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Cicatrizes neurobiologicas do TEPT

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CICATRIZES NEUROBIOLÓGICAS DO TEPT 
Rodrigo Grassi-Oliveira 
Giovanni Kuckartz Pergher 
Lilian Milnitsky Stein 
Em 1890, o psicólogo William James pro-pôs, em sua obra The Principies of Psychology, que uma experiência vivi-
da poderia gerar uma impressão tão excitante do 
ponto de vista emocional, que seria capaz de dei-
xar uma marca (cicatriz) nos tecidos cerebrais 
(James, 1890). Algumas décadas depois, Hans 
Selye publicou uma carta na revista Nature (Seyle, 
1936) na qual descreveu uma síndrome caracteri-
zada por hipertrofia da glândula adrenal, ulcera-
ção gastrointestinal e involução timicolinfática, que 
<e desenvolvia após o corpo ser exposto a algum 
tipo de agente nocivo (estressor). A essa resposta 
física chamou de estresse. Seyle propõe ainda a 
existência de uma Síndrome Geral de Adaptação, 
que seria um processo adaptativo emergencial, 
.uivado perante um estressor, cujo objetivo seria a 
preservação de um equilíbrio das funções responsá-
veis para a sobrevivência (Pacák & Palkovits, 
2001) ou homeostase (Canon, 1929). 
Assim, toda vez que um indivíduo se vê diante 
de uma situação física ou psicossocial adversa é 
forçado a se adaptar para manter sua sobrevivência. 
Alostase é o termo utilizado para se referir aos pro-
cessos de adaptação utilizados para manter a 
estabilidade de um organismo (sua homeostase) 
•>?r meio de processos ativos que, quando aciona-
dos, implicam num "preço" a ser pago pelo corpo. 
Quando a resposta alostática é excessiva ou inefi-
caz, considera-se a existência de um "peso alostá-
tico". Caso esses mecanismos adaptativos sejam 
acionados repetitivamente, o organismo passa a 
funcionar em um "estado alostático". Presume-se 
então que funcionar em um estado de peso 
alostático provavelmente sai muito "caro" para o 
corpo (McEwen, 2003). 
Nesse contexto o trauma psíquico poderia ser 
entendido como uma dificuldade do indivíduo na 
habilidade de integrar uma experiência emocional 
individual (subjetiva) de ameaça à vida, à integri-
dade corporal ou à sanidade. Seria uma dificulda-
de na adaptação que se traduz no desenvolvimen-
to de um estado de peso alostático. O preço desse 
processo poderia ser traduzido em diversas conse-
quências neurobiológicas. 
O objetivo desse capítulo será expor alguns 
achados na literatura especializada no que se refere 
às possíveis consequências neurobiológicas associa-
das com o Transtorno de Estresse Pós-Traumático 
(TEPT). Assim, partindo do significado médico da 
palavra cicatriz1, mais especificamente da expressão 
cicatriz biológica2, reuniu-se alguns dos estudos 
mais expressivos de investigação por neuroimagem 
das cicatrizes neurológicas associadas ao TEPT. 
"Marca deixada na pele, ou em outro órgão, pelo tecido fibroso gue recompõe as partes lesadas" (Ferreira, 1999). 
. 3!DO cicatrizes biológicas é utilizado pelo Dr. Martin Teicher, professor da Harvard University, para se referir à cascata de efeitos 
-seculares e neurobiológicos induzidos pelo abuso e negligência na infância, que alteram de modo irreversível o desenvolvimento neuronal 
"r^her. 2002). 
Cicatrizes Neurobiológicas do TEPT 
O Início 
Os estudos de neuroimagem no TEPT incluem 
todos os estudos que utilizam técnicas radiológicas 
na investigação de achados sobre a estrutura e/ou 
função do cérebro. O primeiro estudo radiológico 
realizado com pacientes que tinham sido expostos 
a situações traumáticas foi realizado por Thygesen, 
Hermann & Willanger (1970). Esses autores sub-
meteram sobreviventes de campos de concentração 
da Segunda Guerra Mundial a um exame chamado 
pneumoencefalografia, ou seja, injeções de ar eram 
aplicadas no espaço cérebro-espinhal e após isso 
era obtida uma imagem por meio de raios-X 
simples. O estudo identificou "diversos graus de 
atrofia cerebral" e "encefalopatia difusa" em mais 
de 81% dos casos, embora os exames tenham sido 
avaliados visualmente, sem medidas quantitativas 
dessa atrofia. 
A Década do Cérebro 
Felizmente, após a década de 1990 ter sido 
dedicada ao estudo do cérebro pela Library of 
Congress e o National Institute of Mental Health 
of the National Institutes of Health dos Estados 
Unidos, técnicas mais avançadas de investigação 
por neuroimagem foram desenvolvidas. A Resso-
nância Magnética (do inglês, Magnetic Resonan-
ce Imaging - MRI) é um exame muito seguro, pois 
não utiliza radiação ionizante. Ela possibilita ob-
ter cortes tomográficos em muitos e diferentes pla-
nos, dando uma visão panorâmica da área do corpo 
de interesse, além de mostrar características dos 
diferentes tecidos do corpo. O paciente entra den-
tro de um campo magnético que vai alinhar os 
spins3 dos átomos de hidrogénio do seu corpo, após 
isso, ondas de radiofrequência são aplicadas 
pulsadamente para desalinhar novamente esses 
spins. Um computador cria as imagens a partir do 
tempo e das coordenadas que foram utilizados 
nesse desalinhamento. A MRI é muito boa para 
estudar estruturas neurológicas. Porém, quando o 
objetivo é poder estudar a função dessas estruturas, 
necessita-se de outros exames de imagem. 
