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“Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas” Jefferson Patrício Nascimento Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre em Ciência e Tecnologia das Radiações, Minerais e Materiais 2013 COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR – CNEN CENTRO DE DESENVOLVIMENTO DA TECNOLOGIA NUCLEAR – CDTN MESTRADO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA DAS RADIAÇÕES, MINERAIS E MATERIAIS ESFOLIAÇÃO QUÍMICA DO GRAFITE NATURAL EM MISTURAS DE SOLVENTES ORGÂNICOS: A OBTENÇÃO DE GRAFENOS DE POUCAS CAMADAS Jefferson Patrício Nascimento Belo Horizonte – MG Março– 2013 COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR – CNEN CENTRO DE DESENVOLVIMENTO DA TECNOLOGIA NUCLEAR – CDTN MESTRADO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA DAS RADIAÇÕES, MINERAIS E MATERIAIS ESFOLIAÇÃO QUÍMICA DO GRAFITE NATURAL EM MISTURAS DE SOLVENTES ORGÂNICOS: A OBTENÇÃO DE GRAFENOS DE POUCAS CAMADAS JEFFERSON PATRÍCIO NASCIMENTO Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia das Radiações, Minerais e Materiais, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. Área de concentração: Ciência e Tecnologia dos Materiais Orientadora: Dra. Clascídia Aparecida Furtado (CDTN/CNEN) Belo Horizonte – MG Março – 2013 Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 V Agradecimentos A Deus por me dar e estar presente na minha vida. Aos meus pais, Paulo e Maria, meu irmão André e minha namorada Roberta (Bebeh), pelo amor, compreensão, incentivo e apoio em todos os momentos. Pessoas que tenho muito orgulho e admiração. Sem eles eu não conseguiria chegar a lugar nenhum. A Dra. Clascídia e Dra. Adelina pela confiança e oportunidade de trabalhar no LQN. Principalmente a Dra. Clascídia (Caca) pela excelente orientação, profissionalismo, ótimo convivo e também pela amizade. A Dra. Adelina e o Dr. Max Passos pela cooperação, ajuda e ótimas dicas sobre o meu trabalho. Sou muito grato a vocês. Ao João Paulo (Jones), André (djow), Lucas (baiano), Tiago (gaúcho), Viviane (Vivi), Gleuber (Greuber), Carla (Carlete), Thais, Rafael e Ana Cristina, pela amizade e as boas risadas. A todos do LQN e do nosso grupo: Flávia, Regina, Lívia, Giovanni, Daniele, Pedro e Fernanda. Também aos colegas passageiros e que saíram do nosso laboratório: Charles, Igor, Daniel Andrada, Sandra, Anderson (UFSJ) e Macarena. Aos colegas da minha turma de mestrado. A empresa Nacional de Grafite Ltda, principalmente a Fernanda, o Geraldinho e a Viviane, pela cooperação e apoio. Aos amigos da UFSJ e Barbacena, apesar do pouco contato, pela amizade e incentivo. A todos os professores e funcionários da pós-graduação do CDTN. A todos os funcionários do prédio 7 e do CDTN. A CNEN pela bolsa de mestrado. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 VI “Nada na vida deve ser receado. Tem apenas que ser compreendido”. Marie Curie (1867 – 1934) Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 VII Este trabalho foi realizado no Laboratório de Química de Nanoestruturas do Serviço de Nanotecnologia do CDTN/CNEN durante o período de março/2011 a fevereiro/2013, sob a orientação da Dra. Clascídia Aparecida Furtado. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 VIII Resumo O grafeno é um material bidimensional (2D) com espessura monoatômica, formado por átomos de carbono com hibridização sp2. Ele é a base das estruturas grafíticas, como os fulerenos, os nanotubos de carbono e o grafite, possuindo excepcionais propriedades eletrônicas, térmicas, mecânicas e ópticas. Entre os métodos de obtenção do grafeno, a esfoliação química do grafite em fase líquida é altamente promissora, pois pode ser escalonada, possibilitando a produção de grandes volumes. Além disso, apresenta alta versatilidade em termos de funcionalização química do grafeno e produção de filmes finos para a confecção de compósitos e de eletrodos transparentes e condutores. Desde que as singulares propriedades mecânicas e condutoras das nanoestruturas de carbono estão associadas a espécies individuais isoladas, a dispersão e estabilização de grafenos em diferentes líquidos são de extrema importância em estudos fundamentais e aplicados. Para tal, o potencial atrativo entre as folhas no grafite deve ser balanceado por um potencial repulsivo. Assim, o custo energético das interações grafeno-solvente, que depende fortemente do material de partida e das propriedades dielétricas do meio, precisa ser entendido. Teorias de solubilidade têm sido recentemente aplicadas a nanoestruturas de carbono. Neste estudo, usamos os parâmetros de solubilidade de Hansen para a proposição de solventes e misturas capazes de esfoliar em fase líquida o grafite natural da empresa Nacional de Grafite Ltda.. Utilizando um algoritmo no Matlab baseado nos parâmetros de solubilidade de Hansen, selecionou-se cinco misturas de solventes orgânicos, onde o clorofórmio é um dos componentes. O grafite natural na forma bruta e pré-esfoliada foi esfoliado em dispersões estáveis de grafenos, as quais foram caracterizadas por espectroscopia no UV-Vis e Raman, MET e DLS. As dispersões produzidas nas misturas de menor valor de D0, apesar de apresentarem uma menor concentração de material disperso, apresentaram flakes de tamanho maior e com poucas camadas de grafeno. Já nas misturas com maior valor de D0, observou-se uma maior concentração de material disperso, com grafenos de dimensões maiores e menores, porém com maior número de camadas. Palavras-chave: grafeno; parâmetros de solubilidade de Hansen; esfoliação química em fase líquida;solventes orgânicos. