Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
© Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Hermenêutica Jurídica Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni Tomo II Espécies de Interpretação Jurídica. O Problema da Ciência do Direito. O Jusnaturalismo. FAESB / Curso de Direito. © 2016 1. ESPÉCIES DE INTERPRETAÇÃO JURÍDICA. A interpretação consiste em empregar as regras que a hermenêutica investiga e ordena para a compreensão dos textos legais. É ao direito que a lei entende que se destinam a hermenêutica e a interpretação, com a finalidade de alcançar aquilo que o legislador nem sempre manifesta com clareza e segurança necessárias no texto da lei. Há única limitação encontrada é que não se deve exagerar na interpretação da lei, cujas determinações legais são aparentemente claras. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB A interpretação jurídica pode ser classificada segundo estes critérios: agente (ou origem), natureza e extensão (ou resultados). (1) Agente (ou origem): é a interpretação feita com base no órgão prolator do entendimento da lei. (2) Natureza (ou método de interpretação): tem como fundamento os diversos tipos de elementos contidos no texto das leis, servindo como ponto de partida para seu entendimento. (3) Extensão (ou resultados): fixa o alcance da lei, segundo o seu interprete, a qual pode ter um maior ou menor alcance em relação ao texto original. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 2. CLASSIFICAÇÃO DA ESPÉCIE QUANTO AO AGENTE (OU ORIGEM). Em relação ao agente (ou origem), a interpretação pode ser pública ou privada. A INTERPRETAÇÃO PÚBLICA é aquela proferida pelos Órgãos do Poder Público, ou seja, Judiciário, Legislativo e Executivo, bem como para os entes da Administração Indireta. A INTERPRETAÇÃO PRIVADA é a proferida pelos particulares, podendo ser juristas ou não, mas sempre devem possuir capacidade técnica sobre a matéria, encontradas e pareceres, que analisam o texto legal, a luz dos princípios do direito e da realidade social. 2.1. Divisão da Interpretação Pública. A Interpretação Pública é dividida pela doutrina em duas subespécies: autêntica, judicial e administrativa. 2.1.1. Interpretação Autêntica: é a que emana do próprio poder que produziu o ato normativo cujo sentido e alcance está forma de interpretação declara. O regulamento pode esclarecer o sentido da lei e completá-lo, através de outro ato normativo. Miguel Reale entende que a interpretação autêntica é somente aquela que se opera por meio de outro ato normativo. Vejamos o seguinte exemplo: Art. 150, § 4º e § 5º do Código Penal, onde o próprio legislador procurou estabelecer os contornos da palavra “casa”: “Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências § 4º - A expressão "casa" compreende: I - qualquer compartimento habitado; II - aposento ocupado de habitação coletiva; III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade. § 5º - Não se compreendem na expressão "casa": I - hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto aberta, salvo a restrição do n.º II do parágrafo anterior; II - taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero. 2.1.2. Interpretação Autêntica: é a interpretação realidade pelo Poder Judiciário, através das decisões prolatadas pela Justiça, seja a realizada pelos magistrados - e outros operadores do Direito - por exemplo, ao sentenciar. Também está relacionada a sentenças, acórdãos, súmulas - vinculantes ou não - dos Tribunais (interpretação judicial imparcial), entre outros (decisões interlocutórias). Já a acusação e defesa realizam um interpretação judicial parcial. As decisões judiciais tem força obrigatória entre as partes que participaram do processo, pois é uma decisão isolada. Já as decisões dos tribunais, dependendo do assunto, podem ter efeitos gerais, aplicando-se a casos iguais, chamados de efeitos vinculantes. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Supremo Tribunal Federal (STF) Súmula Vinculante 05: A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição. Superior Tribunal de Justiça (STJ): Súmula 548: Incumbe ao credor a exclusão do registro da dívida em nome do devedor no cadastro de inadimplentes no prazo de cinco dias úteis, a partir do integral e efetivo pagamento do débito. 2.1.3. Interpretação Administrativa: é aquela cuja fonte elaboradora é a própria Administração Pública e suas Autarquias e Empresas Públicas, através de seus órgãos e mediante pareceres, despachos, decisões, circulares, portarias, instruções, dentre outras. A interpretação administrativa, por sua vez se divide em: 2.1.3.1. Interpretação Regulamentar: é a que se destina a traçar as normas gerais (decretos e portarias), em relação a certos atos das leis ordinárias. 2.1.3.2. Interpretação Casuística: é a que orienta o sentido de esclarecer dúvidas, de caráter regulamentar ou não, que surgem quando da aplicação das normas administrativas aos casos concretos. 2.1.4. Interpretação Usual: é a que nasce com o direito consuetudinário, pois o uso dos costumes é uma forma de aplicação do direito pela interpretação dos fatos cotidianos. 2.2. Da Interpretação Privada. 2.2.1. Interpretação Doutrinária (Doutrinal): vem a ser a realizada cientificamente pelos doutrinadores e juristas e expressas em obras, pareceres, entre outros. Há livros especializados de Direito, que comentam artigo por artigo de uma lei, código ou consolidação, oferecendo sentido (ou sentidos) do texto comentado, com base em critérios científicos. 3. QUANTO A NATUREZA (OU MÉTODO DE INTERPRETAÇÃO): A interpretação quanto a natureza se divide em: gramatical (ou literal), lógica, histórica e sistemática. 3.1. Interpretação Gramatical (ou Literal): pauta-se no exame do significado e alcance de cada uma das palavras da norma jurídica; ela se baseia na letra da norma jurídica. Tem como contribuição a melhoria das normas. Hoje, para que seja plenamente aceita, deve ser feita com as outras formas e espécies de interpretação. 