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LIVRO TEORIAS DO DISCURSO E ENSINO

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TEORIAS DO DISCURSO E ENSINO 
 
 
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul 
Chanceler: 
Dom Dadeus Grings 
 
Reitor 
Joaquim Clotet 
 
Vice-Reitor: 
Evilázio Teixeira 
 
Conselho Editorial: 
Antônio Carlos Hohlfeldt 
Elaine Turk Faria 
Gilberto Keller de Andrade 
Helenita Rosa Franco 
Jaderson Costa da Costa 
Jane Rita Caetano da Silveira 
Jerônimo Carlos Santos Braga 
Jorge Campos da Costa 
Jorge Luis Nicolas Audy (Presidente) 
José Antônio Poli de Figueiredo 
Jussara Maria Rosa Mendes 
Lauro Kopper Filho 
Maria Eunice Moreira 
Maria Lúcia Tiellet Nunes 
Marília Costa Morosini 
Ney Laert Vilar Calazans 
René Ernaini Gertz 
Ricardo Timm de Souza 
Ruth Maria Chittó Gauer 
 
 
EDIPUCRS: 
Jerônimo Carlos Santos Braga – Diretor 
Jorge Campos da Costa – Editor-chefe 
Carmem Luci da Costa Silva 
Claudia Stumpf Toldo 
Leci Borges Barbisan 
Lia Lourdes Marquardt 
Organizadoras 
 
 
 
 
 
 
 
TEORIAS DO DISCURSO E ENSINO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Porto Alegre 
2009 
© EDIPUCRS, 2009 
Capa: Deborah Cattani 
Diagramação: Stephanie Schmidt Skuratowski 
Revisão: Rafael Saraiva 
 
 
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) 
 
 
T314 Teorias do discurso e ensino [recurso eletrônico] / 
organizadoras, Carmem Luci da Costa Silva ... [et al.]. – 
Dados eletrônicos. – Porto Alegre : EDIPUCRS, 2009. 
263 p. 
 
Sistema requerido: Adobe Acrobat Reader 
Modo de Acesso: World Wide Web: 
<http://www.pucrs.br/orgaos/edipucrs> 
ISBN 978-85-7430-936-1 (on-line) 
 
1. Linguistica – Teorias. 2. Português – Ensino. 
3. Línguas Estrangeiras – Ensino. I. Silva, Carmem Luci da 
Costa. 
CDD 410 
 
Ficha Catalográfica elaborada pelo 
Setor de Tratamento da Informação da BC-PUCRS 
 
 
 
 
 
 
 
Av. Ipiranga, 6681 - Prédio 33 
Caixa Postal 1429 
90619-900 Porto Alegre, RS – BRASIL 
Fone/Fax: (51) 3320-3711 
E-mail: edipucrs@pucrs.br 
http://www.edipucrs.com.br 
COLABORADORES 
Carmem Luci da Costa Silva (UFRGS) 
Claudia Stumpf Toldo (UPF) 
Gisele Benk de Moraes (UPF) 
Magali Lopes Endruweit (UERGS) 
Neiva Maria Tebaldi Gomes (UNIRITTER) 
Neusa Maria Henriques Rocha (UPF) 
Niura Maria Fontana (UCS) 
Roberta Macedo Ciocari 
Sônia Litchenberg 
Tânia Maris de Azevedo (UCS) 
Telisa Furlanetto Graeff (UPF) 
Vania Morales Rowell 
SUMÁRIO 
APRESENTAÇÃO ......................................................................................................... 7 
 
PARTE 1 - TEORIAS DO DISCURSO E ENSINO DO PORTUGUÊS 
 
A língua portuguesa como instrumento de aquisição de conhecimentos no 
ensino fundamental: algumas reflexões ................................................................. 12 
Tânia Maris de Azevedo e Vania Morales Rowell 
 
Teorias linguísticas e o ensino da escrita .............................................................. 34 
Magali Lopes Endruweit 
 
Pela inserção do discurso na escola ....................................................................... 51 
Sônia Lichtenberg 
 
Argumentação e ensino de língua materna ............................................................ 77 
Carmem Luci da Costa Silva 
 
Para resumir textos: uma proposta de base semântico-argumentativa .......... 104 
Telisa Furlanetto Graeff 
 
Gêneros discursivos no ensino: o foco na interação verbal ............................. 133 
Neiva Maria Tebaldi Gomes 
 
O comportamento dos demonstrativos na organização dos enunciados ....... 153 
Claudia Stumpf Toldo e Neusa Maria Henriques Rocha 
 
PARTE 2 - TEORIAS DO DISCURSO E ENSINO DE LÍNGUAS 
ESTRANGEIRAS 
 
Construção da autonomia na formação do professor de língua estrangeira .. 175 
Niura Maria Fontana 
 
Operadores argumentativos little, a little, few, e a few no ensino inglês como 
língua estrangeira ..................................................................................................... 211 
Roberta Macedo Ciocari 
 
Uso de pero, sino e sin embargo através da teoria da argumentação na 
língua .......................................................................................................................... 236 
Gisele Benck de Moraes 
APRESENTAÇÃO 
Este livro foi organizado por um grupo de pesquisadores que 
desenvolvem, com o apoio do CNPq, o projeto “A construção do sentido no 
discurso”. 
Ao folhar as páginas desta obra, o leitor encontrará reflexões sobre 
questões teóricas e práticas acerca da língua e de suas perspectivas no 
complexo e heterogêneo mundo da educação. Pensar a realidade da língua é 
pensar que todos os discursos se constroem a partir do uso que dela se faz. 
Como escreveu Saussure em um de seus rascunhos*
Os textos que compõem este livro estão organizados em duas partes. 
Encontram-se, na primeira, estudos concernentes a teorias do discurso, 
aplicadas ao ensino da língua materna. Na segunda parte, há trabalhos que 
dizem respeito à aplicação de teorias ao ensino de línguas estrangeiras. 
, “a língua só é criada com 
vistas ao discurso”. Diante disso, queremos, neste livro, divulgar estudos 
desenvolvidos sob diferentes perspectivas teóricas do discurso e questionar 
alguns aspectos do ensino de língua, tanto materna quanto estrangeira, na 
escola, tendo presente que o professor precisa – acima de tudo – ser um 
profissional capaz de criar conhecimento e alternativas para a aprendizagem de 
seus alunos. Assim, os textos aqui apresentados se propõem a buscar um 
diálogo possível entre concepções teóricas, e são dirigidos a estudiosos da 
língua, a professores de modo geral e a alunos de Graduação, futuros 
professores. 
Na primeira parte, Tânia Maris de Azevedo e Vania Morales Rowell, em “A 
língua portuguesa como instrumento de aquisição de conhecimentos no ensino 
fundamental: algumas reflexões”, propõem uma abordagem para o ensino da 
língua portuguesa que leve em conta a língua como “ferramenta” para a 
aquisição de conhecimentos em todas as áreas. Para tanto, defendem uma 
concepção de ensino de língua materna a partir de pressupostos vinculados às 
 
* STAROBINSKI, Jean. As palavras sob as palavras: os anagramas de Ferdinand Saussure. São 
Paulo: Perspectiva, 1974. 
8 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
teorias linguísticas enunciativas, que se centram nos sentidos produzidos pela 
língua em uso na interlocução. 
Em “Teorias lingüísticas e o ensino da escrita”, Magali Lopes Endruweit 
reflete sobre a presença da escrita na escola e sua relação com as teorias 
linguísticas subjacentes às concepções de escrita. A discussão se dá em três 
momentos: o primeiro trata do entendimento segundo o qual a escola é o lugar da 
escrita por excelência; o segundo analisa as principais publicações presentes em 
sala de aula nos últimos trinta anos e o terceiro procura o significado da escrita 
na escola. 
Em “Pela inserção do discurso na escola”, Sônia Lichtenberg analisa o 
contexto ensino-aprendizagem da língua portuguesa nas escolas de níveis 
fundamental e médio, assim como os instrumentos utilizados para esse fim – 
gramáticas tradicionais e livros didáticos – questiona os limites de um ensino que 
deixa de lado a língua em uso e, em consequência, o discurso. A autora propõe 
um ensino centrado no funcionamento da língua no discurso a partir da Teoria da 
Enunciação de Émile Benveniste. 
No artigo “Argumentação e ensino de língua materna”, Carmem Luci da 
Costa Silva discute o saber teórico-metodológico do ensino de língua materna 
proposto pelos PCNs, bem como verifica, nessas diretrizes para os ensinos 
fundamental e médio, a presença de aspectosque contemplam o funcionamento 
enunciativo-argumentativo da língua. A partir disso, mostra análises centradas na 
Teoria da Argumentação de Oswald Ducrot para refletir sobre as possibilidades 
de exploração do uso argumentativos da língua em sala de aula. Assim, a autora 
pontua em seu texto duas questões relacionadas: (1) o tratamento da língua em 
uso e (2) a consideração da argumentação no uso da língua. 
“Para resumir textos: uma proposta de base semântico-argumentativa” é 
um artigo em que Telisa Furlanettto Graeff testa uma metodologia de resumo de 
textos expositivo-argumentativos com base nas teorias da Polifonia e dos Blocos 
Semânticos propostas por Oswald Ducrot e Marion Carel. A aplicação dessa 
metodologia a alunos de Pós-Graduação em Letras em nível de Mestrado 
revelou-se adequada, visto que os alunos passaram, a partir dessa metodologia, 
a produzir resumos considerando os princípios necessários a esse gênero 
 
