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MACEDO, Jorge Borges de. Formas e premissas do pensamento luso brasileiro do século XVIII

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DO PENSAMeNTO LUSO-BRASILEIRO
FORMAS E PREMISSAS
DO SÉCULO XVIII
por Jorge Borges de Macedo
J. I
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Experiência e campo de análise altamente estimulantes para o historiador
e socióloriO-·sáo·eSsé-f'-ehn:iue-se·-estüd~rn·ãs-frãrisfer~!:i9i~ide··raeias·e··fóimas
de umas para outras áreasou sociedades e se vai examinar cõrri"õ evolurram ou
se desenvolveram, em separado, depõlsdé ériíérgiréni··aéfü"iTiª ori"gemcClnscifen-
temente comum. Os problemas da transformação da mentalidade;·aõn'i"ôdt:njÔmo
esta se vai ajustar a uma nova realidade e se enriquece por criações originais,
assim como o da procura dos seus fundamentos, que as não desmentem, são
dos mais importantes da história da cultura e do pensamento. Os resultados desta
pesquisa têm alcance tanto teórico como prático mas que não vamos referir
aqui, por análise especulativa, Importa muito mais, à maneira histórica, consl-
derá-los em concreto.
Dentro deste tema geral, que aspectos se deverão considerar essencIais,
nas forrn •.•" de ""',..,s"mc •..•to 1r • .,.,..,_h •...;·"õl6i•.,..,do se' culo V\llll? Ouals "'..;"U"":' premissaslU U~IIU •••.'o1· p't.40ll \.4t1 Ii JU\.JU ILIft ••""JUVI~U UU "1,,t.~ •..• Iw ••.•...•.•••'"' w_ ._ lU-.J ••••••'-'~
que se revelaram mais exiqentes de consequências? _É esta a questão, -. .._...
É preciso começar por se dizer que o pen§,ªmento 9.!ª-?íleiroe portuquês
mergulham as suas bases numa perspectlvàcjlstã, Importa, decerto, chamar a
atenção para elas, menos como princípio geral do que no particular da sua
manifestação, neste ten.po e lugar: século XVIII, Brasil, Portugal. E essa consi-
deração leva-nos, inevitavelmente, aCl·quS···ástálrnpllclto no projecto missionário
assente em dois princípios ~ssenciais. Em primeiro lugar, em tal projecto, os
elementos definitórios. do..humano têm de ..ser tomados com9 ...absolutamente
comuns a todos os homens, sem qualquer exclusão. Isto é, para que a evange-
llzacão tenha sentido, tem de ·se acredltarriurna Razão comum, numa unidade
de capacidade e responsabilidade, para além ··Cfasld'ifereH,-ça·s-que,indiscutivel-
mente, se sabe· existirem. Mas, estas diferenças nunca podem afectar a natu-
reza racional dos homens, a capacidade de eles entenderem a sua finalidade
racional e axiológica, de se tomarem como homens. Assim, nos seus extremos,
nobreza e escravatura são, tanto uma como outra, circunstâncias. A. unidade
radical do homem está na apreensão da sua esptrltualldade.Jntrlnseca e na
possibilidade de agir em consequência dela. É por essa unidade existir que
a doutrina pode ser ensinada a todos os homens e por eles pode ser conce-
blda, tanto no seu particular como no universal que lhe corresponde. Os mis-
sionários não duvidam de encontrar o modo da doutrina geral se tornar clara
I•
1
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Rev. Bibl. Nac., Lisboa, 1 (1), 1961, p. 74·82
74
MACEDO. J. B. - Formas e Premissas do Pensamento Luso-Brasileiro
na sua comunicação. sem deixar de se obrlçarern a perceber como é que o
particular de nós se liga ao geral que a todos nos caracteriza.
. EsJJL.~onvicçãoessencial vivida pelo Cristianismo relativa à unidade do
···homenr·aplicou:Sê·n.~~~~?I!t(~é.li.~êÇ~O"-~(r:ªr~~JLc.onl_espeGiaLsi9nJtfoado.Não era
uma círcunstâncla.Tuma vez que exprimia aquilo que continua a ser a filosofia
da evanqellzação. Com efeito, por ela, o homem foi sempre considerado como
uma unidade estabelecida pela confluência da razão e do argumento, pela viabi-
lidade da prova e da comunicação, sem que corrompa a essência do pensamento
que está por detrás das suas ·formas particulares, ou específicas; do existir.
