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Relações de Saber e Poder

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Universidade Federal de Santa Maria 
Departamento de Ciências Sociais e Humanas 
Curso de Direito 
Direito e Política 
Prof. Dr. Jerônimo Siqueira Tybusch 
Acadêmicas: Gabriela Brum e Izabella Gutierres 
 
Comentário crítico acerca do texto “SABER-PODER” escrito por Leonel Severo 
Rocha e Albano Marcos Bastos Pepê 
 
Michel Foucault, importante filósofo e teórico social, elaborou teorias que 
abordam a relação entre poder e conhecimento e como estes são usados ​​como 
forma de controle social por meio das instituições sociais. O texto “saber-poder” de 
Leonel Severo Rocha e Albano Marcos Bastos delineia muito bem estas questões 
desenvolvidas por Foucault, apontando a importante relação entre saber e poder 
que Michel estabelece. 
Foucault em sua teoria assegura que não há nem um saber neutro, 
afirmando que todo saber é político, pois sua origem está nas relações de poder. Ou 
seja, para Michel, o poder se mantém através da produção do saber que se dá 
pelas mãos da classe dominante a qual se legitima por meio da legalidade. 
Portanto, se faz necessário renunciar a idéia de que só irá existir saber onde 
as relações de poder forem suspensas e que o mesmo só poderá desenvolver-se 
fora de seus interesses. Foucault aponta para a necessidade de admitirmos que o 
poder produz saber e que ambos estão diretamente implicados, pois não há relação 
de poder sem a constituição correlata de um campo de saber, nem saber que não 
suponha e não constitua, ao mesmo tempo, relações de poder. 
Dessa forma, admite-se que as relações de poder/saber são as que 
delimitam o próprio sujeito de conhecimento, que passa a ser produzido por elas, 
pois o poder se mantém exatamente pela produção positiva de saber e discursos 
que atravessam todo o corpo social. Um saber se define por possibilidades de 
utilização e de apropriação oferecidas pelo discurso, que nada mais é do que um 
conjunto de pensamentos que são oriundos de relações de poder entre os 
indivíduos, defendendo e legitimando as ideologias. 
Veremos então que o discurso sempre se produz em razão das relações de 
poder e que portanto é um produto da sua época, do poder e saber de seu tempo. O 
discurso é baseado em pensamentos e condições de mundo em que o grupo ou 
sujeito procura legitimá-lo de acordo com seus interesses. 
Para Foucault o conhecimento não é algo intrínseco ao homem, mas algo 
inventado por ele e para ele, e que gera poder na pessoa que o legitima. O poder é 
um direito que está inserido na sociedade, pois todos somos regidos por lei, a fim de 
sermos disciplinados. Foucault também define o poder como uma verdade, está 
estabelecido nos discursos, em que se pauta pelos que legitimam o seu poder e os 
que são hostilizados e assim, aceitam em sua psique tais mecanismos. Portanto, a 
verdade é produzida pelo poder, e assim cada sociedade produz as suas verdades, 
pautando-as em seus próprios discursos. 
Michel Foucault afirma também que o saber é resultado das práticas de 
disciplina que ocorrem ao longo do tempo e que são analisadas. Ou seja, para ele, 
trata-se de uma organização de coisas para produzir conhecimento, o que foi dito 
em determinado momento histórico sobre determinado tema. 
Assim, o ato discursivo não se trata de um ato interpretativo, mas sim de um 
ato que busca a legitimação da verdade produzida pelo sujeito. Dessa forma, é 
possível relacionar o discurso de cada grupo como um mecanismo de gerar poder. 
Uma vez admitido que o saber é artifício de manutenção de poder, é possível 
perceber que ele se apresenta nas formas de dominação propostas por Weber 
também. Dessa maneira, para manutenção do poder legal, obediência é prestada 
não à pessoa, em motivo de direito próprio, mas à norma, que se conhece 
competente para designar a quem e em que extensão deverá ser obedecida. 
No tipo de dominação tradicional, o discurso é alicerçado no respeito à 
pessoa, em razão da tradição de uma dignidade pessoal que é julgada sagrada. O 
comando é originário das normas da “lei moral”, impostas pelo discurso tradicional. 
A dominação carismática seja, talvez, o melhor exemplo de poder pelo 
discurso, já que é aquela devido ao apreço puramente dito, à admiração pessoal ao 
dominador e a seu carisma, ou seja, suas qualidades, seus poderes. Tanto é 
verdade que os tipos mais puros são os profetas e os demagogos. 
Seguindo essa linha de raciocínio, o saber instrumentaliza o poder e este se 
legitima pelo procedimento. Esse é o funcionamento jurídico atual do Brasil. 
Em nome da segurança e neutralidade jurídicas ocorreu um processo de 
positivação do direito, acarretando na tecnificação do direito público. Ou seja, a 
legitimação se dá pelo procedimento, uma vez respeitados os requisitos formais, a 
norma é legítima, sem análise do caso material. A legitimação não deveria 
verificar-se somente no plano da legalidade, uma vez que ela se encontra também 
na forma e nos motivos pelos quais são tomadas as decisões, intrinsecamente 
ligadas ao discurso, que nunca é neutro. Acontece, assim, uma adaptação da 
sociedade à norma, essa representando o tipo dominador, quando deveria ser o 
oposto. 
A legitimidade é alcançada através da consulta aos por ela atingidos, por 
exemplo, quando uma lei for inserida em uma determinada sociedade. No Estado, 
primeiro se busca o cumprimento pela legitimação, só para depois utilizar-se da 
força. Basear-se em argumentos legalistas para justificar decisões judiciais injustas, 
portanto, significa contribuir para subjugar e não dar efetividade à “essência da 
função judicante”, para submeter-se ideológica e politicamente ao legislado. O 
Estado por sua vez, vem a se caracterizar por diferentes formas de governo. 
A pretensa desculpa da procedimentalização em prol da neutralidade, 
imparcialidade e segurança é uma farsa, uma vez que, como assegura Foucault, a 
produção de conhecimento é intimamente contígua às relações de poder. Assim 
sendo, os procedimentos servem àqueles que os inventaram, pois o conhecimento, 
assim como o poder, não é neutro.

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