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26. ADOÇÃO 26. ADOÇÃO 0 26. ADOÇÃO SUMÁRIO: 26.1 Visão histórica – 26.2 Tentativa conceitual – 26.3 Unilateral – 26.4 De maiores – 26.5 Internacional – 26.6 Póstuma – 26.7 “À brasileira” ou afetiva – 26.8 Dirigida ou intuitu personae – 26.9 Homoparental – 26.10 Filho de “criação” – 26.11 De nascituro – 26.12 Lei Nacional da Adoção – 26.13 Cadastros – 26.14 Procedimentos para a adoção: 26.14.1 Habilitação; 26.14.2 Ação de adoção; 26.14.3 Recursos – 26.15 Manifestação de vontade da genitora – 26.16 Destituição do poder familiar – 26. 17 Erros e equívocos – 26.18 Declaração da ascendência genética – 26.19 Benefícios legais – 26.20 Parto anônimo – Leitura complementar. Referências legais: CF 227 §§ 5.º e 6.º; Convenção sobre os Direitos da Criança; Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional (Convenção da Haia); CC 1.618 e 1.619; L 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA) 39 a 52-D, 201 III e 249; L 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos – LRP) 102 3.º; L 8.213/91 (Lei dos Benefícios da Previdência Social) 16, 71-A; L 12.955/14; Dec. 5.491/05; L 11.770/08; L 12.010/09 (Lei Nacional da Adoção); Lei 12.873/13; CNJ Resoluções 54/08, 93/09 e 190/14; CNJ Provimento 36/14. 26.1 Visão histórica O instituto da adoção é um dos mais antigos de que se tem notícia. Afinal, sempre existiram filhos não desejados, que os pais não querem ou não podem assumir. Também há crianças que são afastadas do convívio com os pais. Há legiões de crianças abandonadas, jogadas no lixo, maltratadas, violadas e violentadas, que escancaram essa realidade. A sorte é que milhões de pessoas desejam realizar o sonho de ter filhos. O Código Civil de 1916 chamava de simples a adoção tanto de maiores como de menores de idade. Só podia adotar quem não tivesse filhos. A adoção era levada a efeito por escritura pública e o vínculo de parentesco estabelecia-se somente entre o adotante e ao adotado. A L 4.655/65 admitiu a chamada legitimação adotiva. Dependia de decisão judicial, era irrevogável e fazia cessar o vínculo de parentesco com a família natural. O Código de Menores (L 6.697/79), posteriormente revogado pelo ECA, substituiu a legitimação adotiva pela adoção plena, mas manteve o mesmo espírito.1 O vínculo de parentesco foi estendido à família dos adotantes, de modo que o nome dos avós passou a constar no registro de nascimento do adotado, independentemente de consentimento expresso dos ascendentes. A Constituição Federal (227 § 6.º), ao consagrar o princípio da proteção integral, deferindo idênticos direitos e qualificações aos filhos e proibindo quaisquer designações discriminatórias, eliminou qualquer distinção entre adoção e filiação. Buscando dar efetividade a este comando o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA passou a regular a adoção dos menores de 18 anos, assegurando- lhes todos os direitos, inclusive sucessórios. Permaneceu o Código Civil de 1916 regulamentando a adoção dos maiores de idade. Podia ser levada a efeito por escritura pública. O adotado só tinha direito à herança se o adotante não tivesse prole biológica. Advindo filhos depois da adoção, perceberia o adotado somente a metade do quinhão a que fazia jus a filiação “legítima”. Esses dispositivos, entretanto, foram considerados inconstitucionais pela jurisprudência a partir da vigência da Constituição Federal. Quando do advento do Código Civil de 2002, grande polêmica instaurou-se em sede doutrinária. O ECA regulava de forma exclusiva a adoção de crianças e adolescentes, mas a lei civil trazia dispositivos que faziam referência à adoção de menores de idade. Esta superposição foi corrigida pela chamada Lei Nacional da Adoção (L 12.010/09, 2.º) que, modo expresso, atribui ao ECA a adoção de crianças e adolescentes, mas manda aplicar seus princípios à adoção dos maiores de idade (CC 1.619). Dois tratados internacionais estão incorporados à legislação brasileira: a Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, mais conhecida como Convenção da Haia, e a Convenção sobre os Direitos da Criança. 26.2 Tentativa conceitual O estado de filiação decorre de um fato (nascimento) ou de um ato jurídico: a adoção2 – ato jurídico em sentido estrito, cuja eficácia está condicionada à chancela judicial. A adoção cria um vínculo fictício de paternidade-maternidade-filiação entre pessoas estranhas, análogo ao que resulta da filiação biológica. Ressalta Waldyr Grisard que esse conceito persegue as razões legais e seus efeitos, mas representa somente uma face do instituto.3 A adoção constitui um parentesco eletivo, por decorrer exclusivamente de um ato de vontade. Trata-se de modalidade de filiação construída no amor, na feliz expressão de Luiz Edson Fachin,4 gerando vínculo de parentesco por opção. A adoção consagra a paternidade socioafetiva, baseando-se não em fator biológico, mas em fator sociológico.5 A verdadeira paternidade funda-se no desejo de amar e ser amado. É nesse sentido que o instituto da adoção se apropria da palavra afeto. É no amor paterno- filial entre pessoas mais velhas e mais novas, que imita a vida, que a adoção se baseia. São filhos que resultam de uma opção e não do acaso que são adotivos.6 A doutrina da proteção integral e a vedação de referências discriminatórias (CF 227 § 6.º) alteraram profundamente a perspectiva da adoção. Inverteu-se o enfoque dado à infância e à adolescência, rompendo a ideologia do assistencialismo e da institucionalização, que privilegiava o interesse e a vontade dos adultos.7 A adoção significa muito mais a busca de uma família para uma criança. Foi abandonada a concepção tradicional, em que prevalecia sua natureza contratual e que significava a busca de uma criança para uma família.8 Não é uma paternidade de segunda classe, mas se prefigura como a paternidade do futuro, enraizada no exercício da liberdade.9 A filiação não é um dado da natureza, mas uma construção cultural, fortificada na convivência, no entrelaçamento dos afetos, pouco importando sua origem. Nesse sentido, o filho biológico é também adotado pelos pais no cotidiano de suas vidas.10 Desde o advento da Constituição Federal, estão assegurados os mesmos direitos e qualificações aos filhos havidos ou não da relação do casamento ou por adoção. Não cabe mais falar em “filho adotivo”, mas em “filho por adoção”, como bem lembra Paulo Lôbo. A origem da filiação é única e se apaga quando da adoção.11 A partir do momento em que é constituída pela sentença judicial e é retificado o registro de nascimento, o adotado é filho, sem qualquer adjetivação. O adotado adquire os mesmos direitos e obrigações como qualquer filho. Direito ao nome, parentesco, alimentos e sucessão. Na contramão, também correspondem ao adotado os deveres de respeito e de obediência. Os pais, por sua vez, têm os deveres de guarda, criação, educação e fiscalização.12 A adoção atribui ao adotado a condição de filho para todos os efeitos, desligando-o de qualquer vínculo com os pais biológicos (ECA 41), salvo quanto aos impedimentos para o casamento.13 Do vínculo de consanguinidade não resulta qualquer outro efeito jurídico, pessoal ou patrimonial.14 A relação de parentesco se estabelece entre o adotado e toda a família do adotante. Os seus parentes tornam-se parentes do adotado, tanto em linha reta, como em linha colateral. Também idênticos os graus de parentesco que se estabelecem em relação aos filhos biológicos do adotante (ECA 41).15 Vivendo os adotantes em união estável, também os vínculos parentais se estendem ao adotado. Como a adoção é irrevogável (ECA 39 § 1.º), rompe todos os laços com a família biológica. Ainda assim, com certa frequência simplesmente os adotantes “devolvem” o filho que adotaram. Tal situação não está prevista na lei, mas infelizmente é algo que existe. De qualquer forma, como pode ocorrer a destituiçãodo poder familiar do adotante (CC 1.638) acaba sendo aceita a devolução, até por uma questão de praticidade. A criança pode ser imediatamente adotada por outrem. Talvez esta seja a solução que melhor atende aos seus interesses, pois pode vir a ser adotada por quem de fato a queira. A jurisprudência vem impondo aos adotantes que desistem da adoção o dever de pagar alimentos16 e indenização por danos morais e materiais17 ao menos para subsidiar o acompanhamento psicológico de quem teve mais uma perda, até ser novamente adotado. E, se a adoção que não gerou qualquer vínculo de convivência pode ser desconstituída.18 A morte dos adotantes não restabelece o poder familiar dos pais naturais (ECA 49). Mas cabe questionar se há a possibilidade de os pais biológicos adotarem o filho que fora adotado. Ainda que exista resistência na doutrina,19 não há vedação legal, uma vez que a adoção rompe o vínculo de filiação. Com a morte do adotante, o filho ficou órfão e nada impede que seja adotado pelos pais biológicos. Apesar de ser priorizada e incentivada a permanência de crianças e adolescentes no âmbito da família extensa (ECA 19 § 3.º e 39 § 1.º), ou seja, com parentes próximos com os quais convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade (ECA 25 parágrafo único), é vedada a adoção por ascendentes ou entre irmãos (ECA 42 § 1.