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Economia Colonial Brasileira e o Sentido da Colonização

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Aula 2 – A Opção Colonizadora: o Sentido da Colonização 
Objetivos:
Entender as orientações e perspectivas que fundamentaram teórica e conceitualmente a inclusão do Brasil no projeto imperial português; 
Analisar a importância do pacto colonial para a inserção do Brasil no contexto mercantilista da economia moderna.
Economia colonial brasileira
No ano de 1937, Roberto Simonsen inaugurou um modelo explicativo para a economia colonial brasileira baseado no conceito de ciclos econômicos. Na obra História econômica do Brasil (SIMONSEN,1978), o autor defende que os principais ciclos foram:
o ciclo do Pau- Brasil, que tinha por base a mão-de-obra indígena;
o ciclo da economia açucareira, que se baseava na grande propriedade de terras e escravos que trabalhavam na monocultura de cana-de-açúcar;
e o ciclo da mineração, também escravista.
Segundo ele, estas foram as fases de estabelecimento, apogeu e declínio de inúmeras regiões da sociedade colonial.
Após a obra de Simonsen, outro autor que vai oferecer uma explicação para a economia colonial brasileira será Caio Prado Junior. Sua obra mais conhecida foi o livro Formação do Brasil Contemporâneo, onde no capítulo intitulado “Sentido da Colonização” discute a colônia brasileira. Antes de discuti-lo, vamos refletir sobre os objetivos do autor ao escrever o livro.
A primeira edição data de 1942. Em plena ditadura Vargas, Caio Prado acreditava que a compreensão das contradições e injustiças presentes na sociedade brasileira de sua época só seria possível através de uma análise da história brasileira, ou seja, para compreender o cenário político, econômico e social do Brasil contemporâneo, aquele das décadas de 1930 e 1940, era necessário conhecer seu passado.
É com essa meta que ele se volta para a “descoberta” e a colonização, era preciso investigá-la, somente o estudo dos erros anteriores poderiam evitar a repetição dos mesmos no presente e no futuro.
Como dissemos acima, “Sentido da Colonização” foi o capítulo que pensou o processo de formação do Brasil e procurava entender o que mantinha o país atado a um modelo político-econômico ultrapassado: “O que Caio Prado defende é que os germes da organização social não são novos, mas, apesar disso, o Brasil padece dos mesmos males encontrados no século passado, sem que muita transformação tenha acontecido para remover tais problemas.
Percebemos então que o sentido que ele busca só pode ser apreendido através de uma longa análise do processo histórico, não só do brasileiro, mas do europeu e, particularmente, da Península Ibérica.
O pioneirismo português discutido na aula 1 e a própria dinâmica mercantil da colonização vão permitir a Caio Prado formular a tese de que a colônia orbitava em torno da metrópole, o pacto ou exclusivo colonial atrelava a economia e a sociedade colonial à Europa, era a metrópole que decidia o que seria produzido, quando e para quem seria vendido e o que seria comprado pela colônia, ou seja, o Brasil existia apenas para fornecer riquezas à metrópole, não havendo uma lógica interna para a conformação de uma sociedade.
Se essa era a realidade brasileira, interessava então compará-la à de outras colônias. Ficava claro que o Brasil foi concebido como uma colônia de exploração. A questão que se apresenta agora é saber se essa condição se deu por terem sido os portugueses a colonizá-lo, a investigação estende-se então às colônias espanholas e inglesas.
Segundo ele, o mercantilismo baseava-se em uma lógica capitalista na qual as colônias forneceriam às metrópoles todos os subsídios para o seu enriquecimento, assim metais preciosos e mercadorias raras ou inexistentes na Europa seriam o objetivo primeiro, não importando de qual metrópole fosse analisada.
Chega a afirmar que a América era para Espanha um empecilho a ser vencido para alcançar o Oriente – foi durante a busca por uma passagem, um canal, que ligasse o Atlântico ao Pacífico que o ouro e a prata foram descobertos e, foi nesse momento, que a colonização espanhola começou, ou seja, conclui que também as colônias espanholas eram de exploração.
A análise recai então sobre as colônias inglesas, novamente a comparação é a ferramenta escolhida para demonstrar que a Inglaterra estabeleceu colônias de povoamento ao Norte e de exploração ao Sul.
Nas chamadas Treze Colônias, vigorava a pequena e a média propriedade familiar e uma sociedade muito parecida com a da metrópole, onde hoje é o sul dos Estados Unidos. Entretanto, imperava o latifúndio, a monocultura para exportação e a mão de obra escrava.
É aqui que percebemos que, para o autor, o povoamento não era o objetivo, fosse qual fosse a metrópole, ele ocorria quando não existia a possibilidade de exploração. Na verdade, o que determinava se a colônia seria de exploração ou de povoamento eram as condições geográficas e climáticas das mesmas.