A Ressonância Magnética Funcional (functio-
nal magnetic resonance image - fMRI) é uma téc-
nica que utiliza a MRI associada à percepção das 
mudanças locais da concentração de deoxihemo-
globina, de modo que, quando há um aumento do 
fluxo sanguíneo cerebral em determinada região 
com maior atividade, a oferta de oxigénio supera 
o consumo com uma aparente redução da 
deoxihemoglobina. A Tomografia por Emissão de 
Pósitrons (positron emission tomography - PET) 
é o exame mais utilizado na maioria das publica-
ções sobre investigação de neuroimagem funcional 
no TEPT. A PET avalia o fluxo sanguíneo e o 
metabolismo cerebral. Nas áreas cerebrais em que 
existe maior atividade neuronal identifica-se um 
maior consumo de glicose e um maior aumento do 
fluxo sanguíneo cerebral. Isso faz com que as ta-
xas de glicose sanguínea diminuam nessas áreas, 
por isso, a PET avalia a função cerebral em tempo 
real. Durante o exame, injeta-se água radioativa 
(H2[0-15]) para se avaliar o fluxo sanguíneo e 
glicose radioativa ([18F]2 fluoro-2-desoxiglicose 
ou FDG) para se avaliar o metabolismo. Essas 
substâncias emitem pósitrons que colidem com os 
elétrons do cérebro, criando duas bandas de luz 
que são emitidas e, assim, captadas por uma 
câmera. O computador usa essas informações para 
reconstruir uma imagem do metabolismo cerebral 
ou dos padrões de perfusão sanguínea. 
Estudos Estruturais 
Os estudos que utilizam a MRI na investigação 
do TEPT têm focado, principalmente, a aferição 
do volume do hipocampo, uma estrutura 
relacionada com os processos de aprendizagem e 
memória. Esse enfoque vai ao encontro das pes-
quisas realizadas em animais, cujos resultados 
• energia e de momento que flui numa partícula numa determinada direção. 
56 
Rodrigo Grassi-Oliveira, Giovanni Kuckartz Pergher e Lilian Milnitsky Stein 
mostram que altos níveis de cortisol parecem estar 
relacionados com danos hipocampais (Mathew et 
al, 2003). Um dos pesquisadores mais expressivos 
nesse tipo de metodologia é o psiquiatra Dr. J. 
Douglas Bremner, atualmente professor da Emory 
University, que, na última década, se dedicou a 
publicar extensamente sobre neuroimagem e TEPT. 
Um dos seus primeiros artigos de impacto 
Bremner et ai, 1995) comparou o volume hipo-
campal, aferido por MRI, entre combatentes vete-
ranos do Vietnã com TEPT (n - 26) e sujeitos 
-audáveis (n = 22), pareados para variáveis que 
pudessem alterar o volume do hipocampo, 
incluindo idade, sexo, raça, tempo de escolaridade, 
peso, altura, hemisfério dominante e anos de abu-
so de álcool. O grupo com TEPT evidenciou 8% 
de diminuição no volume do hipocampo direito 
quando comparado ao grupo-controle (1184 vs. 
! 286 mm3; p<0,05), apesar de não haver diminui-
ção volumétricasignificativa em outras estruturas 
cerebrais como o lobo temporal, amígdala e 
caudado. Além disso, os autores verificaram um 
prejuízo da memória verbal de curto prazo 
(^ecoçdaCjãoYwe?) aíeriàape\a"ksca\ àe "Memória 
Wechsler, que se correlacionou positivamente com 
a diminuição de volume no hipocampo direito nos 
pacientes com TEPT (r = 0,64; p<0,05). Em outro 
estudo, realizado com homens e mulheres adultos 
com história de abuso sexual e/ou físico severo e 
TEPT (n = 17), Bremner et al, (1997a) compararam 
o volume hipocampal, avaliado por MRI, desses 
pacientes com controles saudáveis (n = 17), tam-
bém pareados para os fatores de confusão utiliza-
dos em seu primeiro estudo supracitado. Nessa 
pesquisa foi observada uma redução de 12% no 
volume do hipocampo esquerdo no grupo com 
TEPT/abuso em relação ao grupo-controle 
(p<0,05) sem outras diferenças neuroestruturais. 
O estudo também observou que os sintomas de 
TEPT foram correlacionados positivamente com 
a redução volumétrica hipocampal. 
