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13 3 – BALANÇO DE RADIAÇÃO E BALANÇO DE ENERGIA A radiação solar provê a terra de energia, sendo o espectro de radiação solar eminentemente de ondas curtas (0,2 µm ≤ λ ≤ 3,0 µm) (Figura 3.1). Esse termo “ondas curtas” foi empregado apenas como uma forma didática para não se confundir aspectos qualitativos (comprimentos de onda) e quantitativos (irradiância) da radiação solar com a radiação emitida pela terra, denominada radiação de “ondas longas”. Essa classificação do espectro de radiação solar é também um tanto arbitrária. Há alguns autores que consideram a faixa de 0,3 µm ≤ λ ≤ 3,0 µm ou 0,2 µm ≤ λ ≤ 4,0 µm. Isto porque na verdade, o sol emite radiação em todos os comprimentos de onda, entretanto, a quantidade de energia por comprimento de onda se reduz drasticamente à medida que se afasta dessa faixa a ponto de não poder ser medida instrumentalmente, sendo considerada para fins práticos como “desprezível”. Em função das características constitutivas da atmosfera e inclusive por causa das mudanças nestas características devido às atividades antrópicas, a radiação que chega à superfície da terra (Rg) é atenuada. Há, portanto, uma alteração qualitativa e quantitativa da radiação que atinge a superfície da terra em relação àquela que atinge o topo da atmosfera (Ro). A energia que finalmente alcança a superfície da terra não é totalmente absorvida pela mesma. Há uma porção dessa energia que é refletida de volta ao espaço sideral (Rgr), sendo essa reflexão dependente das qualidades ópticas do meio no qual a radiação solar incide. Obviamente que a quantidade refletida (Rgr) é menor que a incidente (Rg) e esse excedente altera o estado energético da superfície aumentando a sua temperatura. Uma vez que essa superfície não está à temperatura de 0,0°K, ela também emite radiação proporcional à quarta potência de sua temperatura absoluta. O saldo de radiação de ondas curtas (Rg - Rgr) é uma fonte de entrada de energia que altera o estado energético da superfície, contribuindo para o aumento de sua própria temperatura. Nesse sentido, essa superfície se constitui também em um emissor, entretanto, as características qualitativas e quantitativas da radiação emitida por ela são distintas daquelas originadas do sol. A radiação emitida pela terra (Rt) é eminentemente de ondas longas (5,0 µm ≤ λ ≤ 50,0 µm) (Figura 3.1). Essa radiação é uma das formas pelas quais a terra dissipa a energia que possui, emitindo radiação infravermelha para o espaço sideral. Entretanto, uma parte dessa radiação não se perde no espaço, ela é absorvida por alguns constituintes atmosféricos, sobretudo o vapor d’água, que por sua vez tem o seu estado energético alterado e re-emite radiação de ondas longas de volta para a terra, denominada de contra-radiação (Rcr). A contra-radiação é totalmente absorvida pela superfície, sendo o saldo de radiação de ondas longas (Rcr – Rt) uma fonte adicional de entrada de energia que contribui à alteração do estado energético dessa superfície e do aumento de sua própria temperatura. O balanço de radiação é a contabilidade do saldo de ondas curtas e ondas longas e esse saldo (também chamado de energia líquida, Rn) é empregado no balanço energético da superfície em estudo. Na verdade, grosso modo, os principais destinos desse saldo de radiação são os fluxos de calor no solo (G, que aumenta a temperatura do solo), os fluxos de calor sensível (H, que aumenta a temperatura do ar), os fluxo de calor latente (LE, que se refere às alterações de fase da água, do estado líquido para o gasoso e vice-e-versa) e a energia empregada no processo fotossintético (P). 14 Figura 3.1 – Espectro de radiação solar (de ondas curtas) e da terra (de ondas longas). 