º). Como avós não podem adotar netos e irmãos não podem ser adotados uns pelos outros, ocorre somente a concessão da guarda. No entanto, em caso muito especial, de forma sensível o STJ admitiu que a adoção pelos avós que haviam adotado a mãe, com oito anos de idade e quando já estava grávida.20 O vínculo de parentesco alcança também a união estável (CC 1.595) e a mesma restrição estende-se aos conviventes, sendo vedada a adoção entre ascendentes e descendentes, mesmo depois de rompida a união. Portanto, o padrasto pode adotar o enteado (adoção unilateral), mas o seu genitor não.21 Não há qualquer óbice à adoção entre parentes colaterais de terceiro e quarto graus. Nada impede que alguém adote um sobrinho ou um primo, quer consanguíneo, quer ele tenha sido adotado. Em face da adoção, a alteração do sobrenome do adotado é obrigatória. Constarão no registro de nascimento os adotantes como pais e seus ascendentes como avós. Os vínculos familiares se estendem a todos que a lei considera parentes em razão do casamento ou da união estável, inclusive no que diz com os vínculos de afinidade. Quando se tratar de adoção de criança ou adolescente, pode haver a alteração do prenome se este for o desejo do adotante ou do adotado (ECA 47 § 5.º). Se a modificação for requerida pelo adotante, a vontade do adotado precisa ser respeitada. Caso tenha ele mais de 12 anos de idade, o seu consentimento precisa ser colhido em audiência (ECA 47 § 6.º). A idade para adotar é 18 anos (ECA 42). Há outro requisito que diz com a idade: entre adotante e adotado deve existir uma diferença de 16 anos (ECA 42 § 3.º). Esta distância de tempo busca imitar a vida, pois é a diferença em anos para a procriação. Sendo dois os adotantes, basta o respeito à diferença de idade com referência a apenas um deles.22 A regra admite flexibilização, principalmente quando o pedido de adoção é antecedido de período de convívio por lapso de tempo que permitiu a constituição da filiação afetiva. Qualquer pessoa pode adotar. Pessoas sozinhas: solteiros, divorciados, viúvos. A lei não faz qualquer restrição quanto à orientação sexual do adotante, nem poderia fazê-lo. Também independe o estado civil do adotante (ECA 42). Quem é casado ou vive em união estável pode adotar, sendo que a adoção não precisa ser levada a efeito pelo casal. Como a lei não proíbe que somente uma pessoa adote, o que não é proibido é permitido. Basta haver a concordância do cônjuge ou companheiro. Essa é a única exigência para a colocação em família substituta (ECA 165 I), norma que se aplica também à adoção (ECA 165 parágrafo único). Não só uma, mas duas pessoas podem adotar alguém. Para conceder a adoção conjunta, de modo pouco técnico, fala a lei em “casados civilmente” (ECA 42 § 2.º). Ora, quem não é legalmente casado, casado não é! Também é descabida a exigência da comprovação documental da união estável (ECA 197-A III). Para o reconhecimento da união a lei não exige prova escrita. Basta que a convivência seja pública, contínua e duradoura, e que haja o desejo de constituir família. Apesar de sua desastrosa redação, o dispositivo não exclui a adoção por casais homossexuais. A adoção pode ser concedida aos divorciados e aos ex- companheiros, desde que o estágio de convivência tenha iniciado na constância da união e haja acordo sobre a guarda e o regime de visitas (ECA 42 § 4.º). Demonstrado o efetivo benefício ao adotando, é assegurada a guarda compartilhada (ECA 42 § 5.º). Diante da pluralidade que adquiriu o conceito de família, o STJ deferiu a adoção a dois irmãos, ao reconhecer que se tratava de família anaparental.23 O consentimento dos pais ou do representante legal do adotando é dispensado se os pais forem desconhecidos ou tenham eles sido destituídos do poder familiar (ECA 45 § 1.º). Nessas hipóteses, Belmiro Welter24 sustenta que seria até dispensável o procedimento judicial de adoção, ao menos em favor de candidatos já habilitados ou quando já estabelecido o convívio. Descabida a exigência da expressa manifestação dos pais registrais para a adoção, quando já existe o vínculo de filiação afetiva. Estando o adotando convivendo com os adotantes, nada justifica exigir a concordância dos genitores. Mas a recusa de um dos genitores precisa ser justificada. Cabe figurar o exemplo de o genitor não conviver com o filho, que cria forte vínculo com o padrasto. Assim, é desarrazoado impedir a adoção pela falta de concordância do genitor, até porque sua postura enseja, inclusive, a perda do poder familiar (CC 1.638 II). Deferida a adoção, se estabelece o vínculo de filiação com um dos genitores biológicos e com o adotante. É o que se chama de adoção híbrida ou unilateral. Sendo alguém adotado por uma única pessoa, não há qualquer impedimento a que permaneça o registro com relação a um dos pais biológicos, mas, a requerimento do adotante, é possível excluir do registro de nascimento o nome de ambos os genitores. Salutar a exigência de o tutor e o curador prestarem contas da sua administração para adotar o pupilo ou o curatelado (ECA 44). Como o tutor e o curador têm a obrigação de prestar contas (obrigação que inexiste em se tratando dos pais), não exigir o adimplemento de tal encargo poderia dar margem à busca da adoção como subterfúgio para simplesmente serem dispensados do encargo: bastaria adotar o tutelado ou o curatelado. 26.3 Unilateral Solvidos os vínculos afetivos, a tendência de todos é buscar novos amores. Quando um ou ambos possuem filhos de uniões anteriores, há a possibilidade de o novo parceiro adotá-los. Forma-se um novo núcleo familiar, chamada família mosaico, e é natural o desejo de consolidar os laços familiares não só do par, mas também com relação aos respectivos filhos. Por isso, admite a lei que o cônjuge ou companheiro adote a prole do outro. Ocorre a exclusão do genitor biológico, que é substituído pelo adotante, permanecendo o vínculo de filiação com relação ao outro genitor (ECA 41 § 1.º). Em outras palavras, se uma mulher tem um filho, seu cônjuge ou companheiro pode adotá-lo. A criança permanece registrada em nome da mãe biológica e o adotante é registrado como pai. O filho mantém os laços de consanguinidade com a mãe e o vínculo paterno é com o adotante. O poder familiar é exercido por ambos, e o parentesco se estabelece com os parentes de cada um dos genitores. É o que se chama de adoção unilateral. Estabelece-se uma biparentalidade fática do filho com o parceiro do genitor biológico.25 Trata-se de forma especial de adoção, que tem caráter híbrido, poispermite a substituição de somente um dos genitores e respectiva ascendência. Daí também se chamar adoção semiplena.26 Subsistem impedimentos matrimoniais de duas ordens, tanto com relação à família de sangue (CC 1.521 I, II e IV), como com relação à adotiva (CC 1.521 III e V). Nada justifica condicionar a adoção ao consentimento expresso do genitor. A necessidade da concordância é de todo descabida. Muitas vezes abandonado pelo pai, o filho passa a ter estreita vinculação com o companheiro ou marido da mãe. Como o abandono serve de causa para a perda do poder familiar (CC 1.638 II), esta é a única solução quando injustamente o pai se insurge contra a adoção. Resistir a essa possibilidade revela sacralização do vínculo familiar originário, ainda que desfeito, em detrimento do elo de afetividade que se estabeleceu com quem assumiu os deveres parentais. O pai somente precisa ser citado para se sujeitar aos efeitos da sentença, pois perderá o vínculo parental. O novo cônjuge ou companheiro dispõe de legitimidade ativa para a ação de destituição do genitor cumulada com a ação de adoção.27 Ainda que não requerida a destituição do poder familiar, este é um efeito anexo da sentença. Para amenizar esse impasse, é possível o enteado acrescentar o sobrenome do padrasto ou madrasta, sem que, para isso, seja necessária a autorização do genitor (LRP 57 § 8.º). Tal possibilidade não subtrai do pai biológico os deveres decorrentes do poder familiar, mas serve de prova para o filho buscar o reconhecimento da filiação afetiva frente àquele que já lhe concedeu o direito ao uso do nome. Quando ocorre o falecimento do padrasto, o enteado tem direito aos benefícios previdenciários. Basta ser comprovada a dependência econômica. O enteado é equiparado ao filho (L 8.213/91, art. 16, III, § 2.º). Cada vez mais a jurisprudência vem reconhecendo a possibilidade de alguém ter mais de dois pais em seu registro de nascimento. É o que se chama de multiparentaliade. Tal ocorre, por exemplo, quando a criança mantém vínculo socioafetivo tanto com o pai biológico quanto com novo companheiro da mãe. Nesta hipótese, ao invés de ser deferida a adoção unilateral, se acrescenta mais um pai e os respectivos avós na certidão de nascimento. Tal pode ensejar, inclusive, a alteração da composição do nome, com a inclusão do sobrenome do padrasto. Deste modo no registro vai constar o nome de três pais e de seis avós. Esta é uma solução para lá de salutar, pois além de ser amado por um maior número de pessoas, o filho também terá um número maior de direitos, como a alimentos e direitos sucessórios. Há três possibilidades para a ocorrência da adoção unilateral: (a) quando o filho foi reconhecido por apenas um dos pais, a ele compete autorizar a adoção pelo seu parceiro; (b) reconhecido por ambos os genitores, é deferida a adoção ao novo cônjuge ou companheiro do guardião, decaindo o genitor biológico do poder familiar; (c) em face do falecimento do pai biológico, pode o órfão ser adotado pelo cônjuge ou parceiro do genitor sobrevivente. Quanto à última hipótese, há divergência em sede doutrinária. A morte do genitor leva à extinção do poder familiar (CC 1.635 I). Na falta de um dos pais, o poder familiar é exercido exclusivamente pelo outro (CC 1.631). No entanto, há quem sustente que o genitor sobrevivente não tem o direito de dispor da identidade e do nome do filho, isto é, não tem legitimidade para autorizar a adoção, o que implica extinguir o poder familiar do genitor falecido.28 Sob esse fundamento, a tendência é não admitir a adoção unilateral em face da impossibilidade de o genitor, em virtude da morte, se manifestar. Porém, com isso simplesmente alija-se de alguém o direito de ter nova identidade familiar. Em nome da preservação dos laços de parentesco com a família biológica, olvida-se que se está vivendo em plena era da doutrina da proteção integral, e que o interesse de crianças e adolescentes é prioridade absoluta. Como é indispensável a concordância do adotando, ao menos depois da idade de 12 anos, manifestando-se ele favoravelmente à adoção, não há porque negá-la. No entanto, para a ação é indispensável a citação dos avós, pais do genitor falecido.29 Além disso, cabe assegurar aos avós o direito de visita. 