3.2. Interpretação Lógica: é a que investiga o sentido das diversas locuções e orações do texto legal e a conexão entre os mesmo. Está relacionada com a evolução da ciência jurídica, onde se passa a adotar o preceito de direito: “conhecer as leis não é compreender as suas palavras, mas o seu alcance e a sua força”. É fundamental para a descoberta do exato mandamento que o legislador prescreveu ao estabelecer o texto da lei. Lógica e Interpretação: - Lógica: Ciência da razão. - Razão: faculdade de conceber, julgar e raciocinar. - Lógica Jurídica: Ciência da razão jurídica, investigada a partir da conexão dos elementos constitutivos da linguagem e discurso jurídicos (conceitos jurídicos; juízos e proposições jurídicos; raciocínios e argumentos jurídicos. Conceber é a capacidade que dispomos de representar intelectualmente os objetos de conhecimento sob a forma de conceitos. O conceito, definido por David Hume como “imagem apagada”, é o resultado desta primeira operação da razão ou inteligência. Os conceitos (ou idéias) são pensamentos incompletos destinados a constituírem a matéria dos juízos. A expressão verbal (ou sinal) da idéia denomina-se termo, que em Lógica não se confunde com a palavra (sinais convencionais, e não naturais) pois o termo pode ter muitas palavras Os conceitos são os átomos do sistema jurídico. “Alguns autores consideram a Lógica do Direito como teoria da dedução jurídica e atribuem importância secundária à proposição e ao conceito jurídico.Mas, na base do sistema jurídico encontram- se nos ‘conceitos’ que são as unidades elementares ou átomos do sistema. Eles são a primeira operação do pensamento". Eduardo Garcia Maynez. Do ponto de vista lógico, todo "sistema científico" é um conjunto de "raciocínios" ou "argumentos" (na acepção de expressão verbal dos raciocínios). O raciocínio é um conjunto de "juízos". E o juízo é uma reunião de "conceitos" ou "termos" (expressões verbais dos conceitos). Exemplo: enquanto sistema, a geometria é um conjunto ordenado de raciocínios como o seguinte: A soma dos ângulos traçados sobre um ponto numa linha reta é igual a 180 graus. Ora, a soma dos ângulos internos de um triângulo é igual à soma dos ângulos traçados sobre um ponto numa linha reta. Logo, a soma dos ângulos internos de um triângulo é igual a 180 graus. Esse raciocínio é constituído de três "proposições", como "A soma dos ângulos traçados sobre um ponto numa linha reta é igual a 180 graus". E cada proposição é constituída de "termos" como "ângulo", "triângulo", "linha reta" etc. Na base de qualquer sistema científico, encontramos os "conceitos", que, reiteremos, constituem as unidades elementares ou átomos do sistema. Paralelamente aos conceitos em geral, os "conceitos jurídicos" podem ser caracterizados como representações intelectuais de objetos pertencentes ao campo do direito, sejam eles relações jurídicas, bens, pessoas, instituições, etc. "Capacidade civil", "reclusão", "empregado", "imposto de renda", "embargos de terceiros", "aposentadoria por tempo de serviço", "sujeito de direito", são exemplos de conceitos jurídicos expressos sob a forma de termos jurídicos. Todo conceito tem sua compreensão e extensão. Compreensão ou conotação é o conjunto de notas constitutivas – atributivas, predicativas, características, etc. - do conceito (dimensão qualitativa). Ex: o conceito de homem inclui as notas de animal e racional. Extensão ou denotação é o conjunto de objetos ou seres a que se pode aplicar o conceito (dimensão quantitativa). Ex: o conceito de homem se estende a todos os seres humanos. Há uma regra lógica que estabelece: compreensão e extensão variam em razão inversa. Quando aumenta a compreensão, diminui a extensão e vice-versa. Já o raciocínio é uma relação entre juízos, e o juízo é uma relação entre conceitos (ideias). Exemplos: “Paulo é aluno”; “Paulo não é médico”; “a norma jurídica possui coercibilidade”; “o direito não elimina a liberdade, protege-a”. A representação oral ou escrita do juízo denomina-se proposição. A expressão verbal do raciocínio, por outro lado, chama-se argumento (em sentido estrito, pois em sentido amplo e para os fins de nosso curso definimos argumento como todo artifício de linguagem apto a contribuir de maneira mais ou menos eficaz para a produção de efeito persuasivo). 3.3. Interpretação Histórica: é a que investiga as condições de meio e o momento da elaboração da norma legal, bem como os antecedentes da lei, como o projeto da lei, sua justificativa ou a exposição dos motivos, discussões, emendas, aprovação e promulgação. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB A grande parte das normas jurídicas constitui a continuidade ou modificação daquelas, sendo de grande utilidade para o operador do direito estudar a origem e o desenvolvimento dos institutos jurídicos para entender o significado exato das leis vigentes. A Interpretação História se divide em: 3.3.1. Interpretação Remota ou Dogmática: indaga das condições de meio e momento da elaboração da norma jurídica, bem como das causas pretéritas da solução dada pelo legislador é a origo legis e occasio legis. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 3.3.2. Interpretação Próxima ou Evolutiva: espécie de interpretação que busca descobrir o sentido e o alcance das expressões de Direito à luz do momento histórico em que, por exemplo, a norma jurídica será aplicada (registro que nesta hipótese, a expressão jurídica descola-se da vontade do legislador, para que seja valorizada a vontade da lei, pelo fato desta abranger hipóteses que o legislador não previu: 'a lei pode ser mais sábia do que o legislador‘. 