Assim a e~colae as Igrejas
«educam»por métodosapropriadosdesanções,
de exclusões,de selecção,etc.,nãosó os seUs
oficiantes,masassuasovelhas.Assima Famí-
lia... Assim o AparelhoIE cultural (a cen-
sura, para só mencionaresta), etc.
Será útil referir queestadeterminaçãodo
duplo«funcionamento»(dema,neiraprevalente,
de maneirasecundária)pelarepressãoe pela
ideologia,consoantese trata do Aparelho(re-
pressivo)de Estado ou dos AparelhosIdeo-
lógicosdeEstado,permitecompreEndero facto
47
de constantementese teceremcombinações
muitosubtisexplícitasou tácitasentreo jogo
do Aparelho(repressivo)do Estadoe o jogo
dos AparelhosIdeológicosde Estado?A vida
quotidianaoferece-nosinúmerosexemplosdisto
queé precisoestudarempormenorparairmos
mais alémda simplesobservação.
Esta observaçãoobre-nosa via da com-
preensãodo queconstituia unidadedo corpo
aparentementedispar dos AlE. Se os AlE
«funcionam»de maneiramassivamentepreva-
lEntepelaideologia,o queunificaa suadiver-
sidadeé precisamenteestefuncionamento,na
medidaem que a ideologiapela qual funcio-
namé sempreunificadaapesardas suascon-
tradiçõese da sua diversidade,na,ideologia
dominante)que é a da «classedominante»...
Se quisermosconsiderarque em principioa
«classedominante»detémo poderde Estado
(de uma forma franca ou, na maioria das
vezes,por meio de Aliançasde classeou de
fracçõesdeclasses),e dispõeportantodoApa-
relho (repressivo)deEstado,podemosadmitir
que a mesmaclassedominanteé a.ctivanos
AparelhosideológicosdeEstado.É claro,agir
por leis e decretosno Aparelho (repressivo)
deEstadoe «agir»por intermédiodaideologia
dominantenosAparelhosideológicosdeEstado
sãoduascoisasdiferentes.Seráprecisoentrar
no pormenordestadiferença,- mas ela não
poderáescondera realidadede umaprofunda
identidade.A partir do quesabemos,nenhnma,
elassepodeduravelmentedACtero poderdeEs-
tadosemexercersimultaneamentea suahege-
maniasobre e nos AparelhosIdeológicosde
Estado.Douumúnicoexemploe prova:a preo-
cupaçãolancinantede Leninede revolucionar
o AparelhoideológicodeEstadoescolar(entre
outros) para permitir ao proletariadosovié-
tico,quetinhatomadoo poderdeEstado,asse-
gurar o futuro da ditadurado proletariadoe
a passagemao socialismo".
Esta últimanotapermite-noscompreender
queosAparelhosIdeológicosdeEstadopodem
ser nãosó o al1'omastambémo localda luta
de classese por vezesde formasrenhidasda
luta de classes.A classe (ou a aliança de
classes)no podernão dominatão facilmente
1 Num textopatéticodatadode 1931,Kroupskaia
cop,taa história dos esforçosdesesperadosde ~n1ne
e daquiloque ela consideracomoO seufracasso (<<L6
chemin parcouru»).
48
" 49
osAlE comoo Aiparelho(N1Pressivo)deEs-
tado,e istonãosóporqueas antigasclasses
dominantespodemdurantemuitoteilllPocon-
servarnelesposiçõesfortes,mastambémpor-
quea resistênciadasclassesexploradaspode
encontrarmeiose ocasiõesde se exprimir
neles,querutilizandoascontradiçõesexisten-
tes (nosAIE), querconquistandopelaluta
(nosAlE) posiçõesdecombate1.
Resum8imosasnossasnotas.
lOque aqui é dito rapidamente,da luta de
classesnos AparelhosIdeológicosde Estado, está evi-
dentementelonge de esgotar a questão da luta de
classes.
Para abordaresta questãoé precisoter presente
no espírito dois princípios.
O primeiro princípio foi formuladopor Marx no
Prefácio à Contribuição:«Quandose consideramtais
perturbações(uma revoluçãosocial) é precisodistin-
guir sempreentreperturbaçãomaterial- quese pode
constatarde uma maneira cientificamenterigorosa-
dascondiçõesdeproduçãoeconómicas,e as formasjurí-
dicas,políticas,relígiosas,artísticasou filosóficasnas
quais os homenstomam consciênciadesteconflito e
o levam até ao fim.~ Portanto, a luta de classes
exprime-see exerce-senas formasideológicase assim
tambémnas formas ideológicasdos AIE. Mas a luta
50
Sea tesequepropusemosé fundamentada,
somosconduzidosa retomar,emboraprecisan-
do-anumlponto,a teoriamarxUstaclássicado
Estado.Diremosqueporumladoé preci&>dis-
tinguiro poderdeEstado(e a suadetenção
por...) e o .AparelhodeEstadoporoutrolado.
Masacrescentaremosqueo Aparelhode Es-
tado compreendedois corpos:o corpodas
instituiçõesquer~resentll;mo Aparelhore·
pressivode Estado,por um lado,e o corpo
das instituiçõesquerepresentamo corpodos
AparelhosIdeológicosde Estado,por outro
lado.
Mas, se assimé, nãopodemosdeixarde
colocara questãoseguinte,mesmonoestádio,
de classesultrapassa largamenteestas formas, e é
porqueas ultraopassaque a luta das classesexplora-
das pode também exercer-senas formas dos AIE,
portantovirar contra as classesno podera arma da
ideologia.
E isto em virtude do segundoprincípio: a luta
de classes ultra,passaos AlE porque está enrai-
zada em qualqueroutra parte que não na ideologia,
na infraestrutura,nas relaçõesde produçãoque são
relaçõesde exploraçãoe que constituema base das
relaçõesde classe.
51
muitosumário,das nossasindicações:qual é
exactamentea medidadopapeldosAparelhos
Ideológicosde Estado? Qual podeser o fun-
damentoda suaimportância?Noutrostermos,
a quecorrespondea «função»destesAparelhos
IdeológicosdeEstado,quenãofuncionampela
repressão,maspela,ideologia?
52
SOBRE A REPRODUÇAO DAS RELAÇõES DE
PRODUÇAO
Podemosrugoraresponderà nossaquestão
centralque permaneceuemsusrpensodurante
longaspáginas:C01'nO é asseguradaa reprodu-
ção das relações de proàfuçáAO?
Na linguagemda tópica (,infraestrutura,
superestrutura),diremos:é, emgrande,parte
assegurada1 pelasuperestrutura,jurídicü;pOlí-
tica e ideológica.
Mas visto que considerámosdooispensável
ultrapassaresta linguagemainda descritiva,
1 Em grandeparte.Porque as relaçõesde produ-
ção são primeiro reproduzidaspela materialidadedo
processodeproduçãoe do processode circulação.Mas
não se podeesquecerque as relaçõesi<leo16gicasestão
imediatamentepresentesnestesmesmosprocessos.
53
diremos:é, emgrandeparte,assegurndapelo
exercíciodo poderde Estadonos Aparelhos
deEstado,noA'Par~lho(~ressivo)deEstado,
porumlado,e nosAparelhosIdeológicosde
Estado,poroutrolado.