Antes do conceito de interdiscipJinaridade, há, pois, na evangelizacão, a certeza
operatlva na lntercomunicação das pessoas e dos"e~.v_o~~~ás··ci~-'.llzli_9.9J?~~:d.as
religiões. Assim, o Brasil, Cioré:ç.éDef·a·süã-::fõrmãçãocristã~coincidente ..com a
portuguesa, recebeu com a mesma força ee me~'TI.~.yI~!~~qª.º.~,.~ssaccnvlcção
da unidade do humano, não propriamente só na tormaqeuma.rellqlêornas.como .
uma vivência que fmpreglJ'i.",,~~Jelações:_.bjJ.riianas,na interpretação de que a
verdade é una, embora seja diversa a forma delá'séapresentar. Recebeu também
a convicção de que, quaisquer que sejam .as particularidades a que está sujeito,
sempre o homem terá capacidade para atingir a condição geral do conhecimento
e distinguir o bem do mal. Princípios que impregnaram o Brasil mental, como já
o tinha feito à cultura portuguesa.
O segundo princípio vivido pela sociedade portuguesa e brasileira acentua
o carácter circunstancial das categorias. sociais .. Só dentro desse principio é
que aceita o funcionamento necessário da hierarquia e!:l_treos homens. Ascate-
gorias sociais em caso algum são tornadas p!310 Cristianismo evangelizador - e não
há outro - como definitórias da qualidade .co homem no mundo, embora lnter-
firam no modo como ele se deve responsabilizar, ou seja, como deve Interpretar
e cumprir as relações consigo próprio e os outros. Do .escravoao senhor,do
negro ao branco, do índio ao reinol, a situação que qualquer deles ocupa neste
mundo nada tem a ver com a sua .natureza .de .hornern, .essa comum e de igual
. significado' sobrenatural. .Um rei não é-iTiais do que um escravo, perante a
Revelação ou os valores. É este conceito que está por detrás da .crítlca social
de Gil Vicente e que vive em António Vieira, é a que nos aparece em críticos
como Matias Aires ou nos educadores do século XVIII.
Foi dentro desses dois principias que os jesuítas e as outras ordens
religiosas evangelizaram no Brasil, tantas vezes em conflito com os defensores
da essencialidade do temporal. Foram esses principias que eles levaram às
últimas consequênclas, ao defender os índios. Assim pensaram Las Casas ou
Marlana, ao analisarem o problema missionário e a organização da sociedade.
Para eles, nunca é a transitória situação política que está em causa mas a neces-
sidade de garantir - e portanto defender -s- os homens contra a viabilidade da
opressão. E esta decorrerá do abandono do fundamento sobrenatural como
exigência insubstituivel para a responsabilidade do poder; O brasileiro, como o
português, foi ensinado pelos franciscanos •.domlnlcanos.ojesultas- como· já. em
Portugal o tinham feito beneditinos e agostinhos de que os regimes são formas
transitórias- e não essenciais - da sociedade. Servem para gerir os negócios ..e
organizar responsabilidades mas não para atingir a motivação essencial da vida
humana. Quando Pombal expulsou os jesuítas já era tarde para que esta verdade·
sobre os regimes políticos e sociais tivesse deixado de penetrar na sociedade
I como um princípio e fermento de resistência. O português, tal como o brasileiro,
foi ensinado que política é serviço, não essência, nem natureza, O português,
Rev. Bibl. Nac.• Lisboa, 1 (1). 1981, p. 74·82
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..._-----
Revista da Biblioteca Nac:;;.-a
tal corno o brasileiro, não via, nem foi ensinado a que a área da política pudesse
estar separada da moral e do direJ!CJ._natural. Aprendeu, antes, que era ind$-
. pensável aç?f,JJ~I,a.r3rpõ.lí~ico~()·r:n.o-l1ma'áréã'-~e.fá,cU,t~_Il~~9~~,~_~~~_~0-:-Porcon-
"sequência, mais do que nenhum ,OlJtr,o".o djrlg~f1.t~..::pre.~lsavade ser instruído
na.igualàaáe dos homens' perante Deus, emborana desig\Jatefã'decom 'que pres-
tam contª-~,_,e.lILJ~ª-YJ~ªçlcf,da~diferentes flÚições.em que se', responsabilizam.
Iguaidade no direito e na responsabilidade, diferenças nas formas e nas circuns-
tâncias, na vida. de cada um. Aplicado ,àpqlitica •. 9:._Qri,stianismo'via, na altura,
sem preocupação" o rei .a.lJsolüt6;:'"qÚ!3.nd9.:,patQli9P,",P.2Ü1Ue(se::·cf..~érà;:-'âeveria
~3jsse·rertõmar.fi:' obrigãçãoaõ'põaef-ãtr!3-vés"'4~ste prisma.de."çli.r~jti::i,'naturál.
Mas já comecava a preocupar-se, como se veriflca nas decisões do Concílio
de' Trento, em, Lainez," oú, "depois,' em' Mariacià-é"óútrôs:--qüanCfõ~-õ ·'prlncipe
pode deixar de ser, católlco., Nessas. condições, como· defender' o povo contra
a tirania? Nesse caso, a monarquia absoluta torna-se lnaceltável, _Estes dados,
por muito que quasedüzénfos anos deccmentárlos ilusórios acerca dos séculos
XVII e XVIII os queiram fazer esquecer, _constitufarn.o_s_:_verda.r;!eiros"debates
políticos .daquele, tempo, s,=!bstituidos, d13P_9is",pelas _opinjões~ tféinsft(Çrj"as~:-dos.
