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Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 1 www.cursoenfase.com.br Sumário 1. Teoria do Crime (Teoria do Delito) ......................................................................... 2 2. Tipicidade ............................................................................................................... 2 2.1. Relação entre Tipicidade e Ilicitude................................................................. 2 2.2. Evolução do Conceito de Tipicidade ................................................................ 2 2.2.1. Tipicidade Formal ......................................................................................... 2 2.2.2. Tipicidade Material ....................................................................................... 3 2.2.3. Teoria dos Elementos Negativos do Tipo...................................................... 6 2.2.4. Tipicidade Conglobante (Zaffaroni) .............................................................. 7 2.2.5. Tipicidade da Teoria da Imputação Objetiva .............................................. 10 2.3. Elementos do Tipo ......................................................................................... 11 2.3.1. Elementos do Tipo Objetivo ....................................................................... 11 2.3.1. Elementos do Tipo Subjetivo ...................................................................... 13 2.4. Classificação dos tipos penais ........................................................................ 13 2.5. Tipo Subjetivo ................................................................................................ 20 2.5.1. Classificações .............................................................................................. 23 2.5.2. Dolo Eventual X Culpa Consciente .............................................................. 24 2.5.3. Dolo Geral ................................................................................................... 26 2.6. Elementos Subjetivos Especiais do Tipo ........................................................ 29 Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 2 www.cursoenfase.com.br Professora: Ana Paula Viera 1. Teoria do Crime (Teoria do Delito) 2. Tipicidade 2.1. Relação entre Tipicidade e Ilicitude 2.2. Evolução do Conceito de Tipicidade Conforme mencionado na aula passada, a distinção da Tipicidade como conceito separado da ilicitude surgiu apenas com Beling. A partir deste autor o conceito de tipicidade foi evoluindo, passando por diversas fases. i) Tipicidade Formal; ii) Tipicidade Material; iii) Tipicidade com os Elementos Negativos do Tipo iv) Tipicidade Conglobante (Zaffaroni) v) Tipicidade da Teoria da Imputação 2.2.1. Tipicidade Formal Trata-‐se da primeira noção de Tipicidade como conceito separado da Ilicitude. Preconiza que o tipo é um modelo abstrato de conduta proibida e que, portanto, a Tipicidade é a adequação de uma conduta concreta ao tipo. O juízo de tipicidade, assim, encerraria apenas a verificação de adequação da conduta com o tipo. A partir do Sistema Neoclássico, a doutrina, contudo, percebeu que seria necessário enxertar juízos de valor aos conceitos de Tipicidade e Ilicitude, uma vez que, muitas vezes, em razão de uma descrição muito genérica e abstrata, o tipo acabava abrangendo condutas que não desejava absorver. Exemplo: subtrair a tampa de uma caneta do curso. A conduta enquadra-‐se no tipo penal (subtrair coisa alheia móvel), porém, o Direito Penal não tem interesse em tratar disso. Necessário, portanto, algo que vá além do simples encaixe da conduta no tipo. Ademais, é realmente muito grave afirmar que determinada conduta é relevante para o Direito Penal – mesmo porque a ideia de subsidiariedade do Direito Penal deve fazer com que a interpretação dos tipos penais seja feita de forma seletiva. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 3 www.cursoenfase.com.br 2.2.2. Tipicidade Material É neste ponto que se busca incutir na Tipicidade os juízos de valor necessários para excluir do tipo as condutas que não interessavam ao Direito Penal. Trabalha-‐se aqui com dois Princípios: a) da insignificância; e b) da adequação social da conduta. Necessário esclarecer que a Tipicidade Material é conceito ultrapassado, muito embora ainda se utilize o Princípio da Insignificância, ele é, hoje, colocado dentro do contexto de um novo conceito de Tipicidade. Para a Tipicidade Material, é possível que uma conduta se encaixe no tipo e mesmo assim não seja típica. Em suma: caso a conduta não se traduza na noção de danosidade social, ainda queenquadrada no tipo, não será típica. a) Princípio da Insignificância: decorre diretamente da ideia de Subsidiariedade do Direito Penal – o Direito Penal não deve cuidar de condutas que não sejam especialmente graves. Portanto, uma conduta formalmente típica que não gere lesão significativa ao bem jurídico (lesão insignificante) será irrelevante para o Direito Penal. Esta ideia de insignificância é utilizada até hoje. Porém, atualmente, a grande dificuldade para a utilização deste Princípio é a parametrização: criar parâmetros sobre o que é ou não insignificante. Exemplo: na hora de analisar a insignificância de um crime contra o patrimônio é necessário saber o que é uma lesão insignificante para esta espécie de delitos. Somente assim uma Promotora, por exemplo, poderá requerer o arquivamento de um inquérito com fundamento na insignificância. É papel dos Tribunais definir os parâmetros para a aplicação do Princípio da Insignificância. O Princípio da Insignificância como necessário ao exame da tipicidade surgiu com a Tipicidade Material, mas encontra guarida até os dias atuais, na Teoria da Imputação. Este Princípio começou a ser utilizado pelo Supremo em crimes contra a ordem tributária, no descaminho e em outros crimes contra o patrimônio. Especificamente no caso do descaminho, a Suprema Corte enfrentou um dilema de natureza prática: a hipótese na qual os “sacoleiros” (muambeiros) repetiam a conduta tida inicialmente como insignificante. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 4 www.cursoenfase.com.br Momento 1 Momento 2 Sujeito A -‐-‐-‐-‐-‐-‐ Descaminho Momento 3 Momento 4 Momento 5 O sujeito ativo realizava uma série de condutas tipificadas como descaminho ao longo do tempo. Vistas individualmente, seria aplicável a insignificância. Contudo, vistas como um conjunto, as condutas criam lesão significativa ao bem jurídico. Na prática, haveria solução para o problema se as investigações e inquéritos fossem conduzidos de modo a apurar em conjunto as infrações – reunindo todos os inquéritos em um só sob a noção de continuidade delitiva. Entretanto, a realidade investigativa é outra, e os inquéritos esparsos permitiam que o sujeito se beneficiasse do Princípio da Insignificância aplicado de forma isolada para cada delito. Na realidade, esta forma de aplicar a insignificância estava praticamente descriminalizando a conduta. Diante disso, tanto Supremo quanto o STJ passaram a exigir requisitos subjetivos para a aplicação da insignificância. Não é a forma correta de aplicação, uma vez que o Princípio da Insignificância é exclusivamente objetivo, levando em conta o desvalor do resultado, e não o desvalor da ação. Dentre os critérios subjetivos exigidos por STJ e STF estão a primariedade e os bons antecedentes do sujeito. Necessário mencionar a existência de acórdãos, do STF, que afastam a aplicação do Princípio da Insignificância com base em anotações de folha de antecedentes -‐ que não são aptas a gerar maus antecedentes ou reincidência. Além do requisito objetivo da pequena lesão, portanto, o Supremo tem exigido requisitos outros de natureza subjetiva (primariedade e antecedência), chegando a, em alguns casos, exigir inexistência de qualquer anotação em folha penal ou inexistência de periculosidade da conduta. Ao mesmo tempo, há acórdãos do STF e STJ que admitem a aplicação do Princípio da Insignificância ao reincidente, ou àquele que tem maus antecedentes, desde que a lesão ao bem jurídico seja muito pequena. Exemplo2: em informativo do STJ do ano passado, a insignificância foi aplicada ao caso de uma mulher que roubou latas de leite em pó de uma farmácia, mesmo sendo reincidente. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 5 www.cursoenfase.com.br Conclui-‐se, assim: a regra geral é a inaplicabilidade se houver a presença dos critérios subjetivos supracitados; a exceção será a diminuta lesão causada, permitindo a incidência da insignificância, mesmo para reincidentes/maus antecedentes. • Parâmetros para aplicação da Insignificância: varia de acordo com o tipo. i) Crimes contra o patrimônio praticados sem violência ou grave ameaça: valores em torno de R$ 100,00 a R$ 300,00 no máximo. O salário mínimo não se enquadra mais como insignificância,pois entra na hipótese de pequeno valor (furto privilegiado e do estelionato privilegiado); ii) Crimes contra a ordem tributária: em princípio o critério era o eleito pela Fazenda para o ajuizamento de Execuções Fiscais (R$ 20.000,00). Entretanto, o STJ tem questionado o aumento do valor (que recentemente saiu de R$ 10.000,00 para R$ 20.000,00 por simples ato do Executivo). Neste sentido, a Corte Especial tem mantido o parâmetro em R$ 10.000,00. iii) Crime de descaminho: o mesmo parâmetro usado para os crimes contra ordem tributária. É exatamente este valor que amplia o problema da reiteração de condutas, exemplificado no esquema acima, uma vez que o parâmetro de R$ 10.000,00 não se refere ao total das mercadorias, mas ao valor do tributo sonegado. iv) Crimes contra a Administração Pública: em regra NÃO cabe o Princípio da Insignificância, eis que não está em jogo somente o dano material causado à Administração, mas sim a probidade no exercício da função pública. Todavia, no crime de peculato, caracterizado pela proteção ao patrimônio da Administração (tanto quanto pela proteção à probidade administrativa), é possível encontrar acórdãos do STJ admitindo a Insignificância em hipóteses muito claras de lesões muito pequenas. Exemplo3: funcionário que leva para casa um maço de folhas de papel A4. Observe-‐se que, para permitir a aplicação da insignificância nos crimes de peculato, é imprescindível que tanto a lesão sobre o patrimônio quanto a lesão sobre a probidade administrativa sejam mínimas. b) Princípio da adequação social da conduta: trata-‐se de Princípio ultrapassado. Fundamenta-‐se na ideia de que típicas devem ser apenas as condutas que expressem alguma danosidade social (Sistema Neoclássico). Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 6 www.cursoenfase.com.br O núcleo deste Princípio é retirar da abrangência do legislador (em razão da natureza da norma criada: caráter geral e abstrato) todas as condutas que não se desejava atingir por serem socialmente adequadas. Exemplo4: artigo 129 do CP, lesão corporal – usando a tipicidade formal, o ato de furar a orelha também seria abrangido pelo tipo, muito embora socialmente aceito. Não era a intenção do legislador penal atingir esta conduta, isto só ocorreu porque o legislador precisou criar uma descrição genérica e abstrata da conduta proibida. Lesão corporal Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena -‐ detenção, de três meses a um ano A crítica que se fez/faz a este critério é que ele seria excessivamente nebuloso (indistinto). O fundamental ao estudar a tipicidade material é a percepção da importância da inclusão de critérios subjetivos na tipicidade. Observação: necessário cuidado para não confundir o Princípio da adequação social da conduta com a Teoria Social da Ação. Como visto em aulas anteriores, a Teoria Social da Ação buscou conceituar a ação como um movimento do corpo que obrigatoriamente tenha repercussão na esfera de terceiros (socialmente relevante = repercute em terceiros). Observação2: também não se confunde o Princípio da adequação social da conduta com a descriminalização pelos costumes. Esta última, é bom lembrar, sequer existe em Direito Penal, uma vez que uma conduta só pode ser criminalizada ou descriminalizada por lei. Princípio da adequação social da conduta visa afastar aquilo que o legislador não quis criminalizar em nenhum momento. Impossível, portanto, aplicar este princípio para afastar algo que o legislador desejou criminalizar mas que, por motivos culturais, tornou-‐se relativamente aceito na sociedade. Exemplo5: jogo do bicho – a contravenção descrita pelo legislador objetiva justamente tipificar a conduta final do jogo do bicho. Não há possibilidade de aplicar Princípio da adequação social da conduta, eis que desde o Princípio o legislador desejou tipificar exatamente a conduta de promover e organizar o jogo de azar. Apenas uma norma revogadora poderia descriminalizar a conduta. 2.2.3. Teoria dos Elementos Negativos do Tipo Prega uma junção entre tipicidade e ilicitude. Ambas deveriam ser fundidas, tornando-‐se uma coisa só. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 7 www.cursoenfase.com.br Então, o tipo penal englobaria aquilo que reconhecemosatualmente, matar alguém, bem como os elementos negativos (ausência de causas de exclusão da ilicitude). O efeito desta construção é que a conduta de matar alguém em legítima defesa, por exemplo, seria atípica desde o início. Inicialmente, percebe-‐se que a construção deixa a análise mais simples. Entretanto, a desvantagem está no fato de que se permite equiparar valorativamente situações que são muito diferentes. Exemplo: equipara-‐se matar um homem em legítima defesa ao ato de matar uma mosca. As duas situações são igualmente atípicas para esta teoria. São duas atitudes muito diferentes e que possuem impactos infinitamente diversos na sociedade. Por este exato motivo, tais atitudes devem ser tratadas de forma diferenciada pelo Direito Penal; é dizer: devem fazer parte de extratos valorativos diversos. Por isso a Teoria dos Elementos Negativos do Tipo foi ultrapassada. 2.2.4. Tipicidade Conglobante (Zaffaroni) Na mesma linha de enriquecer a tipicidade formal, surge a Tipicidade Conglobante. Por ter posições muito respeitadas pela doutrina brasileira, mantendo estreitos laços com o país, as ideias de Zaffaroni não raro são cobradas em provas de concurso. Com o tema da tipicidade conglobante não é diferente. A Tipicidade Conglobante é mais ousada que a Tipicidade Material, pois arrasta mais juízos valorativos para dentro da tipicidade. Zaffaroni estuda a tipicidade a partir de duas diretrizes, ou dois juízos valorativos centrais: Matar alguém Salvo se em: -‐ legítima defesa; -‐ estado de necessidade; -‐ exercício regular de direito; e -‐estrito cumprimento de dever legal Tipo Penal – 121 CP Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 8 www.cursoenfase.com.br i) Antinormatividade: o Direito Penal não existe sozinho, mas dentro de um determinado ordenamento jurídico. Assim, não faz sentido que uma conduta seja típica e ao mesmo tempo permitida ou ordenada por outro ramo do ordenamento jurídico. Exemplo: uma permissão para uma conduta no Direito Tributário deve gerar, necessariamente, a atipicidade desta mesma conduta. Assim, determinada conduta, se autorizada pelo Direito Tributário, ao invés de gerar sonegação fiscal + exercício regular de um direito, seria atípica. Zaffaroni, portanto, não acredita no exercício regular de um direito ou no estrito cumprimento de dever legal como causas de exclusão da ilicitude, trazendo os dois para dentro da tipicidade. Exemplo2: o dever legal do policial ao cumprir um mandado de busca e apreensão não pode ser considerado conduta típica de invasão de domicílio e ao mesmo