3.4. Interpretação Sociológica: tem por finalidade a adaptação do sentido da lei às realidades e aos fins sociais. O art. 5º da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro (antiga LICC), diz que o juiz atenderá aos fins sociais que a lei se dirige e as exigências do bem comum. 3.5. Interpretação sistemática: possibilita ao interprete enfrentar os problemas sintáticos, no que se refere às questões com as quais se depara o interprete da norma jurídica. Neste contexto, a interpretação sistemática consiste em considerar o preceito jurídico interpretando como parte do sistema normativo mais amplo que o envolve. É assim que para compreender um determinado dispositivo do Código Civil de 2002, temos que considerá-lo dentro do sistema geral do código, ou mesmo em relação aos princípios gerais do direito civil ou direito privado como um todo, além de sua compatibilidade de a Constituição Federal. Tal forma de interpretação parte do pressuposto de que o ordenamento jurídico é um todo hermético, ou seja, a noção de que a ordem jurídica deve ser entendida como um sistema fundado na hierarquia das normas (Pirâmide de Hans Kelsen). 4. QUANDO À EXTENSÃO (EFEITOS OU RESULTADOS): A Interpretação quanto à Extensão pode ser declarativa, extensiva ou restritiva. 4.1. Interpretação Declarativa (também pode ser chamada da Estrita ou Especificadora): quando se limita a declarar ou especificar o pensamento expresso na norma jurídica, sem ter necessidade de estendê-la a casos não previstos ou restringi-la mediante a exclusão de casos inadmissíveis. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Nela o intérprete chega à constatação de que as palavras expressam, com medida exata, o espírito da lei, cabendo-lhe apenas constatar esta coincidência. É o tipo mais normal e comum de interpretação, pois presume que o legislação saiba se expressar. Pela interpretação declarativa “aplicam-se (as normas) no sentido exato, não se dilatam, nem restringem os seus termos” segundo CARLOS MAXIMILIANO. A exegese aqui é "estrita, porém não restritiva; deve dar precisamente o que o texto exprime, porém tudo o que no mesmo se compreende; nada de mais, nem de menos". © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB A interpretação declarativa há de ser aplicada, por exemplo, quando se trata de leis que impõem penalidades, que cominam multas, etc. O Código de Direito Canônico, por exemplo, estabelece no seu artigo 18: "As leis que estabelecem pena ou limitam o livre exercício dos direitos ou contêm exceção à lei, devem ser interpretadas estritamente". Finalizando, eis como Alípio Silveira sintetiza a matéria: "É declarativa quando a letra se harmoniza com o significado obtido pelos outros métodos. É extensiva, se o significado obtido pelos outros métodos é mais amplo do que o literal; a final, é restritiva, quando o significado literal é mais amplo do que aquele obtido pelos outros métodos". 4.2. Interpretação Extensiva: quando o intérprete conclui que a abrangência semântica da norma é mais ampla do que indicam suas palavras (v. termo, conceito, palavra). Nesse caso, afirma-se que o legislador escreveu menos do que queria dizer, e o intérprete, alargando o campo de sentido e/ou incidência da norma, recepciona determinadas situações não previstas expressamente em sua letra, mas que nela se encontram, virtualmente, incluídas. Às vezes, o legislador pode formular para um caso singular um conceito que deve valer para toda uma categoria ou usar um elemento que designaespécie, quando queria aludir ao gênero. Por exemplo: a lei diz "filho", quando na realidade queria dizer "descendente". Ou ainda, a Lei do Inquilinato dispõe que: "o proprietário tem direito de pedir o prédio para seu uso"; a interpretação que conclui por incluir o "usufrutuário" entre os que podem pedir o prédio para uso próprio, por entender que a intenção da lei é a de abranger também aquele que tem sobre o prédio um direito real de usufruto, é uma interpretação extensiva. 4.3. Interpretação Restritiva: quando o intérprete restringe o sentido da norma ou limita sua incidência, concluindo que o legislador escreveu mais do que realmente pretendia dizer e assim o intérprete elimina a amplitude das palavras. Por exemplo, a lei diz "descendente", quando na realidade queria dizer "filho". © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 5. AS REGRAS LEGAIS DE INTERPRETAÇÃO. Encontram-se distribuídas pelo ordenamento jurídico e em especial – ao menos pela importância histórica das prescrições hermenêuticas contidas nos artigos 4º e 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB. Indiquemos as expressões das quais podemos extrair regras voltadas sobretudo à atuação hermenêutico- decisória do magistrado mas com projeções compreensivas para todo o Direito: “Art. 4º. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito.” © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB “Art. 5º. Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.” Além desses dois artigos da LINDB para interpretar uma expressão jurídica para poder buscar o sentido correto – ao menos para o caso concreto – do enunciado normativo necessitamos verificar o resultado da interpretação ao levar em consideração, entre tantos outros dispositivos legais de interpretação, como por exemplo: Código Tributário Nacional, artigos 107 a 110; 8º da Consolidação das Leis do Trabalho, o art. 3º do Código de Processo Penal, entre outros. 5.1. REGRAS CIENTÍFICAS DE INTERPRETAÇÃO. As regras científicas são enunciados construídos pelos sábios, desde a antiguidade, como os brocardos e a regras insculpidas no Digesto, de Justiniano, até as reflexões mais atuais. Justiniano compilou dezoito regras especificamente de interpretação, das quais derivam quase todas as outras regras pragmáticas mais atuais, valendo citar: 5.2. Regras clássicas de interpretação jurídica oriundas do Direito Romano. 