.iJuministas-qu,e"éanesial}ªmente" arçurnentavam.sem história. Leia-se, por exem-
plo, Pascoal de Mello Freire e ver-se-a como ele estava fntelramenteccnsclente
do que todos estes principios significavam.
Princípios que nem Pombal nem a expulsão dos jesuftas conseguiram
eliminar. Deles derivavam importantes consequências que diversos pensadores
portugueses e braslleiros exploraram e ventllararn-. A partir destas exigências,
a.função do- governante deverá-ser, afinal;" impedir que as'''circuilstâncias da
vida social afectem a essência do homem ou lhe retirem dlreltosque ele alcançou
pela civilização ou, pejo, encontro .mterior, O governante'" existe para governar.
Não para atribuir fins ao homem. Esses já estão estipulados e definidos, como
racionais e superiores, não precisam mudar em função do político, mera clr-
cunstância.
Pontos de partida, raizes de uma filosofia política e de uma concep-
ção do homem - o que é o mesmo - que enformaram o pensamento de por-
tugueses e brasílelros, espécie de epistema do pensamento político peninsular,
que impregna as meditações dos filósofos da política desde Álvaro Pais a
Francisco Vitória, Suarez ou· Jerónimo Osórlo e prossegue, até ao século XVIII,
não só em concepções teóricas como' na vivência prática numa sociedade, a
esse respeito, exigente." Por razões diversas, a sua exploração sofreu, no sé-
culo XIX, uma considerável impugnação, embora ela não tivesse bastado para
Ihes retirar o papel de principias directores. O ilumlnlsmo, acaso também a
influência de uma concepção estritamente religiosa do Cristianismo, tentou
transferir estes princípios para a esfera exclusiva da vida privada ou para um
distante questionário metaflsico de mero significado formal e oficioso. Nestas
opiniões, tudo isso teria algum sentido, mas tão-só, lna "mera" teologia. E não há
dúvida que o acto religioso, circunscrito à área do/puramente litúrgico, abrandou
a sua intervenção no fenómenopotítico. Disseram-se no século XIX e XX enor-
midades sobre estas questões do pensamento político português em geral,do
jesuíta em particular, referido este último - contra a própria evidência - como
defensor acérrimo da monarquia absoluta. E no entanto a doutrinação era
claríssima e .os jesuítas eram, a esse respeito, intransigentes. Não pactuavam
nem quanto. a. origem' do poder" nem. quanto" às. responsabilidades do" gQ,YJ3r-
nante que dai derivam. As acusações que José Seabra da Silva Ihes fazia, no seu
Rev, Bibl. Nac,. Usboa, 1 (1), 1981, p, 74·62
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MACEDO, J. B. - Formas e Premissas do Pensamento Luso-Brasileiro
T
lonqo- panfleto (1>, de' que negavam o' poder absoluto dos reis; eram perfeitamente
pertinentes, se considerarmos ..que- a, essência- originária do poderé.i.para-eles,
mais importante que a, forma que .ele. pode revestir -. E,.essesensinamentos ou
advertências dos jesuítas impregnaram profundamente a doutrinação pólitica 90
século XVIJI. -
Em consequência da expulsão dos jesuítas, o debate ficou entregue aos
puros ..raéIoCtií-ios=da~n~ç,e~iªJª.~Çf.e.h.!§.,t.§,~E.ª~=2~..:::~~_cibló·gi6à:'O - U~"ój§'~passou ..a
ser tomado tão-só como uma consequ&nç,i,ª natural ao'áfité'ó~dente, vist~,portémtQ
na relatividade da evolução.,' Fpi_,,!'lsta outra"õrrêfitação-'q:u.:~:C=aásirn=~J'!.\r9.4_Jla
,conceptuallzaçâo políticae clJl~ur_aldo século' XVnl~§.nde~J9m.Qu,..e,o!r..~Jl.ós,a f~.!:E)1a
de "desjiotlsrno iluminado" .ou. ilüminls1a;--Má(iá no reinado de D. João V se
desenhava essa tendência para a tutela da Igreja pelo poder político. É mesmo
nesse reinado que ela tem expressão plástica e monumental, como se vê no
Convento de Mafra. Aí, já os torreões do poder civil ou do Palácio Real envolvem
e protegem, à sua maneira, a Igreja e o Convento. Mensagem arquitectónica
que se não vê em nenhuma outra construção nacional. No Mosteiro dos Jerónimos,
do século XVI, D. Manuel está à porta e de joelhos.