Se seguirmos a lógica mercantilista, comprar barato e vender caro, perceberemos que as metrópoles precisavam comercializar mercadorias abundantes na colônia e escassas ou inexistentes na Europa – as colônias de clima subtropical e tropical certamente ofereciam essa oportunidade, já as de clima temperado forneceriam produtos semelhantes aos já existentes na Europa. Por isso, o que toda e qualquer metrópole desejava era estabelecer uma colônia de exploração.
Então, como explicar as Treze colônias? 
Segundo o autor, elas foram utilizadas para livrar a Inglaterra de excessos demográficos e de não anglicanos, responsáveis por guerras religiosas que ameaçavam a sociedade inglesa. Ao enviá-los para o “Novo Mundo”, o rei pacificava seu reino e não deixava de arrecadar impostos, pois mesmo estando do outro lado do Atlântico essas pessoas continuavam a ser súditos reais.
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo
“Os problemas do novo sistema de colonização de territórios quase desertos e primitivos, terão feição variada, dependendo em cada caso das circunstâncias particulares com que se apresentam. A primeira delas será a natureza dos gêneros aproveitáveis que cada um daqueles territórios proporcionará. A princípio, naturalmente, ninguém cogitará de outra coisa que produtos espontâneos, extrativos. (...) Os espanhóis serão os mais felizes: toparão desde logo, nas áreas que lhes couberam, com os metais preciosos, a prata e o ouro do México e Peru. Mas os metais, incentivo e base suficiente para o sucesso de qualquer empresa colonizadora, não ocupam na formação da América senão um lugar relativamente pequeno. (...) Na maior extensão da América ficou-se a princípio exclusivamente nas madeiras, nas peles, na pesca; e a ocupação de territórios, seus progressos e flutuações subordinaram-se por muito tempo ao maior ou menor sucesso daquelas atividades. 
Viria depois em substituição, uma base econômica mais estável, mais ampla: seria a agricultura. (...) podemos, e isto muito interessa nosso assunto, duas áreas diversas, além daquela em que se verificou a ocorrência de metais preciosos, em que a colonização toma rumos inteiramente diversos. São elas as que correspondem respectivamente às zonas temperadas, de um lado tropical e subtropical de outro. A primeira, que compreende grosseiramente o território americano ao norte da baía de Delaware (a outra extremidade temperada do continente, hoje países platinos e Chile, esperará muito tempo para tomar forma e significar alguma coisa), não ofereceu realmente nada de muito interessante, e permanecerá ainda por muito tempo adstrita à exploração de produtos espontâneos: madeiras, peles, pesca. 
Na Nova Inglaterra, nos primeiros anos da colonização, viam-se até com maus olhos quaisquer tentativas de agricultura que desviavam das feitorias de peles e pesca nesta área temperada, o que aliás só ocorreu depois do século XVII, foi por circunstâncias muito especiais. 
É a situação interna da Europa, em particular da Inglaterra, as suas lutas político-religiosas, que desviam para América a atenção de populações que não se sentem à vontade e vão procurar ali abrigo e paz para suas convicções. (...)Há um fator econômico que também concorre na Europa para este tipo de emigração. É a transformação sofrida pela Inglaterra no correr do século XVI, e que modifica profundamente o equilíbrio interno do país e a distribuição de sua população. Esta é deslocada em massa dos campos, que de cultivados se transformam em pastagem para carneiros cuja lã iria abastecer a nascente indústria têxtil inglesa. São assim circunstâncias especiais, que não tem relação direta com ambições de traficantes ou aventureiros, que promoverão a ocupação intensiva e o povoamento em larga escala da zona temperada da América.” 
O que percebemos é que a grande questão para Caio Prado é comprovar a falta de autonomia das colônias frente suas metrópoles e, mais, que esse processo já traz em si traços claros de capitalismo pois na verdade para ele a relação econômica estabelecida aqui é a de uma “grande empresa colonial”, ou seja, a economia na colônia só existe para atender às necessidades da metrópole. Por essa razão, ele chega a outra importante conclusão, se o Brasil só pode produzir e vender para Portugal, como plantar e vender internamente?
A economia colonial é voltada para o mercado externo e não para comercializar com cidades e províncias vizinhas. Logo, não existiria um mercado interno no Brasil colonial.
O modelo interpretativo de Caio Prado estabeleceu que o sistema colonial possuía uma economia majoritariamente agroexportadora e que a produção interna de alimentos estaria dependente do comércio internacional dos produtos coloniais. Dessa forma, atribuía-se pouco dinamismo ao mercado interno que estaria voltado apenas para o autoconsumo. A razão para esta dependência estaria na transferência de recursos para a metrópole, na escravidão e na produção monocultora.
A colônia não possuía, dessa maneira, uma formação econômica e era um corolário do modelo capitalista que estava inserido no mercado dominante da Europa. Além de todas essas questões que são importantes no estudo de Caio Prado, ele finda com a ideia de Simonsen de ciclos econômicos.
As explicações fornecidas por Prado Junior também fascinaram outros autores – Fernando Novais, Celso Furtado, Jacob Gorender, Ciro Flamarion Cardoso, dentre outros – que elaboraram suas próprias teses a partir dos estudos de Caio Prado, embora alguns tenham discordado desse capitalismo precoce.