Poderemosagorareuniroquefoi di,toante-
riormentenostrêssublinhadosseguintes:
1) Todosos AparelhosdeEstadofuncio-
nam simultaneamentepelarepressãoe pela
ideologia,coma diferençadequeo Aparelho
(repressivo)de Estadofuncionademaneira
massivamenteprevalentepelarevressão,en-
quantoosAparelhosIdeológicosdeEstadofUiD.-
cionamde maneiramassivamenteIPrevalente
pelaideologia.
2) Enquantoo ApareTho(repressivo)de
Estadoconstituium todoorganizadocujos
diferentesmembrosestãosubordinadosa uma
unidadede comando,a da políticada luta
declassesrupHca-daIpelosrepresentantespolí-
t1cosdas.classesdominantesquedetêmopoder
deEstado,- os AparelhosIdeológicosdeEs-
tado sãomúltiplos,distintos,«relativamente
autónomos»e. susceptíveisde oferecerum
campoobjectivoa contradiçõesqueex:primem,
54
sob formasora limitadas,ora extremas,os
efeitosdoschoquesentrea lutadeol~ capi-
talistae a luta de classes!proletária,assim
comodassuasformassubordinadas.
3) Enquantoa nnidadedo Aparelho(re-
pressivo)de Estadoé asseguradapela sua
organizaçãocentralizadaUJlificadasoba direc-
çãodosrepresentantesdasclassesno poder,
exeeutandoa [políticade luta de ,classesdas
classesno poder,- 'a unidadeentreos dife-
rentesAparelhosIdeológicosdeEstadoéasse-
gurada,namaioriadasvezesemformascon-
traditórias,pela ideologiadominante,a da
classedominante.
Tendoemcomtaestascaracterísticas,pode-
mosentãorepresentara reproduçãodasrela-
çõesde produção1 da maneiraseguinte,se-
gundoumaespéciede «divisãodotrabalho»:
o papeldo Aparelhorepressivode Estado
consisteessencialmente,enquantoaparelhore-
pressivo,ema.ssegurarpelaforça (físicaou
1 Na parte da reproduçãopara quecontribuemo
Aparelho repressivode Estadoe os AparelhosIdeoló-
gicosde Estado.
55
não) as condiçõespolíticasda reproduçãodas
relaçõesdeproduçãoquesãoemúltimaanálise
relações de exploração. Não só o aparelhode
Estadocontribuilargamentepara se reprodu-
zir a elepróprio (existemno Estadocarpitalista
dinastiasdehomenspolíticos,dinastiasdemi-
litares,etc.), mastambéme sobretudo,o a.pa-
relho de Estadoassegurapela repressão(da
mais brutal força físiJcaàs simplesordense
interditosadministrativos,à censuraabertaou
tácita,etc.),as condiçõespolíticasdoexercício
dos Ap:uelhos Ideológicosde Estado.
São estes de facto que asseguram,em
grandeparte, a própria reproduçãodas rela-
ções de produção,«escudados»no aparelho
repressivode Estado.É aqui quejoga massi-
vamenteo papel da ideologiadominante,a
da classedominanteque detémo poder de
Estado.É por Intermédioda ideologiadomi-
nante que é asseguradaa «harmonia»(por
vezesprecária) entre o aparelhorepressivo
de Estadoe os AparelhosIdeológicosde Es-
tado,e entreos diferentesAparelhosIdeoló-
gicosde Estado.
Somosassim,conduzidosa encarara hipó-
teseseguinte,emfunçãodaprópriadiversidade
dos AparelhosIdeológicosde Estado no seu
56
papelúniICo,,porquecomum,da reproduçãodas
relaçõesde produção.
Enumerámosnas formaçõessociaiscapita-
lis-tas,contemporâneas,um número relativa-
menteelevadode arparelhosideológicosde
Estado: o a"parelhoescolar,o a.parelhoreli-
gioso,o a,parelhofamiliar,o aparelhopolítico,
o aparelhosindical,o aparelhode informação,
o a.parelho«cultura!»,etc.
Ora, nas formaçõessociais do modo de
produção«sen)Q,gista» (normalmentedito feu-
dal), observamosque, se existe um aparelho
repressivodeEstadoúnico,formalmentemuito
semelhante,a verdadeéquenãosóa partir da
Monarquiaabsoluta,comoa partir dosprimei-
ros Estados antigos conhecidos,ao que nós
conhecemos,o númerodosaparelhosideológicos
deEstadoémenoselevadoe a suaindividuali-
dadediferente.Observamosporexemploquena
IdadeMédia a Igreja (aparelhoideológicode
Estadoreligioso)acumulavamuitasdasfunções
hoje atribuídasa vários aparelhosideológicos
deEstadodistintos,novosemrelaçãoao pas-
sadoqueevocamos,emparticularfunçõesesco-
lares e culturais.A par da Igreja existia o
Aparelho Ideológicode Estado familiar que
desempenhavaump8.ipelconsiderávelemcom-
57
paraçãocomo quedeseInilJenhahoje lIlasfor-
maçõessociaisc~italistas.Apesardas~_
cias,a 19rejae a Família nãoerailllosúni.cos
AiparelhosIdeológicosde Estado.Existia tam-
bémumAparelhoIdeológicodeEstadopolítico
(asCortes,o Parlamento,asdiferentesfacções
eLigaspolíticas,antepassadosdospartidospo-
lítilcosmodernose todoo sistemaIPOlíticodas
Coanunasfrancase,depois,dasCidades).Exis-
tiatambémumpoderoso.AJparelhoIdeológicode
Estado«pré-sindical»,arriscalIldoestaexpres-
são forçoslamenteanacrónica(as poderosas
confrariasdosmercados,dosbalIlqueirose tam-
bém as associaçõesdos companheiros,ete.).
Até a Ediçãoe a InformaçãoconheceramUiIn
desenvolvimentoincontestável,assimcomoos
eSlpectáculos,primeiro, parte integrante da
Igreja e depoiscada vez mais independootes
dela.
Ora, no período histórico pré...c~italista,
que examin8Jmosa traçoslargos,é absoluta-
menteevidenteque existia um Apa;relhoIdeo-
lógiao de Estado a.om.inante)a Igreja) que
concentravanão só as funçõesreligiosasmas
tambémescolares,e umaboa parte das fun-
çõesde imorm8JÇãoe de «cultUlI'a».Não é [pOr
8Jcasoquetodaa luta ideológicado séculoXVI
58
ao séculoXVIII, a !partirdo !primeiroimpulso
dado ,pelaReforma,se ccmcentralIlumaluta
antidericale anti-religiosa;lIlãoé por acaso,
é emfunçãoda própria,posiçãodominantedo
AIparelhoIdeológicode Estadoreligioso.
A Revoluçãof.rancesateve antesde mais
por objectivoe resultadofazerpassaro poder
de Estado da aristocraJCiafeudalpara a bur-
guesiacapitalista.,comereial,queb.raremparte
o antigoa.pareI:horepressivodeEstadoe subs-
tituí-Io ;porum novo (ex.o Exércitonacional
popular), - mas tambémaJtacaro ~are1ho
ideológicode Estado n.o 1: a. Igreja. Dai a
constituiçãocivil do clero,a.confis'caçãodos
bensda Igreja e a criaçãode novosaparelhos
ideológicosdeEstadoparasubstituiremo 8.lpa-
relho ideológ1code Estado religiosono seu
p~el dominante.