A alternativa evoluclonista, lrnplícíta no iluminismo, envolve a despro-
moção do presente, Este não surgia válido em si mesmo; só era apreendido em
sequêncla, numa posição de continuidade. Em contrapartida, .-ª-_'p'.Qsição--até
então ensinada e propagada. constituindo a forma mentis.envolvente das.opções
fundamentala-constltutivas -da ...vjç:t~__~~mana (a escolha dé!...p-rqfl$.~j'!9J_<L9.?iSª-
. mento, os aetos de fé, a responsabilidade'das opim~ educação- dos jíes-
cendentes.c.etc.), .exprtmlaa, ,9º-ncepç~() existencial católica sobre o presente.
Sém negar a importância dos antecedentes, o"" hoje" enelá"interprefaifõcomo
um desafio à capacidade de o homem enfrentar, apoiado em valores e na con-
vicção da sua espírltualldade, as dificuldades que a vida puramente material
lhe faz surgir no caminho. A tentação de abandonar a responsabilidade espiritual
para simplificar a 'lida, através da arrumação do material, é considerada, nesta
concepção, como dotada de Igual poder persuasivo em todas as épocas. E todas
elas têm de a repudiar, embora o façam de modos diferentes, .oE~,a importância
existencial (1.0. presente, sem. prejuízo do papel. dos- antecedentes,.impregnou
profundamente e durante muitos séculos, osquadros socials.luso..:-brasilel.ros: eIªa
forma mentis que interpretava todos oS,~c.!o~çi.~ .YJda q~'otLdiaJlª:_,Expre,~~~._~m
leis, ia de -Coimbra com os seus juristas enl::arr~gadoi do ~)(.er~íc.i() dopo,d!3r
judicial; está subjacenteàs Ordenações e à doutrinação geral ~~.~Poç~~.O_l:falJdo
o iluminismo trouxe aquela outra nova alternativa, íntrinsecamente desinteressada
de um tempo que não fosse o evolucionista, .a sociedade brasileira estava Já
constituída nos seus quadros básicos. 6cresce que Pascoal de Mello Freire,
que tanta importância' teve na actualização hábil dos quadros jurídicos de todo
o conjunto da sociedade portuguesa e brasileira do .:último quartel do século XVIII,
deu ao iluminismo uma volta inteligente e cautelosa com os pontos de vista
tradicionais, sem' prejuízo mesmo. do essencialno debate que é a recusa, no
(1) Deducção Chron%gica e Ana/yt/ca, etc. Parte I, 1767,e Parte li, 1768, Não obstante
o debate e as múltiplas alegações de autoria, não pode haver dúvidas de que o texto. nos seus
elementos principais tem um coordenador e um responsãvel e esse é José Seabra da Silva, muito
embora seja multo provável - e até natural - que tivesse diferentes colaboradores, Trata-se de um
panfleto pcktlco-ideolôqtco onde o essencial é a unidade da argumentação e a recusa da versatilidade
nas posições adaptadas.
Rev, Blbl. Nac,. Lisboa, 1 lI), 1981, p, 74·82
"..
"." ._.H. __ .••.~ .• _.__
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- --_ ....-._-~-_..- ...-._-------_ ....--•...... ~_.-..._ .....•..- .....---_._.-
Revista da Biblioteca Nacional
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ponto. de vista político, em dar ao. pnncrpa, o poder' discricionário .. Pascoal-de
Mello Freire recusa em absoluto - o que lhe valeu o ódio de António Pereira
de Figuelredo, o epígono português do regalísmo e do galicanismo, sempre
lnfimarnente 'lIgados - o princípio de que poder absoluto signifique poder, dis-
cricionário, uma vez que está sujeito ao direito natural, ou seja, às responsabili-
dades sobrenaturais e públicas. Isto é, mesmo depois da eolosão- daquilo- a
que Hernâni Cidade chamoua crise mental do século XVIII, os prlnóiplos do direito
natural. e da consequência polftica e civil da distinção entre o bem e o. m'al,
continuarem atnttuenclar; de modo declsívo, dirigentes e responsáveis portuguesas
e brasileiros. Tudo isto se insere numa complexa concepção do poder e como
tal de vida; é também· a base para uma meditacão e uma filosofia de diferentes
níveis, desde a especulação antropológica à unldade axlológlca e epistemológica
do homem, para além do particular. .