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 IX Abstract Graphene is a two-dimensional material (2D) composed by a monoatomic thickness sheet of carbon atoms with sp2 hybridization. It is the basis of graphitic structures, such as fullerenes, carbon nanotubes and graphite, possessing exceptional electronic, thermal, mechanical and optical properties. The method of graphene obtention through graphite exfoliation in liquid phase is highly promising because it can be staggered, allowing the production of large quantities. In addition, it presentshigh versatility in terms of chemical functionalization of graphene and thin films production for the manufacture of composites and transparent and conducting electrodes, respectively. Since natural and mechanical properties of conductive carbon nanostructures are associated with individual isolated species, dispersion and stabilization of graphene in different liquids are of utmost importance in basic and applied studies. For this purpose, the attractive potential between the graphene sheets in the graphite must be balanced by a repulsive potential. Thus, the energy cost of graphene-solvent interactions, which strongly depends on the starting material and the dielectric properties of the medium, needs to be understood. Solubility theories have recently been applied to carbon nanostructures. In this study, we have used the Hansen solubility parameters for proposing solvent mixtures able to exfoliate the natural graphite from the Nacional de Grafite Ltda. company in the liquid phase. Using an algorithm in Matlab based on the Hansen solubility parameters, we have selected five mixtures of organic solvents, where chloroform is one of the components. The natural graphite in raw form and pre-exfoliated was exfoliated in stable dispersions of few-layer graphenes, which were characterized by UV-Vis and Raman spectroscopy, transmission electron microscopy (TEM) and dynamic light scattering (DLS). Dispersions produced in mixtures of lower value of D0, despite having a lower concentration of dispersed material, showed larger flakes size with few-layers of graphene. Mixtures with a higher value of D0 presented a higher concentration of dispersed material, but particles with smaller dimensions and a greater number of layers. Keywords: graphene; Hansen solubility parameters; chemical exfoliation; organic solvents; chloroform. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 X Lista de Abreviaturas e Símbolos CDTN Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear CHP Ciclohexilpirrolidona DEC Densidade de energia coesiva DLS Espalhamento dinâmico de luz, do inglês dynamic light scattering DMA N,N-dimetilacetamida DMF N,N-dimetilformamida ED Energia coesiva de dispersão EH Energia coesiva de ligação de hidrogênio EP Energia coesiva polar HOPG Grafite pirolítico altamente orientado ID/IG Relação entre a intensidade das bandas D e G no espectro Raman MET Microscopia eletrônica de transmissão NGL Empresa brasileira Nacional de Grafite Ltda. NMP N-metilpirrolidona PSHs Parâmetros de Solubilidade de Hansen UV-Vis Espectroscopia de absorção óptica na região do ultravioleta-visível α Coeficiente de absortividade (Lei de Beer) λ Comprimento de onda Ra Distância dos parâmetros de solubilidade de dois materiais ou substâncias D0 Distância mínima entre os parâmetros de solubilidade da mistura de solventes e os parâmetros de solubilidade do grafeno. φ Fração volumétrica Γ Largura a meia altura da banda (FWHM, do inglês full width at half maximum ) μ Momento de dipolo δ Parâmetro de solubilidade de Hildebrand δD Parâmetro de solubilidade de energia coesiva de dispersão (Hansen) δP Parâmetro de solubilidade de energia coesiva polar (Hansen) δH Parâmetro de solubilidade de energia coesiva de Hidrogênio (Hansen) χ Parâmetro de interação de Flory-Huggins Ro Raio do esferóide de Hansen La Tamanho de cristalito Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 XI SUMÁRIO Capítulo 1 - INTRODUÇÃO ............................................................................................... 1 OBJETIVOS ..................................................................................................................... 2 O DOCUMENTO ............................................................................................................ 2 Capítulo 2 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .................................................................. 3 2.1 - Grafeno ..................................................................................................................... 3 2.2 - Estrutura Cristalina do Grafeno ............................................................................. 4 2.3 - Estrutura Eletrônica do Grafeno ............................................................................ 4 2.4 - Propriedades do Grafeno ........................................................................................ 5 2.4.1 - Propriedades Elétricas ................................................................................. 