Naturalmente,as coÍ8oonão andarampor
si: comoprova,temosa Concordata,a Restau-
raçãoe a longalutadeclassesentrea aristo-
cracia fundiária e a burguesiaindustrial ao
longo de todo o séculoXIX rpeloestabeleci-
mento da hegemoniaburguesan8JSfunções
outrora desemrpoohadaspela Igreja: a"ntesde
mais,na Escola.Podemosdizerquea bu.rgue-
sia se apoiou no novo a,parelhoideológico
59
de Estado político, democrático-parlamentar,
criado nos rprimeirosanosda Revolução,em
seguidarestauradoapóslongase violen~ lu-
tas,durantealgunsmesesem1848,e durante
dezenasde anos a.pósa queda do Segundo
Império,a fim detravara lutacontraa Igreja
e dese8JpoderardasfUtnçõesideológicasdesta,
numapalavra,não só para assegurara sUJa
hegemoniapolítica,mas tambéma sua hege-
moniaideológica,indispensávelà reprodução
das relaçõesde produçãoca.pitalistas.
Ê Iporisso quenos julgamosautorizadosa
avançara Teseseguintecomtodosos riscos
que issocomporta:pensamosqueo Aparelho
IdeológicodeEstadoquefoi colocadoem,posi-
çãodominantenas formaçõesc8Jpitalistasma-
duras, após uma violenta luta de classes
políticae ideológicacontrao antigoAparelho
Ideológicode Estadodominante,é o Aparelho
Ideológico escolar.
Esta tesepodeparecerparadoxal,seé ver-
dadequepara toda a gente,isto é, na repre-
sentaçãoideológicaquea burguesiapretende
dar a si própriae às classesqueela eXiplora,
pareceevidenteque o AparelhoIdeológicode
Estadodominantenas formaçõessociaisc3Jpi-
talistasnãoé a Escola,maso AparelhoIdeo-
60
lógicode Estadopolítico, isto é, o regimede
democraciaIparlamentarnascidodo sufrágio
universale das lutasdospartidos.
E no entanto,a história,mesmorecente,
mostra que a burguesia,pôdee podemuito
bemvivercomAparelhosIdeológicosdeEstado
políticosdiferentesdademocraciaparl3Jmentar:
o Império,n.O1 e n.O2, a Monarquiada Carta
(Luís XVIII e CarlosX), a Monarquiaparla-
mentar (Luís Filipe), a democraciapresiden-
cialista (de Gaulle),para só falar da França.
Em Inglaterra,ascoisassãoaindamaismani-
festas.Nestepaís a Revoluçãofoi particular-
mente bem «sucedida»do ponto de vista
burguês,visto que, de maneiradiferenteda
França, em que a burguesia,aliás devidoà
falta de visão da pequenanobreza,teve de
acedera deixar-selevar ao poderà custade
«jornadas revolucionárias»)camponesase ple-
beias,que lhe custaramterrivelmentecaro,a
burguesiainglesaconseguiu«compor»coma
Aristocraciae «partilhar»comela a detenção
dopoderdeEstadoe a utilizaçãodo 8Jparelho
de Estado durantemuito tempo (paz entre
todosos homensde boa-vontadedas classes
dominantes!)Na Alemanha as coisas são
aindamais manifestas,visto que foi sob um
61
aparelllOideológicode Estadopolíticoemque
os Junkers imperiais(sÍtmboloBismark),o seu
exéreitoe a suapoli0ia,lheserviamde escudo
e de pesso.aldirigente,quea burguesiafez a
sua entradaestrondosana históflÍa,antesde
«atravessar»a repúblicade Weimar e de se
confiarao nazismo.
Cremosportantoter fontesrazõesparapen-
sar que,por detrásdosjogosdo seuAparelho
Ideológ1code Estado político, que estavaà
bocade cena,o quea burguesia.crioucomo
AparelhoIdeológicodeEstadon.O1, erportanto
dominante,foi o aparelhoescolar,quedefacto
substituiunassuasfunçÕ€so antigoAparelho
IdeológicodeEstadodominante,istoé,a Igreja.
Podemosaté acrescEntar:o duo Escola-FamÍ-
ha substituiuo duo Igreja-Família.
Porqueé queo a;parelhoescolaré de fado
o .3JparelhoideológicodeEstadodominantenas
formaçõessociais crupita1istase comoé que
ele funciona?
Por agora,bastadizer:
1.- Todosos AparelhosIdeológicosdeEs-
tado,sejamelesquais forem,concorrempara
um mesmoresultado:a reproduçãodas rela-
62
çõesdeprodução,istoé, dasrelaçõesdeexplo-
raçãocrupitalistas.
2.- Cada um deles concorre para este
resultadoúnicoda maneiraquelhe éprópria.
O 3Jparelhopolíticosujei·tandoos indivíduosà
ideologiapolíticadeEstado,a ideologia«demo-
crática», «indirecta»(parlamentar)ou «di-
recta» Cplebiseitáriaou fascista).O aparelho
deinformaçãoembutindo,atravésdaimprensa,
da rádio,da televisão,emtodosos «cidadãos»,
doses quotidianasde nacionalismo,chauvi-
nismo,liberalismo,moralismo,ete.O mesmo
acontececom o aparelho,cultural(o prupeldo
desportono.chauvinismoédeprimeiraordem),
etc. O ruparelhoreligiosolembrandonos ser-
mõese noutrasgrandescerimóniasdo Nasci-
mento,do Casamento,da Morte,queo homem
nãoémaisquecinza,a nãoserquesaibaamar
os seus-irmãosatéaopontodeoferecera face
esquerdaa quemjá o esbofeteouna direita.
O a,parelhofamiliar..., etc.
3. - O cOIllcertoé dominadopor umaparti-
tura ún1ca,perturb3Jdade quandoem quando
por contradições(as dos restosdas antigas
classesdominantes,as dos proletáriose das
63
suas organizações):a ,partiturada ldeologia
da classeactualmentedominante,queintegra
na sua mús1caos grandestemasdo Huma-
nismodosGrandesAntepassados,quefizeram
antesdo Cristianismoo Milagre grego,e de-
pois a Grandezade Roma,a Cidadeeterna,e
os temasdo Interesse,particulare geral,etc.
Nacionalismo,moralismoe economismo.
4.- Contudo,nesteconcerto,há um Apa-
relho Ideológko de Estado que desempenha
incontestavelmenteo papeldominante,embora
nem semprese prestemuita atençãoà sua
mús1ca:ela é de tal maneirasilenciosa!Tra-
ta-seda Escola.
Desdea rpré-1primária,a Escolatomaa seu
cargo todasas criançasde todas as cJasses
sociais,e a partir da Pré-Primária, inculca-
olhesduranteMlOS, os anosemquea criança
estámais «vulneráve!»,entaladaentreo apa-
relhodeEstadofamiliareo aparelhodeEstado
Escola,«saberespráticos»(des «savoir faire»)
envolvidosna ideologiadominante(o francês,
o cálculo,a história,as ciências,a literatura),
ou simplesmente,a ideologiadominanteno
estadopuro (moral,instruçãocívica,filosofia).
Algures, por volta "0S dezasseisanos,uma
64
·I.~·~·.·O
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enormemassadeQriamçasüai «naprodução»:
são os OIperáriosou os pequenoscamponeses.