Posições que, apreendidas na sua importância teórica, se tornam, também,
as premissas essenciais para uma análise da razão e daqueles principios que
enformaram o pensamento luso-brasileiro. Ligam-se, por outro lado, a uma pers-
pectiva própria da sociedade concreta, numa concepção extremamente móvel e
com maior viabilidade para avelocidade de promoção ea cautela nadegradação dos
não aprovados. E esse ponto, ~.I,l_ma~oc!~q~~~._~~~~_a_P9rilJ9l.l~§-ª. ~...brasllelra,
é precisamente o tópico mais importante. Nela, as categorias hierárquicas apre-
sentam um carácter mais amovivel e precário do quanoiitras, aparenternente,
mais versáteis. A sua luta social caracterfstica não é classista e horizontal mas
Visa; sÓhrety.ºo, ao esforço dirigido no sentido do aproveitamento 'dás'-poss'iblli-
dadas sociais imédlatas.' A socledadeportuçuesae brasileira ..do. sé'culo'XVIII
longe de lutar por direitos contrapostos às' cate99.ri.ê.ª-,soclals, [uridicamente exis-
tentes, esforçava-se por garantir oacessoaelas, A nobreza é uma categorl~Çnão-é
uma classe. A mentalidàde das duas sociedades portuguesa e brasileira em termos
de perspectiva social era a mesma: acesso às categorias da comunidade com regras
viáveis de entrada mas mais exigentes quanto à permanência nos privilégios esta-
belecidos. Quandose quiseramcriar formas inamovíveisde nobreza,estacorrompeu-se.
Condições e prlncfpios ordenadores do conjunto colectivo que comportam
uma versatilidade e um sentido de adaptação que é um dos factores mais
significativos - mas também mais ignorados - da vida social do século XVIII.
Certo é que as vantagens características daí tiradas se pagaram, tanto no domínio
da vida social como do pensamento, com o predomínio das atitudes mentais
essencialmente ambíguas, na análise racional, acompanhadas de um pragmatismo
que tendia a assegurar a promoção, sempre possível. Por isso, o gosto pela
exploração teórica e doutrinária da consequência ficou muito aquém do que
podiam dar aquelas premissas e formas de tão rico conteúdo.
Passemos, porém, deste domínio das formações mentais e vamos ao
encontro de um ponto de expressão concreta muito' significativa e que tange já
com problemas da vida colectíva, no espaço deflnJdo onde ela se exerce.
É sabido o papel dinâmicºgV!~LQ..grandehistoriador norte-americano Turner
atribuiu; na- hístórtadóe .EstadosUnidos·dã·-América:-do.:~Norte;-:ad~:concéftO.·de
flj2lJteira (1). A determinação desta constituiu ar um factor de açlutlnaçãocotectlva
-extremamente poderoso. Contribuiu para garantir uma forte unidade entre os tão
diferentes núcleos populacionais, uma vez que a defesa ou exploração da fronteira
(1) F. J. Turner, The frentler in Amer/can Hlstery (1893).
/'levo Bibl. Nac .. Lisboa. 1 (1). 19B1. p. 74·82
78
I-
MACEDO •• 1. B. - Formas e Premissas do Pensamento Luso-Brasileiro
era mais importante do que qualquer divergência interna. Com efeito, é interessante
observar-se que a expansão territorial que leva à constituição dos ,~stad9sl.Jl1idos
se faz de dentro pãfá fora, no sentido das' áiaas-'vlzi~hrii(a:i6d~~'nã'o .dernarcadas
'e verdadeiramente,', até, desconhecidas: 'Oessemódo, a fronteira dos Estados
Unidos tem variado consideravelmente ao longo da sua existência. Tem-se modi-
ficado segundo os mais diferentes meios, desde a compra de territórios, à guerra
ou à ocupação pura e simples de áreas devolutas para a civilização ocidental.
Uma parte desses territórios pertencia aos Indios peles-vermelhas a quem. só
no século XIX, a tecnologia ocidental tinha colocado em situação de inferioridade
perante a população branca. Por consequêncla, o. conceito de civilização. e de
culturas diferentes.jeve nos. Estados Unidos uma funcão coJectiva muito mais
iritensa 'eiieneralizadà do que o conceito da unidadé dohumano essencial à
evanqellzação e que no Brasil, era uma forrnadeS9!:lrevivênci.ª,.99mcUàO,bem o
salientaram Gilberto Freire e Jaime Cortesão. Nestas .condlções, a fronteira norte-
-americana não éurna linha conhecida a defenoér;nias'uma-área-civilizacionalem
crescimento. Óseu carácter dinârnlcc assenta na súa'iiatu'reúi"ií-ióveTs'rúi éCúi'se-
'qu ente tensão. causada pela precariedade que~C:o.nª-liHlt~m~hf~revel,a, Os contrastes
deJaça~,ºE!,Giyili;z:ação tiveram assim uma intervençã9. ~§.s_ELlJ.çial.na.mentalidade
norte-americana, deles derivando elementos' 8iíiâmlc6s Para a constltulção do .seu
próprio território. Afinal, os ingleses deixaram aos americanos, depois da indepen-
dência, uma região a conquistar.
Essa mentalidade de fronteira a corrigir,aalargar,.G.Onsolldar,.a.explo,rar,
esse .carácter provisório e ao mesmo tempo tenso da fr.onteira,não existiu n.p
Brasll. Deu-se ai o fenómeno contrárluDo mesmo. medo que' portugal é o país
de mais antiga e estável fro.IJJelrada.Europa., .asslm o. Braslí.tern.a.rnals-antlqa
frc;niE~ira de tcdosca parse's'da~_três Américas.
