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Abusividade nas taxas de juros em contratos financeiros

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Abusividade nas taxas de juros em contratos financeiros: Possibilidade de revisão de cláusulas contratuais
Resumo: O presente estudo visa destacar alguns aspectos referentes a consumidores que na expectativa de adquirir bem móvel ou imóvel e estar fazendo um bom negócio acabam por aderir a contratos financeiros que na maioria das vezes estabelecem a capitalização mensal de juros, correção monetária cumulada com comissão de permanência e juros moratórios e remuneratórios acima do limite legal, onerando excessiva e unilateralmente o contrato. Nesta seara, a revisão contratual, portanto, não tem o objetivo de ultrapassar a vontade das partes e gerar insegurança ao vínculo contratual, mas reequilibrar o contrato com a finalidade de preservá-lo, com a possibilidade de satisfação dos interesses legítimos dos envolvidos.
Palavras-chave: Taxas de juros. Abusividade. Contratos financeiros
Sumário: 1. Introdução, 2. Limitação de Juros: breve consideração histórica, 3. Revisão dos Contratos Financeiros à Luz do CDC; 4. Aplicabilidade do CDC em Contratos de Adesão; 5. A Violação ao Princípio da Boa-Fé e o Direito de Informação; 6. Arbitrariedade Contratual; 7. Breve consideração sobre a Tabela Price, anatocismo e o “bis in idem”; 8. Conclusões; 9. Referências
1 INTRODUÇÃO
Um dos grandes problemas enfrentados há muito tempo na doutrina e jurisprudência refere-se acerca da possibilidade ou não da incidência dos juros remuneratórios em contratos financeiros limitados em 12% ao ano principalmente no que tange aos estabelecidos pelas instituições financeiras, cooperativas de créditos e bancos.
O art. 192, § 3º da Constituição Federal de 1988 limitava a aplicabilidade de juros no percentual de 12% ao ano, mas a edição da Emenda Constitucional nº 40/2003 esta revogou tal limitação, e coube, a partir de então, ao Conselho Monetário Nacional, nos termos da Lei nº 4.595/64 esta limitação.
Entretanto, ante a aplicabilidade do disposto no Decreto nº 22.626 de 07 de abril de 1933, conhecida como Lei da Usura e também Código Civil Brasileiro de 1916 impôs-se a limitação dos juros remuneratórios legais como sendo, no máximo de 12% ao ano e, neste sentido, qualquer ajuste desprovido de especificação acerca da taxa de juros remuneratórios deveria, necessariamente, pautar-se na disciplina da lei civil.
Ocorre que as instituições financeiras não se submetem aos limites da Lei de Usura o que também perdeu força diante da súmula nº 596[1] do STF a qual aduz que não se aplicam as disposições do Decreto ora citado às taxas de juros e a outros encargos inseridos em operações financeiras, onerando, em muito, os contratos pactuados.
As taxas de juros nos patamares praticados na atualidade contrariam a função social do contrato, sendo que este tem sua razão de ser no interesse da coletividade e na produção, sendo um serviço essencial ao desenvolvimento da sociedade fornecendo crédito para a produção da multiplicação do dinheiro disponível no mercado financeiro, sendo que com essas finalidades deve estar afinada a disciplina legal dos juros.
2 LIMITAÇÃO DE JUROS: BREVE CONSIDERAÇÃO HISTÓRICA
Historicamente o Direito Financeiro, no decorrer dos tempos, passou por inúmeras tentativas de controle a fim de estabelecer taxas máximas ou mínimas de juros. Alencar (2006, p. 5), ressalta que:
“[...] no Estado Moderno, na sua feição social, inspirada na Constituição de Weimar, afirmou todavia sua intervenção ampla tanto no plano econômico como no social, só admitindo a cobrança de juros até determinado teto e combatendo todas as formas de agiotagem e de usura, considerando-se até como figuras típicas de direito penal.”
Sendo assim, vale dizer que o mundo civilizado combatia e combate a usura, por reconhecer que o lucro exagerado do capital impedia e impede o desenvolvimento dos demais setores econômicos, tanto que Caio Mario da Silva Pereira se pronunciou neste sentido, justificando as restrições impostas pela Lei de Usura e nos períodos de crise, sentia o legislador ao baixar o Decreto 22.626 de 1933[2] que os abusos eram levados aos extremos de asfixiarem toda iniciativa honesta.