A outr,aparteda juventudeeSicolarizávelcon-
tinua: e seja comofor faz um troçodo cami-
nho para cair semchegarao fim e preencher
os postos dos quadros médiose pequenos,
empregados,pequenose médiosfuncionários,
pequeno-burguesesde toda a espécie.Uma
últimaparteconsegueacederaoscumes,quer
paracair no semi-desempregointelectual,quer
parafornecer,alémdos«intelectuaisdo traba-
lhador colectivo»,os agentesda exploração,
(capitalistas,managers),os agentesdarepres-
são (militares,polícias,políti,cos, administra-
dores)e os profissionaisda ideologia(padres
de toda a espécie,a maioriados qua,issão
«laicos»convencidos).
Cada massaque fica pelo caminhoestá
praticamenterecheadada ideologiaque con-
vém ao papel que ela deve desempenharna
sociedadedeclasses:papeldeexplorado(com
<c(;onsciênciaprofissiona1»,«mora!»,«cívica»,
<maJCional»e apolítica altamente«desenvol-
vida»); papelde agenteda exploração(saber
mandar e falar aos operários:as «relações
humanas»),de agentesda repressão(saber
mandar e ser obedecido«semdiscussão»ou
65
saber manejara dem8Jgogiada retóricados
dirigentespolítkos), ou profissionaisda ideo-
logia (ques8Jibamtra"taras consc,iênciascom
o respeito,isto é, com o desprezo,a chan-
tagem,a demagog;i.aqueconvêm,a.comodados
às subtilezasda Moral,da Virtude,da «Trans-
cendência»,da Nação,do p8Jpelda Fra"nçano
mundo,etc.).
l!: ,claro,grande nÚimerodestas Virtudes
contrastadas(modéstia,resignação,submissão,
iporum lado,cinismo,desprezo,altivez,segu-
rança,categovia,'cap.acidadepara bem-falare
habilidade)8Jprendem-setambémnasFamílias,
na"sIgrejas,na Trop.a,nosLivros, nos filmes
e aténosestádios.Mas nenhumAparelhoIdeo-
lógicode Esta"dodiSipõedurantetanto tempo
da audiênciaobrigatória (e ainda por cima
gratuita...), 5 a 6 diasem7 quetema semana,
à razãode 8 horaspor dia,da totalidadeda"s
cTiançasda formaçãosocialcrupitalista.
Ora, é atravésda aprendizagemde a"lguns
saberespráticos (savoir-faire) envolvidosna
inculcaçãomassivada ideologiadaclassedomi-
nante,quesão em grandeparte reproduzidas
as relações de produção de uma formação
socialcapItalista,isto é, as relaçõesde explo-
radoscomeXlploradorese deeXiploradorescom
66
,
t
't
JI
i
I
i§; ,
explorados.Osmeclmismosquereproduzemeste
resulta.dovital para o regimecapitalistasão
naturalmenteenvolvidose dissimuladospor
uma ideologiada Escola unive~salmenterei-
nante,visto queé umadas formasessenciais
da ideologiaburguesadominante:umaideolo-
giaque representaa Escola comoum meio
neutro, desprovidode ideologia(visto que...
lai.co), em que os mestres, respeitososda
«consciência»e da diberdade»das crianças
que lhes são confiadas (com toda a con-
fiança) pelos «pais» (os quais são igual-
mentelivres, isto é, proprietáriosdos filhos)
os fazemacederà liberdade,à rnoralidadee à
responsabilidadede adultospelo seu próprio
exemplo,pelosconhecimentos,pela literatura
e pelassuasvirtudes«libertadoras».
Peçodesculpaaosprofessoresque,emcon-
diçõesterríveis,tentamvolta:rcontra a ideo-
logia, ...:ontrao sistemae contra as práticas
emqueesteos encerra,as armasquepodem
encontrarna história e no saberque «ensi-
nam».Em certamedidasão heróis.Mas são
raros, e qua"ntos(a maioria)não têm sequer
um vislumbrede dúvidaquantoao «trabalho»
queo sistema(que os ultr3Jpassae esm3Jga)
os obriga a fazer, ipior, dedic3Jill-se,inteira-
67
mentee em toda a consciênciaà realização
dessetrabalho (os famososmétodosnovos!).
Têm tão poucasdúvidas,que contribuematé
peloseudevotamentoamantere a alimentara
representaçãoideológicada Escolaquea torna
hoje tão «natural»,indispensável-útile até
benfazejaaos nossoscontemporâneos,quanto
a Igreja era «natural»,indispensávele gene-
rosaparaosnossooantepassadosdeháséculos.
De facto,a Igreja hojefoi substituídapela
Escola no seu papel de Aparelho Ideológico
de Estado dmninante. Está emparelhadacom
a Família como outrora a Igreja o estava.
Podemosentãoafirmar que a crise, de uma
profundidadesem precedentes,que por esse
mundofora abalao sistemaescolarde tan-
tos Estados,muitasvezesconjugadacomuma
crise (já anunciadano Manifesto) queS8JCode
o sistemafamiliar,adquireumsentidopolítko,
seconsideramosquea Escola(eo parEscola-
-Família) constituio AparelhoIdeológicode
Estado dominante,Aparelhoque desempenha
um papeldeterminantena reproduçãodas re-
1açãesde produçãode um modo de produção
ameaçadona sua existênciapelaluta de clas-
seamuudial.
68
A PROPóSITO DA IDEOLOGIA
Ao aV8mçarmoso ,conceitode Aparelho
Ideológi~ode Estado,quandodissemosque os
AlE «funcionavampela ,ideologia»,invocámos
uma realidadesobre a qurulé precisodiZ'er
umaspalavnas: a ideologia.
Sabe-seque a exipressão:a ideolo,gia,foi
forjrudapor Cabanis,Destuutde Tracy e pelos
seusamigos,quelheatribuírampor objectoa
teoria (genética)da,sideias.Quando,50 anos
mruistarde, Marx retomao termo,dá-lhe,a
partir das Obras de Juventude,um sentido
totalmentediferente.A ideologiapassaentão
a ser o sistemadas ideias,dasrepresentações,
que domina° espírito de Um homemou de
um gruposocial.A luta ideológko-politicaque
Marx desencadeounos seusartigosda Gazeta
Renana depressao confrontariamIcomesta
69
realidade,eobrigá-Io-iama 341rofundarassuas
primeiras,intuições.
No entamto,depar.amo-lIlosnestepontocom
um paradoxoespantoso.Tudo parecia levar
Marx a formularumateoriada ideologia.De
facto,a ]dJeologia Alemã oferece-nos,antesdos
Manuscritosde 44, uma teoria exlplícitada
ideologia,mas... não é marxista (e prová-lo-
-emosem breve).QUailltoao Capital) se con-
tém mui,tasind1caçãesipaTa'UJIllateooi.a.das
,ideologias(a mais visível: a ideologiados
economistasvulgares), não contémpropria-
menteestateorlÍa,a qualdependeemgrande
parte de uma teoria da ideologJiaem geral.
Gostariade 'correro risco de proporum
esboçoesquemátioodestateoriada ideologia
emgeral.As tesesde quevoupartir nãosão,
é claro, improvisadas,mas só podemser de-
fendidase ex.perimentadas,istoé,iConfi~a;das
ou rectif1cadas,atr,avésde estudose anáLises
a,profundados.
70
A IDEOLOGIA NÃO TEM HISTóRIA
Primeiroquetudo,umaprulavraparaeXipor
a razão de prindpio que me parece,se não
fundamentar,pelomenosa,utorizaro projecto
deumateoriadaideologiaem geral) enãoo de
uma teoria das ideologiasparüculares,que
eXiprimemsempre,seja qual for a sua forma
(religiosa,moral,jurídka, política),posições de
classe.