-''''''''''COiTiefelto.B "área" brasileira está definida, na ~YJLtoJrna-9.eral,_desde
o Tratado de Madrid de 1750.E"as'srITi;-'enqüanto os Estados Unidos utilizaram
uma fronteira em posição da avanço, para uma expansão de dentro para fora,
e em luta contra inimigos que se colocavam no exterior do seu mundo. no mais
amplo sentido do termo. o Brasil dispôs de uma frenteira definida desde sempre.
O tema nacional básico era defendê-Ia e aprov,ei!~~l~_ç.9..mo_estava, já que os
problemas diplomáticos se encontravam •. oa"sua., ..quase ...totatídade.cresolvldos.
As principais questões quesurqlram nos séculos XIX e XXprovieram das dificuldades
de ocupação interna, de aproveitamento do espaço, exprimiam manobras de
espera até que houvesse condições tecnológicas e políticas para promover o
aproveitamento. brasileiro de áreas que são suas. Tudo se passava dentro d!?,,~m
Brasil preexistente, pois a sua zona política nunca esrevif~-iri"caüsa: Enquanto não
'foi posslvelaproveítar o terrltório assim delimitado, o que esteve em causa foi
a capacidade brasileira para assegurar a sua reserva, E no ponto de vistaRropri,a-
m§nte p.QI1ti.ç-º.-ê.,..c..I:!.I!.I,:If!M•._º_.I!1~i.s.JID.portantea enfrenfaCh~9:.!~tn:§üt(i.ns~impe-
rlali sr:D.º.~.,p.olitio-º-Lº,~ ..l]ljliJares, ..mas ,.fundameiitãlmãiitêCo.s .._q@.,PIetend,~JDJmRor
uma mentalidade diferente fora da.rorme.menns-essenctel da unidade do humano
'e da precarie.çiad.ejjoso_~~~Lque ,~ernpr..~,foLa ..raiz ,.do.'çQ:rrü~º.rt~~e.ntob.álsireir.o
e se tem revelado como ajnelhor fo(m~Lde,,,,~gp.Levivê.ncia .. O mais grave, é
qüe essa essencial coridição de que falo perca a força e deixe surgir o imperialismo
, do quadro e do crescimento, a tecnocracia que pretende definir que o melhor para
uma pátria é aquilo que, em dado momento, lhe parece trazer mais abundância mate-
, rial e não maior segurança e um espírito de unidade nacional mais funde, mais
empolgante e criador, de uma qualidade espiritual própria.
Rev, srer. Nac .. LIsbOA, 1 [1). 1981. p, 74·82
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Revista da Biblioteca NâcionaJ
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A fronteira brasileira é pois um fenómenohlstórico. Este tacto Impôs-se
à população inteira dei Brasil desdeo sécutoXvlü.corn.coneêquênctas culturais
de grande alcance, pais trouxe prioridades fundamentais no espirito do povo
brasllelro.iAs tradições de.urn .povo são ccnstltuldas p·eTosractoscue lhê per-
i tencem e permanecem como dados insofismáveis e irrecusávels que esse povo
não pode deixar de conhecer, de manejar e de pensar como regras de defesa
e do seuencontro como personalidade colectiva. Entram assim no seu subcons-
ciente colectivo ..A partir deste conceito histórico.de fronteira, podemos dizer que
a História faz.parte, de uma forma muito especial, da nação brasileira. O decisivo
é que tal não sucede só desde a contestação da soberania polftica portuguesa
- aspecto comum a todas as nações que foram também antigas dependências
coloniais. A dimensão de uma fronteira prévia garantida ao Brasil traz-lhe um elo
de ligação com Portugal que ultrapassa essa dependência existente no século XVIII.
Leva a sentir que algo de comum há na história das duas pátrias até à inde-
pendência. Algo de comum porque conduziu à capacidade que os portuçueses
tiveram para definir o espaço político brasileiro e para o reservar para o futuro Brasil.
Ponto essencial, vinculo expressivo da cultura comum luso-brasileira do século XVIII
é que este facto deu função brasileira à história de Portugal. As capacidades
e decisões deste país, no sentido de garantir a sua p/Ópilà.lndependência, tor-
naram-se, por essa via, essenciais para o Brasil porque estão implícitas na con-
quista da capacidade de estabelecer e manter o espaço político que hoje, sem
contestação, lhe pertence. E assim a história do Brasil fama-se muito mais antiga
do que a sua independência ou a luta pela independência. Pertence-lhe o conhe-
.cimento ·da génese do processo da constituição de uma fronteira brasileira.
muito para além do que portug'ãJ podia então aproveitar.