3.1 – A Radiação Eletromagnética Radiação eletromagnética é energia em trânsito. Todo corpo, desde que não esteja a 0,0°K (-273°C) emite radiação eletromagnética proporcional à quarta potência de sua temperatura absoluta. Portanto, o sol que é a fonte primária de energia para a terra, cuja temperatura atualmente aceita é de 5.780°K, emite radiação eletromagnética em toda extensão de sua superfície. A terra, por sua vez, cuja temperatura gira ao redor de 300°K, igualmente emite radiação. Entretanto, existe uma particularidade com relação ao espectro de radiação eletromagnética (conjunto de radiações eletromagnéticas ordenados de acordo com sua freqüências ou seus comprimentos de ondas) emitida pelo sol e pela terra. Justamente devido à grande diferença de temperatura entre esses astros, o espectro de radiação de cada um deles é muito particular (Figura 3.1). A radiação eletromagnética tem algumas características fundamentais: (a) ela se move em ondas, (b) ela é corpuscular (constituída de partículas denominadas “fótons” que carregam consigo a energia da radiação) e (c) no vácuo, se move à velocidade da luz (3 x 108 m s-1), (d) é capaz de se mover em meio sólido (atravessar vidros), meio líquido (atravessar uma massa de água), meio gasoso (atravessar o ar) e no vácuo. Devido à dualidade partícula-onda, a radiação eletromagnética apresenta um campo magnético e outro elétrico característicos (Figura 3.1.1). 15 Figura 3.1.1 – Detalhe de uma radiação eletromagnética em que se pode visualizar o campo elétrico (em rosa) e o magnético (em azul) na figura superior e o comprimento de onda (λ) na figura inferior. Cada “fóton” contém uma quantidade discreta de energia denominada “quantum” (de plural “quanta”) que pode ser calculada em função do comprimento de onda da radiação (λ, que é a distância entre dois pontos consecutivos de mesma fase) de acordo com a Equação 3.1.1. λυ chhE ⋅=⋅= (Equação 3.1.1) Em que: E = energia contida em um fóton de radiação de freqüência ν , ou de comprimento de onda igual a λ (J); h = constante de Planck (6,6262 x 10-34 J s); ν = freqüência de onda da radiação (Hz); c = velocidade da luz (3 x 108 m s-1); λ = comprimento de onda da radiação (m). 3.2 – O Sol – A Estrela que Provê Energia à Terra O sol é a fonte primária de energia sem a qual a vida, como a conhecemos, não seria possível na terra. Ele permite a manutenção da temperatura média da terra nos padrões requeridos pelos organismos vivos (27ºC), é determinante no ciclo hidrológico e sustenta o processo fotossintético, único e exclusivo que transforma energia da radiação eletromagnética em energia química que entra nas cadeias tróficas de todos os seres vivos. A energia do sol se origina das reações de fusão nuclear que ocorrem no seu núcleo, no qual há condições muito particulares que permitem a transformação de dois átomos de hidrogênio em um de hélio (a pressão no núcleo pode chegar a 109 atm). Ali a massa nuclear é convertida em energia de acordo com a relação de Einstein (E = m.c 2). O nível energético é tal que a temperatura do núcleo pode chegar aos 20.000.000°K e o da superfície solar (a fotosfera) alcança ao redor dos 5.780°K. 16 3.3 – Espectro de Radiação Solar, Radiação Solar Global e Radiação Fotossinteticamente Ativa O espectro de radiação solar é essencialmente de ondas curtas (200 nm ≤ λ ≤ 3.000 nm, veja a Figura 3.3.1). Radiações solares com comprimentos de ondas situados fora dessa faixa são mínimas e desprezíveis. Esse espectro de radiação solar de ondas curtas que chega à superfície da terra de forma direta ou difusa (espalhada pelas partículas constitutivas da atmosfera) define a chamada “radiação solar global” (Rg). Considerando o espectro de radiação solar, há nele uma faixa de comprimento de onda entre 400 e 700 nm denominada “radiação fotossinteticamente ativa” (RFA). É assimdenominada por ser aquela empregada pelos organismos