Teorias do Discurso e Ensino 9 
textual: completude (presença/ausência de unidades semânticas básicas), 
economia e fidelidade. 
“Gêneros discursivos no ensino: o foco na interação verbal”, de Neiva 
Maria Tebaldi Gomes, estuda a possibilidade de levar os gêneros discursivos 
para a escola. Essa atividade permite, conforme a autora, compreender o espaço 
escolar como uma extensão do grande espaço das relações sociais em que se 
movem e se constituem os sujeitos. Esse estudo mostra que, independentemente 
de perspectivas teóricas, falar de gêneros na Linguística é ter como foco a 
interação pela linguagem, é tratar das formas de interação verbal que se 
constroem nas práticas sociais, procurando entender melhor o que o homem faz 
com a linguagem. 
“O comportamento dos demonstrativos na organização dos enunciados”, 
pesquisa desenvolvida por Claudia Stumpf Toldo e Neusa Maria Henriques 
Rocha, evidencia, à luz da perspectiva linguístico-funcionalista, que a língua tem 
de ser tratada no seu contexto de uso e entendida na relação com as diversas 
possibilidades de interação. Para tanto, analisa a construção de sentidos no 
texto, por meio das relações que se estabelecem, nesse processo, entre os 
componentes sintáticos, semântico-discursivos e pragmáticos. As autoras 
procuram compreender o comportamento dos pronomes demonstrativos em 
enunciados de humor, com o propósito de mostrar que o professor pode levar o 
aluno a reconhecer a função referenciadora desses pronomes e o papel que eles 
desempenham na construção dos sentidos do texto. 
A segunda parte é constituída de textos que abordam o ensino de línguas 
estrangeiras a partir de teorias sobre o uso da linguagem. Em “Construção da 
autonomia na formação do professor de língua estrangeira”, Niura Maria Fontana 
apresenta a noção de autonomia na escola e afirma a necessidade de que o 
professor tenha conhecimento de teorias linguísticas para, pela relação da teoria 
com a prática, desenvolver essa competência em seus alunos. Propõe, então, 
que o professor tenha uma concepção de língua, não como estrutura, mas como 
atividade situada, que contemple noções como texto, coesão, enunciação, 
gênero e discurso. É apresentado o relato de um experimento com dois grupos 
de alunos. 
10 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
Em “Operadores argumentativos little, a little, few, e a few no ensino do 
inglês como língua estrangeira”, Roberta Macedo Ciocari estuda o uso dos 
chamados quantificadores, destacando que os materiais didáticos comumente 
utilizados tornam difícil a tarefa de explicar a diferença existente entre os 
componentes de cada par. Por isso, os alunos não conseguem empregá-los com 
segurança, visto não os distinguirem. Com o estudo da Teoria da Argumentação 
na Língua, a autora propõe uma nova abordagem dos quantificadores em 
questão, que ajudaria tanto alunos como professores no entendimento desse 
assunto. 
Com seu trabalho, “Uso de pero, sino e sin embargo, através da teoria da 
argumentação na língua”, Gisele Benck de Moraes constata que uma das 
dificuldades que se apresenta a alunos e professores de língua espanhola é o 
uso de pero, sino, sin embargo no discurso. A busca de esclarecimentos em 
gramáticas, dicionários e até mesmo em livros didáticos parece não ser suficiente 
para dar clareza sobre o uso desses termos: a explicação é sucinta e 
comparativa e, geralmente, trata só de pero e de sino. Em virtude dessa 
dificuldade, a autora faz um estudo em que mostra o funcionamento dos 
articuladores pero, sino e do conector sin embargo em textos, com base em 
descrições amparadas pela Teoria da Argumentação na Língua (TAL) de Oswald 
Ducrot. 
Tendo em vista a importância que a Linguística assume no cenário do 
ensino de língua e a relevância dos temas desenvolvidos neste livro, as autoras 
esperam que os textos aqui apresentados oportunizem reflexões e discussões 
que contribuam para o trabalho de professores em sala de aula. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PARTE 1 
 
 
TEORIAS DO DISCURSO E ENSINO DO PORTUGUÊS 
 
A LÍNGUA PORTUGUESA COMO INSTRUMENTO DE AQUISIÇÃO DE 
CONHECIMENTOS NO ENSINO FUNDAMENTAL: ALGUMAS REFLEXÕES 
Tânia Maris de Azevedo*
tmazeved@ucs.br 
 
 
Vania Morales Rowell**
umorell@yahoo.com.br 
 
 
 
As palavras só têm significado 
na corrente do pensamento e da vida. (Wittgenstein) 
1 Introdução 
O ensino de língua materna, hoje, parece estar um tanto desfocado em 
relação ao seu objetivo, principalmente no que se refere ao Ensino Fundamental: 
à metalinguagem é conferido o status de protagonista, quando deveria, no 
máximo, ser coadjuvante. 
O estudo da língua tem se reduzido à memorização de regras gramaticais 
aplicadas a uma única modalidade, a língua escrita, em uma única variante, a 
padrão-culta. A língua é tratada como uma dobra sobre si mesma no sentido de 
que o estudo da estrutura e da forma é visto como suficiente e até mesmo 
essencial para que, como consequência natural e necessária, o sujeito aprenda a 
produzir e compreender eficientemente textos/discursos reais, aqueles inseridos 
em situações cotidianas de comunicação, quer escolares, quer não. 
Obviamente, e a experiência é testemunha disto, essa consequência não é 
assim tão natural e, menos ainda, necessária. Muito pelo contrário, a 
“aprendizagem” da metalinguagem parece até distanciar o aprendiz das tarefas 
de compreensão leitora e de produção de textos/discursos. O estudo da 
gramática normativa acaba por inibir e limitar a atividade de produção do aluno, 
pois este tem sempre a impressão de não saber escrever, como se a língua 
 
* Professora do Departamento de Letras de Universidade de Caxias do Sul, Doutora em 
Linguística Aplicada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 
** Mestre em Linguística Aplicada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 13 
escrita fosse uma modalidade a que somente os grandes literatos têm acesso, 
longe, portanto, do uso corrente advindo de necessidades cotidianas. Tanto é 
assim que é comum ouvir, nos mais diversos meios e nas mais diferentes 
profissões – inclusive na de professor –, profissionais afirmando categoricamente 
não saber “colocar suas ideias no papel” e ter dificuldade para ler um texto mais 
especializado e mais complexo. 
É preciso lembrar que a criança chega à escola como usuário da língua e 
com uma competência comunicativa de base já bastante desenvolvida em nível 
oral, além de contar com uma imaginação prodigiosa e extremamente fértil em 
termos de possibilidade de criação e potencialidade de aquisição de recursos 
linguísticos para aprimorar sua expressãoverbal. 
A escola, na contramão desse processo, introduz a criança no mundo do 
código escrito, desprezando o que ela já domina linguisticamente e impondo a ela 
um registro desvinculado do seu contexto de uso. Unidades desprovidas de 
sentido – como letras, sílabas, palavras e mesmo orações – são trabalhadas num 
universo totalmente artificial, impondo ao sujeito aprendiz a condição do “não 
saber”, da plena ignorância, como se o falante já não dominasse estruturalmente 
mecanismos básicos de uso da língua. A língua escrita é colocada ao aluno como 
uma ilustre desconhecida, sem qualquer vínculo com a língua que ele já usa, e 
usa proficientemente em várias situações enunciativas. 
Por outro lado, as demais disciplinas curriculares tratam a aquisição do 
conhecimento em suas áreas, cada uma no seu nicho, como retenção de 
conteúdos temáticos, de informações específicas, sem que haja consciência de 
que a linguagem é o principal veículo de interação, por meio da qual se dá a 
construção do conhecimento, e a língua a ferramenta maior de acesso às 
informações e de processamento/sistematização delas rumo à construção dos 
saberes. 
Essa falta de consciência faz com que os professores que atuam com as 
outras disciplinas que compõem o currículo do Ensino Fundamental não se 
percebam como também professores de língua materna, como se o processo de 
apreensão e apropriação do conhecimento não fosse mediado pela língua. 
É nesse contexto que se circunscreve o presente trabalho, cujo objetivo é 
o de propor uma abordagem instrumental para o ensino de Língua Portuguesa no 
14 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
Ensino Fundamental (mais especificamente, de 5ª a 8ª série), ou seja, uma 
abordagem que conceba a língua como “ferramenta” para a aquisição de 
conhecimentos em todas as áreas, desde o acesso à informação até a 
estruturação do pensamento e dos diferentes raciocínios que cada área impõe ao 
sujeito conhecedor. 
São diferentes textos, diferentes estruturas, diversos campos semânticos a 
serem dominados e mobilizados para que o sujeito possa transitar pelas várias 
áreas e pelos múltiplos tipos de conhecimento. São requeridas do aprendiz 
diferentes habilidades linguísticas para a construção dos diversos saberes 
atinentes a cada forma de conhecer e cabe à escola, a cada professor e, mais 
especificamente, ao professor de língua materna a instrumentalização linguística 
do aluno para a construção do conhecimento. 
O que defenderemos aqui são algumas concepções acerca do ensino e do 
ensino de língua materna, algumas formas de conceber a língua como 
instrumento de interação humana e mediadora da aquisição de conhecimentos. 
Portanto, não filiaremos este trabalho a nenhuma teoria linguística em especial, 
mas a determinadas posturas que, transpostas ao ensino, possam dar conta da 
real função da língua na construção do conhecimento. Se houver necessidade de 
explicitar alguns pressupostos teóricos, certamente, estes estarão vinculados às 
chamadas teorias enunciativas, pois cremos que o uso da língua e sua função na 
interlocução devam ser a tônica do processo educativo em se tratando do ensino 
da língua materna. 
Como já foi dito, o Ensino Fundamental não é lugar de discussões 
metalinguísticas e muito menos de prescrições gramaticais, mas, se o objetivo é 
proporcionar ao aluno situações que o leve a construir conhecimentos e formar 
conceitos, nesse nível de ensino a língua portuguesa deve ser tratada desde os 
seus diversos usos, quer em termos de leitura, quer de produção, e o aporte 
teórico que pode alicerçar essa concepção de ensino só poderá ser aquele 
inscrito na perspectiva enunciativa da linguística. 
Dados os limites desse estudo, não se tem a pretensão de propor soluções 
definitivas para o problema detectado, mas apenas elencar algumas reflexões 
que poderão contribuir para que o ensino de língua materna assuma sua principal 
função no Ensino Fundamental: a de municiar o aprendiz com os mecanismos 
 