tempo ilícita em raão do estrito cumprimento do dever legal. ii) Lesão ao bem jurídico: a tipicidade só faz sentido quando há uma lesão a um bem jurídico. Não é uma ideia nova, a Tipicidade Material já entendia desta forma, mas é fundamental para a construção da tipicidade conglobante. Em resumo, a Tipicidade Conglobante de Zaffaroni Investiga a afetação do bem jurídico (lesão ao bem jurídico) e o contraste entre o tipo e as demais normas constantes do ordenamento jurídico (antinormatividade). Casos de atipicidade conglobante: cumprimento de um dever jurídico (estrito cumprimento de um dever legal, que para o Direito Penal brasileiro é causa de exclusão da ilicitude, artigo 23 do CP), o consentimento do ofendido, as cirurgias com fins terapêuticos (as sem fins terapêuticos são típicas, mas justificadas no limite do consentimento e das Matar alguém -‐ exercício regular de direito; e -‐estrito cumprimento de dever legal Tipicidade Conglobante Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 9 www.cursoenfase.com.br normas regulamentares), lesões desportivas (se dentro das normas), atividades perigosas fomentadas, insignificância. Observação: considerando que exercício regular de um direito e estrito cumprimento de um dever legal estão no artigo 23 do CP como excludentes de ilicitude, entende-‐se que sua inclusão na tipicidade é incompatível com o Direito Penal brasileiro. Exclusão de ilicitude(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Art. 23 -‐ Não há crime quando o agente pratica o fato: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) I -‐ em estado de necessidade; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) II -‐ em legítima defesa;(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) III -‐em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Observação2: interessante recordar que as lesões desportivas, para doutrina mais antiga, representam o exercício regular de um direito. Para a doutrina mais moderna, na Teoria da Imputação, as lesões desportivas são tratadas como risco permitido (como o são também as atividades perigosas fomentadas). Especificamente quanto ao consentimento do ofendido, a ser estudado no curso de Direito Penal Parte Geral II (uma vez que tratado pela doutrina majoritariamente como uma causa de exclusão da ilicitude), cabe mencionar que o tema é controvertido. A posição prevalente sustenta que o consentimento do ofendido pode excluir a tipicidade quando o dissenso da vítima for elemento do tipo. Nos demais casos, o consentimento exclui a ilicitude. Exemplo3: artigo 150 do CP – violação de domicílio. Entrar ou permanecer contra a vontade de quem de direito em casa alheia ou em suas dependências. Assim, para alguém que é convidado a tomar um café na casa de terceiro, a conduta será atípica. Entretanto, pegando como exemplo um crime de dano (crime patrimonial, bem jurídico disponível): imagine-‐se que “A” entrega a “B” um objeto pessoal e autoriza que “B” o quebre. O consentimento de “A” não é elemento do tipo de dano (do crime de dano), como o seria na violação de domicílio (“contra a vontade de quem de direito”). Por isso, nestes casos para a doutrina pátria o consentimento do ofendido atingirá a ilicitude. Violação de domicílio Art. 150 -‐ Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências: Pena -‐ detenção, de um a três meses, ou multa. Dano Art. 163 -‐ Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia: Pena -‐ detenção, de um a seis meses, ou multa. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 10 www.cursoenfase.com.br Para Zaffaroni e Roxin, o consentimento do ofendido exclui sempre a tipicidade, desde que o bem jurídico seja disponível. Para Zaffaroni, a exclusão da tipicidade ocorre porque não há verdadeira lesão a bem jurídico – se o titular do bem consente não há uma lesão do bem no sentido jurídico: o ofendido exerce a disponibilidade que o direito lhe confere. Roxin menciona que causas de exclusão da ilicitude pressupõem uma situação de conflito entre interesses com a prevalência de um deles. Quando há o consentimento do ofendido não há situação conflitiva, mas sim o exercício regular da disponibilidade sobre um bem jurídico. Ainda que o artigo 23 do CP não existisse, seria possível fazer o raciocínio favorável à incompatibilidade do sistema com a inserção de causas de exclusão feita por Zaffaroni na tipicidade. Isto porque as causas de exclusão de ilicitude possuem em comum a existência de um conflito entre interesses que colidem; é exatamente neste aspecto que se diferenciam da tipicidade. 2.2.5. Tipicidade da Teoria da Imputação Objetiva É a tipicidade como compreendida atualmente pelo Direito Penal. Exemplo: um tipo material que possua: 1) ação + relação de causalidade + resultado; somados aos 2) elementos já estudados em Teoria da Imputação (criação de risco desaprovado + realização do risco no resultado). 