Será sem dúvida necessáriodesenvolver
umateoriadas ideologiasconsideradasnoduplo
aspectoacima indicado.Veremosentão que
umateoria das ideologiasrepousaem última
análisena históriadasformaçõessociais,por-
tanto na dos modosde produçãocombinooos
nas formaçõessociaise da históriadas lutas
declassesquenelassedesenvolvem.Nestesen-
tido, é ela:roque não se pode fOI11I1lularuma
teoria da,s ideologiasem geral) pois que as
71
ideologias(definidassob a duplarelaçãoque
indicamosacima: regionale de iclasse)têm
uma história, cuja determinaçãoem última
instânciase encontra,comoé e~idente,fora
das ideologiasem sd., emboradizendo-Ihesres-
peit<;}o
Todavia,sepossodefiniro projectodeuma
teoriada ideologiaem geral) e se esta teoria
é de factoumdoselementosde quedependem
as teorias das ideologias,isso impLicauma
proposiçãoaparentemetllteparadoxalqueenun-
ciarei nos seguintesvermos:a ideologia não
tem história.
Comose s,abe,esta fórmula figura numa
passagemda Ideologia Alemã. Marx enuncia-a
a propósitoda metafísicaque, segundodiz,
tal ,comoa moral,não temhistória (subenten-
dido: e as outrasformasda ideologia).
Na Ideologia Alemã) esta fórmula figura
numcontextofrancamentepositivista.A ideo-
logiaé entãoconcebidaeomopurailusão,puro
sonho,isto é, nada.Todaa sua realidadeestá
fora desi própria.É pensadacomoumacons-
truçãoimagináriacujoestatutoé exactamem.te
semelhanteao estatutoteóricodo sonhonos
autoresanterioresa Freud. Para estesauto-
res,o sonho'erao resultadopuramenteimagi-
72
nário,istoé,nulo,de «resíduosdiurnos»,apre-
sentadosnumacomposiçãoenumaordemarbi-
trárias,por vezes«invertidas»,numapalavra,
«nadesordem».Para eles,o SOIIlhoera o ima-
ginário vazioe nulo «eorn:struido»arbitraria-
mente,ao acaso,COtmresíduosda únicareali-
dadecheiae positiva,a do dia.Tal é, na Ideo-
logia Alemã) o estatutoexactoda filosofia e
da ideologiaCpoisquelIlestaobra a filOsofia
é a ideologiapor excelência).
A ideologia,começapor ser,segundoMarx,
uma construçãoimaginária,um puro sonho,
vazio e vão, ,constituídopelos«resíduosdiur-
nos»da únicarealidadeplenae positiva,a da
história concretados indivíduos concretos,
materiais, produzindomaterialmentea sua
existência.É nestaperspectivaque,na Ideolo-
gia Alemã, a ideologianãotemhistória,dado
quea sua história está fora dela,está onde
existea únicahistória possível,a dos indiví-
duosconcretos,etc. Na Ideologia Alemã) a
tesesegundoa qual a ideologianão temhis-
tória é portantoumatesepurament1enegativa
poisquesignificasimultaneamente:
1.- a ideologianãoé nadaooquantopuro
sonho (fabricadonão se sabepor quepotên-
73
eia: sabe-se.rupooasqueela IProvémda aliena-
ção da divisãodo trabalho,o que é também
uma determinação'J'IAegativa)•
2.- a ideologianão tem história, o que
não querde maneiranenhumadizerque não
tenha história (pelo contrário,uma vez que
é apenaso pál'idoreflexo,vazio e invertido,
da história real), mas ela não Itemhistóma
própria.
Ora a teseque eu gostariade derender,
retomaindoformalmenteos termosda Ideolo-
gia Alemã (<<aideologianão'tem história»),
é radicalmentediferooteda tese positivista-
-historicistada IdeologiaAlemã.
Porque,por um lado,,creioIpodersustentar
que as ideologiastêm uma história própria
(emboraesta história seja determinadaem
última instâJllciapela luta de .classes);e, por
outro lado,quea ideologiaemgeralnão tem
história)nãonumsentidonegativo(a suahis-
tória estáfora dela) masnumreIlitidoabsolu-
tamentepositivo.
Este sentidoé 'positivo,se é verdadeque
é ,próprioda ideologiao ser dotadade uma
estrutura e de um funcionamentotais, que
fazemdelauma realidadenão histórica,isto
74
é,omni-histórica,IIlOsentidoemqueestaestru-
tura e este funcionamentoestão, sob uma
mesmaforma,imutável,PI"eSootesnaquiloa que
sechamaa históriainteira,no sentidoemque
o Manifestodefinea históriacomoa história
da luta de classes,isto é, história das socie-
dadesdJeclasses.
Para forneceru:mareferênciateórica,di-
rei, retomando°exemplodo sOIIlhoagorana
concepçãofreudiana,que a proposiçãoenUlIl-
ciada: a ideologianão tem história, pode e
deve(e de umamaneiraquenão tem absolu-
tamentenadade arbitrário, mas que é pelo
contrárioteoricamentenecessária,porqueexis-
te uma ligaçãoorgânicaentre as duas pro-
posições)ser postaemrelaçãodirectacoma
protposiçãodeFreud segundoa qualo incons-
cienteé eterno)istoé, nãotemhistória.
Se eternonão querdizer tramscoodentea
todaa história (temporal)masomnipresente,
trans-histárico,portantoimutávelnasuaforma
ao longo da história,retomarei,valavra por
palavra,a expressãode Freud e direi: a ideo-
logia é eternacomoo inconsciente.E aJCres-
centarei que esta aproXlimaçãome parece
teoricamentejustificaJdapelo faotode que a
eteI'lnidadedo incOlIJ.lscientebem uma certa
75
relação com a eternidadeda ideolo~iaem
geral.
Ê assim que me jul~ autorizado,pelo
menospresuntivamente,a propor uma teoria
da ideologiaemgeral,nosentidoemqueFreud
formulouumateoI"iado inconscienteemgeral.
Para simplificara expressão,e toodoem
contao quesedissesobreas ideologias,pas-
samos a empregaro termo ideologiaprura
designara ideologliaem geral, de que disse
quenãotemhistória ou, o queé equivalente,
que é elerna,isto é omnipresente,sob a sua
forma imutável,em todaa história (=histó-
ria das formaçõessociaiscompreendendoclas-
ses sociais). ProvisoI1iamente,limito-me de
factoàs«sociedadesdeclasses»eàsuahistória.
76
A IDEOLOGIA É UMA ((REPRESENTAÇÃO)) DA
RELAÇÃO IMAGINARIA DOS INDIVIDUOS COM
AS SUAS CONDIÇõES DE EXISTt:NCIA
Para abordara tesecentralsobrea estru-
tura e o funcionllimentoda ideologia,proponho
duas <teses:uma negativae outra Ipositiva.
A primeirarefere-seao objectoqueé «repre-
sentado»soba formaimagináriada ideologia,
a segundarefere-seà materialidadeda ideo-
logia.
Tese1: A ideologiarepresentaa relação
imlligináriados indivíduoscom as suas con-
diçõesreaisde existência.