Villarreal et al. (2002), em um estudo mais 
recente, avaliaram com MRI o volume hipocam-
pal, o volume encefálico total de substância bran-
ca (VSB) e cinzenta (VSC) e o volume de líquido 
cefalorraquiadiano (LCR) de pacientes ambula-
toriais com TEPT. O somatório de todas essas 
medidas foi chamado de volume intracraniano to-
tal (VIC). Os grupos foram pareados com controles 
saudáveis, porém, esse estudo obedeceu critérios 
mais rigorosos que os trabalhos anteriormente 
citados no controle das variáveis potencialmente 
confusas, incluindo sintomas de depressão e ansie-
dade (Inventários Beck-BDIzBAI). Os resultados 
mostraram que apesar dos dois grupos não diferi-
rem no VIC, os indivíduos com TEPT possuíam 
uma maior relação de volume de LCR/VIC 
(p<0,01) e uma menor relação VSB/VIC (p = 0,03), 
achados consistentes com uma atrofia generalizada 
de substância branca. Além disso, mostravam di-
minuição hipocampal generalizada, redução de 
10% no volume do lado direito (p<0,01) e 13% do 
esquerdo (p<0,01), mesmo corrigindo-se os 
resultados de acordo com a variável tempo de 
intoxicação por álcool. O volume hipocampal 
esquerdo correlacionou-se negativamente com os 
escores nas escalas de TEPT (r = -0,66, p = 0,02) e 
depressão (r = -0,63, p = 0,03), embora uma análise 
de regressão passo a passo tenha apontado que o 
TEPT ÇOÇ&VÍV um papel Tcvavs sVgmíicatvvo na pre-
dição de volume hipocampal esquerdo (p = 0,03). 
Cabe ressaltar que é de extrema importância o 
controle da variável "abuso de álcool" em virtude 
dos efeitos neurotóxicos do etanol e da elevada 
co-morbidade com TEPT (Agartz, Momenan, 
Rawlings, Kerich, & Hommer, 1999). Todavia 
existe um estudo piloto publicado por Hedges et 
al. (2003) que avalia veteranos da guerra do Vietnã 
com (n = 4) e sem (n = 4) TEPT. Esses participan-
tes jamais Fizeram uso de álcool, em virtude de 
motivos religiosos. Os autores verificaram que. 
após os grupos serem avaliados por MRI, o grupo 
com TEPT evidenciou diminuição bilateral hipo-
campal (p = 0,02). Assim, sugerem que, apesar do 
pequeno número de participantes, há evidência de 
associação entre TEPT e atrofia hipocampal, 
mesmo na ausência de abuso de álcool. 
Gurvits et al (1996) avaliaram o volume do hi-
pocampo numa amostra clínica de combatentes ve-
teranos do Vietnã com TEPT (n = 7) e em dois 
grupos-controles: veteranos sem TEPT (n = 7) e não-
veteranos saudáveis (n = 8). Os autores encontraram 
uma atrofia de 26% no volume hipocampal esquerdo 
e 22% no hipocampo direito nos indivíduos do grupo 
57 
Rodrigo Grassi-Oliveira, Giovanni Kuckartz Pergher e Lilian Milnitsky Stein 
mostram que altos níveis de cortisol parecem estar 
relacionados com danos hipocampais (Mathew et 
ai, 2003). Um dos pesquisadores mais expressivos 
nesse tipo de metodologia é o psiquiatra Dr. J. 
Douglas Bremner, atualmente professor da Emory 
University, que, na última década, se dedicou a 
publicar extensamente sobre neuroimagem e TEPT. 
Um dos seus primeiros artigos de impacto 
Bremner et al, 1995) comparou o volume hipo-
campal, aferido por MRI, entre combatentes vete-
ranos do Vietnã com TEPT (n = 26) e sujeitos 
-audáveis (n = 22), pareados para variáveis que 
pudessem alterar o volume do hipocampo, 
incluindo idade, sexo, raça, tempo de escolaridade, 
peso, altura, hemisfério dominante e anos de abu-
so de álcool. O grupo com TEPT evidenciou 8% 
de diminuição no volume do hipocampo direito 
quando comparado ao grupo-controle (1184 vs. 
! 286 mm3; p<0.05), apesar de não haver diminui-
ção volumétrica significativa em outras estruturas 
cerebrais como o lobo temporal, amígdala e 
caudado. Além disso, os autores verificaram um 
prejuízo da memória verbal de curto prazo 
i recordação livre) aferida pela Escala de Memória 
Wechsler, que se correlacionou positivamente com 
a diminuição de volume no hipocampo direito nos 
pacientes com TEPT (r = 0,64; p<0,05). Em outro 
estudo, realizado com homens e mulheres adultos 
com história de abuso sexual e/ou físico severo e 
TEPT (n = 17), Bremner et al. (1997a) compararam 
o volume hipocampal, avaliado por MRI, desses 
pacientes com controles saudáveis (n = 17), tam-
bém pareados para os fatores de confusão utiliza-
dos em seu primeiro estudo supracitado. Nessa 
pesquisa foi observada uma redução de 12% no 
volume do hipocampo esquerdo no grupo com 
TEPT/abuso em relação ao grupo-controle 
p<0,05) sem outras diferenças neuroestruturais. 
O estudo também observou que os sintomas de 
TEPT foram correlacionados positivamente com 
a redução volumétrica hipocampal. 