Teorias do Discurso e Ensino 15 
linguísticos necessários à compreensão e produção dos diversos gêneros 
discursivos presentes no cotidiano de qualquer cidadão e daqueles gêneros de 
que se valem as demais disciplinas curriculares para tratar o conhecimento. 
2 Alguns conceitos de base 
No momento em que se concebe a linguagem como responsável pela 
estruturação do pensamento e a língua como veículo dessa estruturação e, 
portanto, como instrumento fundamental à aquisição de conhecimento, faz-se 
mister discutir, mesmo que breve e superficialmente – dadas as limitações 
impostas pela configuração deste trabalho –, alguns conceitos que se põem na 
base de uma proposta de ensino instrumental da língua materna. 
Não há como pensar o ensino de língua sem pensar antes no ensino como 
educação formal. E falar sobre a educação formal requer uma breve reflexão 
sobre o conceito de homem em suas relações com os conceitos de natureza, 
cultura, sociedade. 
O homem só difere dos outros animais por ser capaz de, pela interação 
com seus semelhantes, agir sobre a natureza no sentido de transformá-la de 
acordo com suas necessidades de sobrevivência e também por ser o único a 
preservar o fruto dessas constantes transformações – a cultura – ao longo da 
história para que as gerações futuras possam se valer delas sem ter que refazer 
o caminho já trilhado. 
 
O ser humano distingue-se dos outros animais e assume a 
condição de sujeito, principalmente, por ser o ÚNICO: 
- dotado de racionalidade, o que lhe possibilita abstrair, 
distanciar-se da “realidade” a ponto de, por meio da percepção, 
compreensão, interpretação, representar-se e representar o 
mundo; 
- capaz de, por sua alteridade constitutiva, constituir-se na 
intersubjetividade e auto-referir-se, por meio da linguagem; 
- a manter sua identidade, independentemente das alterações 
físico-químicas, afetivas, de personalidade, de caráter que 
ocorrem com ele ao longo da vida; 
- a poder refletir sobre si mesmo, pois é dotado de consciência – 
consciência esta que lhe permite inclusive ter consciência da 
existência de seu próprio inconsciente, de sua experiência 
pessoal intransferível; 
16 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
- a concretizar a idéia de liberdade, por ser capaz de conceber e 
fazer escolhas e poder operar essas escolhas dentro dos meios 
interno e externo, avaliando-as e avaliando sua própria 
operacionalização.1
 
 
Essas potencialidades do ser humano que o diferenciam dos outros 
animais e o tornam único têm na base – e, ao mesmo tempo, como principal 
instrumento de atualização, de concretização – sua capacidade de linguagem, a 
competência humana de constituir-se e constituir seu mundo na e pela 
linguagem. 
Para abstrair, compreender, interpretar, representar-se e representar o 
mundo, referir e autorreferir-se, preservar sua identidade, refletir sobre si mesmo, 
sobre seu conhecimento e sobre suas próprias formas de conhecer e aprender, 
bem como para realizar, tornar concreta a ideia de liberdade, exercendo sua 
cidadania, o homem se vale da linguagem, e, mais especificamente, do sistema 
linguístico que põe em uso. 
A condição social do homem, a interação com os demais da mesma 
espécie, bem como a preservação da cultura construída só é possível porque o 
homem possui uma linguagem, uma forma de simbolizar, de representar, de 
abstrair dos fenômenos conceitos que perduram por meio da linguagem. 
Da relação do homem, como sujeito conhecedor que é com a natureza e 
com os outros sujeitos, relação desencadeada pelos conflitos que a 
sobrevivência cotidiana impõe, surge o processo de educação informal que, 
novamente via linguagem, é o grande responsável pela preservação da culturae 
pela consolidação da sociedade. 
A educação informal tem por características: (a) a não sistematicidade, 
uma vez que não é planejada nem regida por quaisquer preceitos didático-
pedagógicos; (b) a espontaneidade, já que acontece na justa proporção da 
necessidade, nos diferentes grupos e relações sociais, à medida que os conflitos 
surgem como elementos perturbadores da estabilidade do indivíduo/grupo; e (c) a 
circunstancialidade, visto que o processo não tem local e hora marcados, efetiva-
se conforme a exigência das situações problematizadoras. 
 
1 SANTOS, PEREIRA e AZEVEDO, 2004, p. 14-15. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 17 
Por meio do processo educativo informal, são transmitidos valores, 
crenças, mitos, enfim, regras de convivência de um grupo, de geração em 
geração. 
 
A educação é o vetor de transmissão da cultura enquanto que 
esta define o quadro institucional da educação e ocupa um lugar 
essencial em seus conteúdos. A educação, afirma-se, ocupa uma 
posição central no sistema de valores e os valores são os pilares 
em que se apóia a educação. Postas a serviço das necessidades 
de desenvolvimento do ser humano, a educação e a cultura 
tornam-se, quer uma, quer outra, meios e fins deste mesmo 
desenvolvimento.2
 
 
Da exigência de organizar e disseminar conhecimentos de modo a torná-
los comuns a comunidades maiores e mesmo à sociedade como um todo, surge 
a educação formal, ou ensino. Com ambiente e horários determinados, com 
profissionais especializados, com material apropriado e programas curriculares 
estabelecidos, a educação formal, diferentemente da informal, assume a 
configuração de processo sistemático – metódica e metodologicamente 
organizado para propiciar a aquisição do conhecimento produzido –, programado 
– com objetivos e ações planejados previamente e conteúdos hierarquicamente 
dispostos ao longo de um currículo – e situado artificialmente – em oposição à 
circunstancialidade que define o processo de educação informal, a educação 
formal tem tempos e espaços definidos, ocorre por meio da criação de ambientes 
de aprendizagem, antecipando necessidades e conflitos. 
A educação formal passa a ser, então, um simulacro do processo 
educativo informal, no sentido de que tenta reproduzir situações conflitivas na 
forma de situações de aprendizagem, para que o sujeito conhecedor tenha 
acesso ao conhecimento social e historicamente produzido. 
Todo o processo educativo, seja ele formal ou informal, só é possível por 
meio da linguagem e, mais especificamente, da língua oral ou escrita. 
Conhecimentos matemáticos, físicos, químicos, geográficos, independentemente 
de terem uma linguagem própria, um sistema de formalização e representação, 
são veiculados pela educação, formal ou não, por meio do sistema linguístico, da 
 
2 NANCZHAO, 1998, p. 257. 
18 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
linguagem verbal, oral ou escrita. Os questionamentos, as explicações, as 
definições, os exercícios didáticos têm na linguagem verbal sua forma de 
expressão e o meio de decifração/compreensão de símbolos e gráficos 
pertinentes às diversas áreas do conhecimento. Qualquer que seja a forma de 
educação, da mais sistemática a mais espontânea, tem como veículo mais 
utilizado a língua, justamente por ser ela o meio mais viável de transmissão de 
informações e de processamento delas rumo à formação de conceitos e, 
consequentemente, à construção do conhecimento. 
Falando em conhecimento, esse é outro conceito de base a ser aqui 
discutido, pois de como o compreendemos e entendemos o ato de conhecer 
decorre a concepção de ensino de língua proposta. 
O conhecimento é visto aqui como o resultado, o produto do 
processamento, da organização, enfim, da sistematização do conjunto de 
informações a que somos expostos a todo instante ou a que nos expomos 
quando temos um problema a solucionar. Essas informações chegam a nós de 
várias formas e por diversas vias, desde o que é percebido sensorialmente até o 
que é intelectualmente captado ou acessado. 
O que ocorre é que essas informações por si só não se constituem meios 
para a solução de problemas, precisam ser inter-relacionadas para assumir a 
configuração de conhecimento construído e, então, poder ser adaptadas, 
ressignificadas e aplicadas, como instrumentos de resolução, a situações que se 
colocam como problemas. 
 