O estudo de Celso Furtado intitulado Formação Econômica do Brasil dizia que o comércio exterior se constituía no eixo central da economia escravista, não configurando um sistema autônomo, sendo um simples prolongamento de outros maiores. Na década de 1970, o debate teórico acerca da definição do modo de produção capitalista na Europa chega ao Brasil pela via da crítica ao modelo circulacionista inaugurado por Prado Júnior.
Os debates oriundos dos estudos de Ciro Flamarion abrem espaço para a formulação do conceito de uma formação escravista colonial, que mais tarde foi elaborada por Jacob Gorender. A proposição baseia-se na utilização da mão de obra escrava para a reprodução da economia colonial. 
Ainda segundo Ciro Cardoso, o modo de produção escravista colonial teria como fatores centrais o caráter colonial (periférico e subordinado) e a escravidão, visto que seu funcionamento era base das estruturas sociais.
O autor Fernando Novais trabalhou com a ideia de uma economia colonial voltada para enriquecer a coroa portuguesa e, consequentemente, o capitalismo europeu. Em sua obra, Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema colonial (1986), ele inspirou-se nas teses de Caio Prado Júnior e Celso Furtado, para elaborar o conceito de Exclusivo Metropolitano. Segundo a tese defendida pelo autor, a produção agrícola e mineral estaria voltada para a metrópole, que possuía exclusividade no comércio. A produção de alimentos na colônia servia à subsistência. Também, segundo ele, o escravismo moderno é o fato colonial, ou seja, a posição do Brasil no comércio mundial.
A importância no tráfico negreiro para a economia colonial brasileira.
Nos anos de 1990, entretanto, dois historiadores – João Fragoso e Manolo Florentino – pautados em novas fontes primárias, principalmente inventários, vão discutir a importância no tráfico negreiro para a economia colonial brasileira, o principal argumento desenvolvido é o de que embora a maior parte dos escravos fosse utilizada na produção do açucar, a importação dos mesmos não diminuía em períodos nos quais havia queda na exportação de açucar para a Europa sendo assim, na opinião desses historiadores, fica demonstrado que essa mão de obra era desviada para outros produtos – tabaco, algodão, gado, alimentos – fossem eles para atender as flutuações do mercado externo ou para atender as necessidades dos próprios habitantes da colônia. 
Outro desdobramento, quando se toma o tráfico como fator comercial por si mesmo, é o de que o escravo é uma mercadoria que não é comprada ou vendida para Portugal, ele rompe com os limites impostos pelo pacto colonial – o comércio era feito diretamente entre Brasil e África e uma parte dos escravos era revendida para colônias espanholas na América. 
Ainda existe um terceiro fator, a moeda de troca utilizada pelos traficantes para adquirir mão de obra na costa africana era, principalmente, a aguardente (cachaça) o que nos leva a perceber que uma parte da produção açucareira, mesmo que pequena, não estava direcionada a Europa e o lucro advindo da transação também não vinha dali.
Esses dois autores também questionaram o modelo de sociedade desenvolvido a partir das teses econômicas tradicionais. A forma como era tratada a economia colonial não deixava espaço para a inserção de homens livres pobres que era grande camada da sociedade. A definição de sistema colonial não guardava espaço para os homens livres pobres que constituíam população considerável.
Esses dois autores também questionaram o modelo de sociedade desenvolvido a partir das teses econômicas tradicionais. A forma como era tratada a economia colonial não deixava espaço para a inserção de homens livres pobres que eram grande camada da sociedade. A definição de sistema colonial não guardava espaço para os homens livres pobres que constituíam população considerável.
Sem dúvida alguma, os senhores de escravos eram os protagonistas de uma História praticamente vista de cima. Os novos estudos sobre a colônia contribuíram para mostrar uma grande parcela da população que antes estava na margem da escrita da história.
Sem dúvida alguma, os senhores e escravos eram os protagonistas de uma História praticamente vista de cima. Os novos estudos sobre a colônia contribuíram para mostrar uma grande parcela da população que antes estava à margem da escrita da história.
Actividade
Após ler o conteúdo da aula e os dois textos abaixo, elabore um texto de uma lauda ressaltando as principais divergências entre as teses defendidas pelos autores citados.
MARIUTI, Eduardo B., NOGUERÓL, Luiz P. F., DALIELI NETO, Mário. Mercado interno colonial e grau de autonomia: Críticas às propostas de João Luiz Fragoso e Manolo Florentino. Disponível em: <http://www.4shared.com/office/AitFBtnY/mariutti_eduardo_noguerl_luiz_.html>.
RODRIGUES, Davidson de O. Colonização portuguesa escravismo e atividades econômicas: breve balanço historiográfico. Disponível em: <http://www.fafich.ufmg.br/pae/apoio/colonizacaoportuguesaescravismoeatividadeseconomicas.pdf>.

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