26.4 De maiores A adoção de maiores nunca foi proibida. Ao contrário, era até facilitada, na medida em que podia ser levada a efeito por escritura pública, dispensando-se a via judicial. A partir do advento da nova ordem constitucional, todos, independentemente da origem da filiação, passaram a gozar da condição de filhos, fazendo jus a idênticos direitos, ainda que tenham sido adotados antes da vigência da Constituição. Como o princípio da igualdade da filiação está previsto em dispositivo que integra artigo que trata do direito de crianças e adolescentes (CF 227 § 6.º), houve quem sustentasse que a regra aplicava-se apenas à adoção de menores de idade. No entanto, essa posição não vingou. Isso levou a doutrina a questionar a conveniência de manter a adoção dos maiores de idade. As opiniões divergem. Há quem alegue que a adoção visa, sobretudo, ao exercício do poder familiar, não havendo justificativa para a concessão da medida aos maiores de 18 anos. Antônio Chaves sustenta que, além de ferir a finalidade do instituto, a adoção normalmente é revestida, nesses casos, de interesse escuso ou duvidoso, de ordem patrimonial ou econômica.30 Esses argumentos mereceram veementes críticas de Sérgio Gischkow Pereira: A adoção é instituto por demais sublime e grandioso para que se o amesquinhe com exegeses restritivas, alicerçadas no fechamento egoístico da família consanguínea, em estranhas concepções sobre meias-filiações e no aceitar de uma desigualdade que só provocará problemas psicológicos ao adotado, tudo em nome de interesses menores, porque puramente patrimoniais, ou seja, vinculados à herança.31 No que concerne à adoção de adultos, limita-se o Código Civil a exigir a assistência efetiva do poder público, o que torna necessária a via judicial, aplicando-se, no que couber, as regras do ECA (CC 1.619).32 Como se trata de direito personalíssimo, que diz com o estado da pessoa, indispensável a inequívoca manifestação de vontade de adotante e de adotado, mas dispensável estágio de convivência. Caso a adoção não seja pleiteada pelo casal, é necessária a anuência do cônjuge ou companheiro do adotante (ECA 165 I).33 Apesar do já decidido pela justiça carioca,34 mesmo que o filho tenha mantido vínculo de convivência com o pai biológico, tal não impede que a adoção ocorra depois de atingir a maioridade, sendo de todo irrelevante a discordância do genitor. Persiste a vedação da adoção por ascendentes ou entre irmãos (ECA 42 § 1.º). Assim, avós não podem adotar netos e irmãos não podem ser adotados uns pelos outros, ainda que sejam adultos. Como o vínculo de parentesco alcança também a união estável (CC 1.595), a restrição estende-se aos conviventes, sendo vedada a adoção entre ascendentes e descendentes, mesmo depois de rompida a união. Contudo, não há qualquer óbice à adoção entre parentes colaterais de terceiro e quarto graus. Dúvidas há sobre a necessidade de consentimento dos pais biológicos. As posições são contraditórias.35 No entanto, é imperativo, senão o consentimento, ao menos a citação dos mesmos.36 Ainda que não precisem consentir, devem ser citados, pois a sentença terá profunda ingerência nas suas vidas. Perdem eles a relação paterno- filial, que, às claras, não se esgota com a extinção do poder familiar.37 Como a adoção faz cessar todos os vínculos parentais, de todo desarrazoada a “perda” de um filho sem sequer tomar conhecimento de tal fato. De outro lado, como se trata de ação relativa ao estado de uma pessoa, para a sentença produzir coisa julgada com relação a terceiros é indispensável a citação de todos os interessados como litisconsortes necessários(CPC 472).38 26.5 Internacional A possibilidade de crianças e adolescentes perderem a nacionalidade ao serem adotadas por estrangeiros é tema que sempre gera acesos debates. Há quem considere a adoção internacional de grande valia para amenizar os aflitivos problemas sociais. Outros, no entanto, temem que se transforme em tráfico internacional ou, pior, que objetive a comercialização de órgãos. Mas a adoção tem como finalidade primordial atender ao aspecto da política social de proteção da infância, independentemente da nacionalidade dos sujeitos, porquanto o que interessa é construir uma família com todas as características psicossociais da família natural.39 Trata-se de adoção admitida constitucionalmente (CF 227 § 5.º), sendo delegado à lei o estabelecimento dos casos e das condições de sua efetivação por estrangeiros. O ECA não regulamentava o instituto e limitava-se a impor o cumprimento do estágio de convivência no território nacional. Foi a Lei da Adoção que regulamentou a adoção internacional, de forma exaustiva e altamente burocratizada (ECA 51 a 52-D). Impôs tantos entraves e exigências que dificilmente um estrangeiro consegue adotar. Até parece que a intenção é vetar que ocorra. Os labirintos impostos transformaram-se em barreira intransponível para que desafortunados brasileirinhos tenham a chance de encontrar um futuro melhor fora de sua terra natal. Basta atentar que somente se dá a adoção internacional depois de esgotadas todas as possibilidades de colocação em família substituta brasileira (ECA 51 § 1.º II), havendo ainda a preferência de brasileiros residentes no exterior (ECA 51 § 2.º). O Conselho Nacional de Justiça expediu Resolução40 possibilitando a inclusão de pretendentes estrangeiros no Cadastro Nacional de Adoção, para eventual início da adoção internacional. A habilitação é feita em um subcadastro, e só pode ocorrer quando esgotadas as possibilidades de inserção em família substituta nacional. Para definir a adoção internacional o ECA socorre-se de tratados internacionais (ECA 51): aquela na qual a pessoa ou casal postulante é residente ou domiciliado fora do Brasil, conforme previsto no art. 2.º da Convenção da Haia, de 29/05/93, Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional.41 É chamado de país de acolhida aquele em que o adotante tem sua residência habitual (ECA 52 I). A adoção pressupõe a intervenção das Autoridades Centrais Estaduais e Federal (ECA 51 § 3.º), sendo admitida a intermediação de organismos nacionais e estrangeiros, sem fins lucrativos, devidamente credenciados (ECA 52 § 1.º). O credenciamento tem validade de dois anos (ECA 52 § 6.º) e, semestralmente, os organismos devem apresentar relatórios pós- adotivos (ECA 52 § 4.º V), bem como, a cada ano, relatórios sobre o acompanhamento das adoções internacionais (ECA 52 § 4.º IV). O pedido de adoção de brasileiro deve ser requerido à Autoridade Central do país de acolhida, que encaminha relatório à Autoridade Central Estadual de onde reside a criança (ECA 52 I, II, III). A habilitação do postulante estrangeiro ou residente fora do Brasil tem validade por um ano, podendo ser renovada (ECA 52 § 13). Tratando- se de adolescente, este deve ser consultado. Parecer elaborado por equipe interprofissional precisa demonstrar que ele se encontra preparado para ser adotado e levado a um país estrangeiro (ECA 51 § 1.º III). A sentença concessiva da adoção internacional está sujeita a apelação a ser recebida no duplo efeito (ECA 199-A). Antes do trânsito em julgado da sentença, não é permitida a saída do adotando do território nacional (ECA 52 § 8.º). Após, a autoridade judiciária determina a expedição de alvará com autorização de viagem, bem como para obtenção de passaporte. A Autoridade Central Federal brasileira pode, a qualquer momento, solicitar informações sobre a situação das crianças e adolescentes adotados (ECA 52 § 10). A adoção por brasileiro residente no exterior, em país ratificante da Convenção de Haia, cujo processo de adoção tenha sido realizado em conformidade com a legislação vigente no país de residência, é automaticamente recepcionada com o reingresso no Brasil (ECA 52- B). Caso contrário, deve a sentença ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (ECA 52-B § 1.º). Quando o Brasil for o país de acolhida, deve emitir certificado de naturalização provisório (ECA 52-C). E, se a adoção não for deferida no país de origem ou este não tiver aderido à Convenção, o processo segue o rito da adoção nacional (ECA 52-D). Falando em adoção internacional, cabe lembrar que a adoção de estrangeiro feita por brasileiros concede ao adotado a condição de brasileiro nato, pois não admite a Constituição qualquer discriminação referente à filiação, nem mesmo pelo fato de decorrer da adoção. 26.6 Póstuma A sentença de adoção possui eficácia constitutiva e seus efeitos começam a fluir a partir do trânsito em julgado da sentença (ex nunc), não produzindo efeito retroativo (ECA 47 § 7.º). Contudo, a lei abre exceção na hipótese do falecimento do adotante, no curso do processo: o efeito da sentença retroage à data do falecimento. Paulo Lôbo explica que o óbito faz cessar a personalidade e nenhum direito pode ser atribuído ao morto, sendo a retroatividade excepcional, no interesse do adotando.42 O deferimento da adoção depois do falecimento do adotante está condicionado à propositura da ação antes do óbito (ECA 42 § 6.