fotossintetizantes (membros de um diverso grupo de organismos vivos, chamados autotróficos, como as plantas, os fitoplânctons marinhos, as algas verdes, etc.) responsáveis pela conversão da energia eletromagnética em energia química. Esses organismos, na Ecologia, são denominados “produtores primários” porque todos os demais organismos vivos da terra dependem diretamente (herbívoros), indiretamente (carnívoros) ou nos dois casos (onívoros, como os seres humanos), daquela energia contida na massa cuja fonte primária foi o sol. Recentemente, a estimativa da quantidade anual de CO2 convertida em biomassa pelo processo fotossintético está ao redor das 200 bilhões de toneladas. Dentre essa quantidade, aproximadamente 40% se deve à atividade fotossintética dos fitoplânctons marinhos (Taiz e Zeiger, 1998). Alguns autores se referem à radiação fotossinteticamente ativa como “luz”, por ser esta a faixa visível pelo ser humano. A Tabela 3.3.1 traz os comprimentos de onda representativos das cores percebidas pelo homem. Figura 3.3.1 – Espectro de radiação solar extraterrestre em comparação com o de um corpo negro e da que chega ao nível do mar e picos de absorção da radiação pelo ozônio, pelo dióxido de carbono e pelo vapor d´água. Nota: o eixo das ordenadas está dado emW m-2 nm-1. 17 Tabela 3.3.1 – Faixas de comprimentos de ondas da luz e suas respectivas colorações. Cor Faixa de comprimento de onda (nm) Comprimento de onda representativo (nm) Energia (kJ mol-1) Violeta 400 a 425 410 292 Azul 425 a 490 460 260 Verde 490 a 560 520 230 Amarelo 560 a 585 570 210 Laranjado 585 a 640 620 193 Vermelho 640 a 740 680 176 No topo da atmosfera terrestre, em média incidem sobre uma superfície horizontal 29,6 MJ dia-1, sendo que a atmosfera é responsável pela atenuação de aproximadamente 42% dessa irradiância, o que determina que chegue à superfície terrestre, em média, 17,0 MJ dia-1. Entretanto, dependendo da latitude e do dia do ano, é possível que se encontrem valores próximos a 30,0 MJ dia-1 em alguns locais da terra, como é o caso das regiões tropicais (Nobel, 1991). Em termos de fluxo quântico, em torno de 5% dos fótons incidentes no topo da atmosfera terrestre estão na faixa da radiação ultravioleta (λ ≤ 400 nm), 28% na região do visível (400 nm ≤ λ ≤ 700 nm) e 67% na região do infravermelho (λ ≥ 740 nm). Devido à atenuação da atmosfera, em que muito da radiação ultravioleta e infravermelho são absorvidas pelos gases, nota-se que há um incremento considerável no fluxo quântico da fração visível que atinge à superfície da terra. Assim, na superfície o que se verifica são fluxos em torno de 2% na faixa do ultravioleta, 45% na faixa do visível e 53% na do infravermelho (Nobel, 1991). 3.4 – Leis da Radiação Para dar início ao estudo da radiação, torna-se necessário entender alguns conceitos elementares. Fundamentalmente, se conhecem três processos pelos quais a energia pode ser transferida de um corpo para outro: a condução, a convecção e a radiação. Para os dois primeiros, há necessidade do contato físico entre os dois corpos, o doador e o receptor da energia. A radiação é o único processo de transferência de energia de um corpo para outro sem que haja necessidade de um contato físico, dado a que a radiação é energia em trânsito, que viaja no espaço, possibilitando que o doador de energia esteja separado fisicamente do receptor. O exemplo mais simples de se ilustrar isso é tomando o sol como doador e a terra como receptora da energia solar. A distância média sol-terra, denominada unidade astronômica (UA) é da ordem de 149,6 x 109 m e, apesar de toda essa distância, é a energia solar que atinge a superfície da terra a que propicia a existência de vida na terra, como a conhecemos (Vianello e Alves, 1991). Um elemento básico para tratar da radiação é o denominado corpo negro. O corpo negro é uma idealização conveniente por se tratar de um emissor perfeito de radiação, capaz de absorver integralmente toda a energia radiante incidente sobre ele, ou seja, é uniformemente negro para todo comprimento de onda, e sua emitância é diretamente proporcional à quarta potência de sua temperatura absoluta (Nobel, 1991; Vianello e Alves, 1991). 