Villarreal et al. (2002), em um estudo mais 
recente, avaliaram com MRI o volume hipocam-
pal, o volume encefálico total de substância bran-
ca (VSB) e cinzenta (VSC) e o volume de líquido 
cefalorraquiadiano (LCR) de pacientes ambula-
toriais com TEPT. O somatório de todas essas 
medidas foi chamado de volume intracraniano to-
tal (VIC). Os grupos foram pareados com controles 
saudáveis, porém, esse estudo obedeceu critérios 
mais rigorosos que os trabalhos anteriormente 
citados no controle das variáveis potencialmente 
confusas, incluindo sintomas de depressão e ansie-
dade (Inventários Beck-BDIzBAI). Os resultados 
mostraram que apesar dos dois grupos não diferi-
rem no VIC, os indivíduos com TEPT possuíam 
uma maior relação de volume de LCR/VIC 
(p<0,01) e uma menor relação VSB/VIC (p = 0,03), 
achados consistentes com uma atrofia generalizada 
de substância branca. Além disso, mostravam di-
minuição hipocampal generalizada, redução de 
10% no volume do lado direito (p<0,01) e 13% do 
esquerdo (p<0,01), mesmo corrigindo-se os 
resultados de acordo com a variável tempo de 
intoxicação por álcool. O volume hipocampal 
esquerdo correlacionou-se negativamente com os 
escores nas escalas de TEPT (r = -0,66, p = 0,02) e 
depressão (r = -0,63. p = 0,03), embora uma análise 
de regressão passo a passo tenha apontado que o 
TEPT possui um papel mais significativo na pre-
dição de volume hipocampal esquerdo (p = 0,03). 
Cabe ressaltar que é de extrema importância o 
controle da variável "abuso de álcool" em virtude 
dos efeitos neurotóxicos do etanol e da elevada 
co-morbidade com TEPT (Agartz, Momenan, 
Rawlings, Kerich, & Hommer, 1999). Todavia 
existe um estudo piloto publicado por Hedges et 
al. (2003) que avalia veteranos da guerra do Vietnã 
com (n = 4) e sem (n = 4) TEPT. Esses participan-
tes jamais fizeram uso de álcool, em virtude de 
motivos religiosos. Os autores verificaram que. 
após os grupos serem avaliados por MRI, o grupo 
com TEPT evidenciou diminuição bilateral hipo-
campal (p = 0,02). Assim, sugerem que, apesar do 
pequeno número de participantes, há evidência de 
associação entre TEPT e atrofia hipocampal, 
mesmo na ausência de abuso de álcool. 
Gurvits etal. (1996) avaliaram o volume do hi-
pocampo numa amostraclínica de combatentes ve-
teranos do Vietnã com TEPT (n = 7) e em dois 
grupos-controles: veteranos sem TEPT (n = 7) e não-
veteranos saudáveis (n = 8). Os autores encontraram 
uma atrofia de 26% no volume hipocampal esquerdo 
e 22% no hipocampo direito nos indivíduos do grupo 
57 
Cicatrizes Neurobiológicas do TEPT 
clínico. Embora os grupos não tenham sido pareados 
para abuso de álcool, após ajustar em uma análise 
de covariância a idade, volume total encefálico e 
tempo (anos) de abuso de álcool, esse achado ainda 
se mantém estatisticamente significativo. Esses au-
tores avaliaram a gravidade da exposição traumáti-
ca e acharam uma correlação positiva com o grau 
de atrofia hipocampal. Porém, nessa última análise, 
os autores incluíram em um único grupo os vetera-
nos com e sem TEPT e não realizaram uma análise 
desse fator entre grupos. Sapolsky (2000) chama a 
atenção que, pelos seus cálculos, não haveria dife-
rença entre grupos no caso dessa análise ser feita, 
levantando a possibilidade de a atrofia hipocampal 
poder ser fruto da gravidade do trauma em vez de 
estar relacionada primariamente com o TEPT. Po-
sição que corrobora com um estudo feito por Stein 
et al. (1997), no qual investigaram mulheres que 
relataram história de abuso sexual grave (n = 21) 
que foram pareadas para idade, sexo, peso, altura, 
educação, hemisfério dominante e nível socioe-
conómico com indivíduos-controles (que negaram 
história de abuso). As participantes do grupo clínico 
relataram maior abuso de substâncias psicoativas, 
porém não diferiram do grupo-controle para uso 
ativo de álcool. Todas as participantes foram 
submetidas à MRI cerebral, que demonstrou dimi-
nuição significativa de 4,9% no volume do hipo-
campo esquerdo no grupo clínico em relação ao 
controle. Essa atrofia continuou sendo identificada 
após terem sido controladas a história de álcool e 
outras drogas. Além disso, o volume hipocampal 
foi correlacionado negativamente com a severidade 
de sintomas dissociativos (r = -0,73; p<0,05). To-
davia, apenas 15 das 21 participantes abusadas pos-
suíam TEPT. Da mesma forma, Sapolsky (2000) 
especula que se a atrofia fosse decorrente do TEPT, 
as seis participantes abusadas e sem TEPT deveriam 
evidenciar uma diferença volumétrica significativa 
em relação às demais participantes com TEPT. 
Contudo isso não ocorreu. 
O Dr. Bremner defende a hipótese de que 
existem evidências suficientes para se poder afir-
mar que pacientes traumatizados evidenciam uma 
atrofia hipocampal que parece ser específica para 
o diagnóstico de TEPT. Além disso, especula que 
os pacientes com TEPT associado a traumas pre-
coces na vida possuem uma maior redução do hi-
pocampo esquerdo, enquanto os pacientes que de-
senvolveram TEPT mais tarde (veteranos do 
Vietnã) possuem atrofia bilateral ou do hipocam-
po direito (Bremner, 1999). 