º). A necessidade de que o procedimento judicial de adoção já tenha iniciado, no entanto, deixou de ser exigida a partir de decisão do STJ.43 Basta que seja comprovada a inequívoca manifestação de vontade em adotar, antes do falecimento. Trata-se de verdadeira adoção socioafetiva.44 A posse do estado de filho é mais do que uma simples manifestação escrita feita pelo de cujus, porque o seu reconhecimento não está ligado a um único ato, mas a uma ampla gama de acontecimentos que se prolongam no tempo e que perfeitamente servem de sustentáculo para o deferimento da adoção.45 A justiça apenas convalida o desejo do falecido. Dá para afirmar que se trata de verdadeira adoção nuncupativa. Trata-se de um processo socioafetivo de adoção.46 Opera-se simultaneamente a extinção do poder familiar existente e a constituição do vínculo de filiação civil.47 Também é de admitir-se a adoção levada a efeito por meio de testamento, pois evidencia claramente a intenção de adotar.48 Ora, no momento em que é admitida a possibilidade da adoção, mesmo que não tenha o adotante dado início ao respectivo processo, às claras se está aceitando o reconhecimento da paternidade afetiva. Até porque é isso que a sentença faz. Flagrada a existência da posse do estado de filho, ou melhor, da posse do estado de pai, é declarado o vínculo de filiação por adoção.49 26.7 “À brasileira” ou afetiva Há uma prática disseminada no Brasil – daí o nome adoção à brasileira – de o companheiro de uma mulher perfilhar o filho dela, simplesmente o registrando como se fosse filho seu. Ainda que este agir constitua crime contra o estado de filiação (CP 242), pela motivação afetiva que envolve essa forma de agir, é concedido perdão judicial.50 Muito frequentemente, rompido o vínculo afetivo do casal, ante a obrigatoriedade de arcar com alimentos a favor do filho, o pai busca a desconstituição do registro por meio de ação anulatória ou negatória de paternidade. A jurisprudência, reconhecendo a voluntariedade do ato, praticado de modo espontâneo, não admite a anulação do registro de nascimento, considerando-o irreversível. Não tendo havido vício de vontade, não cabe a anulação, sob o fundamento de que a lei não autoriza a ninguém vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento (CC 1.604). Ainda que dito dispositivo legal excepcione a possibilidade de anulação por erro ou falsidade, não se pode aceitar a alegação de falsidade doregistro levada a efeito pela própria pessoa. Assim, registrar filho alheio como próprio, sabendo não ser verdadeira filiação, impede posterior pedido de anulação. O registro não revela nada mais do que aquilo que foi declarado – por conseguinte, corresponde à realidade do fato jurídico. Descabido falar em falsidade.51 A intenção de formar um núcleo familiar deveria ensejar a adoção do filho da companheira, e não o seu indevido registro. E, como a adoção é irrevogável (ECA 39 § 1.º), não se pode conceder tratamento diferenciado a quem faz uso de expediente ilegal. Inquestionável a vontade de quem assim age em assumir a paternidade, não podendo ser aceito arrependimento posterior. Imperativo prestigiar a posse de estado de filho de que desfruta o registrado, na medida em que se constituiu uma filiação socioafetiva. Ainda que seja obstaculizado ao pai a desconstituição, igual impedimento não existe com relação ao filho, que pode fazer uso da ação anulatória do registro, pois está a vindicar seu estado de filiação. Esta espécie de adoção não se equipara ao instituto da adoção, pela forma como foi levada a efeito. Deste modo dispõe o filho de legitimidade para buscar o reconhecimento da filiação biológica e a anulação do registro levado a efeito, independente da existência de filiação socioafetiva com o pai registral.52 Também pode o filho, somente buscar o efeito anulatório, sem intentar a ação de reconhecimento da paternidade contra o pai biológico. Dispõe ele do direito de simplesmente excluir do registro o nome de quem lá consta como seu genitor. Há a possibilidade de ser reconhecida a multiparentalidade, inserindo-se no registro a filiação biológica sem excluir o pai registral. Neste sentido a decisão proferida em demanda investigatória de paternidade cumulada com anulação de registro civil, em que a autora buscava substituir o registro decorrente de adoção à brasileira pelo pai biológico. Em face da revelia de ambos os demandados a magistrada determinou o acréscimo do nome do genitor, sem prejuízo da filiação registral.53 26.8 Dirigida ou intuitu personae Determina o ECA que, em cada comarca ou foro regional, haja um duplo cadastro: um de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas em adotar (ECA 50). Para serem incluídos nesse rol, os pretendentes devem ser considerados aptos à adoção, após se submeterem a entrevistas e a estudos psicossociais. Existe uma exacerbada tendência de sacralizar a lista de preferência e não admitir, em hipótese nenhuma, a adoção por pessoas não inscritas. É tal a intransigência e a cega obediência à ordem de preferência que se deixa de atender a situações em que, mais do que necessário, é recomendável deferir a adoção sem atentar à listagem. Muitas vezes o candidato não se submeteu ao procedimento de inscrição, até porque jamais havia pensado em adotar. Chama-se de adoção intuitu personae ou adoção dirigida quando há o desejo da mãe de entregar o filho a determinada pessoa. Também é assim chamada a intenção de alguém em adotar uma certa criança. As circunstâncias são variadas. Há quem busque adotar o recém-nascido que encontrou no lixo. Também há esse desejo quando surge um vínculo afetivo entre quem trabalha ou desenvolve serviço voluntário com uma criança abrigada na instituição. Em muitos casos, a própria mãe entrega o filho ao pretenso adotante. Porém, a tendência é não reconhecer o direito de a mãe escolher os pais do seu filho. Aliás, dar um filho à adoção é o maior gesto de amor que existe: sabendo que não poderá criá-lo, renunciar ao filho, para assegurar-lhe uma vida melhor da que pode lhe propiciar, é atitude que só o amor justifica!54 A ideologia da maternidade vivida nos nossos dias e nascida com a sociedade burguesa patriarcal confere a todas as mulheres a faculdade natural de amar sem restrições e de cuidar da criança que concebeu sob quaisquer condições. As que recusam de algum modo este destino biológico e social são consideradas exceções e recebem com frequência rótulos negativos e desqualificantes. Fazem-se assim as vítimas do mito do amor materno.55 E nada, absolutamente nada, deveria impedir a mãe de escolher a quem entregar o seu filho. Às vezes é a patroa, às vezes uma vizinha, em outros casos é um casal de amigos, que têm certa maneira de ver a vida, ou uma retidão de caráter, que a mãe considera serem os pais ideais para o seu filho. Basta lembrar que a lei assegura aos pais o direito de nomear tutor ao filho (CC 1.729). E, se há a possibilidade de eleger quem vai ficar com o filho depois da morte, não se justifica negar o direito de escolha de a quem dar em adoção. Aliás, não se pode olvidar que o encaminhamento de crianças à adoção requer o consentimento dos genitores (ECA 166). Pois nem isso está sendo admitido. Mesmo que a mãe entregue o filho a quem lhe aprouver, o Ministério Público ingressa com pedido de busca e apreensão. O juiz não avalia sequer quem a mãe entregou o filho, para verificar se a situação em que se encontra a criança atende ao seu melhor interesse. Não, imediatamente arranca a criança dos braços que sempre a acalentou e determina sua institucionalização. Lá permanece até findar o processo de destituição do poder familiar, o que frequentemente chega a demorar anos. Só depois a criança é entregue em adoção ao primeiro inscrito da lista que esteja disposto a adotá-la. Como, de modo geral, todos desejam adotar crianças de pouca idade, retirada de quem a quis, acaba sem ninguém que a queira. O STJ tem atentado ao princípio do melhor interesse,56 e inclusive tem aceito o uso de mandado de segurança,57habeas corpus58 e medida cautelar, mesmo antes de admitido recurso especial.59 A sorte é que a jurisprudência vem atentando ao melhor interesse da criança.60 Quando a criança mantém vínculos com a família substituta, sua vontade deve prevalecer.61 E, não havendo risco, deve ser prestigiado o período de convívio, ainda que o guardião não esteja cadastrado à adoção.62 De outro lado, o abandono justifica a destituição do poder familiar, devendo a adoção ser deferida aos guardiões.63 Tendo a mãe procedido a entrega do filho – de forma regular ou irregularmente – ou mesmo a jogado no lixo, posterior arrependimento não autoriza que busque sua restituição. Independente do tempo em que a criança se encontra em poder de quem a acolheu, a constituição da filiação socioafetiva impede que seja retirada dos braços de quem identifica como seus pais. Solução em sentido contrário configura mero apego ao biologismo, que não se justifica, deixando de atentar ao seu melhor interesse para privilegiar o desejo da mãe.64 A Lei da Adoção admite que uma pessoa ou um casal cadastrado para o acolhimento familiar receba crianças mediante guarda (ECA 33 § 2.º). E quem detém a guarda legal de criança maior de três anos ou adolescente pode adotar mesmo que não esteja cadastrado à adoção. Basta a presença de laços de afinidade e afetividade e não exista má- fé (ECA 50 § 13 III). 