18 A partir desta conceituação inicial, pode-se definir algumas propriedades que também são fundamentais para o estudo da radiação (Vianello e Alves, 1991). São as variáveis denominadas de emissividade (ε), absortividade (a), refletividade (r) e transmissividade (t). A emissividade monocromática de um corpo define-se como sendo a razão entre a emitância monocromática deste corpo e a emitância monocromática de um corpo negro que esteja à mesma temperatura do corpo em questão. A absortividade monocromática de um corpo define-se como sendo a razão entre a quantidade de energia radiante absorvida pelo corpo e a quantidade total de energia radiante incidente para um comprimento de onda específico. A refletividade monocromática de um corpo define-se como sendo a razão entre a quantidade de energia radiante refletida pelo corpo e a quantidade total de energia radiante incidente para um comprimento de onda específico. No estudo do balanço de ondas curtas, emprega-se o termo “albedo” (αs) para representar a refletividade da radiação solar global (com comprimentos de onda entre 200 nm e 3.000 nm) por uma superfície em estudo. A transmissividade monocromática de um corpo define-se como sendo a razão entre a quantidade de energia radiante transmitida e a quantidade total de energia radiante incidente para um comprimento de onda específico. Em relação à radiação, existem duas formas básicas de se quantificá-la, uma denominada radiométrica e outra fotométrica. Assim, de acordo com interesse, pode-se tanto expressar a radiação em termos da quantidade de energia por unidade de área e de tempo (sistema radiométrico, dado em J m-2 s-1, ou W m-2, porque 1 J s-1 = 1 W), quanto em termos da quantidade de quanta por unidade de área e de tempo (sistema fotométrico, dado em µmol de quanta m-2 s-1). 3.4.1 – Lei de Planck De acordo com Planck, a emitância monocromática de um corpo negro é uma função de sua temperatura absoluta e da própria freqüência da radiação (ou do comprimento de onda, Equação 3.4.1.1). − ⋅⋅ ⋅ ⋅ ⋅⋅⋅ = − ⋅ ⋅ ⋅⋅⋅ = 1exp 2 1exp 2 5 22 3 T ch ch T h c h Ebf λσλ pi σ υ υpi (Equação 3.4.1.1) Em que: Ebf = emitância monocromática de um corpo negro (W m-2 nm-1), pi = 3,141593..., h = constante de Planck (6,6262 x 10-34 J s), ν = freqüência de onda da radiação (Hz), c = velocidade da luz (3 x 108 m s-1), σ = constante de Stefan-Boltzmann (5,67 x 10-8 W m-2 °K-4), λ = comprimento de onda da radiação (nm). 3.4.2 – Lei de Stefan-Boltzmann Tomando a Equação 3.4.1.1 e integrando para todos os comprimentos de onda (0 ≤ λ ≤ ∞), chega-se à expressão matemática descrita na Equação 3.4.2.1, conhecida 19 como sendo a Lei de Stefan-Boltzmann, que atesta que todo corpo que não se encontre à temperatura de 0,0°K, ou inferior, emite energia eletromagnética, proporcional à quarta potência de sua temperatura absoluta. 4TE ⋅⋅= σε (Equação 3.4.2.1) Em que: E = emitância do corpo em questão (W m-2); ε = emissividade do corpo em questão (adimensional); σ = constante de Stefan-Boltzmann (5,67 x 10-8 W m-2 °K-4); T = temperatura absoluta do corpo em questão (°K). 3.4.3 – Lei de WienTomando a Equação 3.4.2.1, diferenciando com respeito ao comprimento de onda e igualando a derivada à zero obtém-se a Equação 3.4.3.1, conhecida como a Lei de Wien. Assim, uma vez conhecida a temperatura de um corpo negro, é possível predizer a qual comprimento de onda ocorrerá a máxima emitância desse corpo. T 6 max 109,2 × =λ (Equação 3.4.3.1) Em que: λmax = comprimento de onda ocorrerá a máxima emitância (nm); 2,9 x 106 = constante de ajustamento (nm °K); T = temperatura absoluta (°K). Esta mesma relação pode ser empregada quando se deseja conhecer qual o comprimento de onda responsável pela maior densidade de fluxo quântico, empregando-se, neste caso, uma constante de ajustamento igual a 3,6 x 106 nm °K na Equação 3.4.3.1. 