Estudos Funcionais 
Para tentar esclarecer isso Bremner et al. (2003) 
realizaram um estudo de neuroimagem estrutural 
e funcional com mulheres com história de abuso 
sexual na infância e com TEPT (n = 10), mulheres 
com história de abuso sexual na infância e sem 
TEPT (n = 12) e mulheres sem história de abuso 
sexual na infância e sem TEPT (n = 11). Todas as 
participantes foram submetidas a exames de MRI 
e PET. Os autores verificaram que o volume do 
hipocampo esquerdo no grupo abuso/TEPT 
mostrou-se 15% menor em relação ao grupo abu-
so/sem-TEPT e 17% menor em relação ao grupo-
controle (p = 0,01). Da mesma maneira, o volume 
do hipocampo esquerdo no grupo abuso/TEPT 
mostrou-se 16% menor em relação ao grupo abu-
so/sem-TEPT e 22% menor em relação ao grupo-
controle (p = 0,01). Não houve diferenças entre o 
grupo abuso/sem-TEPT e o controle. As mulheres 
com TEPT mostraram um prejuízo na ativação do 
hipocampo esquerdo, visto pela PET, durante um 
teste de memória verbal (paragraph encoding) em 
comparação com o grupo abuso/sem-TEPT, 
mesmo após correção para a atrofia hipocampal 
(p<0.001). Os autores ainda verificaram que os 
sintomas dissociativos correlacionaram-se com a 
redução hipocampal esquerda (r2 = 0,3; p<0,05), 
porém os sintomas de TEPT obtiveram essa 
correlação com a diminuição do volume do hipo-
campo direito (r2 = 0,27; p<0,05). 
Além do hipocampo, os estudos funcionais 
propiciaram a detecção de alterações fisiológicas 
em outras áreas cerebrais, como o córtex órbito-
frontal, que tem um papel importante na memória 
emocional. Bremner et al. (1998), utilizando PET 
com água radioativa, compararam a perfusão 
cerebral de combatentes veteranos do Vietnã com 
TEPT (n = 10) e sem TEPT (n = 10), em resposta 
a imagens e sons relacionados com a guerra e com 
58 
Rodrigo Grassi-Oliveira, Giovanni Kuckartz Pergher e Lilian Milnitsky Stein 
temática neutra. Os autores verificaram um consi-
derável aumento na perfusão no córtex parietal 
esquerdo, córtex motor esquerdo, ponte dorsal, 
para-hipocampo posterior e cingulado medial (z > 
3: p<0,001) dos pacientes com TEPT, em resposta 
ao material de guerra. Essas regiões estão envol-
vidas na memória espacial e emoção. Além disso, 
houve uma falha na ativação do córtex órbito-fron-
tal no grupo com TEPT, em relação ao grupo-
controle. Isso está de acordo com o estudo realizado 
por Rauch et al. (1996) que expôs pacientes com 
TEPT a narrativas pictográficas relacionadas com 
>ituações traumáticas e verificou, via PET, um 
aumento na perfusão do lobo temporal direito 
ínsula, no córtex associativo, no córtex órbito-fron-
tal e no cingulado anterior, com diminuição da 
perfusão no córtex frontal inferior esquerdo e no 
córtex temporal medial, embora os autores não 
tenham estudado um grupo-controle. 
Bremner et al. (1997b) utilizaram a PET após 
a administração de ioimbina (um agonista beta 2 
adrenérgico que estimula a liberação cerebral de 
noradrenalina) ou placebo a combatentes vetera-
nos do Vietnã e a controles saudáveis. O aumento 
cia função noradrenérgica tem sido implicado na 
génese de muitos dos sintomas do TEPT. Dessa 
maneira a ioimbina pioraria os sintomas de TEPT 
e de ansiedade. Os resultados desse estudo mostra-
ram que a ioimbina resultou em um aumento 
significativo nos sintomas ansiosos nos pacientes 
com TEPT, mas não nos controles. Aliado a isso 
K resultados da PET demonstraram que ocorreu 
diminuição do metabolismo da ioimbina no hipo-
campo (p = 0,006) dos pacientes com TEPT e um 
aumento desse metabolismo no córtex pré-frontal 
p<0,003) e órbito-frontal (p< 0,001) dos controles. 
Resumidamente, há um aumento de noradrenalina 
no cérebro do paciente com TEPT em função de 
seu metabolismo estar alterado. 
Um resultado intrigante é o de Shin et al. 
2004), no qual os autores verificaram que bom-
r>eiros com TEPT (n = 8) demonstraram uma di-
minuição do volume hipocampal direito em 
comparação com bombeiros sem TEPT (n = 8). A 
PET revelou que o grupo com TEPT mostrou uma 
resposta perfusional anormal no hipocampo du-
rante lembranças explícitas de material não-emo-
cional. A perfusão sanguínea mostrou-se aumen-
tada bilateralmente no hipocampo e amígdala 
esquerda. Além disso, a severidade dos sintomas 
de TEPT correlacionou-se positivamente com a 
perfusão no hipocampo e no giro para-hipocam-
pal, o que poderia justificar as diferenças encontra-
das no teste de memória. 
