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Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 1 www.cursoenfase.com.br Sumário 1. Teoria do Crime (Teoria do Delito) .......................................................................... 2 1.3. Teoria da Imputação Objetiva do Resultado (cont.) ......................................... 2 1.3.2.3. Outras hipóteses ......................................................................................... 2 2. Tipicidade ................................................................................................................. 8 2.1. Relação entre Tipicidade e Ilicitude .................................................................. 8 Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 2 www.cursoenfase.com.br Professora: Ana Paula Viera 1. Teoria do Crime (Teoria do Delito) 1.3. Teoria da Imputação Objetiva do Resultado (cont.) A título de revisão do exposto até o momento sobre imputação, observe-se o esquema abaixo: Falar em criação de um risco desaprovado significa falar em um juízo de valor de grande importância, eis que implica dizer que riscos aprovados podem ser criados (serão conduta atípica). Portanto, o termo “desaprovado” permite que se realizem diversos juízos de valor para, em alguns casos, afastar a tipicidade de condutas criadoras de um risco aprovado. 1.3.2.3. Outras hipóteses Importante mencionar, também, duas hipóteses nas quais, criado o risco, a Doutrina o entende aprovado e, portanto, atípica a conduta que o produziu. Uma das hipóteses tem aceitação mais pacífica, enquanto a outra possui algumas controvérsias. a) Contribuição a uma autocolocação em perigo: neste caso, a própria vítima se coloca em perigo sozinha, criando a situação de perigo, e o sujeito (terceiro) apenas contribui de forma acessória. Exemplo1: a vítima “A” deseja escalar o Everest. “B” empresta à vítima seu equipamento. Durante a escalada ao Everest “A” morre. Qual seria a contribuição de “B”? Se a vítima é maior, capaz e tem conhecimento suficiente para avaliar os riscos aos quais está se submetendo, a contribuição de “B” será impunível. O Direito Penal não deve tutelar pessoas maiores, capazes, que conhecem o que fazem e resolvem, mesmo assim, aceitar o risco. Imputação a) criação de um risco juridicamente desaprovado (avaliação ex ante) b) realização do risco no resultado Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 3 www.cursoenfase.com.br Os riscos, neste caso, ficam na esfera de decisão da própria vítima. Ela escolhe como viver. Ao contrário, tutelar tais pessoas denotaria uma postura paternalista que não cabe ao Direito Penal. Crítico é entender que, quanto ao conhecimento dos riscos, a vítima, além de maior e capaz, deve ter ao menos o mesmo conhecimento dos riscos que o sujeito que a está ajudando (no Exemplo1 a vítima “A” deve ter os mesmos conhecimentos do risco que o sujeito “B”). Se o sujeito que auxilia observa que a vítima não tem ideia de que a atividade é tão arriscada quanto de fato o é, não será aplicável a presente regra (isto é, a conduta do sujeito que auxilia poderá ser punível). O exemplo a seguir já caiu em provas: Exemplo2: sujeito “B” oferece drogas a vítima “A”. O crime de “B” é o de tráfico de drogas. Porém, se “A” utiliza a droga e sofre uma overdose, “B” poderia ser responsabilizado por homicídio? R: Não, cumpridas todas as exigências para “A”, conclui-se que a vítima submeteu-se aos riscos voluntariamente. Portanto, conduta de “B” é atípica para o crime de homicídio. Esta primeira situação é tranquila na Doutrina. Já a próxima apresenta algumas controvérsias. b) Heterocolocação em perigo consentida: neste caso, vítima e autor criam a situação de perigo juntos. Neste caso, o entendimento é de que também configura conduta atípica, como no item “a)”, a heterocolocação em perigo. Este posicionamento é adotado por Roxin, entre outros. Exemplo3: a vítima “A” está atrasada para pegar um voo. Contrata um taxista “B” e promete pagar o triplo do valor da corrida se ele dirigir a 120 Km/h até o aeroporto. “B” aceita a proposta. Trata-se de situação de risco criada pelos dois (portanto, não aplicável a terceiros que possam ser vitimados também). Fundamental notar que “A” e “B” controlam em conjunto a situação arriscada, uma vez que, a qualquer momento, o taxista pode mudar de ideia e dizer que não quer mais o A B Situação Arriscada Vítima Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 4 www.cursoenfase.com.br pagamento. “A” também pode mudar de ideia, pedir para que o taxista dirija em velocidade normal. A qualquer momento qualquer um dos dois pode fazer cessar o risco. Materializando-se a conduta arriscada na morte de um dos dois, o raciocínio para exclusão da tipicidade pode ser aplicado. Cabe deixar claro que se uma das pessoas envolvidas não possui o controle da situação de risco, (imagine-se que “A” pegou uma carona com “B”), a ideia da heterocolocação em perigo não é aplicável. O mesmo serve para um terceiro eventualmente atropelado no Exemplo3. Exemplo4: outra situação que exemplifica a heterocolocação em perigo é a de contatos sexuais em que um dos parceiros tem AIDS. “A” é portadora da AIDS e casada com “B”, não portador do vírus. Conscientemente, o casal deseja ter relações sexuais sem proteção. Eventual infecção de “B” pelo vírus estará enquadrada na hipótese da heterocolocação em perigo consentida. Interessante citar caso concreto ocorrido na Alemanha no qual a vítima possuía taras sexuais relacionadas ao fogo e, em uma de suas experiências, pediu a sua parceira para amarrá-lo numa cama, jogar álcool em seu corpo, colocar fogo e apagar logo em seguida. Sua parceira fez todo o procedimento, mas não conseguiu apagar o fogo e a vítima faleceu. O caso não se configura como heterocolocação em perigo consentida, eis que, muito embora a vítima tenha pedido, uma vez iniciados os procedimentos o controle estava apenas com sua parceira, e não com as duas partes. O exemplo é fundamental, pois ajuda a entender que o controle, além de ser exercido por ambas as partes, deve o ser durante toda a duração da situação arriscada. Outra questão importante é diferenciar a heterocolocação em perigo consentida com o consentimento do ofendido. O consentimento do ofendido não é possível quanto estiver em jogo bem jurídico indisponível, ao contrário da heterocolocação. Tanto na autocolocação quanto na heterocolocação em perigo consentida não há consentimento à lesão alguma de qualquer das partes. Nenhuma das partes deseja a lesão (no exemplo do taxi, nem o sujeito que contrata, nem o taxista desejam morrer ou sofrer um acidente automotor). Portanto, o consentimentoé com o risco, não com o resultado. Tanto no caso da letra “a)” (autocolocação) quanto no caso da letra “b)” (heterocolocação), a Doutrina entende que não existe risco desaprovado. Por isso, a análise será feita quando do exame do risco (item 1.3.1. – a criação de um risco juridicamente desaprovado, no primeiro bloco da presente aula) e, se devidamente enquadrada, a conduta será atípica. Esta visão, no Brasil, será encontrada no livro do Luís Greco. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 5 www.cursoenfase.com.br Caso se deseje estudar diretamente Roxin (“Funcionalismo e Imputação Objetiva”), ver-se-á que o autor cria, para enquadrar autocolocação e heterocolocação, uma terceira categoria com o nome de “alcance do tipo”. A professora recomenda o formato adotado por Luís Greco por entendê-lo mais didático e claro. O resultado prático da utilização dos dois formatos é o mesmo: a exclusão da tipicidade. Nas hipóteses a seguir, o sujeito cria um risco, mas o risco não se materializa no resultado. São hipóteses, portanto, que deverão ser examinadas quando do resultado do risco (item 1.3.2. – materialização/realização do risco no resultado). c) o erro médico: Há uma relação de causalidade física: se não fosse o tiro dado por “A”, “B” não teria ido ao hospital e o erro médico não teria acontecido. Assim, quando “A” atirou em “B” criou o risco de um resultado homicídio; sua conduta, então, é típica (no mínimo para a tentativa de homicídio). Feita esta análise preliminar, passa-se a analisar o item 1.3.2. – a realização do risco no resultado. Roxin traz um critério para avaliar