3.4.4 – Lei de Kirchoff Um bom emissor de radiação é também um bom absorvedor. Para um corpo negro, a emissividade monocromática é igual à absortividade monocromática e ambas, iguais à unidade. Essa condição é expressa pela denominada Lei de Kirchoff. 3.4.5 – Lei de Lambert A irradiância incidente sobre uma superfície será sempre considerada como a componente normal à superfície, devendo-se, portanto, multiplicar o valor da irradiância pelo cosseno do ângulo de sua incidência sobre a superfície (Equação 3.4.5.1). ( )zII i θcos⋅= (Equação 3.4.5.1) Em que: I = irradiância incidente na superfície considerada (W m-2); Ii = irradiância inicial incidente, formando um ângulo θz com a normal à superfície considerada (W m-2); θz = ângulo zenital (graus). 20 3.4.6 – Lei de Beer-Bouguer-Lambert A irradiância monocromática sofre uma atenuação exponencial quando atravessa um meio homogêneo. Esse fenômeno é descrito matematicamente pela Lei de Beer- Bouguer-Lambert (Equação 3.4.6.1). ( )xk o eII ⋅− ⋅= (Equação 3.4.6.1) Em que: I = irradiância transmitida pela superfície considerada (W m-2); Io = irradiância incidente na superfície considerada (W m-2); e = base do logaritmo natural (2,718282...); k = coeficiente de extinção do meio considerado; x = distância percorrida pela radiação no meio considerado. Nota: neste caso, ambos, k e x, tem unidades variáveis de acordo com o emprego da Equação 3.4.6.1. 3.5 – Quantificação da Radiação que Incide na Superfície da Terra A radiação solar global (Rg) pode ser medida instrumentalmente, por meio de actinógrafos bimetálicos (que registram em papel os valores instantâneos, Figura 3.5.1) ou piranômetros (que medem os valores instantâneos), ou estimada por meio de uma equação empírica, o que é muito útil para aqueles casos em que não se dispõe de equipamentos meteorológicos. Figura 3.5.1 – Fotografias de um actinógrafo bimetálico, à esquerda, e de um piranômetro, à direita. 21 A irradiância instantânea que atinge o topo da atmosfera (Ro) também pode ser medida instrumentalmente (Figura 3.5.2), ou pode ser calculada com base na constante solar, na distância atual sol-terra e no ângulo de inclinação dos raios solares com a normal ao plano horizontal, de acordo com a Equação 3.5.1. Figura 3.5.2 – Sonda para medição da radiação extraterrestre (que atinge o topo da atmosfera). Entende-se por constante solar (S) a irradiância que atinge o topo da atmosfera considerando a distância média sol-terra, a qual pode ter seu valor estimado a partir da fração entre a emitância total do sol e a área da esfera cujo raio seja igual à distância média sol-terra (uma unidade astronômica, 1 UA = 149,6 x 109 m). O seu valor é igual a 1.367 W m-2 (Vianello e Alves, 1991), mas a NASA e a American Society for Testing Materials aceitam o valor standard de 1.353 W m-2. Para realizar uma estimativa do valor da constante solar, primeiramente deve-se estimar qual é a irradiância solar por unidade de superfície do sol, de acordo com a Equação 3.4.2.1, considerando uma temperatura média de 5.780°K. -2484 m W 63284071,557801067,51 =⇒×××=⇒⋅⋅= − EETE σε Posteriormente, se calcula a radiação emitida por toda a superfície solar, considerando que o sol tem um diâmetro igual a 1,39 x 109 m (≈ 1,4 x 109 m). 