5.3. DIGESTO – JUSTINIANO: “Quem quer que seja que tenha a ousadia de aditar algum comentário a esta nossa coleção de leis... seja cientificado de que não só pelas leis seja considerado réu futuro de crime de falso, como também de que o que tenha escrito se apreenda e de todos os modos se destrua" (De confirmatione digestorum, in Corpus Juris Civilis, par. 21). 1) Benignius leges interpretandae sunt, quo voluntas earum conservetur (As leis devem ser interpretadas mais benignamente, para que se conserve a sua vontade. (Celso, Dig., L. 1, 18, De legibus, 1, 3) 2) Favorabilia sunt aplianda, odiosa sunt restringenda (As coisas favoráveis devem ser ampliadas; as odiosas restritas). 3) Fiat iustitia, pereat mundus (Faça-se justiça, ainda que pereça o mundo). 4) In claris cessat interpretatio (nas coisas claras cessa a interpretação) 5) Scire leges non hoc est verba earum tenere, sed vim ac potestatem (“saber as leis não é conhecer suas palavras, mas sim, conhecer a sua força e o seu poder" Celso, Dig., L. XXVI). a) Em toda disposição de direito, o gênero é revogado pela espécie; b) Nas coisas obscuras, seguimos o mínimo; c) Quando houver duplicidade de regras sobre a liberdade, interpreta-se em favor desta; d) Em caso de dúvida, interpreta-se pela solução mais benigna; e) No todo está contida a parte. Limongi França inclui entre as regras científicas o catálogo elaborado por Carlos de Carvalho, na sua Consolidação das Leis Civis: Caput - A ementa da lei facilita sua inteligência. § 1o No texto da lei se entende não haver frase ou palavra inútil, supérflua ou sem efeito. § 2o Se as palavras da lei são conformes com a razão devem ser tomadas no sentido literal e as referentes não dão mais direito do que aquelas a que se referem. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB § 3º Deve-se evitar a supersticiosa observância da lei que, olhando só a letra dela, destrói a sua intenção. § 4º O que é conforme ao espírito e letra da lei se compreende na sua disposição. § 5º Os textos da mesma lei devem-se entender uns pelos outros; as palavras antecedentes e subsequentes declaram o seu espírito. § 6º Devem concordar os textos da lei, de modo a torná-los conformes, e não contraditórios, não sendo admissível a contradição ou incompatibilidade neles. § 7º As proposições enunciativas ou incidentes da lei não têm a mesma força que as suas decisões. § 8º Os casos compreendidos na lei estão sujeitos à sua disposição, ainda que os especifique, devendo proceder-se de semelhante a semelhante e dar igual inteligência às disposições conexas. § 9º O caso omisso na letra da lei se compreende na disposição quando há razão mais forte. § 10º A identidade de razão corresponde à mesma disposição de direito. § 11º Pelo espírito de umas se declara o das outras, tratando-se de leis análogas. § 12º As leis conformes no seu fim devem ter idêntica execução e não podem ser entendidas de modo a produzir decisões diferentes sobre o mesmo objeto. § 13º Quando a lei não fez distinção, o intérprete não deve fazê- la, cumprindo entender geralmente toda a lei geral. § 14º A eqüidade é de direito natural e não permite que alguém se locuplete com a jactura alheia. § 15º Violentas interpretações constituem fraude da lei. Limonge França propõe ainda dez regras de interpretação, ao que parece, de caráter histórico-evolutivo, das quais é oportuno transcrever as seguintes: "I - O ponto de partida da interpretação será sempre a exegese pura e simples da lei. II - Num segundo momento, de posse do resultado dessa indagação, o intérprete deverá reconstruir o pensamento do legislador, servindo-se dos elementos lógico, histórico e sistemático. III - Num terceiro momento, cumprir-lhe-á aquinhoar a coincidência entre a expressão da lei e a descoberta auferida, da intenção do legislador. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB IV - Verificada a coincidência, estará concluído o trabalho interpretativo, passando-se desde logo à aplicação da lei. V - Averiguada, porém, desconexão entre a letra da lei e a mens legislatoris devidamente comprovada, o intérprete aplicará esta, e não aquela". Pasqualini também elabora sete regras hermenêuticas, estas, sim, pautadas nos estudos mais atuais da hermenêutica filosófica, que podem assim ser resumidas: I - A hermenêutica tem o dom da ubiqüidade. É a realidade da realidade. "Não há interpretação que não se estribe em uma experiência, e nenhuma experiência que não tenha por antecedente o legado hermenêutico da pré-compreensão". II - Os intérpretes fazem o sistema sistematizar e o significado significar, razão pela qual interpretar é interpretar-se. III - O Direito e a hermenêutica apresentam-se cognitivamente indissociáveis, razão por que a jurisprudência integra, lógica e epistemologicamente, as fontes do Direito. "O Sistema jurídico, em última análise, não é apenas a totalidade das normas, dos princípios e dos valores, mas, acima de tudo, a totalidade hermenêutica do que tais normas, princípios e valores, como conexões de sentido, podem significar". IV - As possibilidades de interpretação são infinitas,porém conservam a justa reserva para com o arbitrário e a irracionalidade. "A hermenêutica acha-se, pois, em dupla oposição, por um lado, ao ceticismo e, por outro, ao dogmatismo. A sua resposta é uma só: busca da melhor exegese". V - Interpretar é hierarquizar. "A hierarquização axiológica constitui- se, ao que tudo leva a crer, na mais autêntica condição de possibilidade do agir hermenêutico". VI - A busca das melhores exegeses revela-se espiraliforme. Girando em torno do seu núcleo principiológico, o sistema se expande a cada releitura. "o juiz não aplica a lei apenas in concreto, mas colabora ele mesmo, através da sua sentença, para o desenvolvimento do direito...", segundo Gadamer. VII - A ronda infindável das interpretações rejeita os extremos absolutos do subjetivismo e do objetivismo, pois o sistema jurídico não é tanto nem tão pouco. A hermenêutica jurídica é indissociável da vinculação e da discricionariedade, ou seja, opera num sistema ao mesmo tempo em que o expande: "somente a elasticidade produz verdadeira resistência“. 