Assim, parece existir uma falha na ativação do 
córtex órbito-frontal ou regiões vizinhas, durante 
tarefas de manipulação experimental de material 
semanticamente associado com o evento traumáti-
co. Isso sugere uma possível base neuroanatômica 
para a falha na extinção do medo, manifestação tí-
pica do TEPT. O mecanismo de extinção envolve a 
inibição da função da amígdala por intermédio do 
córtex órbito-frontal. Se há dano nessa neuroes-
trutura, há falha nesse mecanismo. Por exemplo, 
um indivíduo que foi trancado em um closet quan-do criança pode continuar a demonstrar reações de 
ansiedade quando posteriormente, já adulto, tiver 
de pegar um casaco em algum outro closet, mesmo 
que não haja ameaça real de perigo. Uma falha na 
extinção poderia precipitar condicionamentos com-
portamentais que evitariam situações passíveis de 
lembrar esse indivíduo do evento traumático infantil. 
Isso acontece de maneira não consciente e nem 
sempre a memória para o trauma é recordada de 
maneira íntegra (pode ser apenas um fragmento 
sensorial) (Bremner, 1998). Por outro lado, há um 
estudo utilizando fMRI em pacientes traumatizadas 
com transtorno de personalidade borderline com (n 
= 6) e sem ( n = 6) TEPT que identificou predomi-
nância na ativação do córtex órbito-frontal nos pa-
cientes com TEPT (Driessen et al, 2004). É impor-
tante ressaltar que ambos os grupos tinham história 
de vitimização traumática. 
Estudos que utilizam a fMRI na investigação 
do TEPT têm demonstrado outras áreas neuroana-
tômicas comprometidas nesses pacientes. Lanius 
et al. (2003) compararam indivíduos com TEPT 
(n = 10) com controles saudáveis (n = 10), usando 
fMRI durante diferentes estados emocionais 
(neutro, triste, ansioso e traumático) induzidos por 
manipulações experimentais. Esses autores verifi-
caram que o grupo com TEPT demonstrou prejuí-
zo na ativação do tálamo e do giro cingulado em 
todos os estados emocionais (triste, ansioso e trau-
59 
Cicatrizes Neurobiológicas do TEPT 
mático). Uma falha na ativação do cingulado, 
identificada por fMRI, também foi um dos achados 
de Yang, Wu, Hsu, & Ker. (2004). 
Cicatrizes do TEPT ou do Trauma? 
Um resumo dos achados referentes à atrofia 
neuronal encontrados no TEPT é mostrado na Ta-
bela 1. Em decorrência dessas alterações estruturais 
e funcionais, a questão que surge é se essas atrofias 
são anteriores ao trauma, provocadas pelo trauma 
ou se são consequências do transtorno de estresse 
seguido ao trauma? 
Uma hipótese seria a que um hipocampo peque-
no poderia preceder o trauma e predispor o indivíduo 
a desenvolver TEPT. Nesse sentido, fatores de risco 
conhecidos para TEPT como déficit de atenção e 
hiperatividade, problemas de aprendizagem, baixos 
níveis de QI, história familiar de psicopatologia e 
maus-tratos infantis, poderiam corroborar com essa 
hipótese de vulnerabilidade prévia ao evento trau-
mático desencadeante do transtorno. Além disso, o 
TEPT ocorre em apenas algumas das pessoas 
expostas a eventos traumáticos. Essa hipótese é 
consistente com um estudo realizado com gémeos 
monozigóticos, no qual somente um dos irmãos ti-
nha ido ao Vietnã. O estudo revelou que aqueles 
veteranos com TEPT possuíam hipocampos 
significativamente menores que os veteranos sem 
TEPT, quando avaliados por MRI. O diferencial nesse 
estudo foi o fato de que os irmãos gémeos que haviam 
ficado nos Estados Unidos e, assim, não expostos a 
eventos de guerra, também apresentaram redução 
hipocampal (Gilbertson et al, 2002). 
Por outro lado, outras pesquisas demonstram 
que os achados sobre atrofia neuronal poderiam 
estar relacionados ao trauma propriamente dito e, 
somente depois, desenvolver TEPT. O trauma pro-
vocaria alterações no tecido cerebral, o que torna-
riam o indivíduo susceptível a desenvolver algu-
ma psicopatologia. Nesse sentido, o trabalho do 
Dr. Martin Teicher é muito interessante (Teicher, 
Andersen, Polcari, Anderson, Navalta, & Kim, 
2003). Sua equipe estudou as consequências neu-
robiológicas do estresse e maus-tratos ocorridos 
na infância. Em uma perspectiva neurobiológica, 
o estresse precoce assumiria um papel disruptivo 
no desenvolvimento normal da criança: alteraria o 
estado neuroendócrino e modificaria algumas 
estruturas cerebrais definitivamente (Bremner, 
1999). Algumas dessas alterações incluem sensibi-
lização da hipófise anterior e contra-regulação 
adaptativa do córtex adrenal (Heim, Newport, 
Bonsall, Miller, & Nemeroff, 2001), redução do 
tamanho do corpo caloso, atenuação do desenvol-
vimento do neocórtex esquerdo, hipocampo e 
amígdala, aumento de irritabilidade elétrica nas 
estruturas límbicas e redução da atividade funcio-
nal do vermis cerebelar (Teicher et al, 2003). 