1-26 29 s J 103,90 2 101,4463284071,5 ×=⇒ × ×××= tottot EE pi Finalmente, se divide essa energia total emitida pela superfície total da esfera solar pela área compreendida pela esfera cujo raio tenha exatamente a distância média sol-terra de uma unidade astronômica. Assim, se obtém uma estimativa da constante solar que, neste caso foi de 1.385,6 W m-2. ( ) 2 29 26 m W 1385,6 106,1494 103,90 − = ××× × = pi S 22 Uma vez entendido como se pode estimar a constante solar, pode-se dar seqüência aos cálculos necessários para estimar a radiação que chega no topo da atmosfera (Equação 3.5.1). ( )[ ] ( ) ( ) ( )[ ]{ }nno wwD DSR sencoscossen)sen(0864,0 2 ××+××× ××= δφδφ pi (Equação 3.5.1) Em que: Ro = radiação extraterrestre, ou também chamada de radiação que chega no topo da atmosfera (MJ m-2 d-1), S = constante solar (1.353 W m-2), pi = 3,141593..., 0,0864 = fator de correção empregado para passar a unidade de W m-2 para MJ m-2 d-1, 2 D D = quadrado da fração entre a distância média sol-terra ( D ) e a atual (D), sendo um valor adimensional, wn = ângulo horário do nascer ou do pôr-do-sol (na primeira vez que aparece na fórmula, deve ser dado em radianos), φ = latitude local (graus), δ = declinação solar (graus). O valor do quadrado da fração entre a distância média sol-terra e a atual pode ser calculado pela Equação de Spencer (1971), descrita abaixo (Equação 3.5.2). ( ) ( ) ( ) ( )XsenXXsenX D D 2000077,02cos000719,000128,0cos034221,000011,1 2 ×+×+×+×+= (Equação 3.5.2) Em que: 2 D D = quadrado da fração entre a distância média sol-terra ( D ) e a atual (D), sendo um valor adimensional, X = valor expresso em graus e calculado segundo a Equação 3.5.3. ( ) 365 1360 −× = dX (Equação 3.5.3) Em que: X = variável para estimativa de 2 D D (graus), pi = 3,141593..., d = dia juliano (1 ≤ d ≤ 365). 23 Com a Equação 3.5.2, pode-se determinar o valor da irradiância diária no topo da atmosfera terrestre para qualquer latitude local e qualquer dia do ano. Para estimar matematicamente o valor da irradiância diária que atinge a superfície do solo (a denominada de radiação solar global, Rg), deve-se fazer uso da Equação de Angstron (Equação 3.5.4). ×+×= N nbaRR og (Equação 3.5.4) Em que: Rg = radiação solar global que atinge a superfície da terra durante um dia (MJ m-2 dia-1), Ro = irradiância diária que atinge o topo da atmosfera (MJ m-2 dia-1); a = constante de ajustamento, calculada pela Equação 3.5.5, b = constante de ajustamento, igual a 0,52, N n = razão de insolação, em que n é a duração do dia (ouo número efetivo de horas de brilho solar de radiação direta que houve no dia) e N é a duração astronômica do dia (ou o número de horas de brilho solar teórica máxima do dia), sendo N calculado pela Equação 2.3.2.8, com as devidas correções para wn. ( )φcos29,0 ×=a (Equação 3.5.5) Em que: a = constante de ajustamento, φ = latitude local (graus). Na realidade, ambas as constantes de ajustamento da Equação 3.5.5 são determinadas experimentalmente, porque variam de local para local e num mesmo local em função das características da atmosfera. Essa determinação se faz mediante medições da radiação solar global e da insolação. Por meio de regressão linear do primeiro grau, tendo como variável independente a razão de insolação e como dependente a fração entre a radiação global e a radiação extraterrestre, estimam-se seus coeficientes. O coeficiente linear é igual à constante de ajustamento “a” e o coeficiente angular, “b”. A insolação (n) é uma variável medida instrumentalmente. O aparelho que se presta para realizar essa medição é denominado de heliógrafo. Consiste de uma lente que converge os raios solares da radiação solar direta (Rgdir) sobre um foco que se muda a medida que o sol se move em sua trajetória aparente em relação à terra. Por toda a extensão em que se move esse foco, uma tira de papel com escala de tempo é inserida e sempre que há radiação direta, o papel se queima e a duração desse fenômeno é medido na escala de tempo (Figura 3.5.3). Como a declinação solar varia todos os dias do ano, com um valor máximo de 23,45° e mínimo de -23,45°, a disposição da fita no heliógrafo deve obedecer essa variação, daí a utilização de diferentes tipos de fitas devido à mudança no ângulo do foco do aparelho (Figura 3.5.3). 