1) ação + relação de causalidade + resultado + 2) criação de risco desaprovado + 3) realização do risco no resultado Tipo Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 11 www.cursoenfase.com.br 2.3. Elementos do Tipo Como mencionado em aulas passadas, o Tipo é a descrição abstrata da conduta proibida. Tal descrição conta com alguns elementos classificados entre objetivos e subjetivos. A partir do finalismo, o tipo passou a contar com uma parte objetiva e outra subjetiva. A primeira é a descrição da conduta criminosa, utilizando-‐se de conceitos descritivos e normativos. A segunda representa a intenção que impele a realização da conduta (o movimento do corpo): dolo e, em alguns casos, um elemento subjetivo especial. Tipo: Objetivo Subjetivo 2.3.1. Elementos do Tipo Objetivo O legislador ao descrever uma conduta utiliza um verbo (açãoou omissão) e uma série de conceitos que podem ser classificados como descritivos ou normativos. Um conceito descritivo é aquele que pode ser aferido através da mera percepção sensorial. Já o elemento normativo é aquele que exige um juízo de valor. Sabe-‐se, também, que esta divisão tão clara serve a propósitos didáticos, eis que, na realidade, todos os elementos do tipo possuem alguma carga de valoração. É dizer: nenhum deles é totalmente livre de carga valorativa, mas uns possuem carga valorativa maior ou menor. Exemplo: o elemento “alguém” no crime de homicídio (“matar alguém”) – a princípio possui carga objetiva, pois percebe-‐se que alguém esta vivo através de estímulos sensoriais (olhando, tocando, etc). Contudo, em algumas hipóteses limite faz-‐se necessário realizar um juízo de valoração para permitir identificar se alguém esta vivo ou não – é o caso do doente terminal com morte cerebral, mas que o coração ainda pulsa: o legislador fez um juízo de valor e definiu que esta pessoa está morta. Os Elementos valorativos podem ser: Descrição: descritivos + normativos Dolo + (em alguns delitos) elemento subjetivo especial Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 12 www.cursoenfase.com.br a) de valoração jurídica: conceitos jurídicos ou referentes a normas jurídicas – cheque, documento, casamento (todos possuem elementos de natureza jurídica: não é qualquer título que é cheque, ou qualquer coisa um documento); e b) de valoração extra-‐jurídica ou empírico-‐cultural: juízos de valor fundados na experiência, na sociedade ou na cultura (ato obsceno, mulher honesta). Tudo que está na descrição legal, isto é, no tipo, é dele elemento. Exemplo2: subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel – “subtrair” é o núcleo do verbo, “coisa alheia móvel” são os elementos do tipo objetivo. No tipo objetivo há o dolo e o elemento sobjetivo especial “para si ou para outrem”. Contudo, existe controvérsia sobre alguns elementos previstos em tipos penais. Observe-‐se o artigo 151 do CP: Violação de correspondência Art. 151 -‐ Devassar indevidamente o conteúdo de correspondência fechada, dirigida a outrem: Pena -‐ detenção, de um a seis meses, ou multa. O termo “indevidamente” foi inserido no tipo para excetuar as permissões eventualmente existentes em outros ramos do Direito, como, por exemplo, a permissão para abrir as cartas trocadas por presos em penitenciárias. Trata-‐se de permissão externa ao Direito Penal. A conduta de abrir correspondências de presos, portanto, não será típica, eis que inexistente a exigência “indevidamente”. Elementos como este (“indevidamente”), que se remetem a causas de exclusão da ilicitude que estão fora do Direito Penal, são chamados pela doutrina de Elementos de Valoração Global do Fato. Muito embora tais elementos estejam no tipo, boa parte da doutrina (como Regis Prado, Roxin, entre outros), entende que o erro sobre eles não é erro de tipo, mas erro sobre a ilicitude do fato (isto é, um erro de proibição), uma vez que tais elementos referem a causas de exclusão da ilicitude. Exemplo3: “A”, esposa de “B”, acredita que pode abrir a correspondência de “B” por existir uma permissão extra penal neste sentido. “A” está cometendo um erro sobre o “indevidamente” que, para parte da doutrina, é um erro de proibição, pois ligado a uma suposta permissão (causa de exclusão da ilicitude) que, na verdade, não existe. Tal posicionamento é controvertido. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 13 www.cursoenfase.com.br No Brasil, boa parte da doutrina entende que os Elementos de Valoração Global do Fato são parte do tipo como qualquer outro e, portanto, o erro sobre eles é simples erro de tipo. 2.3.1. Elementos do Tipo Subjetivo Aqui estão contidos o dolo e os elementos subjetivos especiais do tipo. Cabe lembrar que o tipo subjetivo não existia no Causalismo, uma vez que, para os causalistas, o dolo era elemento da culpabilidade; passou a existir como tipo subjetivo a partir do Finalismo. Necessário esclarecer que este tema será tratado em uma aula específica mais adiante na aula de hoje. Antes, porém, fundamental tratar da classificação dos tipos penais, matéria que possui bastante incidência em provas. 