De umamaneirageral,diz-seda ideologia
religiosa,da ideologiamoral,da ideologiajurí-
dica,da ideologiapolítica,etc.,quesão «con-
cepçõesdo mundo».E é claro quese admite,
a mooosque se viva uma destasideologias
77
camaa verdade(,parexemplO',sese«acreditar~
emDeus,na DeverO'Una Justiça, etc.),quea
ideologiade que~ fala entãO'de um pontO'
de vistacrítica, aO' examiná-Iacomaum etnó-
lagO'e~aminaas mitosdeuma«sociedooepri-
mitiva»,que estas «'concepçõesdO' mundO'»
sãO'na sua grandeparte imaginárias,,istO'é,
1}ãa«carrespondentesà realidade».
ContudO',embon adinütindO'que elas nãO'
correspandemà realidooe,portantO'que cans-
tituemumailusão,admite-~quefazemalusãO'
à realidade,e quebasta«inte~retá-las»para
reencontrar,sO'ba sua representaçãO'imaginá-
ria damundO',a própriarealidadedessemundO'
(idealagia=ilusão/alusão).
E~istemdiferentesüpas de inte~retaçãa,
dasquaisas mais,canhecidassãO'O'üpO'meca-
nicista)correntena séculO'XVIII (Deusé a
representaçãO'imagináriada Rei 'real), e a
interpretaçãO'«hermenêutica»,inauguradape-
los primeirosPadresda Igrejae vetamadapar
Feuerbache pela es,calateO'lógi,ca-filO'sófica
nele inspirada,pO're~emplO'O'teólogO'Barth,
etc. (Para Feuerbach,par e~empla,Deus é
a essênciadaHomemreal).Afirma a essencial
di~endaque,sab a condiçãO'de interpretara
transposiçãO'(e a inversãO')imagináviada
78
ideolog,ia,chega-seà ,conclusãodequena ideo-
lagia «os homensse representamsob uma
farma imagináriaassuascondiçõesde e~is-
tênciareais».
Esta inte11pretaçãadei~ ,infeli~menteem
suspelI1Saum pequenaprablema:parque«,pre-
cisam»as homensdesta transp08'içãaimagi-
náI'liadas suascondições,reaisde e~istência,
para se «representarem»as suascandiçõesde
existênciareais?
A primeira resposta,a da séculO'XVIII,
propõeuma soluçãO'simples:acu1pa é das
Padrese dasDéspotas.Faram elesque «far-
jaram» as BelasMentiraspara que,julgandO'
abedecera Deus, as hamensabedecessemde
factO'aos padresau aas Déspatas,na maiar
:partedasvezesaliadasnasuaimpostura,asPa-
dresao serviçO'dosDéspatasauvice-versa,se-
gundoaspasiçõespalíticasdosditas«teóricos».
ExisteportantO'umacausaparaa transpasiçãa
imagináriadas candiçõesde existênciareal:
estacausaéa exis,tênciadeumpequenogrupO'
de hamenscínicas,queassentama sua dami-
naçãO'e a sua explaraçãada «pava»numa
representaçãO'falseadada mundO'que inven-
taram para subjugaras espíritas,dominando
a ima,ginaçãadestes.
79
A segundareSlposta(a de Feuerba,ch,reto-
madaa par e passopor Marx nas ObI1asde
Juventude)é mais «profunda»,isto é, igual-
mentefalsa. Tambémela procurae encontra
umacausaparaa transposiçãoe paraa defor-
maçãoimagináriadas condiçõesde existência
reaisdoshomens,numapalavra,paraa aliena-
çãono imaginádoda representaçãodascondi-
çõesde existênciados homens.Esta causajá
nãosãoos Padresou osDéspotas,nema ima-
ginaçãoactivadestese a imaginaçãopassiva
das suas vít,imas.Esta eausaé a alienação
materialquereinanascondiçõesdeexistência
dospróprioshomens.Ê assimque,na Questão
Judaica e noutros escritos,Marx defendea
ideiafeuerbachianasegundoa qualos homens
se fazemumarepresentaçãoalienada(= ima-
ginária) dassuascondiçõesdeexistênciapor-
que estascondiçõesde existênciasão em si
alienantes(nos Manuscritosde 44: porque
estas condiçÕ€ssão dominadaspela essência
da sociedadealienada:o «trabalhoalienado»).
Todasestasinterpretaçõestomamportanto
à letraa tesequepressupõem,e emquerepou-
sam,a saber,queo queé reflectidona repre-
sentaçãoimagináriado mundo,presentenuma
80
ideologia,são as condiçõesde existênciados
homens,,istoé, o seumundoreal.
Ora, retomoaquúumatesequejá formu-
lei: nãosãoas,condiçõesdeexistênciareais,o
seumundoreal,que«oshomens»«serepresen-
tam»na ideologia,masé a relaçãodoshomens
comestas condiçõesde existênciaque lhes é
representrudana 'ideologia.Ê esta relaçãoque
estáno c~mtrodetodaa representaçãoideoló-
gica, porta:ntoimaginária,do mundo real.
Ê nestarelaçãoqueestácontidaa «üausa»que
devedar contada deformaçãoimagináriada
representaçãoideológicado mundoreal. Ou
melhor,rparadeixa:remsuspensoa linguagem
da ica:usa,convémformulara tesesegundoa
qual é a naturezaimaginária destarelação
quefundamentatodaa deformaçãoimaginária
quese ipodeobservaremtodaa ideologia(se
mãose viver na verdadedesta).
Falando uma Linguagemmarxista, se é
verdadequea ,representaçãodasIcondiçõesde
existênciarealdosülJdividuosqueOCUP3JID pos-
tos de agentesda produção,da exploração,da
repressão,da ideologização,da prática cien-
tifka, relevaemúltimainstânciadasrelações
deproduçãoe dasrelaçõesderivadasdasrela-
çõesde produção,rpodemosdizer O seguinte:
81
todaa ideO'logiarepresenba,nasuadefO'rmação
necess,ariamenteim~ginária,nãoasrelaçõesde
[produçãoex:istentes(e as O'utrasrelaçõesque
delasderivam),mas antesde mais a relação
(imaginária)dos ,indivíduoscom as relações
deproduçãoe ,comas reLaçõesquedelasderi-
vam. Na !ideologia,o que é representadonãO'
€ o si,stemadasrelaçõesreaisquegovel1nama
existênciados indivíduos,mas a relaçãO'ima-
gináriadestesindivíduos,comas relaçõesreais
emquevivem.
Se\lldoassim,a questãoda «causa»da de-
formaçãO'imaginária das relaçõesreais na
,ideologia,caJi[lor ,terra,e deveser substituída
por umaoutraquestãO':ipO'rqueé quea repre-
sentaçãO'dada aos indivíduosda sua relação
(individual)comasrelaçõessociaisquegover-
namas suas ,condiçõesde existênciae a sua
vida ,coleertivae individual,é necessariamente
imaJginária?E qual é a naturezadesteima-
ginário? Assim colocada,a questãoeV3;0uaa
soluçãopeLa«pandilha»(<<clique»)1 de um
1 11:propositadamenteque empregoeste termo
muito moderno,Porque mesmonos meioscomunistas,
82
grupO'de indivíduos (Padres ou Déspotas)
autO'resdagrandemistificaçãoiÍdeológLca,asSiÍm
comO'a soluçãO'pelo carkter ali€lIladO'do
mundO'real.NO'prosseguimentO'da iIlossaexpO'-
siçãO'vamosver pO'l1quê.PO'raJgüra,nãO'ire~
mosmais longe.
Tese II: A ideologiatem uma ~istência
material.