O conhecimento só é conhecimento enquanto organização, 
relacionado com as informações e inserido nos contextos destas. 
As informações constituem parcelas dispersas de saber. [...] 
[A] informação é uma matéria-prima que o conhecimento deve 
dominar e integrar.3
 
 
O conhecimento resulta, por conseguinte, de uma ação do sujeito sobre o 
objeto a ser conhecido. Não há, pois, transmissão de conhecimento, mas 
reconstrução, ressignificação do objeto de conhecimento pelo sujeito por meio da 
ação, da interação, que se faz, por sua vez, pela linguagem. 
 
3 MORIN, 2002, p. 16 e 18. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 19 
É a partir de um acontecimento que se institui como desafio/problema ao 
sujeito que o processo de conhecer entra em ação, ou seja, que o sujeito, pela 
interação com outros sujeitos e com as informações – objeto de conhecimento –, 
constrói uma rede de relações entre essas informações e delas com a situação- - 
problema, interpretando-as e convertendo-as em possibilidades de solução ou de 
minimização do problema instituído. 
O produto desse processo, independentemente da efetiva solução do 
problema, é o que se concebe como conhecimento, uma vez que essa rede de 
relações estabelecida foi incorporada pelo sujeito e poderá ser o alicerce de 
novas relações na busca de outras soluções para outras situações conflitivas. A 
cada evento que se apresenta ao sujeito cognoscente, ele localiza e mobiliza o 
que já assimilou a respeito, ressignifica e reconstrói o conhecimento que já 
possui e, buscando novas informações, realizando novas interações, incorpora 
novas redes de relações ao seu conhecimento prévio, ampliando-o, 
redimensionando-o e/ou sedimentando-o para a solução de novos problemas. 
Assim, sucessiva e recursivamente, o conhecimento vai sendo construído, 
aprofundado, alargado, e o sujeito vai se tornando mais autônomo, mais senhor 
de suas interpretações e ações sobre o mundo e sobre si mesmo. 
Como diz Luckesi (1989, p. 47-48), 
 
o conhecimento é o produto de um enfrentamento do mundo 
realizado pelo ser humano que só faz plenamente sentido na 
medida em que o produzimos e o retemos como um modo de 
entender a realidade, que nos facilite e nos melhore o modo de 
viver, e não, pura e simplesmente, como uma forma enfadonha e 
desinteressante de memorizar fórmulas abstratas e inúteis para 
nossa vivência e convivência no e com o mundo. 
 
Desde essa perspectiva, o objeto de conhecimento não se apresenta ao 
sujeito como um reflexo do real a ser assimilado, mas como um objeto a que o 
sujeito precisa atribuir sentido. Por isso, o conhecimento é sempre, como diz 
Morin (2002), tributário da interpretação, logo, da subjetividade, isto é, construído 
individual e transitoriamente, não admitindo o caráter de verdade tácita e 
imutável. 
A linguagem assume no processo de conhecer pelo menos três funções: a 
de veicular a interação do sujeito cognoscente com o objeto de conhecimento, 
20 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
possibilitando sua apropriação; a de estruturar e organizar o conhecimento 
resultante dessa interação; e a de tornar consciente ao sujeito todo esse 
processo. 
 
[...] o homem transformae é transformado nas relações 
produzidas em uma determinada cultura. Mas a sua relação com 
o meio não se dá de forma direta, ela é mediada por sistemas 
simbólicos que representam a realidade; e a linguagem, que se 
interpõe entre o sujeito e o objeto de conhecimento, é o principal 
sistema de todos os grupos humanos.4
 
 
Quando o sujeito se questiona sobre algo, quando mobiliza o que já 
conhece a respeito do que está investigando e, desde aí, estabelece novas 
relações a fim de se apropriar desse objeto de investigação e, ainda, quando 
consegue tomar consciência do caminho percorrido para desvendar o objeto que 
se lhe põe à frente, bem como do resultado desse desvelamento, o faz por meio 
da linguagem, seja ela verbal ou não. Como diz Vygotsky, a linguagem dá forma 
ao pensamento, estruturando-o. É por meio da linguagem que o sujeito interpreta, 
constrói, reconstrói, ressignifica, redimensiona e socializa o conhecimento. 
Para Luria (1987, p. 202), 
 
a presença da linguagem e de suas estruturas lógico-gramaticais 
permite ao homem tirar conclusões com base em raciocínios 
lógicos, sem ter que se dirigir cada vez à experiência sensorial 
imediata. A presença da linguagem permite ao homem realizar a 
operação dedutiva sem se apoiar nas impressões imediatas e se 
limitando àqueles meios de que dispõe a própria linguagem. Esta 
propriedade da linguagem cria possibilidade de existência das 
formas mais complexas do pensamento discursivo (indutivo e 
dedutivo), que constituem as formas fundamentais da atividade 
intelectual produtiva humana. 
 
Se a linguagem é o instrumento fundamental do processo de conhecer e 
se o conhecer pressupõe o aprender, a linguagem desempenha na 
aprendizagem função igualmente essencial, como mediadora das relações entre 
o sujeito e o objeto a conhecer. 
 
4 BEZERRA, 2002, p. 38. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 21 
Nesse sentido, quando se pensa uma proposta para o ensino de língua 
materna, outro conceito de base a ser repensado é o de aprendizagem. É preciso 
saber como se entende o processo de aprendizagem, como se aprende, para 
poder conceber uma proposta de ensino, uma vez que este só tem sentido se 
pensado da perspectiva do aprender. 
Não há espaço aqui para analisarmos todas as formas de aprendizagem, 
restringir-nos-emos, pois, à aprendizagem formal, sistematizada, escolar. 
Se o ato de conhecer pressupõe a construção de uma rede de 
informações interconectadas, faz-se necessário aprender a tecer essa rede. A 
aprendizagem, aqui, é vista como o desenvolvimento de 
competências/habilidades essenciais ao ato de conhecer como as de observar, 
comparar, classificar, analisar, sintetizar, interpretar, criticar, descobrir, 
estabelecer relações. Outra vez, o desenvolvimento de tais 
competências/habilidades tem como principal ferramenta a linguagem e, 
essencialmente, a linguagem verbal. Desde a mais simples observação até a 
construção da mais complexa rede de relações tem na verbalização o maior 
instrumento de representação/sistematização/consolidação. 
Segundo Piaget, aprender é diferente de conhecer. Aprender, para o autor, 
é saber realizar, ao passo que conhecer é compreender e distinguir as relações 
necessárias, é atribuir significado às coisas. Nesse sentido, aprender diz respeito 
mais aos procedimentos e às estratégias empregadas pelo sujeito para agir sobre 
o objeto de conhecimento e decifrá-lo ou ressignificá-lo. 
Novamente, aqui, torna-se essencial a consciência sobre esses 
procedimentos: aprender a aprender, pois, é fundamental para o aprimoramento 
das estratégias pressupostas pelo conhecer. A meta-aprendizagem, assim como 
a metacognição, é fundamental para assegurar ao sujeito a autonomia do seu 
desenvolvimento, uma vez que lhe permite otimizar processos e redimensionar 
estratégias em função do objeto a conhecer. 
A aprendizagem resulta de construções efetivadas pelo sujeito 
cognoscente por meio de estágios de reflexão, remanejamento e remontagem 
das percepções que ocorrem na ação sobre o mundo e na interação com outras 
22 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
pessoas5. A aprendizagem é resultado de um processo de interação entre o 
mundo do sujeito e o mundo do objeto, por uma integração ativada pelas ações 
do sujeito6
A aprendizagem, por decorrência, só ocorre à proporção que o aluno age 
sobre os conteúdos específicos e, desafiado por situações problematizadoras, 
tem suas próprias estruturas de pensamento previamente construídas ou em 
construção. E, ainda, pelo desenvolvimento de competências/habilidades, 
mantém uma relação ativa como o conhecimento, relação essa que produz 
transformações no sujeito cognoscente e no próprio objeto cognoscível. 
. 
No entanto, a aprendizagem não pode ser vista como um fenômeno 
unicamente individual. Se o ser humano é aqui entendido como um ser 
essencialmente social, só se pode compreender a aprendizagem como resultado 
de um constante processo de interação, não apenas do sujeito com o objeto a 
conhecer, mas do sujeito com outros sujeitos. No caso específico do ensino 
formal, a aprendizagem decorre fundamentalmente das interações aluno-
professor e aluno-aluno. 
Segundo Wood7
 