5.4. REGRAS DA JURISPRUDÊNCIA PARA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA. Um dos juristas mais preocupados com a compilação das regras de jurisprudência foi Washington de Barros Monteiro, que entre outras apresentou as seguintes regras: a) Na interpretação deve-se sempre preferir a inteligência que faz sentido à que não faz. b) deve-se preferir a inteligência que melhor atenda à tradição do Direito. c) deve ser afastada a exegese que conduz ao vago, ao inexplicável, ao contraditório e ao absurdo. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB d) há que se ter em vista o eo quod plerumque fit, isto é, o que ordinariamente sucede no meio social. e) Onde a lei não distingue, o intérprete não deve igualmente distinguir. f) todas as leis excepcionais ou especiais devem ser interpretadas restritivamente. g) tratando-se porém, de interpretar leis sociais, preciso será temperar o espírito do jurista, adicionando-lhe certa dose de espírito social, sob pena de sacrificar-se a verdade à lógica. h) em matéria fiscal, a interpretação se fará restritivamente. i) deve ser considerado o lugar onde será colocado o dispositivo, cujo sentido deve ser fixado 5.5.Interpretação absurda, significa: a) que leva a ineficácia ou inaplicabilidade da norma, tornando-a sem efeito b) conduz a uma injustiça ou iniqüidade. c) contradiz a finalidade da norma ou do sistema; d) conduz a um resultado impossível, ou contrário à lógica; e) conduz a uma contradição com princípios constitucionais ou do sub-sistema a que se refere a norma. f) conduz a uma contradição com normas de hierarquia superior, ou com normas do mesmo texto legal, ou a situações onde não pode haver contradição; g) conduz a uma fórmula incompreensível, inaplicável na prática. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 6. O PROBLEMA DA CIÊNCIA DO DIREITO. 6.1. Introdução. A ciência do Direito possui vários aspectos relacionados com a sua conceituação como com a sua problemática. Ainda que se possa discutir se o Direito constitui uma ciência própria, efetiva (a chamada ciência do Direito), a verdade é que poucos são os autores que ousam desafiar a visão dominante do Direito como ciência e suas principais consequências, especialmente após o advento da obra Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen, em que o autor se esmerou em demonstrar, como expoente do positivismo jurídico, a pureza jurídica do Direito em seu aspecto tipicamente científico. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB A construção do conhecimento se dá numa relação de conjunção entre o objeto e o que pensou intelectualmente a respeito dele o sujeito que o observou. O conhecimento é fato e não podemos duvidar de sua existência. No que diz a relação entre sujeito e objeto existem duas correntes que discutem a problemática. A corrente empirista parte da ideia de que o conhecimento só se adquire porque nasce do objeto e ao sujeito cabe somente registrá- lo e descrevê-lo, ou seja, ele partiria do real (objeto) para o racional (sujeito). O objeto seria algo transparente, invisível, se apresentaria ao sujeito como ele é, e a este caberia somente saber ver e assim construir o conhecimento. O conhecimento é para o empirista uma descrição do objeto, tanto mais exata quanto melhor apontar as suas características. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB A corrente racionalista, ao contrário, coloca seu fundamento de validade no sujeito e o objeto é somente um ponto de referência, quando não é ignorado; trabalha ou confere à razão uma importância mais alta, bem afastada do objeto, que não há como confundi-los. Dentro do racionalismo encontramos o idealismo, que seria o extremo dessa postura, pois para um idealista o conhecimento nasce e se esgota no sujeito. A problemática sobre o conhecimento e a divergência existente entre essas duas correntes, empírica e racional, faz com que busquemos entender dentro da relação sujeito-objeto a construção do termo ciência, que é o objeto de estudo. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 6.2. O SIGNIFICADO DO TERMO CIÊNCIA. O termo ciência, na acepção popular, indica conhecimento. O vocábulo ciência, em todos os autores por nós estudados, significa conhecimento, saber, possui um sentido dos mais variados e define todos os ramos do saber. Dessa forma a expressão ciência não possui sentido unívoco, evidencia que é composta de elementos e de enunciados que visam a transmitir informações verdadeiras sobre tudo o que existe, existiu ou existirá. O conhecimento científico quer, na verdade, que essas constatações e enunciados tornem-se descritivos, comprovando assim a existência desses dados. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 6.3. O PROBLEMA DA CIÊNCIA DO DIREITO. Se a ciência é, em primeiro lugar, conhecimento de novos fatos da realidade, cabe perguntar que fatos, que realidade o jurista investiga. São os fatos e a realidade legais, isto é, o direito positivo vigente num dado momento e num dado país. Mas esse direito é mutável? A problemática da ciência do Direito reside justamente na questão do seu método e de seu objeto de conhecimento, pois para alguns juristas a ciência do Direito é uma atividade intelectual que tem por objeto o conhecimento racional e sistemático dos fenômenos jurídicos, se enquadrando então num conhecimento unívoco e não variado. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB É este, portanto, o conceito de ciência do Direito que se encontra nos mais variados manuais estudados, ou seja, de uma ciência dogmática, estática, chamada dogmática jurídica. Por possuir essas características, seu papel seria somente avaliar o que está contido basicamente nas leis e nos códigos. Nesse sentido, ao operar no plano da ciência do Direito, o cientista tão somente cogita dos juízos de constatações, a fim de converter as determinações contidas no conjunto normativo. É irrelevante qualquer constatação sobre o valor de justiça, mantendo-se alheia a valores. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Apenas define e sistematiza o conjunto de normas que o Estado impõe à sociedade. A partir disso se pode questionar como uma ciência como o Direito pode permanecer alheia a valores, se o princípio fundamental dessa área do saber é trabalhar com questões humanas, que são variáveis, jamais estáticas ou vinculadas à norma posta. Se a ciência é conhecimento ela é mutável, mesmo que se trabalhe com conceitos que digam que deve ser descritiva. Para quese concretize numa verdadeira ciência, temos de trabalhar então com normas descritíveis, mas que estejam sempre preparadas para possíveis modificações de acordo com o progresso social que envolve o Direito. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 6.4. A CIÊNCIA DO DIREITO. Se considerarmos ciência qualquer tipo de conhecimento racional que engloba dados da realidade natural, social ou cultural, não teremos problemas para falar de uma ciência jurídica, visto que essa estuda dados da realidade, embora de forma racional. Suponhamos, no entanto, que exista uma ciência e que a sua utilização seja lícita. Assim, poderemos entendê-la então como arbitrária, nada progressiva, distante da realidade social e tomaríamos como exemplo a ciência jurídica, pois seu problema reside aí: é a ciência jurídica, por ser ciência, arbitrária e nada progressiva? © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Um dos maiores problemas da ciência do Direito é a sua arbitrariedade, por ser constituída de leis arbitrárias que se modificam com o tempo, pois uma mera palavra do legislador “converte bibliotecas inteiras em lixo”, ou seja, uma mudança na legislação torna inúteis a maioria dos manuais de Direito. Não podemos exagerar esse feito, pois um ordenamento jurídico num todo não se modifica, mas evolui. Assim, o que muda são algumas normas, o que ocorre na verdade é um progresso, uma evolução da ciência jurídica quando se busca atender a dados da realidade social. Temos de ter presente que se a ciência jurídica é arbitrária é porque o legislador fica preso à doutrina tradicional, com métodos, sistemas e conceitos, e que esse, mesmo querendo realizar inovações, se prende a técnicas habituais de determinada época histórica. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Por isso uma ciência jurídica, mesmo entendida no modesto sentido de ordenação de conceitos e métodos de análise de normas legais, não se improvisa, mas adquire-se através de uma educação especializada que transmite seus métodos e suas rotinas de geração para geração. Hoje, por mais radicais que sejam as mudanças, o jurista continua utilizando técnicas e hábitos da tradição doutrinária, já que o progresso social da ciência jurídica é discutível. Se considerarmos como objeto da ciência jurídica apenas o conhecimento do Direito, esse progresso é duvidoso. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Na realidade, quando se fala de progresso da ciência jurídica, teria que se pensar especialmente na forma como, graças ao desenvolvimento desses métodos de análise, o jurista é capaz de enfrentar novos problemas e realidades partindo de um Direito que inevitavelmente vai ficando ultrapassado pela evolução social. A resolução de tal problema está em sabermos se existe ou não um progresso social da ciência do Direito e que importância tem o jurista na existência desse progresso. Tal constatação se dá através da própria evolução dos homens e de suas realidades e é através dessas que o Direito, ou o conhecimento do Direito poderá realmente se caracterizar como progresso social, regulando e controlando a vida da comunidade. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 6.5. A CIÊNCIA DO DIREITO: MÉTODO E OBJETO. Para que possamos enfocar aspectos relacionados com o objeto e o método da ciência jurídica, uma primeira proposta pode ser a seguinte: a ciência tem por objeto o conhecimento do conjunto de normas que constituem o Direito vigente ou positivo. O jurista, ao utilizar esse objeto de conhecimento, deve buscar e desenvolver seus conceitos, sua metodologia, utilizando-se somente da lei. Nessa ótica, o jurista deve limitar-se ao Direito assim como ele nos é posto, estabelecido, não podendo adentrar e envolver-se em questões éticas ou valorativas, ou ainda ater-se a questões sociais ou, especificamente, a normas que se prendam à realidade social. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB O direito normativo ou dogmático e somente esse é seu objeto de estudo. Diante disso, o jurista não precisa ser indiferente ao que diz respeito a valores éticos, morais e sociais. Ele pode criticar o Direito positivo e esforçar-se para modificá-lo, alcançando assim sua reforma e estruturação de algumas normas quando achar necessário. Isso significa que o objeto do Direito nessa concepção pode e deve ser estudado como algo diverso/ separado dos fenômenos sociais. Depois de buscarmos entender a problemática que envolve a cientificidade ou não da ciência do Direito, abordando aspectos desde a construção do conceito de conhecimento e de ciência e sua vinculação com o direito, procuraremos enfocar alguns aspectos relacionados com Ciência jurídica de acordo com Hans Kelsen. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 6.5. HANS KELSEN E A CIÊNCIA DO DIREITO. O conceito de ciência jurídica apresentado por Hans Kelsen é o de uma ciência purificada de qualquer valor, tanto social como ético ou moral. Tal postura tornou-se algo realmente polêmico e bastante discutido, porém são poucos os que ousam desafiar essas premissas com competência e clareza de afirmações. Nesse sentido, partimos da ideia de quais são ou devem ser os métodos de estudo do Direito. Hans Kelsen parte do mesmo ponto dos demais positivistas tradicionais, ou seja, a análise do Direito deve fazer-se independentemente de qualquer juízo de valor ético, político, e de qualquer referência à realidade social em que atua. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB O Direito é um fenômeno autônomo, cujo conhecimento é o objeto da ciência jurídica como atividade intelectual distinta da ética e das ciências sociais. A autonomia da ciência jurídica requer que ela se liberte das contaminações ideológicas que, de forma mais ou menos consciente, têm perturbado o estudo do Direito. Hans Kelsen parte de uma concepção de ciência que está fundada na objetividade, exatidão e neutralidade de suas proposições, que vão descrever o objeto dado. Seu objetivo é purificar a ciência jurídica de todos os elementos estranhos, fixando como seu único objeto o conhecimento do que é o Direito, sem tentar justificá-lo nem colocá- lo sob pontos de vista alheios a ele. Ou seja, uma teoria consciente da legalidade específica de seu objeto. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Para constituir uma ciência tão purificada e limpa, sem quaisquer impurezas, o fundamental para Hans Kelsen é que o Direito se resuma exclusivamente à norma. Aqui o objeto é a norma e não o fato. Todos os fatos deverão obedecer ao que a lei ordena. Para enfocarmos toda a problemática que envolve a Teoria Pura do Direito, ou mais especificamente a ciência do Direito, precisaríamos aprofundar todos os elementos até aqui apresentados no que concerne a esse tema. Fazendo perceber através de um contradiscurso que a visão positivista abordada por Kelsen, ou a visão de ciência jurídica como uma ciência dogmática do Direito, não pode mais ter força de sistema normativo, pois se apresenta como um corpo confuso de regras, cheias de defeitos e insuficientes para satisfazer às necessidades reais da sociedade moderna. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Por isso, é preciso deslocar a ideia de uma ciência rigorosa e objetiva e estabelecer o caráter imaginário das verdades, para que possamos compreender que através do gênero científico nunca se poderá efetivar a crítica à sociedade e reconhecer o homem com seus anseios. No contextodessa discussão uma questão é certa: a partir da segunda metade do século XX a ciência do Direito firmou-se como uma ciência dogmática do Direito, apesar de persistirem opiniões e críticas contrárias a esse dogmatismo. De qualquer forma, o que se está discutindo e muito na área jurídica a respeito dessa concepção dogmática de ciência é a sua relação com a hermenêutica como teoria da interpretação, ou a busca de métodos de interpretação que possibilitem uma adequação ou a readequação da dogmática à realidade social. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 7. O JUSNATURALISMO. 7.1. O Jusnaturalismo e o Juspositivismo. Direito Positivo: é o conjunto de normas estatais em vigor, em determinado país, em uma determinada época. Limita o estudo do direito sobre as legislações jurídicas. Acredita que a lei resolva tudo, está acima de tudo. Surge do Estado, é mutável e particular à sociedade política que o cria (Constituição, Lei Complementar, Lei Ordinária e Decreto). Direito Natural: é o conjunto mínimo de preceitos dotados de caráter universal, imutável, que surge da natureza humana e que se configura como um dos princípios de legitimidade do direito. Adota o direito universal. Está ligado à moral e aos costumes. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 7.2. Jusnaturalismo e o Juspositivismo na Visão Moderna. Podem ser consideradas como primas-irmãs da Modernidade. São pressupostos impostos pela Modernidade: a) Fase de Conceitos e Preconceitos; b) Produção de conhecimento científico da humanidade; c) Racionalidade científica; d) Formulação de leis – tradução da realidade; e) Previsão de comportamento futuro. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 7.3. O Jusnaturalismo. São as Leis da Natureza. As ciências naturais passam a ditar os parâmetros científicos. Suas características são: a) Ordem Jurídica vinda da própria natureza humana; b) Não há coerção material; c) Princípios universais e necessários inerentes à natureza do homem; d) A razão, as exigências sociais, os preceitos éticos, morais ou espirituais, definem a sua natureza – a unidade natural da pessoa humana. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB e) Estado de Natureza – sociedade com relações exclusivamente intersubjetivas entre os homens, sem um poder político organizado. 7.4. Direito Natural: como surgiu? Sociedade de homens que cultivavam a terra, produzindo o seu próprio consumo. Constituíam famílias e o chefe da família tinha servos a sua disposição. Com a morte do pai, o seus haveres se transmitiam a seus descendentes. Todas essas relações sociais eram reguladas por normas jurídicas (tinha-se assim os direitos reais, o das obrigações, o da família e o das sucessões). © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 7.5. A Intervenção do Estado no Jusnaturalismo. Limita-se a torna estáveis as relações jurídicas. O direito privado já existe no estado de natureza e a constituição do Estado determina apenas o surgimento do direito público. No primeiro momento tem-se um direito provisório, precário, e no segundo momento um direito peremptório, isto é, definitivamente afirmado pelo poder do Estado; As normas naturais vão reger a convivência entre os homens. Homem é conforme a sua natureza. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 7.6. O Juspositivismo. O Juspositivismo é a contraposição ao direito natural. Significa o Positivismo Jurídico. Positivismo é a concretização do direito em normas ou preceitos legislativos, ou simplesmente costumeiros, ou jurisprudenciais, mas sancionados e impostos pela autoridade do Estado. Revela o que é justo, ou injusto nas relações humanas e no modo de solução dos conflitos que destas relações surgem. O direito positivo é um direito declarado, praticado e feito valer, materialmente, pela proteção-coerção a cargo do Estado. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Bobbio explica que o positivismo jurídico é uma concepção do direito que nasce quando “direito positivo” e “direito natural” não mais são considerados direito no mesmo sentido. Quando surge o positivismo jurídico então? O positivismo jurídico surge como reação ao Jusnaturalismo, repelindo tudo aquilho que extravasasse os limites do que não fosse posto e aprovado pelo Estado, surgindo como consequência da formação do Estado moderno. 7.7. Consequência: O Juiz só pode aplicar aquilo que está normatizado. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB As demais regras são descartadas e não são mais aplicadas nos juízos. O direito posto e aprovado pelo Estado é tido como o único e verdadeiro direito: este é o único a encontrar aplicação nos tribunais. E como encaixar o positivismo jurídico no projeto da modernidade? Se o Jusnaturalismo é o primeiro passo em direito a independência do direito, como forma de conhecimento individualizada, já que se desvinculou da Teologia, o Positivismo Jurídico é o esforço final de avocação para o direito do estatuto de ciência, e portanto, de ganhar o seu lugar na comunidade científica moderna. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Pode-se dizer, em última analise, que ele representa um tentativa de cientificação do direito, de modo a aproximá-lo, ao máximo, do paradigma das matemáticas, num esforço de trazer maior rigor e exatidão para seus postulados. Em um outro aspecto, inspirado no racionalismo moderno, o Positivismo Jurídico acaba se tornando o produto da razão humana, mais até do que o Jusnaturalismo. Se neste ela é apenas um instrumento de captação de uma ordem natural predeterminada; naquele a razão humana, na concepção de que o homem por ser racional (em função da razão) é capaz de definir para cada forma de sociedade qual o regime político e a melhor forma de mantê-lo racionalmente, é a própria força motriz do direito. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Em outras palavras, o Positivismo é fruto da própria razão, como derivação do racionalismo político. Como ele, o juiz, livre órgão da sociedade, se torna um órgão do Estado, autêntico funcionário do Estado. O direito positivo, isto é, o direito posto e aprovado pelo Estado, é tido como o único verdadeiro direito: este é o único a encontrar aplicação nos tribunais. O Positivismo Jurídico é um doutrina de direito, que considera que somente é direito aquilo que é posto pelo Estado, sendo então esse o objeto que deve ser definido e cujos esforços sejam voltados à reflexão sobre a sua interpretação. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB A sua tese básica afirma que o direito constitui produto de ação e vontade humana (direito positivo) e não da imposição de Deus, da natureza ou da razão como afirma o Jusnaturalismo. A maioria dos adeptos ao positivismo jurídico defende também que não existe necessariamente uma relação entre o direito, a moral e a justiça, visto que as noções de justiça e moral são relativas, mutáveis no tempo e sem força para se impor contra a vontade de quem cria as normas jurídicas. 7.8. Fundamentos Principais do Positivismo Jurídico. As leis são frutos dos comandos dos seres humanos. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB Não existe vínculo necessário entre o direito e a moral, ou entre o direito como ele é o como deveria ser. A analise dos conceitos jurídicos deve ser distinta de preceitos históricos, sociológicose quaisquer outros. O sistema jurídico é um sistema lógico fechado, em que as decisões jurídicas corretas podem ser inferidas, por meios lógicos, a partir de regras jurídicas predeterminadas sem referência a objetivos sociais, políticos ou morais. Os juízos morais podem ser emitidos, ou defendidos, como o podem as afirmações de fatos, por meio de argumentação racional, evidência ou prova. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 7.8. Relação entre o Jusnaturalismo e o Juspositivismo. Ontológio: trata o ser como ser; Deontológico: auxilia nas escolas; O positivismo surgiu, então, a partir de uma fase difícil do jusnaturalismo. A grande diferença das correntes de pensamento, que se deu a aceitação maior do positivismo, foi de que o positivismo valoriza apenas os fatos concretos, as leis escritas. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB O Direito Natural é considerado como metafísico, no abstrato, um método dedutivo. Havendo sintonia entre o direito positivo e o natural, as leis se revelam substancialmente justas. 7.9. Principais diferenças: Jusnaturalismo: subjetivo, imutável (estável), ético e moral, e universal. Juspositivismo: normativo, dogmático, fonte estatal e unidimensional. © Prof. Esp. Cesar Augustus Mazzoni – Hermenêutica Jurídica – 2016 – Direito – FAESB 7.10. Conclusão: As ciências naturais passam a ditar os parâmetros científicos, como ponto de referência, para as demais formas de conhecimento atualmente. Bibliografia: FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica jurídica. 11ª ed. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais. 2012. KELSEN, Hans,Teoria Pura do Direito. 7ª ed. São Paulo: Martins fontes. 2009. BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico, apresentação Tércio Sampaio Ferraz Júnior. Trad. Cláudio de Cicco, Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos. São Paulo, polis Brasília: UNB. 2011. PASQUALINI, Alexandre. Hermenêutica e Sistema Jurídico: Uma Introdução à Hermenêutica Sistemática do Direito.
Compartilhar