Já aflO'rámO'sesta tese quandO'dissérrlos
que as «1dieias»üU «rCfPresentações»,etJc.,de
queparecesercO!IllIpostaaiÍdeologia,nãO'tinham
existênciaideal,CiSlPiritiUal,masmaterial.Suge-
rimos que a existênôiaideal, eS[lLritual,das
«ideias»relevavaex:clusivamentedeumaideO'-
logia da «ideia»e da ideologiae, acrescen-
temos,deumaideolO'giadO'querpareee«funda-
mentar»estaiCollicerpçãO'a[lartirdarupariçãO'das
ciências,a sruber,O'que00 práticosdas,ciências
se re[lresentam,na sua ideolügiacS[lOlltânea,
comO'«ideias»,verdadeirasüU falsas.É clarO'
que,rupresentaJdasO'b'a fO'rmade umaafirma-
çãO',estatesenãO'é demOIlSitrada.Aipenaspedi-
a «explicação»de um desviopolítico (oportunismode
direita ou de esquerda)pela acçãode uma «pandilha»
(<<clique») é infelizmentecorrente.
83
mosquellie sejaIconcedtdo,emnomedo ma;De-
vialismo,um preconceitofavorável.DesenvoJ-
vimentosmuitolongosseriamnecessários:para
a SiUademonstração.
A tese:presuntiva da existêncianão oopiri-
tual masma;teI'Íaldas «ÍJdeias»ou outras«re-
presentações»,é-tllosde Lado necessáriapara
wvançarna anáLiseda naturezada ideologia.
Ou melhor,é-nosútil :paraescl3;I'ecero que
todaa análisesé.riade umaideologiamostra
imediatamente,eIl1ipirkamente,'atodoo obser-
v8Jdormesmopoucocritico.
Dissemos,ao falar dos aparelhosideoló-
gicosdeEsta;doe dasprá1Jitcasdestes,quecooa
um delesera a crealizaçãode uma ideologia
(sendoa unidadedestasdiferentesideologias
regionais- religiosa,moral,jurkLi:ca,(política,
estética,€tc.- asseguradapela sua subsun-
ção à 'ideologiadominante).Retomamosesta
tese:umaideologiaexiste,semprenuma;pare-
lho, e na sua prática ou suaspráticas.Esta
existênciaé material.
Ê daro quea existênciamaterialda ideolo-
gianumaparelhoenassuas:práticasnãopossui
a mesmamodalidooequea e~istênüiamaterial
de umapedraou de uma espingarda.Mas, e
correndoo risco de nos chamaremn€o-aristo-
84
télicos (note-seque Marx tinha Aristóteles
emgrande'conta),diremosque «amatériase
àiz em vários sentidos»,ou melhorque ela
existesobdiferentesmodalidades,todasenrai-
zadasemúltimainstâneiana matéria«física».
Dito isto, vejamoso que se passa nos
«indivíduos»que vivemna ideologia,isto é,
numa ropresentaçãodo mundo determinada
(religiosa,moral,etc.),cuja deformaçãoima-
ginária dependeda relaçãoimagináriadestes
indivíduoscomassuascondiçõesdeexistência,
Íf,toé, emúltimainstâmcia,comasrelaçõesde
produçãoe declasse(ideologia=relaçãoima-
gináriacomrelaçõesreais). Diremosqueesta
relaçãoimagináriaé emsi mesmadotadade
umaexistênciamate!1Íal.
Ora verificamoso seguinte:
Um indivíduocrê em Deus,ou no Dever,
ou na Justiça, etc. Esta crençareleva (para
todosos quevivemInuma'representaçãoideo-
lógka da ideologia,que reduz a ideologiaa
ideiasdotadaspor definiçãodee~istênciaespi-
ritual) das ideiasdessemesmoindividuo,por-
tantodele,comosujeitopossuindouma cons-
ciênciana qual estão contidasas ideias da
suacrença.Atravésdodispositivo«concerptual»
perfeitamenteideológicoassim estabelecido
85
(umsuj<litodotadodeumaconsciênciaemque
fo~malirvremente,ou reconhecelivremente,as
ideiasemquecrê),ocompomamento(material)
do dito sujeitodecorrenaturalmente.
O ,indivíduoem,questãoconduz-sedestaou
daquelamameira,adOlptaesteou ruquelecom-
portrumento(práticoe, o queé ma~s,iParbidpa
emcertasprátLcasreguladas,quesãoasdoapa-
relho ideológi'code que «dependem»as ideirus
queenquantosujeitoescolheulivremente,cons-
cientemente.SecrêemDeus,vaià Igreja para
assistirà Missa, ajoelha-se,reza,confeSlSa-se,
faz penitência(antigMIlJent<lestaera material
no sentidocorrentedo teNllo)e naturalmente
arrepende-se,e continua,etC.Secrêno Dever,
terácomportamentos,correspondentes,inscritos
nasprática,srituais,«,conformesaosbonscostu-
mes».S'ecrê na Justiça, subme1er-se-ásem
discussãoàs regras do Direito, e poderáruté
prort€sltarquamdoestas são v,iolrudas,russinar
petições,tomaripartenumamanifestação,e1lc.
Em tOldoesteesquemaverificamos,portanto
que:arepresentaçãoideológicada ~deologiaé
obrigadaa reconhecerque todo o «sujeito»,
dotado de uma «,consciência»e crendonas
«ideüas»quea sua «:consciência»lhe inspirae
que aceitalivremente,deve«agir segundoas
86
II
-~I
'"
1.,.
suasideias»,deverportantoinscrevernosactos
dasuaprátilcamaterÍailas suasprqpriasideias
desujeito,Livre.Se 01 não faz, «ascoisasnão
estãobem».
De facto, se não faz o que deveriafazer
emfunçãodaquiloemque rucredJita,é ipOTque
faz outra coisa,o que,sempreemfunçãodo
mesmo:esquemaideaJista,dá a entenderque
temideiasdiferootesdasqueproclruma,e que
agesegundoessasoutrasideias,comohomem
querdnconsequente»(<<ninguémé mauvolun-
tariamente»),quercÍillÍICoou perverso.
Em quaLquerdoIS,casos,a ideologiadaá.deo-
logiareconheceportanto,apesarda suadefor-
maçãoimaginária,queas«ideias»deumsujeito
humanoexistemnosseulSalCtos,oudevemexis-
tir nos seus:tctos,e se ,istonãowcnntece,em-
presta-lheoutras 1deiascorrespondentesaos
aJctos(mesmopervemos)queelerealiza.Esta
ideologi,afala dos·actos: nós falaremosde
actosinseridosempráticas.E faremosnotar
que estasIpráticaJssão reguladaspor rituais
emqueelasseinscrevem,no seiodaexistência
materialde um aparelhoideológico)mesmo
quese trate de umaipequenísSlÍma:partedeste
alParelho:umamissapoucofrequentrudanUlffia
crupela,um enterro,'UmpeqUi€lIlOdesalfiode
87
fuItebolnumasooiedadedesportiva,um d~ade
aulasnumaescOila,uma'I1tmniãoouummeeting
de um partidopolítico,eW.