5 MORAES, 2000, p. 200. 
, a teoria vigotskiana atribui ao sucesso alcançado pela 
cooperação a base da aprendizagem e do desenvolvimento. A instrução, tanto 
formal como informal, em contextos sociais variados, realizada por colegas, 
familiares, amigos e professores dotados de maior conhecimento, é o principal 
veículo de transmissão cultural do conhecimento. O conhecimento encontra-se 
inscrito nas ações, no trabalho, nas brincadeiras, na tecnologia, na literatura, nas 
artes e na fala dos membros de uma sociedade. E apenas por meio da interação 
com os representantes de vários grupos sociais e culturais é que o sujeito poderá 
adquirir, incorporar e desenvolver posteriormente aquele conhecimento. Ou seja, 
é através das múltiplas inter-relações que o indivíduo mantém com os diferentes 
grupos sociais que vai construindo seu conhecimento e incorporando valores, 
crenças e atitudes que compõem a cultura e que, por sua vez, fazem-na 
perpetuar-se. 
6 Id. Ib. 
7 1996, p. 45. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 23 
O ato de conhecer pressupõe uma ação do sujeito sobre o objeto de 
conhecimento, no sentido de compreendê-lo e decifrá-lo, processos que por sua 
vez implicam o ato de refletir, já que nem todo o objeto de conhecimento está 
disponível sensorialmente. É pela possibilidade de representar simbolicamente, ou 
seja, pela linguagem, que o sujeito consegue abstrair, logo, analisar, hipotetizar, 
deduzir, generalizar, transferir, projetar, acessar e processar informações, 
sistematizando-as e incorporando-as na forma de conhecimento construído. 
É pela linguagem que o homem se apropria do conhecimento. E é pelo 
questionamento sobre a realidade (esta concebida como um ponto de vista do 
sujeito, logo, individualmente percebida e compreendida) que o conhecedor 
conhece. Portanto, é a língua que permite ao sujeito assumir uma atitude 
investigativa sobre o mundo, questioná-lo e questionar o conhecimento 
produzido, e, assim, construir sobre ele seus pontos de vista. É a língua o 
principal instrumento de tomada de consciência do mundo pelo sujeito. 
Conhecer nada mais é do que atribuir sentido ao que se nos apresenta; 
conhecer, portanto, pressupõe a linguagem para tal atribuição de sentido. É por 
meio da linguagem que o sujeito conhecedor age sobre o objeto a conhecer e, 
nessa ação, construindo hipóteses e generalizações, confere sentido a ele, 
apropriando-se desse objeto etomando consciência do próprio processo de 
conhecê-lo, o que, consequentemente, lhe permitirá decifrar novos objetos 
cognocíveis e implementar novas formas de conhecer. 
De acordo com Vygotsky (1998), quando trata do processo de formação de 
conceitos, o signo, ao mesmo tempo em que funciona como elemento mediador 
nesse processo, afigura-se como sua síntese, uma vez que se torna a 
exteriorização, a abstração, a formalização do próprio conceito formado. A 
linguagem, nesse sentido, assume papel mediador e estruturante no processo de 
conhecer. É por meio dela, e mais especificamente por meio da língua, que 
significamos e representamos o mundo que se nos dá a conhecer. 
É a língua a responsável pela transformação do conhecimento em saber e 
em saber-fazer, visto que ela possibilita a socialização de informações e o 
desenvolvimento de habilidades que o raciocinar pressupõe. É pela propriedade 
de referir pela língua que o sujeito se constitui e constitui o mundo que o cerca. 
24 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
As concepções até aqui discutidas formam o alicerce sem o que não seria 
possível delinear uma proposta para o ensino de língua materna no Ensino 
Fundamental. Somente quando se tem por base e se acredita que a função da 
língua é a de mediar o processo de conhecer em qualquer área pode-se propor 
que o ensino de língua configure-se como uma instrumentalização ao ato de 
transformar informações em conhecimento e, posteriormente, outra vez por meio 
da língua, transformar esse conhecimento construído em ferramenta para a 
solução de problemas que o viver e o conviver impõem. 
Assim sendo, é hora de repensarmos o ensino da língua materna desde essa 
perspectiva: algumas concepções, algumas diretrizes, alguns redimensionamentos. 
3 Português instrumental: a língua a serviço da construção de saberes no 
ensino fundamental 
Se a educação formal é tida aqui como uma simulação dos processos de 
ensino e aprendizagem desenvolvidos pela educação informal, o ensino da língua 
materna não poderia ser concebido de outra forma. Assim, o ensino da língua 
portuguesa deveria seguir na direção da aquisição da linguagem oral, no sentido 
de que essa modalidade da língua é apreendida e aprendida em seu uso, pela 
interação do sujeito com outros que já a detém. Ensinar língua materna, então, 
significa expor o sujeito aprendiz a diferentes situações de emprego da língua, 
seja na modalidade escrita para aprendê-la, seja na modalidade oral para 
aperfeiçoá-la. 
Hoje, as aulas de língua portuguesa estão direcionadas prioritariamente à 
aquisição e ao desenvolvimento da língua escrita, quer em termos de 
compreensão leitora, quer no que se refere à produção de textos. A língua oral é 
relegada a um segundo plano ou nem sequer trabalhada, sendo inclusive 
“atrofiado” seu uso no ambiente escolar, já que as interlocuções são limitadas e 
rigidamente supervisionadas, e as intervenções dos professores sobre a 
oralidade dos alunos vão exclusivamente ao sentido da correção e, ainda, da 
correção com critérios do nível culto da modalidade escrita. 
Além disso, o ensino de língua está muito longe de priorizar as situações 
de uso efetivo da língua a ser aprendida/aprimorada; a descrição ou mesmo a 
 
Teorias do Discurso e Ensino 25 
normatização do sistema linguístico é o foco dos currículos na Educação Básica. 
A língua como objeto de ensino é uma língua atemporal, fora de contexto, 
portanto, desprovida de qualquer função, mas plenamente recheada de regras e 
normas, cuja infração é sempre motivo de punição; é a língua sobre si mesma e 
por si mesma, sem qualquer vínculo com as possibilidades reais de emprego e, 
menos ainda, sem qualquer possibilidade de criação sobre ou de rompimento do 
sistema que é tido como restritivo e coercitivo; é uma língua fossilizada, sem 
ninguém que a atualize, que a realize, que atribua sentido a ela. 
Ora, sabe-se bem que o sentido não está na língua, como entidade virtual, 
mas no contexto de uso das formas da língua; é o discurso, como diz Ducrot 
(2002), que doa sentido, é na parole saussuriana que o dizer se faz dito e, 
portanto, pleno de sentido. Então, como conceber um ensino de língua que a 
artificializa, que suprime dela o que lhe confere sentido? Como esperar que o 
aluno aprenda a usar uma língua, a sua língua, ensinando suas formas e 
estruturas descontextualizadas, fora da situação enunciativa que a faz fazer 
sentido? 
Diante disso e da crença de que a língua é, além do principal instrumento 
de interlocução dos seres humanos, o principal mediador na formação de 
conceitos e, consequentemente, da construção de saberes pelos sujeitos, o que 
se propõe aqui é quase o inverso disso. É um ensino de língua materna (em que 
as modalidades oral e escrita tenham o mesmo status e sejam constante e 
concomitantemente trabalhadas) cujas bases sejam as situações enunciativas, os 
contextos de interlocução, os diferentes objetivos dos locutores, os diversos 
perfis dos interlocutores. 
 
Nossos professores de língua – seja por formação profissional, 
seja por falta de formação – são muito atraídos pela descrição de 
língua e pelo ensino de gramática. Sempre fazemos sucesso na 
formação de professores quando discutimos as características 
formais e de estilo de um texto ou gênero, a partir de nossos 
instrumentos. Por outro lado, nossos alunos não precisam ser 
gramáticos de texto e nem mesmo conhecer uma metalinguagem 
sofisticada. Ao contrário, no Brasil, com seus acentuados 
problemas de iletrismo, a necessidade dos alunos é de terem 
acesso letrado a textos (de opinião, literários, científicos, 
26 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
jornalísticos, informativos, etc.) e de poderem fazer uma leitura 
crítica e cidadã desses textos.8
 
 
Por isso, acredita-se que os gêneros discursivos, desde a abordagem de 
Bakhtin, possam se constituir meios eficientes para o ensino da língua materna 
numa perspectiva mais enunciativa e funcional. 
A proposta desse autor vem ao encontro da função que se atribui aqui ao 
ensino de língua materna no Ensino Fundamental, ou seja, a de instrumento do 
processo de aquisição/construção de conhecimentos em todas as demais 
disciplinas que compõem o currículo desse nível de ensino. 
Como diz Bakhtin, 
 
todos os diversos campos da atividade humana estão ligados ao 
uso da linguagem. Compreende-se perfeitamente que o caráter e 
as formas desse uso sejam tão multiformes quanto os campos da 
atividade humana, o que, é claro, não contradiz a unidade 
nacional de uma língua. O emprego da língua efetua-se em forma 
de enunciados9 (orais e escritos) concretos e únicos, proferidos 
pelos integrantes desse ou daquele campo da atividade humana. 
Esses enunciados refletem as condições específicas e as 
finalidades de cada referido campo não só por seu conteúdo 
(temático) e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos 
recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua, mas, 
acima de tudo, por sua construção composicional. Todos esses 
três elementos – o conteúdo temático, o estilo, a construção 
composicional – estão indissoluvelmente ligados no todo do 
enunciado e são igualmente determinados pela especificidade de 
um determinado campo da comunicação. Evidentemente, cada 
enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização 
da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de 
enunciados, os quais denominados gêneros do discurso.10
 
 
Cada área do conhecimento – e, por conseguinte, no referido processo de 
simulação, cada disciplina do currículo – possui formas específicas de expressar 
seus raciocínios e conceitos: definições, explicações, justificativas, 
questionamentos, fórmulas, gráficos, mapas, esquemas,enfim, uma grande 
 