erros médicos. Para o autor há dois tipos de erros médicos: i) o médico erra e não impede a linha de risco anteriormente criada: no exemplo mencionado, o médico não impede que os efeitos do tiro continuem se produzindo. Nesta situação, suponha-se que o médico não consiga retirar a bala do corpo da vítima, procedimento que um bom médico conseguiria fazer. A bala segue produzindo efeitos no corpo da vítima. Aqui o sujeito que atirou responderá pelo resultado (homicídio doloso consumado), uma vez que é a linha de risco por ele criada que ainda está produzindo resultados. O médico terá autoria colateral. A atira em B No Hospital: erro médico Vítima Vítima Morre Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 6 www.cursoenfase.com.br ii) o médico substitui a linha de risco anterior: imagine-se que o médico prescreve o remédio errado e o paciente morre envenenado. Neste caso, o sujeito que criou a linha de risco anterior não responderá pelo resultado – no exemplo anteriormente dado, “A”, que atirou em “B”, não responderá pelo resultado morte. c) salvamento feito por terceiros: imagine-se a seguinte situação. Exemplo4: “A” coloca fogo em sua casa para poder coletar o seguro. Porém, o bombeiro que entrou na residência para apagar o fogo morre queimado. � Quando profissionais encarregados de debelar riscos criados por terceiros são lesionados, é possível responsabilizar aquele que criou o risco? Trata-se de tema bastante controvertido. Para Roxin, seria político-criminalmente nefasto se o agente respondesse pela morte do bombeiro. Isso porque, se houvesse tal responsabilidade, ninguém que se arrependesse do que fez chamaria o bombeiro para debelar o fogo (ou o policial para reduzir os riscos do que fez). Convocá-los chamaria mais responsabilidade ainda ao agente. Com base nisso, Roxin conclui que os riscos da profissão são suportados por quem a exerce. Assim, na hipótese ora apresentada não ocorre a materialização do risco no resultado. Não é entendimento pacífico. � E no caso de terceiros não profissionais que, eventualmente, atuem em determinada situação de salvamento, é possível responsabilizar aquele que criou o risco? R: Depende. Segundo Luís Greco, se o ingresso para salvamento é algo razoável, ou seja, algo que se podia esperar (por exemplo, entra no meio do incêndio para salvar um bebê, uma criança ou uma outra pessoa) seria possível responsabilizar o criador do risco. Ao contrário, se o ingresso é desarrazoado (por exemplo, entra no incêndio para salvar um game de playstation), não haverá imputação do resultado ao agente que criou o risco. Percebe-se que se trata de um juízo completamente valorativo. d) resultados tardios: trata de resultados que aparecem depois do evento. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 7 www.cursoenfase.com.br Em 2005: 10 anos depois, em 2015: Neste momento, o que se discute não é relacionado necessariamente com o tempo transcorrido entre a ação e o resultado. Neste sentido, Luís Greco traz o exemplo da mina terrestre. Se em algum momento alguém enterra uma mina num campo e apenas 10 anos depois alguém pisa e ela explode, será possível a imputação. Portanto, o decisivo não é o tempo transcorrido. Decisivo aqui será a noção de nexo de risco: quando uma situação é proibida se tem em mira resultados que concretizam a lesão primária. Todas as demais consequências secundárias não estão na intenção do legislador ao proibir condutas arriscadas. Assim, quando se proíbe a conduta arriscada que lesionou a perna de “B”, o legislador tem em mente punir exatamente aquela lesão primária. A situação fática se esgota no resultado primário. É o mesmo que dizer: o legislador não tem em mira punir todas as centenas de resultados que possam decorrer na vida de uma pessoa em razão daquela lesão primária. Assim, “A” já teria respondido pelo resultado que lhe cabe. e) resultados decorrentes de choques: Exemplo5: policial morreu em serviço. Ao saber da notícia, sua mãe tem um ataque cardíaco e morre também. � Qual é a responsabilidade do agente que matou o policial em relação à morte da mãe? R: Regra geral, nestes casos, a Doutrina também afasta a imputação através da ideia do nexo de risco. “A” causa Lesão grave em B “A” é condenado – regime fechado Vítima – perdeu a perna “B” cai ao tentar subir em um ônibus Há responsabilidade para “A” ? Em resultado, “B” morre Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 8 www.cursoenfase.com.br Além disso, por trás também deve ser considerada a ideia de previsibilidade, muito embora seja mais fácil trabalhar com a ideia de nexo de risco. 