26.9 Homoparental O tema ainda divide opiniões, mas não existe obstáculo à adoção por homossexuais. As únicas exigências para o deferimento da adoção (ECA 43) são que apresente reais vantagens para o adotado e se fundamente em motivos legítimos. Em um primeiro momento, gays e lésbicas se candidatavam individualmente à adoção, não sendo questionado se mantinham relacionamento homoafetivo. Assim, não era feito o estudo social com o parceiro, o que tornava a habilitação deficiente e incompleta, deixando de atentar aos prevalentes interesses do adotando. O resultado também vinha em prejuízo à criança. Vivendo em família homoafetiva e possuindo vínculo jurídico com somente um do par, restava absolutamente desamparada com relação ao outro, que também considerava pai ou mãe, mas que não tinham os deveres decorrentes do poder familiar. O não estabelecimento de uma vinculaçãoobrigacional gerava a absoluta irresponsabilidade de um dos genitores para com o filho que também era seu. Principalmente depois do reconhecimento, pelo STF, da união estável homoafetiva, a justiça passou a conceder a adoção a casais formados de pessoas do mesmo sexo.65 A partir daí inúmeras decisões passaram a admitir a dupla parentalidade homoafetiva.66 26.10 Filho de “criação” A partir do momento em que foi instituído o princípio da proteção integral, a filiação não pode ser alvo de designações discriminatórias. A palavra filho não admite qualquer adjetivação. A pejorativa complementação “de criação” deve ser abolida. A identidade dos vínculos de filiação divorciou-se das verdades biológica, registral e jurídica. Sustenta Belmiro Welter que quem sempre foi chamado de “filho de criação”, ou seja, aquela criança – normalmente carente – que passa a conviver no seio de uma família, ainda que sabendo da inexistência de vínculo biológico, merece desfrutar de todos os direitos atinentes à filiação.67 Ainda resiste a jurisprudência em admitir a quem foi criado como filho – daí filho “de criação” – que proponha ação declaratória de paternidade afetiva, o que nada mais é do que uma forma de buscar a adoção. 26.11 De nascituro A doutrina mantém aceso o debate sobre adoção antes do nascimento. Essa faculdade estava expressamente consagrada na legislação pretérita (CC/16 372). A Lei da Adoção, apesar de assegurar assistência psicológica à gestante (ECA 8.º § 4.º) e determinar seu encaminhamento a juízo quando manifestar interesse em entregar o filho à adoção (ECA 8.º § 5.º), somente após o seu nascimento pode consentir com a adoção (ECA 166 § 6.º). A manifestação de vontade é colhida pelo juiz em audiência, na presença do Ministério Público (ECA 166 § 3.º). Assim, não há mais como sustentar a possibilidade de adoção antes do nascimento. Às claras configuraria uma adoção intuitu personae. Como diz José Carlos Teixeira Giorgis, o catálogo protetivo dos infantes recomenda um estágio de convivência entre o adotante e o adotado, o que se revela incompatível em relação a um ser enclausurado no corpo feminino; ademais, sendo a sobrevivência do nascituro mera cogitação, a adoção não pode ser atrelada a acontecimento incerto, o que conflitaria com a própria natureza do regime, que aspira a um parentesco definitivo e irrevogável.68 26.12 Lei Nacional da Adoção Na tentativa de agilizar o procedimento de adoção e reduzir o tempo de permanência de crianças e adolescentes em instituições, a chamada de Lei Nacional da Adoção (Lei 12.010/09) não faz jus ao nome, pois só veio dificultar o processo de adoção. De forma injustificável por onze vezes reitera a preferência à família natural.69 Ao dar nova redação a dois artigos do Código Civil (1.618 e 1.619) e revogar os demais artigos do capítulo da adoção, passou exclusivamente o ECA a regular a adoção de crianças e adolescentes. A adoção de maiores resta regrada pelo Código Civil. Também foi modificada a lei que regula a investigação oficiosa da paternidade (L 8.560/92). E, talvez, a medida mais salutar trazida pela lei foi eliminar os prazos diferenciados da licença-maternidade, a depender da idade do adotado. Muitas das mudanças são mera troca de palavras: o que era chamado de abrigo passou a ser chamado de acolhimento institucional (ECA 90 IV). Foi priorizado o acolhimento familiar, nada mais do que pessoas que se habilitam, mediante pagamento, para temporariamente permanecerem com crianças. A permanência nas famílias acolhedoras não pode ser superior a dois anos, sendo que a criança não pode ser adotada por quem a acolheu. Claro que o resultado é perverso. A criança acumula mais uma perda ao ter que retornar ao abrigo depois deste prazo. Talvez esta seja uma solução para os adolescentes tidos por “inadotáveis”, só que não poderia haver prazo, devendo permanecer com quem os acolheu mesmo após completar a maioridade. Da mesma insensibilidade padece o Programa de Apadrinhamento Afetivo, que são criados em âmbito municipal ou por entidades não governamentais. O requisito para alguém se candidatar a apadrinhar uma criança, para com ela permanecer nos finais de semana, é não estar inscrito para adoção. Ou seja, o padrinho não pode adotar o seu afilhado, mesmo que entre eles tenha se formado um elo de afetividade. A família de origem adquiriu o nome de família natural e foi trazido o conceito de família extensa ou ampliada (ECA 25 parágrafo único): é a que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade. Deste modo cabe somente buscar parentes que a criança gosta e revele o desejo de ir residir com ela. Não há qualquer justificativa para ir à busca de parentes longínquos que a criança nunca viu e com os quais jamais conviveu. E, quanto aos recém-nascidos, não se pode olvidar que não têm vínculo de convívio e de afeto com ninguém.70 Mesmo indo de encontro ao desejo da mãe – que quer entregar o filho à adoção e não a algum parente – parte o Estado à caça de algum membro da família, insistindo para que acolham a criança, ainda que tal situação gere para lá de precária. Afinal, fica sob a guarda ou da avó ou de algum parente, o que não lhe garante qualquer segurança jurídica. O “guardado” não adquire nenhum direito, quer a alimentos, quer à herança do “guardador”. Mas a lei tem méritos. Assegura ao adotado o direito de conhecer sua origem biológica e ter acesso ao processo de adoção (ECA 48). Garante aos pais o direito de visitas e a mantença do dever de prestar alimentos aos filhos quando colocados sob a guarda de terceiros (ECA 33 § 4.º). Há mais. Os grupos de irmãos devem ser colocados sob adoção, tutela ou guarda na mesma família substituta (ECA 28 § 4.º). É preferente a colocação de crianças indígenas ou provenientes de quilombo junto à sua comunidade ou membro da mesma etnia (ECA 28 § 6.º II), devendo ser ouvido o órgão federal responsável e antropólogos (ECA 28 § 6.º III). É imposto aos dirigentes das entidades que desenvolvem programas de acolhimento familiar ou institucional que, a cada seis meses, encaminhem a juízo relatório (ECA 92 § 2.º), elaborado por equipe interprofissional ou interdisciplinar, para a reavaliação judicial das crianças e adolescentes em programas de acolhimento (ECA 19 § 1.º). No entanto, não há a mínima chance de se tornar efetiva a limitação da permanência institucional em dois anos (ECA 19 § 2.º). Às claras que não há como o juiz reconhecer que atende ao melhor interesse da criança a necessidade de permanecer institucionalizada por prazo superior. A justificativa será apenas uma: não há onde colocá-las. O fato é que a adoção transformou-se em medida excepcional, à qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da criança e do adolescente na família natural ou extensa. Assim, a chamada Lei da Adoção não conseguiu alcançar os seus propósitos. Em vez de agilizar a adoção, acabou por impor mais entraves para sua concessão. 26.13 Cadastros Determina o ECA que cada comarca ou foro regional mantenha um duplo registro: um de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de candidatos à adoção (ECA 50). A inscrição nos cadastros deve ocorrer em 48 horas (ECA 50 § 8.º), sendo que sua alimentação e a convocação dos candidatos são fiscalizados pelo Ministério Público (ECA 50 § 12). Além das listagens locais, existem os cadastros estaduais e um cadastro nacional (ECA 50 § 5.º). O Conselho Nacional de Justiça regulamentou a implantação e o funcionamento do Cadastro Nacional de Adoção de Crianças e Adolescentes.71 Com isso, há a possibilidade de uma criança de um Estado ser adotada por alguém do outro extremo. Também há a previsão de cadastros de candidatos residentes fora do País (ECA 50 §6.º). O CNJ também regulamentou a inclusão dos pretendentes estrangeiros e de brasileiros residentes no exterior.72 A adoção é condiciona ao prévio cadastro dos candidatos, mas a lei admite exceções (ECA 50 § 13): I – a adoção unilateral; II – formulada por parente com o qual a criança ou adolescente mantenha vínculos de afinidade e afetividade; III – se o pedido é formulado por quem detém a tutela ou guarda legal de criança maior de três anos ou adolescente, desde que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação de laços de afinidade e afetividade, e não seja constatada a ocorrência de má-fé. Também é indispensável que fique comprovado que a solução é a que melhor atende ao interesse do adotando (ECA 197-E § 1.º). Em qualquer dessas hipóteses, o candidato deve comprovar, no curso do procedimento, que preenche os requisitos necessários à adoção (ECA 50 § 14). Outra possibilidade de ocorrer a adoção sem a prévia inscrição nos cadastros é por meio da colocação em família substituta (ECA 166). Basta os pais concordarem com o pedido, que pode ser formulado diretamente em cartório e sem a assistência de advogado. Só precisaram ser ouvidos judicialmente (ECA 166 § 1.