Assim o intervencionismo estatal voltou a regulamentar a prática dos juros, o art. 1º caput e o §3º da Lei de Usura dispõe que:
“Art. 1º. É vedado, e será punido nos termos desta Lei, estipular em quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal. [...]
§3º. A taxa de juros deve ser estipulada em escritura pública ou escrito particular, e não o sendo, entender-se-á que as partes acordaram nos juros de 6% ao ano, a contar da data da propositura da respectiva ação ou do protesto cambial.”
Sob o comando do artigo 11 do Decreto ora mencionado, os contratos celebrados à época que sofressem infração seria nulo de pleno direito, e ficava assegurada ao devedor a repetição do que havia sido pago a maior.
Com o advento da Lei nº 4.595/64, denominada “Lei da Reforma Bancária”, em sua ementa dispunha que sobre a Política e as Instituições monetárias, bancárias e creditícias criava o Conselho Monetário Nacional[3], segundo o qual as diretrizes eram estabelecidas pelo Presidente da República no sentido de limitação das taxas de juros sempre que necessárias em operações e serviços bancários ou financeiros (art. 4º), encerrando o limite previsto Pela lei de Usura. Neste sentido as restrições impostas pelas leis comuns às taxas de juros não mais se aplicariam aos bancos (ABRÃO, p. 71, 1999).
Com proficiência no assunto o professor Marçal Justen Filho[4] relatou que, juridicamente, não compete ao Conselho Monetário Nacional autorizar a cobrança da comissão de permanência ou dispor sobre normas relacionadas a contratos praticados entre instituições financeiras e particulares, podendo somente receber competência administrativa, nunca normativa.
O Supremo Tribunal Federal se pronunciou em 1976 editando a súmula nº 596, dispondo em seu bojo que “as disposições do DL 22.626/93 não se aplicam às taxas de juros aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições financeiras públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional”, o tema, entretanto, nunca foi objeto de pacífica interpretação entre os doutrinadores.
Grande celeuma se instalou no contexto jurídico da época no sentido de que a Lei nº 4.595/64 jamais revogou a Lei de Usura, a sua finalidade principal foi dar subsídios para as classes produtoras, o que se tornaria impossível com juros superiores a 12% ao ano, pois num país de dimensões continentais, necessitava de um setor produtivo forte e competitivo (TOLENTINO, p. 5, 2007).
Nos contratos financeiros de um modo geral nota-se que há uma inserção exagerada na taxa de juros remuneratórios – juros que objetivam remunerar ou recompensar o mutuante pelo uso do capital e, neste sentido, numa visão constitucionalista do direito privado, este atingiu em cheio tais contratos, submetendo o patrimônio à pessoa do contratante, ferindo o princípio da igualdade na sua essência. O fator de discriminação eleito encontra abrigo no fato de terem as pessoas jurídicas o caráter de instituições financeiras, pois se criou a possibilidade de cobrarem juros acima da taxa da Lei de Usura (MELLO, p. 99, 1993).
Nesta seara há uma grande concentração de recursos nas mãos de poucos contrariando um dos objetivos erigidos na Carta Magna, artigo 3º, III, qual seja o de erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais, ferindo o art. 170 CF/88[5].
Tal preceito subordina a livre iniciativa à justiça social, conferindo o aspecto finalístico da ordem econômica e devido a esta especulação financeira das grandes corporações tem levado em detrimento à boa fé objetiva e equidade nas relações comerciais e ou financeiras.
Neste sentido, Luiz Edson Fachin (2000, p. 244) afirma que:
“A Constituição Federal de 1988 operou uma inversão ao erigir fundamento da República a dignidade da pessoa humana, impondo ao Direito Privado o abandono da postura patrimonialista herdada do século XIX e na qual se inspirou o CódigoCivil pátrio. Submete-se o patrimônio à pessoa: aquele se legitima enquanto meio de realização desta.”