E assim. a Histó:ia. isto é. O inventário da procura racional das sequências.
o esíabeieci.-nento das ar.teríoridades poIarizaéoras. não é. na cultura brasileira,
desde o ~ XYID como não. é na cultura portuguesa. wn dado externo e circuns-
·'tar:cial r.essa ~ CtJttura.A históa-ia,6..~im: um e+emer.to r-"i.;aj-da men-
tarKiade brasieira.é_esses~ ~ a~. comoo apara emendei a pimiguesa
Hoje. a História. como~etximem ~i~. :la_SlIa.CUItUra. crimocaracterística
indiScirtiVêI as-um País QUe !eni,-c-it:~:JmeGQS·de :DsJ;.éailos de ~riCia,
apresenta nela um peso criador. COClO ~·de aláIse e de ~ no-p~-
mento brasileiro que se não pode nesa:- Essa!Drçaáa bistóriana cultura~.e parti-
cular slqnlfíoado no século XVII! e prossegõ.:iu ~ ~ Aaescel1talanrse. evidente-
mente, as realizações que a cultura portuguesa e ~ têm sabido alcançar e
que são, muito naturalmente, diversas. Mas ~ COIi'LtJII.DO pensamento portu-
.guês e brasileiro, e gerado nos.s~\os -X'~e XW ~aprofundadO- no decorrer do
século XVIII, é, sem dúvida, o papel que em ambasas culturas apresenta a dimensão
hlstórica;' concebida não como acto de razão, mas vivendalmeate. como potência
.e acto" Não é só a"partir do grito do Ipi!'af1Qa ou do Tuadentes que o Brasil se
encontra hístorícamente.crnas. muito antes. a parpr: dos Gândavor- dos Antonil-e
Rachá Pita, e.da.carta.de.Pêro.Vaz de camínne, como consciência do lugar e muito
mais..:.para.-trás·-;co.mo"expedenê:iã~e~-CO:nSciência,sociat- e- politica Afirmações
para a retórica das circunstâncias? Não é. Ou que o fosse. 8as fazem, afinal,
parte da 'mais antiga experiência nacional brasileira. que abrange não civiliza-
ções venci das mas uma tradição inserida no ramo que se fez comum e depois
se diversificou.
Esta lrnportâricia da história facilitou a criação ou o fortalecimento de'
um sistema autônomo de canais de recepção de cultura, uma vez que não foi
Rev. Bibl, Nac .. Lisboa, 1 (1). 1981, p, 74'82
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MACEDO. J: B. - Formes e Premissas do Pensamento Luso-Brasileiro
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uma. mentalidade de tutela.que ficou· no Brasil, mas uma mentalidade de história
comum, por muito: colonizadores que tivessem sido os portugueses.
Princípios. de. fundamentação presentes na elaboraçãn ti". formas do
filosofar. do pensar, do existir e do querer, orlentaçõ=- r
tantas na ciência· põlitica- e-das relaçêes entre 0<' •
.Sentido dn ~;_. .. ..•~c prossegue.
Eis o segundo vector para _ ~"llJra luS()-:br~Ueira do
século XVlIL E deve, de novo, íernbrar-sa aqui GilbertO Freira Decertoencontramos
nele o eatabeleclmento das provas de que esse histórico, esse tradicional, foi
ao. encontro. da gente comum. de todos nós e se moldou em formas cotidianas
da, viver •. transferi das e restauradas ccmo se suas fossem. como são. Gilberto
Freire mostrou-nos, na sua argúcia de socíóloço, que o histórico mergulha fundo
na vívêncla corrente do brasileiro, insere-se em formas consagradas e entregues
ao sentir corrente do povo, como entre os portugueses sucede. A presença da
história em Portugai e no Brasil não é o sinal para a cultura de escol. É um sinal
de vida nacional intrínseca que o historiador ou erudito só aprimora e aprofunda.
Pertence também ao subconsciente colectivo dos dois povos.