24 Figura 3.5.3 – Heliógrafo com sua lente em forma de esfera e a fita de papel contendo a escala de tempo para cálculo da insolação diária, à esquerda; e fitas do aparelho para as diferentes estações do ano. 3.6 – Balanço de Ondas Curtas, Balanço de Ondas Longas e Balanço de Radiação A contabilidade do balanço de radiação se faz considerando positivo aquela quantidade de radiação que incide na superfície e negativo aquela que sai dessa superfície. 3.6.1 – Balanço de Ondas Curtas A contabilidade do saldo de ondas curtas se faz considerando positivo a radiação solar global (Rg) e negativo a porção dessa radiação que é refletida pela superfície em estudo (Rgr). A radiação solar global (Rg) incide na superfície de duas maneiras: (a) de forma direta (Rgdir), ou seja, aquela radiação provinda do sol que atinge diretamente o solo, sem ser desviada pelos constituintes atmosféricos, ou (b) de forma difusa (Rgdif), quando os constituintes atmosféricos desviam os raios solares, espalhando-os em todas as direções. A radiação solar difusa (Rgdif) pode ser medida instrumentalmente empregando- se os mesmos equipamentos utilizados para medir a radiação solar global (Rg), entretanto, sobre o elemento sensível destes se coloca uma proteção (um impedimento físico para fazer sombra) contra a radiação direta do sol (Figura 3.6.1.1). 25 Figura 3.6.1.1 – Medição da radiação solar difusa com uso de um sensor piranômetro sobre o qual se instalou um anteparo para fazer sombra durante todo o dia. Assim, em termos quantitativos, o balanço de ondas curtas é dado pela Equação 3.6.1.1. ( )sggrgoc RRRQ α−=−= 1 (Equação 3.6.1.1) Em que: Qoc = balanço de ondas curtas (MJ m-2 d-1), Rg = radiação solar global incidente (MJ m-2 d-1), Rgr = radiação solar global refletida (MJ m-2 d-1), αs = albedo da superfície em estudo (coeficiente de reflexão da superfície para radiação de ondas curtas, adimensional). O albedo é uma propriedade da superfície. Ele se reveste de uma grande importância, porque determina quanto da radiação global incidente pode ser dissipada sem afetar o nível energético do meio. Um exemplo de sua importância está nos projetos de edificações, O conforto ambiental pode ser alterado segundo a refletividade das superfícies para as ondas curtas, portanto, uma simples escolha de cor para pintura de paredes pode afetar totalmente o nível energético da edificação. A Tabela 3.6.1.1 traz o valor do albedo para algumas superfícies, que podem servir como um guia. 26 Tabela 3.6.1.1 – Valores médios de albedo para algumas superfícies. Superfícies Valor do albedo (%) Concreto 22 Solo arado úmido 15 Asfalto 7 Areia branca 37 Neve recém caída 82 Neve velha 57 Solo escuro 10 Solo claro ou deserto 27 Inanimadas Água 5 Grama 24 Batata 20 Beterraba açucareira 26 Cevada 24 Trigo 24 Feijão 24 Milho 20 Fumo 22 Tomate 23 Abacaxi 15 Sorgo 20 Espécies vegetais Algodão 21 Bovino zulu, cor branca 51 a 54 Bovino simental, cor creme 50 Bovino africânder, cor vermelha 22 Bovino sussex, vermelho escuro 17 Bovino aberdeen angus, cor preta 11 Bovino santa gertrudes, vermelho 28 Bovino jersey, amarelo 40 Homem branco 35 Espécies animais Homem negro 18 3.6.2 – Balanço de Ondas Longas A contabilidade do saldo de ondas longas se faz considerando positivo a contra- radiação (Rcr) e negativo a radiação que é emitida pela superfície em estudo (Rt). Existem sensores que medem radiação infravermelha, permitindo que esse balanço possa ser quantificado instrumentalmente (Figura 3.6.2.1). Entretanto, pode-se realizar a estimativa desse balanço empregando-se uma equação empírica (Equação 3.6.2.1). 