As relações jurídicas devem ser perseguidas no sentido de um maior favorecimento da pessoa humana, atualmente nestes termos a vontade contratual deixou de ser o núcleo do contrato, abrindo espaço, entre outros valores jurídicos fundados na Constituição Federal. Nalin (2000, p. 79), assinala que isso é observado com grande destaque nas relações jurídicas contratuais, em que a vontade surge como mero papel de impulso, quando não, completamente inexistente, no âmbito das relações de contrato de adesão.
É pacífico o entendimento em grande parte da doutrina a respeito das taxas de juros aplicadas aos contratos, assim também é a opinião de Mário Soares Caymmi Gomes (2004, p. 2):
“(...) há de haver proporcionalidade entre a necessidade do sistema de sancionar o devedor faltoso e a necessidade de se adequar tal imperativo com as garantias de dignidade da pessoa humana e intangibilidade patrimonial previstas nos artigos 170, caput e 5º, XXII, ambos da Constituição Federal, de maneira que a falta de pontualidade não pode levar à espoliação completa do accipiens.”
Para tecer uma noção geral sobre juros remuneratórios a ciência jurídica, apoiando-se nas conceituações econômicas, qualifica os juros como sendo o preço do uso do capital, ou seja, o fruto civil. Rodrigues (2002, p. 315) diz que ele (fruto) a um tempo remunera o credor por ficar privado de seu capital e paga-lhe o risco em que incorre de o não receber de volta.
Destarte, possui significado equivalente a ganhos, usuras, interesses ou lucros. Leciona Caio Mario (1981, p. 110):
“Chamam-se juros as coisas fungíveis que o devedor paga ao credor, pela utilização de coisas da mesma espécie a este devidas. Pressupõe uma obrigação de capital, de que o juro representa o respectivo rendimento, distinguindo-se com toda nitidez das cotas de amortização. Na idéia de juro integram-se dois elementos: um que implica a remuneração pelo uso da coisa ou quantia pelo devedor, e outro que é a de cobertura do risco que sofre o credor.”
Juros remuneratórios, portanto, são aqueles que representam uma compensação pelo uso que o devedor faz do capital, em razão de cobertura dos sacrifícios de abstinência e riscos sofridos pelo credor; enquanto os juros moratórios constituem uma indenização pelo atraso culposo do pagamento, (ALENCAR, p. 2, 2006).
Neste sentido, importante ressaltar que nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser consignado no respectivo instrumento.
Assim, uma vez ausente a fixação da taxa no contrato, quando da sua revisão, o juiz deve limitar os juros à média de mercado nas operações da espécie, divulgada pelo Banco Central, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente. O entendimento foi pacificado pela Segunda Seção do STJ, no julgamento de dois recursos especiais impetrados pelo Unibanco.
Ao analisar os processos a ministra Nancy Andrighi, no seu entender, relata que nos contratos bancários que preveem a incidência de juros, mas não especificam seu montante, têm de ter essa cláusula anulada, já que deixam ao arbítrio da instituição financeira definir esse índice. Há casos, porém, em que o contrato é omisso quanto a essa questão, é preciso interpretar o negócio considerando-se a intenção das partes ao firmá-lo.
Para a ministra, a utilização da taxa média de mercado é adequada porque é medida por diversas instituições financeiras, representando, portanto, o ponto de equilíbrio nas forças do mercado, e seu uso, nos processos sob análise, é a “solução que recomenda a boa-fé”. A jurisprudência do STJ tem utilizado a taxa média de mercado na solução de conflitos envolvendo contratos bancários.
Paralelamente, o Tribunal tem reiterado o entendimento de que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade. (REsp. nº 1112879 e 1112880 – STJ).
3 REVISÃO DOS CONTRATOS FINANCEIROS À LUZ DO CDC
Não se pode olvidar sobre a possibilidade de revisão judicial de contratos bancários diante do desequilíbrio na relação contratual, levando-se em consideração a idéia de cláusula abusiva no momento de formação do contrato, a vantagem exagerada de uma das partes e a lesão subjetiva ou o chamado dolo de aproveitamento. O novo Código Civil, no art. 157,[6] reintroduz, no ordenamento, a lesão como modalidade de vício do negócio jurídico. (VENOSA, 2006). É também o entendimento de Paulo Villela (2002), quando aduz que:
“O instituto da lesão justifica-se como forma de proteção ao contratante que se encontra em estado de inferioridade. No contrato, mesmo naqueles paritários, ou seja, naqueles em que as partes discutem livremente suas cláusulas, em determinadas situações, um dos contratantes, por premências várias, é colocado em situação de inferioridade.”