8 ROJO, p. 27. 
9 Conceito situado pelo próprio autor no campo da parole saussuriana, significa o ato de enunciar, 
de exprimir, transmitir pensamentos, sentimentos, etc. Bakhtin, segundo seu tradutor, usa 
indiscriminadamente os termos enunciado e enunciação, sem distingui-los. 
10 BAKHTIN, 2003, p. 261-262. Grifos do autor. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 27 
quantidade e diversidade de gêneros discursivos aplicados às finalidades e 
necessidades de cada área e de cada conceito trabalhado, analisado. 
O sujeito aprendiz é exposto a essa multiplicidade de gêneros discursivos 
sem que nenhuma instrumentalização linguística lhe seja fornecida. A ideologia 
escolar tem a falsa impressão de que o fundamental a ser ensinado é o conteúdo 
temático de cada área, como se esse conteúdo não fosse veiculado por um 
conjunto de sequências discursivas próprias da área e que requerem domínio, 
por parte do sujeito cognoscente, para que possam ser compreendidas e, então, 
aprendido, transferido e aplicado o conteúdo que é por elas transmitido. 
Desde essa perspectiva, à educação formal cabe não só ensinar o 
conhecimento produzido em cada área, mas também instrumentalizar o aprendiz 
para que tenha acesso a esses conhecimentos e seja capaz de apropriar-se 
deles para construir seus próprios conceitos e produzir novos conhecimentos. 
Particularmente, à disciplina de língua portuguesa fica uma dupla tarefa: a 
de instrumentalizar o aluno para compreender e produzir os gêneros discursivos 
cotidianos, orais ou escritos, dos mais informais aos mais formais; e a de 
instrumentalizá-lo também para operar, quer em termos de leitura, quer de 
produção, com os gêneros utilizados pelas outras disciplinas, desde aqueles 
próprios das várias áreas do conhecimento até os que são didaticamente usados 
pelas disciplinas para acesso e construção do conhecimento produzido, a saber: 
os relatórios, resumos, resenhas, esquemas, etc. 
Ainda conforme Bakhtin, 
 
em cada campo existem e são empregados gêneros que 
correspondem às condições específicas de dado campo; é a 
esses gêneros que correspondem determinados estilos. Uma 
determinada função (científica, técnica, publicística, oficial, 
cotidiana) e determinadas condições de comunicação discursiva, 
específicas de cada campo, geram determinados gêneros, isto é, 
determinados tipos de enunciados estilísticos, temáticos e 
composicionais relativamente estáveis.11
 
 
Nesse sentido, o que se propõe aqui é que a função, a finalidade, a 
situação enunciativa determinem a forma, os mecanismos linguístico-gramaticais 
 
11 BAKHTIN, 2003, p.266. 
28 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
e textuais a serem trabalhados, ensinados nas aulas de língua materna, e não o 
contrário como vem sendo feito. Que a hierarquização dos conteúdos a serem 
trabalhados no Ensino Fundamental, principalmente nas últimas quatro séries, 
em língua portuguesa, seja feita com base nos gêneros discursivos veiculados 
nas outras disciplinas do currículo e que seja assumida pela disciplina de língua 
materna a função instrumental que tem em relação às outras que compõem o 
currículo. 
Não se postula que seja abolido o estudo da forma em função da análise 
enunciativo-discursiva, mas que esta seja priorizada e norteie o ensino daquela. 
Acredita-se que tanto os recursos textuais (mecanismos que asseguram 
coerência e coesão nos níveis macro e microtextual) quanto os aspectos 
gramaticais sejam tratados em função do gênero analisado, de acordo com o que 
é requerido pela situação enunciativa. 
De acordo com Rojo, 
 
toda prática de linguagem se dá numa situação (de comunicação, 
de enunciação, de produção ou circulação) que é própria de uma 
determinada esfera social, em um dado tempo e espaço 
históricos. Esta esfera neste tempo/espaço admite determinados 
participantes (com relações específicas), temas e modalidades de 
linguagem e de mídia, e não outros. Estes participantes articulam 
seus enunciados em gêneros específicos dessa esfera e as 
propriedades composicionais e estilísticas desses enunciados em 
gêneros (forma composicional, formas lingüísticas) serão 
dependentes das relações entre estes participantes. Em especial, 
das apreciações de valor que estes façam sobe o tema e sobre 
seus interlocutores.12
 
 
Cabe ao professor de língua materna criar situações-problema que 
desafiem o aprendiz não só a compreender como também a produzir diferentes 
gêneros discursivos, isto é, situações conflitivas cuja resolução dependa da 
produção/compreensão de determinados gêneros. Só assim os alunos 
perceberão a importância de aprimorar-se linguisticamente para poder interagir 
em diferentes contextos e com diversos objetivos e interlocutores e tirar o 
máximo proveito dessas interações. 
 
 
12 ROJO, p. 16-17. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 29 
Falamos apenas através de determinados gêneros do discurso, 
isto é, todos os nossos enunciados possuem formas 
relativamente estáveis e típicas de construção do todo. Dispomos 
de um rico repertório de gêneros de discurso orais (e escritos). 
Em termos práticos, nós os empregamos de forma segura e 
habilidosa, mas em termos teóricos podemos desconhecer 
inteiramente sua existência. [...] até mesmo no bate-papo mais 
descontraído e livre nós moldamos nosso discurso por 
determinadas formas de gênero, às vezes padronizadas e 
estereotipadas, às vezes mais flexíveis, plásticas e criativas [...]. 
Esses gêneros do discurso nos são dados quase da mesma 
forma que nos é dada a língua materna, a qual dominamos 
livremente até começarmos o estudo teórico da gramática.13
 
 
Bakhtin acrescenta ainda que a língua materna – sua composição 
vocabular e sua estrutura gramatical – não é apreendida por nós a partir de 
dicionários e gramáticas, mas de enunciações concretas que ouvimos e 
reproduzimos nas diferentes situações discursivas, com os interlocutores que nos 
rodeiam. Assimilamos as formas da língua somente nas e pelas enunciações. As 
formas da língua e as formas típicas dos enunciados, isto é, os gêneros do 
discurso, chegam à nossa experiência e à nossa consciência em conjunto e 
estreitamente vinculadas.14
Aprender a falar, de acordo com o mesmo autor, significa aprender a 
construir enunciados (porque falamos por enunciados e não por orações isoladas 
e, menos ainda, por palavras isoladas). Há, segundo ele, entre os gêneros do 
discurso e as formas gramaticais e destes com o discurso uma relação de inter-
dependência em termos de organização: os gêneros do discurso organizam o 
nosso discurso quase da mesma forma que o organizam as formas gramaticais 
(sintáticas).
 
15
Não entraremos aqui nos meandros da discussão linguística existente 
entre tipos textuais e gêneros discursivos (ou como quer Marcuschi, gêneros 
textuais). Não é objetivo deste texto apresentar uma discussão teórica e 
terminológica sobre esse assunto, no entanto, Marcuschi (2002) faz uma 
distinção interessante entre esses conceitos e pensamos ser pertinente 
 
 
13 BAKHTIN, 2003, p. 282-283. 
14 Id. ib. 
15 Id. ib. 
30 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
apresentá-la aqui, pois cremos ser possível aliar, como ferramentas pedagógicas 
para o ensino de língua materna, tipos textuais e gêneros do discurso. 
O autor16
Já a expressão gêneros textuais (ou o que chamamos aqui gêneros 
discursivos) é usada como uma noção propositalmente vaga para referir os textos 
materializados que encontramos em nossa vida e que apresentam características 
sócio-comunicativasdefinidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e 
composição característica. Os gêneros, segundo ele, são inúmeros, e alguns 
exemplos seriam o telefonema, a carta comercial, a carta pessoal, o romance, o 
bilhete, a reportagem jornalística, o horóscopo, o artigo científico, a resenha, etc. 
 diz usar a expressão tipo textual para designar uma espécie de 
construção teórica definida pela natureza linguística de sua composição 
(aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas) e afirma que 
esses tipos abrangem categorias como a narração, a exposição, a 
argumentação, a descrição e a injunção. 
Por estar didaticamente muito bem posto, reproduziremos o quadro 
elaborado pelo autor17
 
 para expressar essa distinção. 
TIPOS TEXTUAIS GÊNEROS TEXTUAIS 
1. construtos teóricos definidos por pro-
priedades linguísticas intrínsecas; 
1. realizações linguísticas concretas 
definidas por propriedades 
sociocomunicativas; 
2. constituem sequências linguísticas ou 
sequências de enunciados e não são 
textos empíricos; 
2. constituem textos empiricamente 
realizados cumprindo funções em 
situações comunicativas; 
3. sua nomeação abrange um conjunto 
limita-do de categorias teóricas 
determinadas por aspectos lexicais, 
sintáticos, relações lógicas, tempo 
verbal; 
3. sua nomeação abrange um conjunto 
aberto e praticamente ilimitado de 
designações concretas determinadas 
pelo canal, estilo, conteúdo, 
composição e função; 
4. designações teóricas dos tipos: 
narração, argumentação, descrição, 
injunção e exposição. 
4. exemplos de gêneros: telefonema, 
sermão, carta comercial, carta pessoal, 
romance, bilhete, aula expositiva, 
reunião de condomínio, horóscopo, 
 
16 2002, p. 22-23. 
17 Id, p. 23. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 31 
receita culinária, bula de remédio, lista 
de compras, cardápio, instruções de 
uso, outdoor, inquérito policial, 
resenha, edital de concurso, piada, 
conversação espontânea, conferência, 
carta eletrônica, bate-papo virtual, 
aulas virtuais, etc. 
 