º). Ainda que haja a determinação de que sejam elaboradas as listas, deve-se atentar ao direito da criança de ser adotada por quem já lhe dedica carinho diferenciado, em vez de priorizar os adultos pelo só fato de estarem incluídos no registro de adoção. Não sendo a pretensão contrária ao interesse da criança, injustificável negar a adoção por ausência de prévia inscrição dos interessados. Principalmente quando a criança de há muito convive com quem reconhece como seus pais. A finalidade das listas é agilizar o processo de adoção, organizar os pretendentes à adoção, facilitar a concessão da medida, e não para obstaculizá-la. Estabelecido vínculo afetivo com a criança, é perverso negar o pedido e entregá-la ao primeiro inscrito. Tal postura desatende aos interesses prioritários de quem goza da especial proteção constitucional. A enorme burocracia que cerca a adoção faz com que as crianças se tornem “inadotáveis”, palavra feia, quase um palavrão, que significa crianças que ninguém quer, seja porque já não são bebês, seja porque não são brancas, não são perfeitas. Pelo jeito ninguém lembra o porquê de as crianças lá estarem: ou foram abandonadas, ou os pais foram destituídos do poder familiar por maus-tratos ou por abuso sexual. Nessa última hipótese, aliás, é bem mais difícil que sejam adotadas. Portanto, o que era para ser simples mecanismo, singelo instrumento agilizador de um procedimento, transformou-se em fim em si mesmo. Em vez de meio libertário, passou a ser um fator inibitório e limitativo da adoção. Com isso, olvida-se tudo que vem sendo construído pela doutrina e já é aceito pela jurisprudência, quando se fala em vínculos familiares. Filiação socioafetiva, “adoção à brasileira”, posse do estado de filho são novos institutos construídos pela sensibilidade da justiça, que têm origem no elo afetivo e levam ao reconhecimento do vínculo jurídico da filiação. É de tal ordem a relevância que se empresta ao afeto que se pode dizer que a filiação se define não pela verdade biológica, nem pela verdade legal ou pela verdade jurídica, mas pela verdade do coração. Quando se trilha o caminho que busca enlaçar no próprio conceito de família o afeto, desprezá-lo afronta não só a norma constitucional que consagra o princípio da proteção integral, mas também o princípio maior que serve de fundamento ao Estado Democrático de Direito: o respeito à dignidade de crianças e adolescentes. Assim, independentemente da ocorrência de eventual vício de consentimento com relação à mãe biológica, comprovada a boa-fé dos adotantes, há que se preservar o interesse do adotando.73 26.14 Procedimentos para a adoção A adoção de crianças e adolescentes (ECA 47), bem como de maiores de 18 anos de idade (CC 1.619), só pode ocorrer mediante intervenção judicial – tanto o procedimento para a habilitação à adoção como a ação de adoção. É garantida a tramitação prioritária dos processos, sob pena de responsabilidade (ECA 152 parágrafo único). Tanto a ação de perda como de suspensão do poder familiar precisam estar concluídas no prazo máximo de 120 dias (ECA 163). Assim também a ação de adoção, sob pena de investigação disciplinar, conforme determinação do CNJ.74 A sentença é averbada, mediante mandado judicial, no registro civil, sem qualquer referência à origem do ato (LRP 102 3.º). É tal o interesse em que a natureza do vínculo não seja revelada que da inscrição no registro de nascimento do adotado não deve constar nenhuma observação, sendo vedado o fornecimento de certidão (ECA 47). Sustenta Belmiro Welter – não sem razão – a inconstitucionalidade do tortuoso, moroso e desacreditado processo de adoção judicial.75 Preconiza ele a dispensabilidade do cumprimento de todos os requisitos legais (ECA 39 a 52-D), sob o fundamento de que o reconhecimento do filho afetivo é consensual e voluntário. Argumenta, ainda, ser inútil a via judicial, principalmente se já houve a prévia destituição do poder familiar. 26.14.1 Habilitação O procedimento para a habilitação à adoção é de jurisdição voluntária. A competência é da Vara da Infância e da Juventude, onde deve o candidato à adoção comparecer. Não é necessário estar acompanhado por advogado. Se os candidatos forem casados ou viverem em união estável, hétero ou homoafetiva, deve o casal comparecer ao cartório. Mesmo que o candidato seja casado ou viva em união estável, a habilitação pode ser levada a efeito por somente um do par. Mas o cônjuge ou companheiro deve manifestar sua concordância. Com a petição inicial é necessária a apresentação de uma série de documentos: comprovante de renda e de domicílio; atestado de sanidade física e mental; certidão de antecedentes criminais e negativa de distribuição cível (ECA 197-A). Na oportunidade os candidatos devem indicar o perfil de quem aceita adotar. O Ministério Público pode requerer a designação de audiência para a ouvida dos postulantes e de testemunhas (ECA 197-B II). A inscrição dos candidatos está condicionada a um período de preparação psicossocial e jurídica (ECA 50 § 3.º), mediante frequência obrigatória a programa de preparação psicológica, orientação e estímulo à adoção interracial, de crianças maiores ou de adolescentes, com necessidades específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de irmãos (ECA 197-C § 1.º). Há uma exigência particularmente perversa: incentivar, de forma obrigatória, o contato dos candidatos com crianças e adolescentes que se encontram institucionalizados e em condições de serem adotados (ECA 50 § 4.º). Além de expô-los à visitação, pode gerar neles, e em quem as quer adotar, falsas expectativas. Afinal, a visita é tão só para candidatar-se à adoção. Deferida a habilitação, o postulante é inscrito nos cadastros (ECA 50), cuja ordem cronológica é obedecida quase cegamente (ECA 197- E § 1.º). 26.14.2 Ação de adoção A adoção de determinada pessoa, quer de uma criança, um adolescente ou uma pessoa maior de idade, depende da propositura de uma ação. É vedada a adoção por procuração (ECA 39 § 2.º), sendo necessária a participação do Ministério Público, por ser ação de estado (CPC 82 II). A competência para a ação de adoção de maiores é das varas de família e, em se tratando de crianças e adolescentes, é das varas da infância e da juventude (ECA 148 III). A fixação da competência deve atender ao princípio do juízo imediato, ou seja, do juízo onde se encontra o adotando, critério que melhor atende aos objetivos do ECA para a outorga de uma prestação jurisdicional mais célere e eficaz. A ação de adoção deve tramitar, tanto na primeira instância como nos Tribunais, com prioridade absoluta identificada com tarja apropriada na capa. Quando o adotado for criançaou adolescente com deficiência ou doença crônica, a prioridade precisa ser ainda maior (L 12.955/14). Deve o juiz determinar a realização de estudo social e, se possível, perícia por equipe interdisciplinar. Provimento do CNJ determina uma série de medidas a serem adotadas pelos Tribunais de Justiça, como a instalação de varas com competência absoluta em matéria de infância e juventude, composta de equipes técnicas, bem como a realização de audiências concentradas.76 É necessário o estágio de convivência (ECA 46), havendo a possibilidade de o juiz dispensá-lo quando o adotando já estiver sob tutela ou guarda por tempo suficiente para se avaliar a conveniência da constituição do vínculo (ECA 46 § 1.º). A guarda de fato não autoriza a dispensa do estágio (ECA 46 § 2.º), que precisa ser acompanhado por equipe interprofissional, preferencialmente com apoio de técnicos responsáveis pela execução da política de garantia do direito à convivência familiar, os quais deverão apresentar relatório minucioso (ECA 46 § 4.º). Quando o adotando contar com mais de 12 anos, é indispensável colher sua manifestação de vontade (ECA 28 § 2.º). Antes dessa idade, deve ser ouvido por equipe interprofissional e, sempre que possível, a sua opinião ser devidamente considerada (ECA 28 § 1.º). Para resguardar o melhor interesse da criança, que tem direito de se manifestar, é importante sua ouvida, independentemente de sua idade, do domínio da linguagem falada e de seu grau de maturidade.77 Mas sua escuta não deve ser realizada pelo juiz, sendo recomendável o desempenho da tarefa por profissional com preparo especializado, da área da psicologia ou do serviço social.78 Na hipótese de os autores se separarem depois de iniciada a ação, como a adoção pode ser concedida aos divorciados e aos ex- companheiros, devem ambos prosseguir com a ação. Caso um deles desista da adoção, nada impede que a demanda continue, com a concessão da adoção somente a favor de um dos pretendentes. A adoção é estabelecida por sentença judicial, que dispõe de eficácia constitutiva e produz efeitos a partir de seu trânsito em julgado. Há uma exceção a essa regra: quando ocorrer o falecimento do adotante no curso do processo de adoção, a sentença dispõe de efeito retroativo à data do óbito (ECA 47 § 7.º), desde que já tenha havido inequívoca manifestação de vontade (ECA 42 § 6.º). Provimento do CNJ determina investigação disciplinar pela Corregedoria Geral da Justiça do magistrado sempre que tiver, sob sua condução, ação de adoção há mais de 12 meses.79 26.14.3 Recursos A sentença que defere a adoção tem eficácia imediata e o eventual recurso não dispõe de efeito suspensivo. A exceção fica por conta da adoção internacional e de eventual risco ao adotado (ECA 199-A). Também não dispõe de efeito suspensivo a sentença que destitui um ou ambos os pais do poder familiar (ECA 199-B). Em todos os procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude, o sistema recursal é o do CPC.80 Os recursos independem de preparo (ECA 198 I). O prazo para o Ministério Público e para defesa é sempre de 10 dias, salvo nos embargos de declaração (ECA 198 II). É assegurado juízo de retratação pelo juiz, devendo a remessa ao órgão recursal ser feita por decisão fundamentada, no prazo de cinco dias (ECA 198 VII).81 O recurso tem prioridade absoluta e o julgamento deve ocorrer em 60 dias (ECA 199-D), sob pena de investigação disciplinar.82 Para isso é dispensada a revisão e a publicação da pauta de julgamento (ECA 199-C), sendo admitido parecer oral do Ministério Público (ECA 199-D parágrafo único). 26.15 Manifestação de vontade da genitora A gestante ou a mãe que deseje entregar os filhos à adoção tem direito a assistência psicológica no período pré e pós-natal (ECA 8.º § 5.º). Precisa ser encaminhada à Justiça da Infância e da Juventude (ECA 13 parágrafo único). O consentimento para a adoção deve ser precedido de esclarecimento prestado por equipe interprofissional, em especial, sobre a irrevogabilidade da medida (ECA 166 § 2.