O instituto da lesão justifica-se como forma de proteção ao contratante que se encontra em estado de inferioridade, caracterizado pelo prejuízo resultante da desproporção existente entre as prestações de um determinado negócio jurídico, em face do abuso da inexperiência de um dos contratantes.
No contrato, mesmo naqueles paritários, ou seja, naqueles em que as partes discutem livremente suas cláusulas, em determinadas situações, um dos contratantes, por premências várias, é colocado em situação de inferioridade. (GAGLIANO & FILHO, p. 370, 2004).
Sabe-se que a teoria geral clássica do contrato tem sua origem nos séc. XVIII e XIX época em que na filosofia vigorava o individualismo de base Kantiana; na análise de Celso Oliveira (1998), a economia explodia o liberalismo e na política desenvolviam-se as idéias de abstencionismo, recomendando-se ao Estado que não se imiscuísse nas atividades privadas e nas relações negociais entre particulares.
Um dos reflexos dessas idéias no direito contratual foi a consagração do voluntarismo jurídico, ou seja, a construção jurídica no direito obrigacional voltou-se completamente para a autonomia da vontade e liberdade contratual.
Como corolário natural do princípio da liberdade contratual foi desenvolvido o princípio da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda), segundo o qual o contrato faz lei entre as partes (conforme a conhecida fórmula do "Code Napoleon").
São características desse princípio a coercibilidade do que foi avençado e a irrevogabilidade unilateral das cláusulas contratuais. Somente o caso fortuito ou de força maior pode liberar a parte contratante de cumprir a avença. Ao Judiciário restaria apenas o controle formal do contrato, sendo-lhe defesa a análise das questões relativas à justiça contratual. (ROPPO, Enzo. O contrato. Coimbra: Almedina, 1988)
Nesse sistema, fundado na mais ampla liberdade de contratar, não havia lugar para a questão da intrínseca igualdade, da justiça substancial das operações econômicas, afigurando-se, em muitos casos, como regra flagrantemente injusta. (GACLIANO & FILHO, p. 6, 2007).
Tal concepção jurídica (do voluntarismo contratual) atingiu seu apogeu no século passado, por influência do Código Civil francês, e entrou em franco declínio no século presente, diante da constatação de que a igualdade entre as partes contratantes era apenas teórica e formal, chocando-se com uma desigualdade material entre os indivíduos.
Sente sentido, quando as partes estão desigualadas materialmente, e se lhes concede liberdade para estabelecerem as cláusulas contratuais, a inexorável conseqüência é a exploração da parte mais necessitada pela parte economicamente mais avantajada. (GOMES, p. 6, 1999).
O liberalismo contratual mostrou, assim, toda a sua insuficiência, diante da ausência de uma efetiva vontade contratual. Havia necessidade de uma função social do direito privado. Uma nova realidade contratual se manifesta nos nossos dias, tornando necessária a vinculação da teoria do contrato com a base econômica geral.
Percebe-se nitidamente o surgimento dos contratos de massa, que são previamentedefinidos através de cláusulas contratuais gerais, elaboradas por uma das partes contratantes e impostas à aceitação da outra parte, que normalmente não tem alternativa senão aceitar, em bloco, tais cláusulas.
A liberdade contratual tornou-se apenas um ideal - inexistente na prática. Neste sentido, nos dizeres de Paulo Roberto Nalin (p. 109, 2002):
“O homem contratante acabou, no final do século passado e início do presente, por deparar com uma situação inusitada, qual seja, a de despersonalização das relações contratuais, em função de uma preponderante massificação, voltada ao escoamento, em larga escala, do que se produzia nas relações industriais.”
O que se constata é que a realidade diverge francamente do que havia outrora quando da construção da teoria geral do contrato. Não se pode mais aplicar, de forma automática e mecânica, os ideais do voluntarismo jurídico e da obrigatoriedade do pacta sunt servanda.

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