O neurodesenvolvimento é um processo pro-
gramado: as células progenitoras nascem, diferen-
ciam-se e migram paia suas localizações finais. 
Além disso, as redes neuronais serão formadas pela 
arborização dendrítica a qual dará origem às 
conexões sinápticas, responsáveis pela codificação 
de todas as nossas informações. No cérebro dos 
mamíferos, essas conexões são superproduzidas e 
eliminadas, em aproximadamente 50%, durante 
dois períodos evolutivos: imediatamente após o 
nascimento e durante a transição da infância e da 
adolescência à idade adulta. Todo esse processo 
de maturação neurológica compreende uma etapa 
de desenvolvimento neuronal, conhecida como 
neurogênese. Para que isso ocorra, existem 
substâncias químicas responsáveis pela regulação 
da sobrevivência, diferenciação e manutenção da 
função dos neurónios no cérebro, denominadas 
neurotrofinas. Sua síntese e secreção são reguladas 
pela atividade neuronal, que é diretamente 
relacionada aos estímulos ambientais. Essa ativida-
de neurogênica é especialmente aumentada nos 
dois primeiros anos de vida, quando se observa 
um crescimento sequencial, uma extraordinária 
proliferação e uma superprodução de axônios, 
dendritos e sinapses nas diferentes regiões do 
cérebro (Glasser, 2000). Esse processo é 
geneticamente determinado. Contudo, algumas das 
conexões sinápticas formadas deixam de existir em 
razão da falta de uso e outras passam a ser forma-
das em decorrência de uma necessidade de sua 
existência. Esse fenómeno é conhecido como 
plasticidade. No período da infância e adolescên-
cia, o neurodesenvolvimento é particularmente 
6o 
Rodrigo Grassi-Oliveira, Giovanni Kuckartz Pergher e Lilian Miinitsky Stein 
. : .irrite das influências ambientais, pois é o 
período de maior plasticidade neuronal: as 
« • e x õ e s não utilizadas são "podadas'" e as 
• irias, formadas (Andersen, 2003). Dessa 
•Krseira. a exposição a elementos positivos ou 
•EEtivos antes da adolescência poderia impactar 
. - grafia adulta final de uma maneira diferen-
_ • e a mesma exposição ocorresse depois dessa 
- r exemplo, se estiverem ausentes estimu-
^cNes precoces como o toque, conversa e afeto, 
. nexões sinápticas responsáveis por esses 
cafaulos serão interpretadas como inúteis e eli-
•Èsadas. No sentido da "poda neuronal1', os maus-
laios infantis podem ser entendidos como impor-
2r:e> agentes de disrupção neurodesenvolvimental 
"csdersen, 2003), provocando cicatrizes neurobio-
r.:as em algumas estruturas, o que poderia tor-
E T alguns indivíduos vulneráveis a detenninados 
rr»?s de psicopatologias, principalmente TEPT, 
nritornos de personalidade anti-social, borderline 
: r_n-torno do déficit de atenção e hiperatividade 
írdchere? al., 2003). 
Em relação ao TEPT, identificam-se na litera-
_ra três tipos de estudos empíricos relacionando 
-aas-tratos na infância e TEPT: (1) estudos de 
.corte prospectivos, relativamente curtos, com 
crianças vítimas de abusos, internadas ou enca-
mnhadas para serviços de psiquiatria; (2) estudos 
Nos-controles com adultos vítimas de maus-
ratos ou com TEPT; e (3) estudos transversais ba-
seados na prevalência de TEPT em amostras de 
adolescentes ou adultos que retrospectivamente 
relatam história de abuso ou negligência na infância 
Widom, 1999). A maioria desses estudos identifi-
cou que os maus-tratos infantis constituem um 
portante fator de risco para o desenvolvimento 
i ; TEPT, mesmo quando possíveis fatores que 
geram confusão nos dados são controlados. Widom 
1999) realizou um estudo de coorte no qual um 
r~apo de mais de mil crianças, divididas em dois 
jrupos: vítimas de maus-tratose um outro grupo-
controle. Esses indivíduos foram acompanhados 
tornarem-se adultos, observando-se o risco de 
:r?envolverem TEPT. A história de maus-tratos 
mfantis aumentou significativamente a chance 
:Jds ratio = 1.75) para TEPT ao longo da vida. 
Em nosso país, Grassi-Oliveira & Stein (2004) 
realizaram um estudo pioneiro na investigação da 
associação entre TEPT e maus-tratos na infância 
em homens e mulheres de baixa renda, usuários 
de um hospital público do sul do Brasil. Os auto-
res observaram que a história de abuso e negli-
gência na infância, de uma maneira em geral, pos-
sui forte associação com sintomas de TEPT na vida 
adulta. Além disso, identificaram algumas diferen-
ças entre os sexos: os homens parecem ser mais 
vulneráveis ao efeito de abuso e negligência infantil 
no desenvolvimento de TEPT do que as mulheres, 
ao contrário do que é descrito na literatura norte -
americana (Brewin, Andrew, & Valentine, 2000). 