º). O consentimento é colhido em audiência pelo juiz, com a presença do Ministério Público, e isso depois de esgotados os esforços para a manutenção do filho junto à família natural ou extensa (ECA 166 § 3.º). O consentimento prestado por escrito precisa ser ratificado em audiência (ECA 166 § 4.º) e não pode ocorrer antes do nascimento do filho (ECA 166 § 6.º). Apesar de os efeitos da adoção só terem início a partir do trânsito em julgado da sentença (ECA 199-A), até a data da sua publicação o consentimento é retratável (ECA 166 § 5.º). Tal possibilidade, na contramão do bom-senso, permite que a mãe biológica, depois de ter manifestado o consentimento em audiência, perante a autoridade judiciária e o Ministério Público, e depois de ser ouvida por equipe técnica, sendo devidamente esclarecida sobre as consequências de sua manifestação, simplesmente se arrependa.83 A simples discordância dos pais biológicos, porém, não pode levar ao desacolhimento do pedido de adoção.84 Deve-se atentar ao melhor interesse do adotando, sob pena de a possibilidade de revogação do consentimento, por parte dos genitores, gerar insegurança tanto aos pretendentes à adoção como ao adotado, até porque, muitas vezes, este já se encontra na guarda dos candidatos à adoção.85 Eventual arrependimento posterior à sentença é ineficaz, eis que a sentença é constitutiva da adoção. 26.16 Destituição do poder familiar Como a adoção assegura todos os direitos decorrentes da filiação, seu deferimento leva à destituição do poder familiar dos pais biológicos. Não havendo a concordância dos genitores com a adoção, a tendência sempre foi exigir prévia demanda desconstitutiva. Em um primeiro momento, exigia-se primeiro a propositura da ação autônoma de extinção do poder familiar, extinguindo-se a ação de adoção por impossibilidade jurídica do pedido (CPC 267 VI). Depois a jurisprudência passou a admitir a cumulação das demandas de destituição e de adoção. Agora, como a concessão da adoção implica, necessariamente, na perda do poder familiar (CC 1.635 IV e ECA 41), mesmo havendo ausência de expresso pedido de destituição, considera-se implícito. Assim, a destituição do poder familiar passou a ser reconhecida como efeito reflexo da sentença concessiva da adoção. A única exigência é a citação dos genitores como litisconsortes necessários. 26.17 Erros e equívocos Claro que ninguém questiona que o ideal é crianças e adolescentes crescerem junto a quem os trouxe ao mundo. Mas é chegada a hora de acabar com a visão romanticamente idealizada da família. O filho não é uma “coisa”, um objeto de propriedade da família biológica. Quando a convivência com a família natural se revela impossível ou é desaconselhável, melhor atende ao interesse de quem a família não deseja, ou não pode ter consigo, ser entregue aos cuidados de quem sonha reconhecê-lo como filho. A celeridade deste processo é o que garante a convivência familiar, direito constitucionalmente preservado com absoluta prioridade (CF 227). Para esse fim – e infelizmente – não se presta a legislação e nem todos os esforços do Conselho Federal de Justiça, que nada mais fazem do que burocratizar e emperrar o direito à adoção de quem teve a desdita de não ser acolhido no seio de sua família biológica. É tal a burocracia para disponibilizar crianças à adoção que, quando finalmente isso acontece, muitas vezes ninguém mais as quer. Os candidatos a adotá-las perderam a chance de compartilhar da primeira infância do filho que esperaram durante anos na fila da adoção. É tão perverso o cerco para impedir o acesso a crianças abrigadas que os adotantes não são sequer admitidos para realizar trabalho voluntário. São impostos enormes e intransponíveis obstáculos para que a mãe não abra mão daquela criança que gestou sem a querer. Os genitores além de receberem de equipe interprofissionalorientações e esclarecimentos sobre a irrevogabilidade da adoção, o juiz e o promotor devem esgotar os esforços para manutenção da criança com os pais ou com a família natural ou extensa. No entanto, há que prevalecer o melhor interesse da criança, conforme enunciado do IBDFAM.86 Seguindo a peregrinação, é dada preferência à família extensa ou ampliada: parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade. (ECA, 25 parágrafo único). Só após incessantes e infrutíferas tentativas é que tem início o demorado processo de destituição do poder familiar.87 Mais um laudo psicossocial é realizado, na tentativa de manter o filho com a mãe. Inclusive a Defensoria Pública é orientada a recorrer sempre, até quando os genitores foram citados por edital.88 Superadas todas estas etapas é que, finalmente, a criança é incluída no cadastro nacional, a ser confrontado com o cadastro dos adotantes. Parte-se então à busca de um adotante, o qual para se candidatar à adoção, precisa submeter-se a um verdadeiro “rali”, que chega a durar mais de ano. Depois o candidato é inscrito no cadastro, aguardando anos até ser convocado. Ainda assim os candidatos não tem chance de conhecer, sequer ver uma foto ou um vídeo das crianças que podem adotar. A escolha é feita pelos técnicos e acaba acontecendo o que se chama de um encontro às escuras. É necessário disponibilizar foto e vídeo das crianças abrigadas na rede nacional dos candidatos cadastrados à adoção. A exibição de imagens não afronta nenhum direito, pois há um bem maior em jogo que é dar-lhes a chance de ter um lar. Afinal, basta postar a foto de um cãozinho para que alguém o adote. Sem que se esteja comparando crianças a animais, nada justifica que com elas não ocorra o mesmo. Até porque há grande chance de candidatos escolherem crianças que se afastem do perfil que haviam indicado, como grupo de irmãos, crianças maiores, especiais ou não brancas. Também é indispensável assegurar a todos os candidatos à adoção o direito de visitar os estabelecimentos em que se encontram abrigadas as crianças e adolescente, e isso em qualquer lugar do país. Surgindo o interesse em alguma criança, mesmo que não esteja ela disponível à adoção, pode lhes ser entregue, ainda que como família substituta. Em face dos enormes percalços impostos à adoção, quem deseja ter filhos, em vez de se sujeitar a anos de espera, está fazendo uso das modernas técnicas de reprodução assistida. Esta é a solução que vem sendo encontrada por quem só deseja concretizar o sonho de ter uma família com filhos. Simplesmente está gestando os filhos. Apesar de esta ser uma prática legítima, tem um efeito assustador, pois impede que as crianças tenham a chance de conseguir uma família. Quem sabe perdem a única possibilidade que teriam de sobreviver. Pelo jeito, o Estado tem esquecido do seu dever de cumprir o preceito constitucional de dar proteção especial, com absoluta prioridade, a crianças, adolescentes e jovens. Diante da falta de vontade política para criar estrutura e mecanismos eficientes para agilizar o processo de adoção, juízes e promotores devem ter a coragem que tiveram os magistrados das Varas da Execução Criminal. Diante da precariedade dos presídios e a ausência de instalações adequadas para o cumprimento de determinadas penas, simplesmente vem libertando os presos, concedo-lhes prisão domiciliar. O fato é que, como as coisas estão não podem continuar. Está na hora de mudar esta realidade. É necessário eliminar os berçários dos abrigos, os quais devem se tornar simples casas de passagem e não depósitos permanentes de crianças. 26.18 Declaração da ascendência genética Em consonância com os antecedentes jurisprudenciais, o ECA passou a admitir a possibilidade de o adotado, a partir dos 18 anos, investigar – ou melhor, ver declarada – sua origem biológica, bem como obter acesso irrestrito ao processo de adoção (ECA 48). Por isso, o processo deve ficar arquivado e garantida sua conservação (ECA 47 § 8.º). Antes dessa idade, o adotado precisa receber assistência jurídica e psicológica para promover a busca (ECA 48 parágrafo único). Gerando a adoção vínculo de filiação socioafetiva, a declaração da paternidade biológica, de um modo geral, não surte efeitos registrais, a impedir benefícios de caráter econômico. No entanto, cada vez com maior frequência é reconhecida a multiparentalidade, de modo a se reconhecer o estabelecimento da dupla filiação: a biológica e a adotiva. Assim, foi acolhida a ação de investigação de paternidade intentada pela criança, os pais adotivos e o pai biológico, em face do vínculo afetivo existente entre todos.89 Promovida a adoção pelo tio e a esposa, que criaram a sobrinha desde o nascimento, foi deferida a adoção em nome do casal adotante, permanecendo no registro o nome da mãe biológica.90 Falecida a mãe em virtude de complicação pós-parto, seu irmão e a esposa passaram a criá-la, tendo sido deferida a adoção ao casal sem a exclusão do nome da mãe.91 De qualquer forma, seja para satisfazer mera curiosidade, seja em respeito ao direito de conhecer a origem biológica, ou mesmo para efeitos médicos, é indispensável admitir a declaração da paternidade genética sem desconstituir a filiação gerada pela adoção. 