Formas de filosofia política, de comportamento público, aquilo a que Cabral
de Moncada chamava os "quadros subjacentes". concepção historial de existência,
de organização e vlvêncla. Premissas da igualdade radical dos homens,na possi-
bilidade de comunicação, para além de quaisquer diferenças. Preferência. pelos
pequenos mundos humanos. Mas isso não basta. Certo é que qualquer sociedade-
-civilização como nós somos, para se constituir com a consciência na sua diferença
relativamente a outras, precisa também de conceber e viver uma interpretação
do ...espaço.rdentro do qual ordena osseus edifícios e jardins, os seus lugares de
recreio e de trabalho. Ora, não podemos ignorar o papel criador quer essa sensi-
bilidade ao espaço ocupou' nas realizações da cultura ou na arte portuguesas.",
É esse um dos aspectos menos referidos no ivianueiino, mas nem por isso é menos
característico. Bastará lembrar aquelas amplas paredes dos Jerónimos, do Paço
de Sintra só abertas no lugar próprio. O mesmo se verifica no Barroco ou no
neoclássico. Sensibilidade que se apreende no recorte típico do espaço expresso
por aquelas pequenas espantosas Igrejas românicas do Norte do Pais onde espreita
um Deus tutor, uma Nossa Senhora de Caridade e um Jesus Cristo de sacriffcio
que constituem a essência do nosso Cristianismo, colocado naqueles templos
misteriosos, sem esoterismo, ao alcance da nossa gente, das nossas possibili-
dades de culto e do nosso sentido da vida. É com essa capacidade de criação
concreta de um espaço existente na cultura portuguesa que vamos corrigir e
adaptar nas obras compradas ao Barroco internacional. trazendo-as às necessi-
dades verdadeiras da gente luso-brasileira do século XVII!. Assim se manifesta esse
barroco na nossa imaginária ou na filigrana concebida:' para a dimensão da face
da mulher, dando-lhe força e comunicação. sem lhe corromper a reserva. Nem mais
nem menos do que isso. á.nossa procura ...do-espaço-exacto -lembremos o
"absolutamente exacto" de Fernandb Pessoa - conquistando a dimensão adequada,
domina nas artes plásticaseêxprime-sedasrnais diversas maneiras. E é também
o que vamos encontrar nas igrejas da Baía, ou em Vila Rica do Ouro Preto, no
riqor espegíficoda sua retórica. Decerto não é dos menores sucessos da cultura
luso-brasileira do sécL.J.I()_XYIIIter conseguido chegar a uma dimensão arquítac-
tônica; concebida dentro-do- Barroco, transmitida para o sol possante do ..Brasil,
sem perder a graça da imagem geral que o Barroco tem, mas sem se encaminhar
para o sentido do colossal, tornado deflnitivamente repugnante à arquitectura
p..,~.Sibt Ns;; .• L.;sbca. 1 (1), 1*'1. p. 74-82
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Revista da Biblioteca Nacional
. brasileira e portuguesa, apesar da pressão estúpida para um conceito do grandioso
como só estatura que não está na tradição da arte brasileira, como não pode,
consequentemente, estar na nossa. De comum.icriárnos,ViV?':t'!~sªJixárnosessa
nocão bem definida de espaco a que demos a vivência da área íntima, tanto nas
'art~s plásticas como na literatura e para cuja maturação foram essenclals as reaJi-
zacões barrocas do século XVIII, cornunsaportuçueses.e brasileiros. Caminhando
juntos, ..C), pensamento ~.r:a..sileiroe português no século Xvlllapreendeu e realizou
essa capacIdade de criar Uma ,dimensão plástlca.próprla.Jmpossível d,~..seooplar
ou de se sobrepor, desenvolvida depois de forma diversa, mas que tem ainda- de
comum esse modo especialíssimo de encontrar o intimo, mesmo no grandioso.
De tal maneira assim é que, mesmo na grande4a bruta de Mafra, ficamos impres-
sionados com a capacidade de redução do espaço interno à escala da capela que,
na imensa basílica, passa a ser o mundo próprio do crente de que a construção
é o mero invólucro. E o altar rico de S. Francisco, na Baia, não desdiz da pobreza
do Poverelo. Sentido da medida apurado em séculos, esse da cultura luso-brasileira,
vivido em comum no século XVIII, perdurando, ainda hoje, nas dimensões da nossa
arte, já diversa, mas igualmente bem sucedida no encontro constante das escalas
específicas aos nossos povos e às nossas culturas.
E se nos aproximarmos do campo da vida cotidiana, civil e administrativa,
aí vamos encontrar, noutra área, essa procura e execução dos actos da vida
pública em constituições que nos correspondam. E vemo-Ia realizada em insti-
tuições que nos são comuns: são as misericórdias, os municípios, as Irmandades,
as vivências da humanidade imediata - a que nos define - procurando alcançar o
homem como ele é, nos seus pequenos dramas, sem perda da motivação trans-
cendente, se lhe procurarmos a raiz. Só assim - na dimensão do homem para
homem - vivemos a solidariedade. Acaso será este o ponto que unifica, nesta
medida que é a nossa, toda a caminhada comum de brasileiros e portugueses
no século XVIII, quando na unidade da coroa ou da justiça e da lei, no achado
das premissas da raclonalldade e da comunicação com verdade, na procura do
melhor e na criação de uma dimensão própria de espaço, apesar da diferença
das paisagens. Assim percebemos que alcançárnos um sentido e um modo de
pensar o visto e o feito que recria o mundo à nossa escala, sem o mentir.
a. pensamento comum entre brasileiros' é portugueses é a consciência profunda,
vivida em cultura, da unidade do humano e da vivência de uma dimensão poética,
plástica, moral e política-para essaunldade que. não pode ser-só-conoeptuaí:
precisa de, existir para ser, Assim o conseguimos nós, recorrendo à inesgotável
reserva da solidariedade entre os homens que continua a ser a marca distinta dos
nossos dois povos, em tantos domínios já tão diferentes.
Rev. 8ibl. Nao., Lisboa. 1 (1': 1981, p. 74-B2
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