Homens com história de abuso sexual na infância 
parecem ser mais vulneráveis para TEPT na vida 
adulta, porém, se esse tipo de abuso for acompa-
nhado de abuso emocional, os homens tornarn-se 
particularmente mais susceptíveis. Por outro lado, 
nas mulheres, a negligência emocional infantil 
mostrou ser o tipo de maus-tratos com maior 
influência no desenvolvimento de TEPT. 
Finalmente, alguns estudos postulam que as 
alterações morfológicas encontradas, principal-
mente no hipocampo, seriam consequências 
provocadas pelo TEPT. Essa última hipótese é de-
fendida pelo Dr. Bremner e seus colegas, conforme 
discutido anteriormente nesse capítulo. Porém, 
considerando-se que o TEPT é um distúrbio 
crónico e cumulativo, qualquer atrofia detectada 
deverá ser analisada dentro de um processo em 
constante evolução. O fato é que não existem da-
dos suficientes na literatura para determinar se a 
atrofia neuronal é ou, ainda, anterior ao trauma, 
ou uma consequência do trauma ou o resultado do 
período pós-traumático. 
Possíveis Explicações 
Em primeiro lugar é importante lembrar que 
normalmente, entre idosos, a redução do hipocam-
po correlaciona-se com prejuízo na consolidação 
da memória explícita de longo prazo, assim como 
com o aumento no nível de cortisol (Golomb 
et al, 1994; Lupien <??al, 1998). 
Todavia, assumindo uma perspectiva fisiopa-
tológica para explicar como ocorre o dano neuronal, 
01 
Cicatrizes Neurobiológicas do TEPT 
uma das hipóteses aventadas seria a de que altos 
níveis de glicocorticóides (cortisol) seriam libera-
dos durante uma situação de estresse agudo (abuso) 
e resultaria em dano hipocampal (Sapolsky, 1996). 
A exposição a altos níveis de cortisol levaria a uma 
diminuição da arborização dendrítica e perda 
neuronal, o que cronicamente explicaria essas 
reduções neuroanatômicas (Bremner, 1998). Nesta 
perspectiva, o estresse seria associado com um 
aumento da atividade do eixo hipotálamo-hipófise-
adrenal (HPA). Todavia, alguns estudos têm 
mostrado que adultos com TEPT apresentam uma 
hiporresponsividade desse eixo. O achado mais 
relevante seria de que esses indivíduos possuem uma 
diminuição do cortisol circulante no organismo 
(hipocortisolemia), provavelmente relacionado com 
uma reprogramação do HPA ocorrido após alguma 
situação estressora prévia (via ativação crónica de 
altos níveis de cortisol pelo HPA) (Gunnar e 
Vazquez, 2001; Heim et al, 2001). 
Dentro de uma perspectiva evolucionista, Teicher 
et al (2003) assumiram inicialmente que o estresse 
precoce desencadearia uma cascata de efeitos neuro-
humorais e neurotransmissores que danificariam a 
estrutura e a função cerebral. Pensaram que os altos 
níveis de cortisol, que poderiam reprogramar o eixo 
HPA, precipitariam lesões neurotóxicas hipocampais. 
Dentro desse ponto de vista, o estresse excessivo 
agiria como um agente tóxico que interferiria no pro-
cesso de neurodesenvolvimento habitual. As altera-
ções neuropsiquiátricas associadas a eventos 
estressantes precoces seriam resultados dessa forma 
de agressão ao tecido cerebral. 
Todavia, o próprio autor reavaliou essa pers-
pectiva inicial. Atualmente sua equipe sustenta a 
hipótese de que as alterações neurodesenvol-
vimentais representariam uma forma alternativa e 
adaptativa que o organismo precisou passar em 
virtude de um estressor. Um indivíduo que nasceu 
em um ambiente desfavorável e estressante terá 
de modificar sua estrutura (psíquica e neurológica) 
para poder se adaptar a essas experiências tóxicas 
infantis. Em alguma etapa inicial do desenvolvi-
mento, essas organizações teriam sido necessárias, 
porém, na tentativa de serem empregadas fora de 
contexto, tornar-se-iam desadaptadas, inúteis e 
potencialmente prejudiciais (ou "muito caras") 
para o indivíduo quando em um ambiente mais 
favorável (Teicher, 2003). 
Desse modo o conceito de peso alostático é 
retomado e, atualmente, parece ser o modelo expli-
cativo mais apropriado para o entendimento dos 
achados de neuroimagem como cicatrizes neuro-
biológicas associadas ao TEPT. 
Tabela 1. Resumo dos achados referentes à atrofia neuronal encontrados no TEPT 
Achados TEPT 
Dimensão da atrofia detectada 5% - 26% 
Lateralidade da atrofia Dados conflitantes 
Especificidade Anatómica Principalmente no hipocampo 
Consequências funcionais Forte evidência de prejuízo na memória explícita 
Quando ocorreu a atrofia Não há consenso 
Possíveis mecanismos envolvidos na atrofia Perda celular e inibição da neurogênese? 
Papel dos glicocorticóides Nenhuma influência se a atrofia preceder o 
trauma; Indiretamente implicados se a atrofia for 
decorrência do trauma; Evidências conflitantes se 
a atrofia provier do TEPT. 
Fonte: Tabela adaptada de Sapolsky (2000) 
62 
Rodrigo Grassi-Oliveira, Giovanni Kuckartz Pergher e Lilian Milnitsky Stein 
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