26.19 Benefícios legais No caso de adoção ou guarda judicial de criança, é assegurado salário-maternidade e benefício previdenciário a ser pago pelo INSS, pelo prazo de 120 dias.92 No entanto, o benefício não pode ser concedido a mais de um segurado, como na hipótese de adoção por um casal de mulheres. Somente uma faz jus ao mesmo. Também a adotante e a guardiã fazem jus à licença-maternidade (CLT 392-A) e a sua prorrogação por mais 60 dias, se o empregado aderiu ao Programa Empresa Cidadã (L 11.770/08). Embora os direitos sejam reconhecidos somente à adotante mulher, nada justifica não serem concedidos licença-paternidade e benefícios previdenciários ao adotante. Mais uma vez cabe ao Judiciário decidir, conferindo a licença de seis meses a um homem que havia adotado uma criança.93 Ocorrendo o falecimento da genitora, é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa de quem ficar com a guarda do filho.94 No âmbito da previdência social, em caso de falecimento do segurado que fizer jus ao salário-maternidade, o benefício será pago ao cônjuge ou companheiro sobrevivente.95 Aliás, como existe a possibilidade da adoção por uma única pessoa e também por casais homoafetivos, impositiva a adoção da licença-natalidade, a ser usufruída por ambos os genitores pelo período de 15 dias e depois por qualquer deles, dividindo o tempo do modo como convencionarem.96 O Conselho Superior da Justiça do Trabalho já concedeu licença- adotante a um pai solteiro.97 A Lei da Adoção (art. 8.º), ao revogar os §§ 1.º, 2.º e 3.º do art. 392-A da CLT, acabou com os prazos diversificados da licença, a depender da idade do adotado. A divergência temporal era de flagrante inconstitucionalidade, em razão da evidente discriminação no tratamento dispensado a mães e filhos. Quanto maior a criança, mais difícil a adaptação ao novo lar. É fundamental que adotante e adotado disponham de um período para conviver e estreitar laços de afinidade. Crianças constroem sua estrutura social e emocional a partir da identificação com as pessoas que preenchem suas necessidades de alimentação, proteção, higiene, aconchego, entre outras, sendo que as necessidades psicológicas, quase sempre, suplantam as necessidades de ordem material.98 26.20 Parto anônimo Ainda que o planejamento familiar seja assegurado constitucionalmente e existam – ou deveriam existir – políticas públicas que garantam acesso aos meios contraceptivos, o fato é que a gravidez precoce ou indesejada é uma realidade. A solução é o aborto. Como ainda é prática considerada criminosa, a interrupção da gestação é realizada deforma clandestina, o que coloca a vida da mãe em risco. Outra forma de livrar-se do filho não planejado é abandoná-lo, quando do nascimento, em qualquer lugar. Assim, com uma frequência assustadora, recém-nascidos são encontrados em lixões, rios e praças públicas. Na maioria das vezes, já mortos. Só ganham o noticiário quando são achados com vida. Uma saída: o parto anônimo. A expressão é recente, mas tem origem em uma prática da Idade Média, historicamente chamada de “roda dos expostos” ou “roda dos enjeitados”. O nome identifica os artefatos que eram colocados nas portas ou janelas dos hospitais, casas de misericórdia ou orfanatos, onde eram depositados os recém- nascidos. Acionado o mecanismo giratório, as crianças chegavam ao interior do estabelecimento. Curiosamente, como lembra Fabíola Albuquerque, a roda dos expostos apresentou-se como a primeira iniciativa pública de atendimento à criança, vez que histórias de abandono, desde os mais longínquos tempos, sempre fizeram parte da realidade social mundial.99 Esta prática existe em vários países. Há hospitais que dispõem de espaços externos que permitem que crianças lá sejam colocadas em anonimato. Tal, no entanto, não afronta o direito de conhecer a ascendência genética, uma vez que seus dados ficam registrados na maternidade. Dita possibilidade sempre foi alvo de muitas críticas. Há quem a considere uma solução simplista e ingênua, inadequada e anacrônica sob o ponto de vista psicológico, para uma questão complexa como o abandono materno e paterno.100 No entanto, como refere Rodrigo da Cunha Pereira, a lei não resolveria a questão do abandono. Não. Claro que não. Mas, certamente, poderia diminuir as formas trágicas do abandono.101 A tentativa de diminuir a clandestinidade dos abortos e evitar o abandono de bebês levou o IBDFAM a apresentar projeto de lei para instituir o parto anônimo. Mas o tema gerou tanta polêmica que foi arquivado. Leitura complementar ALBUQUERQUE, Fabíola Santos. O instituto do parto anônimo no direito brasileiro. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (coord.). Família e solidariedade: teoria e prática do direito de família. Rio de Janeiro: IBDFAM/Lumen Juris, 2008. p. 139-155. BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção: do abandono à garantia do direito à convivência familiar e comunitária. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. CAMARADELLA, Mylena Rios; PÁDUA, Vanessa de. Aspectos jurídicos do parto anônimo. Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões. Belo Horizonte: IBDFAM, 2014, v. 6. nov./dez. p. 87-110. DIUANA, Solange; LADVOCAT, Cynthia. Guia de adoção: no jurídico, no social, no psicológico e na família. São Paulo: Roca, 2014. MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade. A verdade biológica e a verdade adotiva: a construção da identidade plena do filho adotado. Revista Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões, Porto Alegre, Magister; Belo Horizonte, IBDFAM, n. 30, p. 35-66, out.-nov. 2012. SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2011. 1. Tânia da Silva Pereira, Da adoção, 158. 2. Alice de Souza Birchal, A relação processual dos avós no direito de família:…, 41. 3. Waldyr Grisard Filho, Será verdadeiramente plena a adoção unilateral?, 39. 4. Luiz Edson Fachin, Elementos críticos…, 219. 5. Zeno Veloso, Direito brasileiro da filiação e da paternidade, 160. 6. José Fernando Simão, Afetividade e responsabilidade, 37. 7. Maria Claudia Crespo Brauner e Maria Regina Fay de Azambuja, A releitura da adoção…, 31. 8. Tânia da Silva Pereira, Da adoção, 152. 9. João Baptista Villela, Desbiologização da paternidade, 404. 10. Paulo Lôbo, Código Civil comentado…, 144. 11. Idem, 143. 12. Waldyr Grisard Filho, Será verdadeiramente plena a adoção unilateral?, 39. 13. Idem, 173. 14. Heloisa Helena Barboza, Direito à identidade genética, 283. 15. Paulo Lôbo, Código Civil comentado…, 32. 16. Ação civil pública. Adoção. Não concluída. Devolução do menor. Doença hereditária. Liminar. Existência de vínculo familiar. Presença do fumus boni iuris e do periculum in mora. Recurso provido. Não há dúvidas que a convivência pelo período de mais de dois anos entre o menor e os agravados resultou em um vínculo familiar com o menor, interrompido apenas em decorrência do fato de este apresentar uma doença hereditária no sistema nervoso central. Contudo, não se pode desconhecer que se manteve o vínculo socioafetivo, de modo que, embora não tenham os agravados vínculo de consanguinidade com o menor, têm a obrigação de arcar com os alimentos provisionais, que lhe são devidos. (TJMG, 1.0481.12.000289-6/001, 2.ª C. Cív., Rel. Des. Hilda Teixeira da Costa, p. 31/10/2012). 17. Ação civil pública. Indenização. Danos morais e materiais. Adoção. Devolução do menor. Responsabilidade civil dos pais adotivos configurada. Tendo os pais adotivos abandonado o menor, devolvendo-o ao abrigo, não tendo demonstrado sequer um mínimo de esforço para reaproximarem da criança, patente o dever de indenizar, não só porque o filho foi privado do convívio de seus pais mas, primordialmente, de sua irmã de sangue de quem sente muita saudade. Negligenciando os requeridos na criação e educação do adotado, mormente, por terem ciência de que a adoção somente foi concedida, para possibilitar o convívio dos irmãos, ferindo, assim, o princípio constitucionalmente assegurado, da dignidade da pessoa humana, cabe-lhes indenizar a criança pelos danos sofridos. (TJMG, AC 1.0702.09.568648-2/002, 8.ª C. Cív., Rel. Des. Teresa Cristina da Cunha Peixoto, j. 10/11/2011).. 18 Ação de dissolução do vínculo da escritura pública de adoção. Peculiaridades do caso. Ausência do vínculo afetivo. Relevância. Ato formal. Inexistência de prejuízo. 1. A adoção objetiva a completa integração do adotado na família do adotante. 2. O retorno do adotado ao convívio da família biológica, em menos de um mês do ato de adoção, impede a formação de qualquer vínculo social ou afetivo com a adotante. 3. Sendo a adoção apenas um ato artificial e formal, a mesma não deve subsistir. 4. Recurso provido. (TJPR, AC 19020002184, 2.ª C. Cív., Rel. Des. Samuel Meira Brasil Junior, j. 03/09/2007). 19. Tânia da Silva Pereira reconhece a possibilidade de os pais biológicos resgatarem a relação familiar como família substituta, estritamente através de guarda ou tutela, mas jamais adotá-lo, por se tratar de ascendentes biológicos, o que é vedado pelo § 1.º do art. 42 do ECA (Da adoção, 167). 20. Recurso especial. Ação de adoção c/c destituição do poder familiar movida pelos ascendentes que já exerciam a paternidade socioafetiva. Sentença e acórdão estadual pela procedência do pedido. Mãe biológica adotada aos oito anos de idade grávida do adotando. […] Prevalência dos princípios da proteção integral e da garantia do melhor interesse do menor. Art. 6.º do ECA. Incidência. Interpretação da norma feita pelo juiz no caso concreto. Possibilidade. Adoção mantida. Recurso improvido. […] 2. As estruturas familiares estão em constante mutação e para se lidar com elas não bastam somente as Leis. É necessário buscar subsídios em diversas áreas, levando-se em conta aspectos individuais de cada situação e os direitos de 3.ª geração. 3. Pais que adotaram uma criança de oito anos de idade, já grávida, em razão de abuso sexual sofrido e, por sua tenríssima idade de mãe, passaram a exercer a paternidade socioafetiva de fato do filho dela, nascido quando contava apenas 9 anos de idade. 4. A vedação da adoção de descendente por ascendente, prevista no art. 42, § 1.º, do ECA, visou evitar que o instituto fosse indevidamente utilizado com intuitos meramente patrimoniais ou assistenciais, bem como buscou proteger o adotando em relação a eventual “confusão mental e patrimonial” decorrente da “transformação” dos avós em pais. 5. Realidade diversa do quadro dos autos, porque os avós sempre
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