Se no ambiente escolar, e mesmo fora dele, o conhecimento se manifesta 
por diferentes gêneros discursivos e se é papel da disciplina de língua materna 
instrumentalizar o aluno para o livre trânsito entre esses gêneros para que possa 
se apropriar do conhecimento produzido pela humanidade e, então, exercer 
plenamente sua cidadania, acreditamos ser possível, no ensino de língua 
portuguesa, aliar, mesmo que somente como instrumentos didáticos – uma vez 
que as bases teóricas que dão origem à distinção feita por Marcuschi sejam em 
muitos pontos divergentes – esses dois pontos de vista apresentados pelo autor. 
Os tipos de texto, tanto quanto os aspectos gramaticais da língua, vêm 
sendo trabalhados no ensino como fins em si mesmos. É comum vermos 
professores destinarem grande parte do período letivo ao ensino de narrações e 
descrições (principalmente no Ensino Fundamental), suas estruturas, seus 
elementos, seus subtipos e, a par disso, categorizações e classificações lexicais 
e sintáticas, forçando ambientes de compreensão e produção de textos que se 
“enquadrem” nessa tipologia, como se um texto real fosse puramente narrativo ou 
descritivo. 
Nossa proposta é que, partindo das situações enunciativas que dão origem 
aos diversos gêneros discursivos (quer aqueles presentes no cotidiano, quer 
aqueles de que se valem as demais disciplinas curriculares), analisando a 
finalidade de cada gênero, seu estilo, seu conteúdo, os tipos de texto, ou mais 
especificamente as sequências discursivas que os constituem, sejam trabalhados 
para explicitar a composição característica de cada gênero, sua construção 
composicional, como define Bakhtin. 
Nesse sentido, tanto a tipologia textual quanto os aspectos gramaticais – 
que passam a ser vistos como mecanismos de coesão e coerência textuais, 
portanto de um prisma descritivo e não mais prescritivo – serão trabalhados em 
32 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
função dos gêneros discursivos ensinados, ou seja, o uso da língua em contextos 
similares aos reais determinará o estudo do sistema linguístico. 
Conforme o próprio Bakhtin18
 
, 
A língua como sistema possui uma imensa reserva de recursos 
puramente lingüísticos para exprimir o direcionamento formal: 
recursos lexicais, morfológicos [...], sintáticos [...]. Entretanto, eles 
só atingem direcionamento real no todo de um enunciado 
concreto. 
 
Uma instrumentalização linguística com essa configuração parece-nos ser 
capaz de facilitar ao aluno seu processo de formação de conceitos, a aquisição 
de conhecimentos e, consequentemente, a construção dos saberes 
indispensáveis a sua inserção na sociedade de que faz parte como verdadeiro 
cidadão. 
Visto que o aluno, quando chega à escola, já domina a língua materna, o 
papel do ensino da língua, mesmo da modalidade escrita, deve ser o de instigar, 
provocar e promover uma tomada de consciência dos mecanismos e processos 
linguísticos que o sujeito já usa e de outros disponíveis no sistema linguístico, 
quer oral, quer escrito, no sentido de possibilitar a ele um uso mais efetivo e 
eficaz desses recursos no desenvolvimento de competências/habilidades 
necessárias à aquisição do conhecimento. 
REFERÊNCIAS 
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18 2003, p. 306. 
 
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WOOD, David. Como as crianças pensam e aprendem. São Paulo, SP: Martins 
Fontes, 1996. 
TEORIAS LINGUÍSTICAS E O ENSINO DA ESCRITA 
Magali Lopes Endruweit*
magali.endruweit@gmail.com 
 
1 Introdução 
Esta reflexão parte da escola e sua relação com a linguística, mais 
precisamente, da presença da escrita na escola e as teorias linguísticas que 
subjazem à concepção de escrita presente em sala de aula. Algumas razões 
sustentam esse caminho. 
Em primeiro lugar,a relação entre o ensino de língua e a escrita segue um 
senso comum responsável por ligar a escrita ao ensino e à escola, filiando a 
prática da escrita escolar ao positivo próprio da ciência. Por esse prisma, “é 
preciso ir à escola para aprender a ler e a escrever”. 
Em segundo lugar, pela tão discutida relação entre linguística e escola, 
sugerindo que esta possa tornar-se um lugar em que as teorias sejam aplicadas, 
oportunizando, de certa forma, uma “prática” a uma epistemologia. 
Por fim, pela suspeita de que a presença da escrita na escola esteja 
ancorada em duas questões: a) na relação com a ciência e b) na relação com a 
fala. Ambas as versões estão presentes na escola e estão autorizadas pela 
linguística saussuriana. 
Mas como se chegou a conceituação de escrita como sendo “da escola?” 
Para responder a essa pergunta será necessário um passo atrás, ou seja, tentar 
acompanhar a discussão de como a escrita é entendida na escola e as prováveis 
consequências dessa conceituação para o ensino da escrita. 
 
 
 
* Professora de Língua Portuguesa da UERGS e Doutora em Letras – Estudos da Linguagem pelo 
PPG- Letras/UFRGS. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 35 
2 A escola como o lugar da escrita 
O ensino da língua vale-se da legitimação da escrita como regularidade, 
própria do saber escolar, resultando no distanciamento de qualquer visão 
enunciativa da escrita. Na verdade, a escola é, sim, o lugar da escrita regular. 
Talvez porque a primazia cronológica da fala como prática oral desenvolvida em 
interações do dia a dia, sendo adquirida naturalmente à medida que a criança 
cresce, seja entendida como uma aquisição informal. Ao contrário da escrita, 
tomada como uma manifestação formal da alfabetização, representa a aquisição 
de um bem cultural, significando certo prestígio decorrente do processo de 
escolarização1
A escrita está presente na maioria das práticas sociais dos povos em que 
penetrou. Mesmo quem não sabe escrever está constantemente sendo 
influenciado por ela. Segundo Kato (1995), é função da escola introduzir a 
criança no mundo da escrita para que esta seja capaz de fazer uso desse tipo de 
linguagem para comunicar-se, em uma sociedade que prestigia a escrita. A 
escrita faz parte da escola, tanto que é impensável uma sala de aula sem quadro 
negro - ou branco, seguindo o avanço tecnológico - ainda mais nos ensinos 
fundamental e médio. Por mais que mudem as metodologias, os recursos usados 
no dia a dia escolar, “dar aula” significa, também e ainda, escrever no quadro; 
frequentar a sala de aula, por sua vez, também implica envolver-se muito mais 
com a expressão escrita do que com a oral. Sem dúvida, a escrita facilita as 
atividades desenvolvidas na escola. Citando Bottéro (1995, p.21): 
. É, portanto, na escola que a criança terá maior contato formal 
com a língua escrita. 
 
Por outro lado, ao contrário do discurso oral, flutuante, lábil e 
contínuo, que não se pode apanhar, como água e o tempo que 
escorrem, a mensagem escrita é materializada, tendo recebido ao 
mesmo tempo consistência e duração: não é uma corrente de 
água inesgotável e impermanente como o rio de Heráclito, no 
qual nunca nos banhamos duas vezes; tornou-se um objeto, 
coerente, autônomo e manipulável à vontade. 
 
1 Para Graff, (1994), é equivocada a identificação entre alfabetização e escolarização, pois é 
possível haver alfabetização desvinculada de escolarização. 
36 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
A escrita como um objeto material se presta à análise, à separação de 
suas partes e ao retorno reparador sobre o que foi escrito, mas talvez sua 
principal função seja a de armazenar. De fato, a função de arquivar da escrita 
parece ser decisiva para compreenderem-se as implicações sociais e intelectuais 
da cultura escrita2
Para esse fim, as publicações mais representativas
 e, acrescento, de sua importância em sala de aula como 
representação do oral e da regularidade. Mas é possível pontuar essa presença 
da escrita tão arraigada ao discernível da língua em relação ao ensino? Apontar 
gestos dessa presença é a proposta do item seguinte, perseguindo as formas de 
retorno da escrita através das publicações dirigidas aos professores, pois, 
certamente serão um testemunho da época em que surgiram. 
3
A questão de fundo, no entanto, é saber como a escrita situa-se dentro das 
teorias linguísticas apresentadas aos professores, posição que, 
consequentemente, repercutirá no ensino da escrita em sala de aula. 
de cada década 
(abordando os últimos trinta anos) serão chamadas a testemunhar sobre o ensino 
de língua na escola. 
3 As teorias linguísticas e a escrita 
Entre os anos 70 e 80 o ensino volta-se para as teorias da comunicação, 
prioriza o uso e vê a língua como um instrumento de comunicação transparente, 
afastando-se gradativamente do ensino da gramática. A discussão sobre o 
ensino ou não de Gramática na escola é tema de grande interesse na época. Por 
conta disso, textos não literários, do dia a dia, passam a fazer parte dos livros 
didáticos; a linguagem oral torna-se parte das aulas. A visão instrumental domina 
a concepção de língua como veículo de comunicação. 
Até a década de 70, o estudo centrado no ensino da Gramática priorizava 
a escrita. Com a mudança de enfoque, as atenções voltadas para a oralidade, o 
 
2 Olson (1995) refere-se à cultura escrita em âmbito mais geral do que apenas a instrução, em 
sentido restrito, como à capacidade de ler e escrever. Tomo emprestada a condição de 
armazenamento, característica da cultura escrita, estendendo-a para o processo de escrita dentro 
da escola. 
3 Evidentemente, essa escolha irá retratar uma visão particular em relação à escolha das obras 
citadas. No entanto, não deixa de ser um testemunho em relação à importância da publicação. 
 