Devemosà «dia1OOt~ca»defemsivadePascal
a maravilhosafórmula que nos vaiÍpermitir
invertera ordemdo esquemanocionalda ideo-
logia.Pl8,SlcaldÍQ';aproximadamenteo seguinte:
«Ajoelhai-iVos,mexeios lábioscomose fOSlSeis
rezar,esereiscrentes».Inverteportantoescam-
dalosarnenteaordemdascoisas,trazendo,como
CrÍlSto,nãoa rpaz,masa divisão,e aLémdisso,
o queémuitopoucocristão('porque3:idaquele
que provocaescâruialo!),o escândalo.Bem-
-aventuradoescândaloque, 'por desafiojan-
senista,o leva a falar uma Linguagemque
designaa Tealidadeem/pessoa,
VamosdeixarPascal aosseusargumentos
de luta ideológkano seiodo aparelhoideoló-
gicode mstrudoreLigiosodo seu tOO'lrpo.Reto-
maremosuma HIIl@U8<gemmais directamente
marxista,sepudermos,rpoisentramosemdomí-
nios aindamal explorados.
Diremosportanto,,considerandoarpenrusum
sujeito (tal indivíduo),que taexistênciada::;
ideirusda sua ,crençaé material,porquerus
suas idcias são ados materiaisi1'Weridosem
88
t
II
práticas materi.ati8,regulaiUlspar ritu.wismate-
riais quesoo tambémde/i'Yllido8 peloaparelho
ideológicomaterialde que relevam00 ideia8
dessesujeito.o,squaItroadjectivos«materiais~
ÍlnsoritosnanossarprÜlposiçãodevemserafecta-
dosdemodalidadesdiferentes:a materialidade
de uma deslocaçãopara ~r à missa,de um
ajoelhar,de um gestode sinal da oruz ou de
meaculpa,de UJInafI'lase,de uma oração,de
uma,contrição,deumapenitência,deumolhar,
de um apertode mão,de um dis~ursoiVerbal
ex'temoou de um d~urso verball«'interno»
(a consciência)não é uma única e mesma
materia1idade.Deixamosemsuspensoa teoria
dadiferençadasmodalidadesdamaterialidade.
N~ta apresentaçãoIÍnverlidadas coisas,
não estamoslperamteuma «inversão»,pois
const3Jtlamosque a;lgumas:noçõesdeS3jparece-
rampura e simplesmenteda nossaiI10IVaaJPre-
sentação,enquantooutras subs,iateme novos
termos3Jparecem.
Desapareceu:o termo ideias.
Subsistem:os ,termossujeito, cornseiência)
crença,aotos.
AJparecem:os termospráticas)rituais,apa-
relho ideológico.
89
Não se !trataportMlJtode uma inversão
(salvo.nosentidoem que se diz que 111m,go-
vermoou um capoforam derrubados[renver-
sés] ), mas de umaremodelação(de tipo não
ministerial)ibastamteestI1amha,dadoqueobte-
moso seguJ1nteresult8ido:
As ideias desa'Pareceramenquamtotais
(enquantodotadasde uma e~istênciaideal,
espiritual),na med,idaemquef:lcouclaroque
a existêncIadestasse linscreY1ianosactosdas
práticasreguladas,pelosrituais def,inidosem
última instânciaIpor UtIll alParellioideológico.
Surge assim que o sujeito age enqu8mJtoé
agidopeloseguintesistema(enunciadona sua
oroemde determina.çãoreal): ideologiaexis-
tindonum aparelho'ideológicoma;terirul,pres-
crevendop.rMic8JSmateriais,reguladaspor um
rutualmruteI1ial,as quais (práticas) existem
nos actosmaJteriaisde um sujeitorugindoem
consciênciasegundo,asua crença.
~as estaapresentação~ostra que,conser-
vámosasInoçõesseguintes:sujeito,consciência,
crença,actos.Desta sequência,extraímosjá
o termo,central,decisivo,dequetudodepende:
a Inoçãode ~mjeito.
90
E enunoi'amosentão as duas teses con-
juntas:
1- Só existeIPrátleaatravése sob uma
~deologia;
2- Só existe,ideoJogiaatravésdo sujeito
e para sujeitos.
Podemosagora regressar à nossa tese
central.
91
A IDEOLOGIA INTERPELA OS INDIVíDUOS
COMO SUJEITOS
Esta tese seTVepara eXip1icitara nossa
última proposição:só existe ideologiapelo
sujeito e para sujei,tos.Entenda-se:só existe
ideologiapaJ'asujeitosconcretos,e estadesti-
naçãoda ideologiasó é possívelpelosujeito:
entenda-se,pelacategoriadesujeitoe peloseu
funcionamento.
Com,istopretendemosdizerque,mesmoque
elasóapareçasobestadenominação(osujeito)
aquandoda instauraçãoda ideologi'aburguesa,
e sobretudoaquandoda instauraçãoda ideo-
logia jurídica\ a categoriade sujeito '(que
1 Que toma a. categoriajuridica de «sujeito de
direito» para fazer dela uma noção ideológica:o ho-
memé por naturezaum sujeito.
93
podefuncionarsob OIUtvasdenominações:par
exemplüem Pl3Jtãü,a alma,Deus, ebc.) é a
eategorra,cün'Sltitutivadetüdaa ideülOlg,ia,seja
qual for a detellminaçãüdesta (regionalou
de classe)e seja qual [ar a sua data histó-
rka - dadoque a ideologianão temhistória.
DizemüS:raC3Jtegüria.desujeitoé 'Constitu-
tiva detodaa ,ideola~ia,masaümesmütempo
e imediatamenterucresc€II1Jtamosque a cate-
goria de sujeito só é constitrutivade toda a
ideologia)na mediàaem quetodaa ideologia
tempar função(quea deji'Y/Je)«constituir»üS
i'YIJdivíduosconcretosemsujeitos.É nestejogo
de duplacolI),sUtuiçãoquecOll.&iste01 fUiOJciona-
mentodetodaa ideülogia,!poisquea ideolog;ia
não é mais que o seuprÓlIJriüfUllIcionamerntü
nas forma:smruteriaisda exJistêrnoiadestefutll-
cijünamento.
Para secompreenderbem01 quesegue,con-
vémsublinharquetantüa autordestaslinhas,
camüo leitür, são sujeitas,rportantüSlUjeitos
ideológi'cas(prOlposiçãotautOllógica),istü é,
quea 3Jutorcomü01 leitor ,desta:slirnhasv,ivem
«eSIPontaneamente»üu «rnaturalmente»na ideo-
log,ia,no sentidü em que dissémasque «o
hamemé par naturezaum anianalideológica».
94
Queo autor,enquantoescreveestaslinhas
deumdiscursoquesepretente.científilca,es.teja
completamenteauselllte,,como«sujeito»,do
«seu»discursrOcierntíficüCrporquetodo a dis-
curso rCicntíficoé por def,iniçãoum discurso
semsujerito;não existe «Sujeitoda ,ciência»
a não ser numaideologiada ciência), é outra
questãoque por agara deixaremosde lado.
COlmodizi,aadmiraveLmenteS. Paula,é no
«Lagos»(entenda-se:na ideülo~ia),quetemos
«o ser, o movimentoe a vida».Segue-seque
paravocê(leitor),rcoma'paramim,a categoria
desujeitoé uma«evidêrnóa»primeira(asevi-
dênciassãasernpre,primeiras): éclaroqueeu
e você somossujeitos (1.ivres,morais, et:c.).
Cama todas as evidênaias,incluindo as que
fazemcom que uma !palavra«designeuma
coisa»üu «possuaumasignifi:cação»(portantü
incluindü,aiSevidêrnciasda «trans'parência»da
linguagem),esta«evidência»dequeeu e você
somossujeitos- e queessefactonãü

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