2. Tipicidade Antigamente, há pelo menos 200 anos atrás, a ideia de tipicidade não existia. Falava- se apenas em ilicitude e culpabilidade. A tipicidade não era uma categoria separada. Apenas com Beling foi feita a distinção (distinguiu tipicidade da antijuridicidade e culpabilidade). Foi necessário separar a tipicidade da ilicitude, eis que necessário, após a primeira fase na qual se constata a existência de ação, verificarse a conduta se amolda no tipo. É a ideia do tipo como ferramenta do Princípio da Legalidade – que deve ser obedecido através da descrição da conduta proibida. Então, a primeira qualidade que a ação penal precisa ter é a tipicidade: ela precisa ser encaixada no modelo descrito na norma. Sabe-se, hoje, que o tipo é um modelo abstrato de comportamento proibido. � Como visto, a tipicidade está hoje num degrau separado da ilicitude. Então qual será a relação entre elas? � Afirmar que uma conduta é típica, significa necessariamente dizer algo sobre a ilicitude? � Qual a relação entre tipicidade, proibição e ilicitude? Quanto à última pergunta, o tema é controvertido. Alguns autores entendem que tais noções estão muito próximas. Por outro lado, há autores que pretendem unir todas em um único degrau. Por fim, há aqueles que visualizam que tais ideias estariam bem separadas. 2.1. Relação entre Tipicidade e Ilicitude A primeira forma de pensar a relação entre estas duas qualidades da conduta criminosa as vê como características separadas. Porém, a tipicidade seria um indício da ilicitude. É dizer: se a conduta é típica, já se tem um indício de que ela pode ser ilícita também. Tal indício somente poderá ser confirmado no próximo degrau, quando forem analisadas as causas de exclusão de ilicitude. Para Mayer, finalista, o tipo é um indício da antijuridicidade (ratio cognoscendi) Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 9 www.cursoenfase.com.br A doutrina costuma dizer que a relação das duas seria como a relação da fumaça com o fogo. Fumaça pode ser fogo, mas pode também não ser. A primeira posição acima exposta (finalista) é a predominante nos Manuais de Direito Penal Brasileiros. A professora apresenta críticas a tal visão, pois entende que a relação entre ilicitude e tipicidade é mais próxima, ainda que as duas não se confundam (como o quer a teoria dos elementos negativos do tipo). É mais próxima porque, atualmente, o operador do direito faz uma série de juízos valorativos de grande complexidade na tipicidade. Por isso, em muitas situações, o raciocínio feito na tipicidade já estará afirmando a ilicitude. Seguindo a posição de autores como Roxin, a professora entende que, de fato, falar que uma conduta é típica significa dizer que ela é ilícita. Pode ser que no degrau seguinte se afaste a ilicitude, porém, nestes casos já se estaria fazendo um juízo de valor condicionado a, no degrau seguinte, não haver causas de exclusão de ilicitude. Portanto, para esta posição doutrinária, a tipicidade seria mais que um mero indício da ilicitude de uma conduta. A tipicidade já afirma algo, também, sobre a ilicitude, sobre a proibição. Ainda que não venha a se confirmar, a afirmação é feita, sim. No Funcionalismo, com uma tipicidade tão complexa, os autores admitem que o avanço ao terceiro degrau é feito sob a afirmação da proibição. Ao chegar ao terceiro degrau, não obstante, serão analisadas as causas de exclusão da ilicitude. Como afirma Mezger: a tipicidade é um juízo de desvalor condicionado (ratio essendi). Portanto, na tipicidade já se faz juízo de desvalor, mas tal juízo é condicionado a que, no próximo degrau, não existam causas de exclusão da ilicitude.
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