Teorias do Discurso e Ensino 37 
trabalho em sala de aula buscou atividades diferenciadas do que se fazia até 
então. Em vista disso, surge no Brasil, nos anos 80, uma gama de autores 
dedicados a estudar a relação que se estabelece entre a linguística e o ensino de 
língua materna em sala de aula. Tais trabalhos repercutem até hoje entre os 
professores, refletindo a delicada situação que se abateu sobre o ensino, 
sugerindo que muitas questões (talvez a maioria delas) ainda permanecem 
insolúveis4
De certa forma, algumas previsões foram lançadas bem antes, em 1973, 
com Lingüística e ensino do Português (GENOUVRIER; PEYTARD), e 
alcançaram os dias de hoje. Trata-se de uma obra singular: precursora de uma 
discussão que perduraria muitas décadas, traduzida do francês para o português, 
tinha como objetivo atender às necessidades do professor português e brasileiro 
e levou a reformulações frequentes e radicais do original francês, o princípio 
básico foi o de utilizar o arcabouço conceitual do texto francês estofando-o com 
material luso-brasileiro. 
. 
A posição de vanguarda defendida pelos autores abre caminho para as 
novas discussões a respeito da adoção de textos literários consagrados como 
modelo do bem escrever: cremos que bons textos não são apenas os do 
passado; cremos que a língua escrita vive também nas cartas, nas revistas, nos 
jornais, e que uma língua existe, antes de mais nada, oralmente (1973, p.146). Já 
afirmavam que não deveria haver primazia da língua escrita em relação à oral: 
duas faces da mesma moeda, interdependentes entre si. A língua escrita é vista 
como transcrição gráfica, como a materialização da oralidade. Os autores 
acreditam que o aprendizado da escrita, a partir da entrada para a escola,é o 
momento em que a criança passará a conhecer verdadeiramente a língua: A 
primeira distância experimentada e vivida em relação à língua refere-se, portanto 
 
4 Ilustrando esse período vale lembrar as palavras de Ataliba Castilho ao apresentar o livro de 
Perini (2000):Uma aula de gramática, ou mesmo um livro de gramática, funcionam mais ou menos 
assim: o professor diz lá umas coisas em que você não crê, os alunos piscam, piscam, e fingem 
que acreditam, e tudo fica na mesma. Para que então aprender gramática? Porque cai no 
vestibular. Mas haveria alguma razão verdadeira para tudo isso? Ah, bom... As coisas estavam 
nesse pé quando, em 1985, apareceram três professores universitários e seus livros 
maravilhosos. Sem nenhum acordo prévio, usando argumentos não coincidentes, eles semearam 
a desconfiança quanto às certezas da gramática escolar: Rodolfo Ilari, Celso Pedro Luft e Mário 
Perini. 
38 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
ao contacto da criança com a escrita. É isso que caracteriza sua situação de 
aluno (p.20). 
É possível perceber que o ponto de vista defendido pelos autores reflete o 
momento de mudança por que passam os estudos linguísticos no Brasil. Nota-se 
a tendência da valorização da expressão oral relegada ao segundo plano devido 
aos estudos gramaticais, e o professor é instigado a recorrer à linguística para 
poder realizar a passagem além das aparências gráficas (p. 45). 
Vê-se que a escrita é a exterioridade, representando um empecilho para 
se chegar até a verdadeira essência: a fala como oralidade. Tal caracterização da 
escrita testemunha a concepção de escrita como simples reprodução do som. 
Seguindo essa discussão, Ilari (1984-1986)5
Considerando algumas orientações teóricas presentes em nosso ensino, o 
autor tenta avaliar a assimilação de ideias provenientes da linguística e suas 
consequências práticas para o ensino: a primazia da expressão falada sobre a 
escrita, proporcionando o uso de textos antes pouco valorizados por não serem 
literários. E é pela via da redação que a escrita aparece como a expressão de um 
exercício escolar tendo como função escrever textos. 
, em Lingüística e ensino da 
língua portuguesa, apresenta a coletânea de seis artigos que procuram 
responder a uma mesma pergunta: pode a Linguística contribuir para o 
aperfeiçoamento do ensino da língua materna? 
Ilari propõe uma perspectiva formal mais ampla que a gramática para 
pensar a redação escolar: a teoria do texto ou teoria do discurso. A partir daí, 
apresenta objetivos para a aula de redação, priorizando a expressão escrita 
como uma oportunidade de explorar a variabilidade da língua. 
É preciso dizer que essa forma de ver a escrita como “expressão escrita” 
manifestada através de textos não chega a colocar em questão a relação de 
submissão ou não da escrita em relação à oralidade. O interesse passa a ser o 
texto tomado como unidade essencialmente comunicativa da língua; ponto de 
 
5 Será citada entre parêntese a data da primeira edição seguida da data da publicação em uso. 
 
 
Teorias do Discurso e Ensino 39 
vista assumido pelas Teorias do Texto e pela Linguística Textual6
 
- termos nem 
sempre sinônimos. Nessa visão, 
o texto consiste em qualquer passagem, falada ou escrita, que 
forma um todo significativo, independente de sua extensão. Trata-
se, pois, de uma unidade de sentido, de um contínuo 
comunicativo contextual que se caracteriza por um conjunto de 
relações responsáveis pela tessitura do texto – os critérios ou 
padrões de textualidade, entre os quais merecem destaque 
especial a coesão e a coerência. (Fávero e Koch;1988, p.25) 
 
A escrita é, portanto, tomada como a expressão do domínio das estruturas 
linguísticas, adquiridas através do exercício escrito: a produção de texto. 
Exercício que passou a ser sinônimo de escrita na escola, tornando-se o ponto 
centralizador das aulas de língua materna, buscando instrumentalizar o aluno 
para que seja capaz de fazer uso das operações que a língua oferece. 
Vê-se que a escrita é um instrumento de que se pode lançar mão com o 
intuito de comunicar através de textos; nesse sentido, a escrita continua a ser 
entendida como exterioridade, reforçando a concepção de escrita apenas como 
representação. Importante salientar que essa forma de tomar a escrita passou a 
fazer parte do ensino de língua, sendo acusada de utilizar “o texto como pretexto” 
para ensinar nomenclatura. 
Assim, é possível vislumbrar uma visão “textual” nas publicações que 
seguiram nos anos 80, transformando o texto como o lugar em que o aluno 
mostra o domínio gramatical da língua e depois da “subjetividade”. 
Como podemos ver na obra de Celso Pedro Luft – professor de português 
e gramático – em Língua e Liberdade (1985), a questão levantada pelo autor é a 
maneira de se ensinar a língua materna, a postura opressora de um ensino cuja 
obsessão gramaticalista acaba por traduzir uma visão distorcida de que ensinar 
uma língua está relacionado com a correção da escrita. 
 
6 A linguística textual começou a desenvolver-se na década de 60, na Europa, em especial, na 
Alemanha. Marcuschi (1983, p.12) assim a define: proponho que se veja a Lingüística Textual, 
mesmo que provisória e genericamente, como o estudo das operações lingüísticas e cognitivas 
reguladoras e controladoras da produção, construção, funcionamento e recepção de textos 
escritos ou orais [...] Em suma, a lingüística Textual trata o texto como um ato de comunicação 
unificado num complexo universo de ações humanas. 
40 Carmem Luci da Costa Silva, et al. 
Luft defende que falar e escrever bem tem a ver com a gramática natural – 
sistema de regras que os falantes interiorizam ouvindo e falando, um dom que 
qualquer indivíduo adquire por volta dos cinco ou seis anos, acessível a todas as 
pessoas normais7
A posição de Luft traz de volta a questão relativa à escrita como 
representação da fala. Reafirma-se a antiga antinomia entre fala e escrita, entre 
naturalidade e exterioridade, para a partir daí poder ser discutido o ensino da 
gramática. A aproximação entre escrita e gramática prescritiva reforça a 
concepção de que a escrita é formalidade, regra artificial, em oposição à 
gramática natural da fala, que, por ser verdadeira, deve ser priorizada. O ensino 
dessa gramática artificial escrita se dá na escola, lugar da regularização. É, pois, 
sobre o ensino de língua na escola que discute Possenti. 
. Significa dizer que nascemos programados para falar e que 
toda pessoa sabe a língua que fala, assim, aprender a língua é evolução natural, 
como crescer (p. 62). Esta gramática natural é uma gramática da fala, um sistema 
de regras para a comunicação oral, que nada tem a ver com a correção escrita, 
pois a verdadeira língua é a fala (p. 44). A escrita é vista como uma sinalização 
secundária que pode mesmo nem ocorrer, como é o caso dos analfabetos e dos 
povos ágrafos. Luft sustenta que a escola tradicional volta-se prioritariamente a 
atividades relacionadas com a leitura e a escrita, deixando de lado o ouvir e o 
falar, já que letras e outros sinais servem apenas para representar o que alguém 
falou, o que vai ou poderia falar (p.44). Dessa forma, o ensino deve priorizar a 
gramática natural da fala, e esta, por sua vez, deve sempre preceder, 
fundamentar e controlar a gramática artificial da escrita (p.44). 
Em seu livro, Por que (não) ensinar gramática na escola (1996-2000), Sírio 
Possenti expõe questões relativas à contribuição da linguística para o ensino de 
língua, afirmando que a escola não ensina língua materna, mas língua padrão.

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