27 Figura 3.6.2.1 – Sensor de radiação de ondas longas, à esquerda; e sensor de balanço de ondas longas, à direita. ( )[ ] ×+×−××××= N n etQ ol 9,01,056,009,00864,0 4σ (Equação 3.6.2.1) Em que: Qol = balanço de ondas longas (MJ m-2 d-1), 0,0864 = fator de correção empregado para passar a unidade de W m-2 para MJ m-2 d-1, σ = constante de Stefan-Boltzmann (5,67 x 10-8 W m-2 °K-4), t4 = temperatura do ar (°K), e = tensão de vapor d’água na atmosfera (mm Hg), n = insolação diária (horas), N = duração astronômica do dia (horas). 3.6.2 – Balanço de Radiação A Figura 3.6.2.1 mostra um esquema quantitativo de como a radiação extraterrestre (Ro) é atenuada pelos constituintes da atmosfera e atinge a superfície da terra de forma direta (Rgdir) ou difusa (Rgdif), sendo o total destas (Rg) parcialmente refletido (Rgr). Por sua vez, a terra também emite radiação como uma forma de dissipar seu conteúdo energético, na forma de ondas longas (Rt), mas uma parte dessa radiação é absorvida pelos constituintes da atmosfera e estes re-emitem de volta para a terra uma quantidade de energia de onda longa denominada contra-radiação (Rcr) que é totalmente absorvida pela superfície da terra. 28 BalanBalançço de radiao de radiaççãoão Figura 3.6.2.1 – Esquema quantitativo do balanço de radiação. Nota-se na Figura 3.6.2.1 que o saldo de radiação (Rn) representa, para o caso em estudo, 48% que do total da radiação que atinge o topo da atmosfera (Ro). Entretanto, esses não são valores fixos, pois dependem das propriedades ópticas da atmosfera que variam de acordo com seus constituintes, das propriedades ópticas da superfície, da latitude e altitude locais e da época do ano.A contabilidade final, considerando o balanço de ondas curtas (Qoc) e o balanço de ondas longas (Qol), fornece o saldo de radiação (Rn). O balanço de radiação (Rn) pode ser estimado matematicamente, a partir das equações anteriormente apresentadas para as estimativas dos balanços de ondas curtas e de ondas longas (Equação 3.6.2.1), ou também ser medido instrumentalmente, com emprego de um saldo radiômetro (Figura 3.6.2.2). olocn QQR += (Equação 3.6.2.1) Em que: Rn = saldo de radiação (MJ m-2 d-1), Qoc = balanço de ondas curtas (MJ m-2 d-1), Qol = balanço de ondas longas (MJ m-2 d-1). 29 Figura 3.6.2.2 – Diferentes tipos de saldo radiômetros, sendo o da esquerda provido de um sensor constituído em teflon resistente às intempéries e o da direita, um outro tipo provido de cúpulas feitas de plástico e que são frágeis e tem risco de condensação de vapor d’água em seu interior afetando a qualidade das medições. 3.6.2 – Balanço de Energia O balanço de energia se refere à distribuição da energia líquida disponível (Rn), ao seu destino na terra. Fundamentalmente, como já foi mencionado, o saldo de radiação é a energia disponível para aquecer o solo, o ar, alterar o estado físico da água e ser empregada no processo fotossintético. A forma quantitativa da expressão do balanço energético e os destinos dos fluxos de energia se calcula com o emprego da Equação 3.6.2.1. PLEHGRn +++= (Equação 3.6.2.1) Em que: Rn = saldo de radiação (MJ m-2 d-1), G = fluxo de calor no solo (MJ m-2 d-1), H = fluxo de calor sensível (MJ m-2 d-1), LE = fluxo de calor latente (MJ m-2 d-1), P = fluxo de energia empregada no processo fotossintético (MJ m-2 d-1). 3.7 – Referências Bibliográficas Geiger, R. 1980. Manual de Microclimatologia. O Clima da Camada de Ar Junto ao Solo. Fundação Calouste Gulbernkian, Lisboa. 556 p. Tubelis, A. e Nascimento, F.J.L. do. 1980. Meteorologia Descritiva. Fundamentos e Aplicações Brasileiras. Nobel, São Paulo. 374 p. Vianello, R.L. e Alves, A.R. 1991. Meteorologia Básica e Aplicações. Universidade Federal de Viçosa, Imprensa Universitária, Viçosa. 449 p.
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