2.4. Classificação dos tipos penais Há diversos critériosde classificação: a) Crimes materiais, formais e de mera conduta -‐ Materiais: o tipo penal prevê conduta e resultado; ademais, o resultado precisa ocorrer para haja crime consumado (exemplo: homicídio) -‐ Formais: o tipo prevê conduta e resultado, porém, o resultado não precisa acontecer para que haja crime consumado (exemplo: corrupção – solicitada, mas não recebida a vantagem indevida). -‐ Mera conduta: como o nome diz, o tipo descreve apenas uma conduta, sem mencionar qualquer resultado. b) Tipos congruentes e incongruentes -‐ Congruente: é aquele em que há uma exata correspondência entre o tipo objetivo e o tipo subjetivo. É dizer, aquilo que precisa acontecer no mundo (tipo objetivo) é exatamente o que o agente precisa desejar (subjetivo). Exemplo: matar alguém -‐ Objetivo: matar alguém Dolo (Subjetivo): matar alguém Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 14 www.cursoenfase.com.br Incongruente: ao contrário, é aquele no qual não há exata correspondência entre o tipo objetivo e o subjetivo. Exemplo2: lesão corporal seguida de morte (artigo 129, §3 o. do CP) Vê-‐se que o que acontece no mundo dos fatos (lesão + morte) é diferente, e maior, do que aquilo que o agente desejava (lesão). Assim, o tipo é classificado como incongruente. Lesão corporal seguida de morte § 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quís o resultado, nem assumiu o risco de produzí-‐lo: Pena -‐ reclusão, de quatro a doze anos. É possível, ainda, que o tipo subjetivo seja maior que o objetivo. Observe-‐se: Exemplo3: extorsão mediante sequestro (artigo 129, §3 o. do CP) Extorsão mediante seqüestro Art. 159 -‐ Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90 (Vide Lei nº 10.446, de 2002) Pena -‐ reclusão, de oito a quinze anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990) Vê-‐se que o tipo é incongruente, eis que o agente deseja mais do que precisa acontecer no mundo real para consumar o tipo. Se o agente não deseja a finalidade especial de obter o resgate, o crime será o do artigo 148 do CP. Seqüestro e cárcere privado Art. 148 -‐ Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere privado: (Vide Lei nº 10.446, de 2002) Objetivo: lesão + morte Subjetivo: lesão (culpa) Objetivo: Sequestro (basta apenas a privação da liberdade da vítima, não é necessário que o sequestrador receba o resgate) Subjetivo: Dolo de privar a vítima de sua liberdade (consciência e vontade sequestrar) + com o fim de obter o resgate Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 15 www.cursoenfase.com.br Pena -‐ reclusão, de um a três anos. Conclusão: na tipicidade incongruente ou o tipo objetivo é maior que o subjetivo, ou o subjetivo é maior que o objetivo – neste último caso, normalmente, em razão da existência de um elemento subjetivo especial. c) Tipos básicos e derivados, simples e mistos (cumulativos e alternativos): -‐ Básico: é o tipo fundamental previsto no caput do artigo. -‐ Derivado: é aquele previsto em qualificadoras, que oferecem penas mínima e máxima diferentes do tipo fundamental (básico). Atenção: não se refere a causas de aumento e diminuição, eis que não oferecem novas penas, apenas causas para aumentar o diminuir penas previstas. -‐ Simples: aqueles que oferecem um único verbo. Exemplo4: matar alguém. -‐ Mistos: tipos que oferecem diversos verbos. Quase todos os tipos mistos são alternativos, isto é, se o agente realizar várias das ações previstas em um mesmo contexto haverá apenas um crime. Exemplo5: crime de receptação (artigo 180 do CP) – transportar, receber, ocultar, entre outros. Receptação Art. 180 -‐ Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-‐fé, a adquira, receba ou oculte: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996) Pena -‐ reclusão, de um a quatro anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996) Em hipóteses raras o tipo pode ser considerado misto cumulativo. Noexemplo a seguir, a jurisprudência tendeu a interpretar o tipo como misto cumulativo, mas depois voltou atrás. Exemplo6: antigamente, estupro e atentado violento ao pudor eram crimes previstos em tipos penais diversos (artigos 213 e 214 do CP). Nesta época, se um homem ataca uma mulher e, no mesmo contexto, a estupra e a força ao coito anal (ou sexo oral forçado), a jurisprudência sustentava que haveria um concurso material de crimes. Redação antiga – já revogada: Estupro Art. 213 -‐ Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça: Pena -‐ reclusão, de seis a dez anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990) Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 16 www.cursoenfase.com.br Atentado violento ao pudor (Revogado pela Lei nº 12.015, de 2009) Art. 214 -‐ Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90 (Revogado pela Lei nº 12.015, de 2009) Pena -‐ reclusão de dois a sete anos. (Revogado pela Lei nº 12.015, de 2009) Com o advento da inovação legislativa que reuniu as duas condutas num mesmo tipo, a primeira reação do STJ foi de considerar como cumulativas as duas condutas, agora pertencentes a um só tipo penal misto. Inicialmente, então, a prática do estupro e do coito anal forçado, para o STJ, configurariam a prática de dois crimes do artigo 213 do CP. Estupro Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009) Pena -‐ reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009) Posteriormente, a orientação do STJ foi alterada e a Corte passou a entender o tipo do artigo 213 como misto alternativo: as duas condutas num mesmo contexto representariam um crime só. d) Tipos normais e anormais, fechados e abertos -‐ Normal: possui apenas elementos descritivos. -‐ Anormal: possui elementos descritivos e normativos. -‐ Fechados: possui uma descrição exaustiva da conduta proibida. -‐ Abertos: são aqueles nos quais a descrição da conduta precisa ser fechada num segundo momento, pelo intérprete. Em princípio, é possível observar tipos abertos em crimes culposos e naqueles que possuem elementos normativos. Parte da doutrina também considera aberta a tipicidade dos crimes omissivos impróprios (tema que será abordado em momento oportuno). e) Tipos instantâneos e permanentes -‐ Permanentes: tipo penal em que a ação ou omissão se prolonga no tempo. A partir da afirmação de que um crime é permanente, é possível extrair importantes consequências: o flagrante será permitido a qualquer momento; lei nova mais grave incidirá sobre o fato se a conduta ainda esta em prática; e a prescrição começa a correr apenas da data em que se encerra a permanência Exemplo7: sequestro (artigo 148 do CP) -‐ Instantâneos: ao contrário, a conduta é realizada numa fração fixa de tempo, sem se prolongar. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 17 www.cursoenfase.com.br f) Crimes Habituais: possuem um elemento subjetivo especial. Seria o caso do artigo 282 do CP – exercício ilegal da medicina. A doutrina tradicional entende que para a configuração do crime habitual se exige uma repetição de condutas. Assim, na visão tradicional, o falso médico teria que repetir o ato de se passar por médico atendendo vários pacientes. A crítica a esta visão está na definição do mínimo de repetições necessárias para configurar o tipo. Não há critério objetivo, muito embora autores como Fragoso tentem definir o número de repetições mínimas (para o autor, no mínimo 3 vezes). Todavia, o importante para caracterizar a habitualidade não é a repetição, uma vez que a repetição é mero sintoma da intenção de repetir. Os crimes habituais podem configurar-‐se com apenas uma conduta, pois o aquilo que os caracteriza como tais é a intenção de repetir. Configuração para a doutrina tradicional: Configuração para a doutrina mais moderna: A intenção de repetir, portanto, configura um elemento subjetivo especial, quer dizer, para alémdo dolo. A repetição é um sintoma da habitualidade que, por sua vez, é um elemento subjetivo especial (“intenção de repetir”) que alguns crimes integram ao tipo. Zaffaroni cria o seguinte exemplo: o falso médico que se instala em uma cidade do interior. Para tanto, faz propagandas nas rádios, distribui panfletos e outros meios de divulgação. No dia marcado para inaugurar o consultório, com uma fila na porta, o falso médico atende apenas o primeiro paciente. Houve a prática de uma conduta somente. Não obstante, fica clara a intenção de repetir a conduta (propaganda, investimento no consultório, a fila de pessoas esperando na porta para ser atendida), por isso, já existe crime habitual consumado. Com a definição da doutrina mais moderna (e predominante fora do país), o crime habitual passa a admitir o flagrante (eis que muito difícil o flagrante quando se exige um mínimo de 03 condutas), bem como a tentativa. 1a. Conduta 2a. Conduta 3a. Conduta 4a. Conduta 1a. Conduta + intenção de repetir + Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 18 www.cursoenfase.com.br g) Crimes de lesão e de perigo: tema recorrente em prova e especialmente importante em razão de uma certa confusão em sua abordagem por parte da doutrina brasileira. -‐ de lesão: exigem a efetiva lesão ao bem jurídico. Exemplo8: homicídio, lesão corporal, entre outros. -‐ de perigo: exigem que o bem jurídico seja colocado em perigo, mas sem que haja efetiva lesão. Exemplo9: artigo 132 do CP (perigo para a vida de outrem) e artigo 250 do CP (incêndio). Perigo para a vida ou saúde de outrem Art. 132 -‐ Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena -‐ detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave. Incêndio Art. 250 -‐ Causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem: Pena -‐ reclusão, de três a seis anos, e multa. Pode ser crime de perigo individual (colocar em risco uma pessoa ou poucas pessoas determinadas) ou de perigo coletivo (colocar em risco um número indeterminado de pessoas). i) delitos de perigo concreto (constatação ex post de perigo): Ideia tradicional sustenta que o crime de perigo concreto é aquele que exige a comprovação do perigo no caso concreto. Exemplo de crime de perigo concreto seria o crime de Incêndio. ii) delitos de perigo abstrato (constatação ex ante de perigo): Também há uma noção tradicional, segundo a qual o crime de perigo abstrato é aquele no qual o legislador presume o perigo sem admitir prova em contrário. Não se faz necessário provar, no caso concreto, perigo algum. O perigo é presumido. Para a corrente tradicional, o exemplo disso seria o artigo 253 do CP. Fabrico, fornecimento, aquisição posse ou transporte de explosivos ou gás tóxico, ou asfixiante Art. 253 -‐ Fabricar, fornecer, adquirir, possuir ou transportar, sem licença da autoridade, substância ou engenho explosivo, gás tóxico ou asfixiante, ou material destinado à sua fabricação: Pena -‐ detenção, de seis meses a dois anos, e multa. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 19 www.cursoenfase.com.br Portanto, na visão antiga, se o agente transporta um gás tóxico sem licença, mesmo que obedecendo todas as regras de segurança, incorre no crime do artigo 253 do CP. Presume-‐se de forma absoluta o perigo. Em razão desta definição, alguns autores no Brasil chegaram a defender a inconstitucionalidade dos crimes de perigo abstrato, entendendo inviável a presunção em desfavor do acusado sem admitir prova em contrário. Na realidade, ultrapassada a visão da presunção absoluta, não há qualquer inconstitucionalidade no perigo abstrato. O correto raciocínio segue as seguintes linhas: O crime de perigo concreto será reconhecido como tal se, depois da realização da conduta, for possível enxergar o perigo do que aconteceu. Exemplo10: alguém coloca fogo em um prédio. Depois que o fogo for debelado, que estiver tudo sob controle, será feita a avaliação da magnitude do perigo e suas características. Por isso, se houve perigo para um número indeterminado de pessoas, fala-‐se em constatação ex post de perigo. De outro lado, o perigo abstrato nãoé presunção absoluta de perigo, eis que também deve haver constatação de perigo no caso concreto. A diferença é que no perigo abstrato o exame é ex ante de perigo, isto é, pode ser vista enquanto a conduta é realizada. Exemplo11: sujeito “A” transportando substância tóxica, sem documentação formal, mas obedecendo a todas as regras de segurança. Um observador as conduta de “A” poderia aferir com tranquilidade que não há perigo. Conclui-‐se que não existirá crime. Exemplo12: a quadrilha é um crime de perigo abstrato. Para existir quadrilha deve ser possível enxergar perigo na associação enquanto ela é realizada; ainda que, eventualmente, os componentes desta quadrilha sejam incompetentes e desastrados ao ponto de fazer tudo errado. O que importa é a observação do perigo a partir da formação da quadrilha. h) comuns, próprios e de mão própria -‐ Crime comum: aquele que pode ser praticado por qualquer pessoa; não exige uma qualidade especial do sujeito ativo. -‐ Crime próprio: exige uma qualidade especial do sujeito ativo. Exemplo13: peculato. -‐ Crime de mão própria: além de exigir uma qualidade especial do sujeito ativo, somente que tem esta qualidade pode ser autor. Não admite coautoria, somente participação. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 20 www.cursoenfase.com.br Exemplo14: no crime próprio, como o peculato, quem tem a qualidade especial é o funcionário público. Porém, se o funcionário se associar a um particular, será possível enxergar entre os dois uma coautoria. Assim, o particular que não tem a qualidade especial também pode ser autor do crime próprio. Exemplo15: falso testemunho – somente a testemunha pode ser autora. Qualquer atuação conjunta será a título de participação, nunca coautoria. 2.5. Tipo Subjetivo A seguir serão tratados o dolo e os elementos subjetivos especiais. Alguns poucos crimes possuem elementos subjetivos especiais; a maioria dos tipos formados por tipo subjetivo apresenta apenas o dolo. Dolo é consciência e vontade de realizar o tipo objetivo. Como descobrir qual é o dolo de um determinado crime? O entendimento desta questão é fundamental para saber separar o dolo de elementos subjetivos especiais. R: Primeiramente necessário descobrir o tipo objetivo, isto é, aquilo que precisa acontecer no mundo real. Exemplo: na extorsão mediante sequestro é preciso que ocorra no mundo a privação da liberdade da vítima (“sequestrar pessoa”). Uma vez descoberto o tipo objetivo, fica mais fácil descobrir o dolo: no exemplo acima o dolo é a consciência e vontade de sequestrar pessoa. O raciocínio é aplicável a todos os crimes (homicídio, entre outros). Ademais, destacar ordenadamente o que é o tipo objetivo e o que é o dolo permite observar, eventualmente, a existência de alguma vontade a mais, isto é, alguma vontade que extrapole o dolo. Em existindo, esta vontade a mais será um elemento subjetivo especial. Portanto, o dolo possui elementos cognitivos (relacionados à consciência) e volitivos (relacionados à vontade). Contudo, interessa compreender exatamente o que é está consciência que compreende o dolo, eis que, como visto, no Sistema Neoclássico o dolo estava acoplado a outro tipo de consciência: a consciência da ilicitude. O dolo residia na culpabilidade e estava acoplado à consciência da ilicitude: dolus malus. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-‐se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 21 www.cursoenfase.com.br Neoclássico: -‐ Dolo Culpabilidade + Dolus Malus -‐ Consciência da Ilicitude A título de revisão, foi visto que com a evolução da doutrina o dolo foi trazido para dentro do tipo; por sua vez, a consciência da ilicitude (consciência de que a conduta é ilícita) virou Potencial Consciência da Ilicitude. A consciência como elemento do dolo significa tão somente que o sujeito ativo precisa conhecer a presença dos elementos do tipo objetivo no caso concreto. Exemplo2: para cometer um homicídio é necessário que o sujeito “A” conheça a presença, NO CASO CONCRETO, de outra pessoa a qual está matando. Não haverá a presença da consciência do dolo se “A” não souber da presença da outra pessoa. Então o dolo é conhecer os elementos do tipo objetivo no caso concreto e desejar realizar
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