5 2.4.2 - Propriedades Térmicas ................................................................................ 7 2.4.3 - Propriedades Mecânicas ............................................................................. 8 2.4.4 - Propriedades Ópticas .................................................................................. 8 2.5 - Obtenção do Grafeno ............................................................................................. 9 2.5.1 - Esfoliação Micromecânica .......................................................................... 9 2.5.2 - Crescimento Epitaxial em SiC ..................................................................... 10 2.5.3 - Deposição Química da Fase Vapor (CVD) ................................................. 11 2.5.4 - Esfoliação Química em Fase Líquida .......................................................... 12 2.5.4.1- Esfoliação em Fase Líquida do Óxido de Grafite ......................... 13 2.5.4.2 - Esfoliação em Fase Líquida do Grafite Natural .......................... 15 2.5.4.3 - Esfoliação em Fase Líquida do Grafite Expandido ...................... 18 2.5.4.4 - Esfoliação em Fase Líquida Livre de Sonificação ....................... 19 2.6 - Teorias de Solubilidade .......................................................................................... 20 2.6.1 – Interações Intermoleculares e Energia Coesiva .......................................... 21 2.6.2 - Parâmetro de Solubilidade de Hildebrand ................................................... 21 2.6.3 - Parâmetros de Solubilidade de Hansen ....................................................... 23 2.6.4 - Parâmetro de Interação de Flory-Huggins ................................................... 27 2.6.5 - Trabalhos da Literatura que Aplicaram os Parâmetros de Solubilidade na Dispersão em Fase Líquida de Nanomateriais de Carbono .................................... 29 Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 XII Capítulo 3 – PARTE EXPERIMENTAL ....................................................................... 35 3.1 – Material de Partida .................................................................................................. 35 3.2 - Procedimento Experimental ................................................................................... 35 3.2.1 - Construção do Algoritmo para a Seleção da Mistura de Solventes ............. 35 3.2.2 - Preparo das Dispersões de Grafeno ............................................................. 38 3.2.3 - Caracterização das Dispersões de Grafeno .................................................. 40 3.2.3.1 - Espectroscopiana região do UV-Vis ............................................ 41 3.2.3.2 - Espalhamento Dinâmico de Luz ................................................... 41 3.2.3.3 - Microscopia Eletrônica de Transmissão (MET) .......................... 41 3.2.3.4 - Espectroscopia Raman ................................................................. 41 Capítulo 4 – RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................... 43 4.1 - Espectroscopia na região do UV-Vis .................................................................... 43 4.2 - Espalhamento Dinâmico de Luz (DLS) ............................................................... 51 4.3 - Microscopia Eletrônica de Transmissão (MET) ................................................ 55 4.4 - Espectroscopia Raman ............................................................................................ 69 Capítulo 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................... 77 APÊNDICE A – Produção Científica................................................................................. 78 Conferências Nacionais Conferências Internacionais Colaboração com Outros Trabalhos e Grupos de Pesquisa APÊNDICE B – Espectros de UV-Vis .............................................................................. 80 APÊNDICE C – Imagens das Dispersões Finais Obtidas ......................................... 86 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 87 Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 1 Capítulo 1 – INTRODUÇÃO Grafeno, um material de carbono bidimensional, surgiu como o material mais exótico nesta primeira década do século XXI e tem recebido enorme atenção da comunidade científica devido a suas excepcionais propriedades eletrônicas, térmicas, mecânicas e ópticas: alta condutividade elétrica com grande mobilidade de portadores de carga (~200.000 cm2/Vs ), alta condutividade térmica (~5000 W/mK ), alto modulo de Young (~1,0 TPA) e resistência à fratura (~130 GPa) e transmissão de 92,7% da luz incidente. O grafeno é um promissor candidato para a construção de novos dispositivos, como transistores de efeito de campo (FETs) com alta freqüência e eletrodos transparentes. Além disso, o grafeno pode ser adicionado a outros materiais (compósitos a base de grafeno), melhorando suas propriedades elétricas e mecânicas (SINGH et al., 2011). O grafeno é um material bidimensional (2D) com espessura monoatômica, formado por átomos de carbono com hibridização sp2, em que cada átomo de carbono está ligado a outros três átomos de carbono em uma estrutura hexagonal. Esse material é a base das estruturas grafíticas, como os fulerenos, os nanotubos de carbono e o grafite. Os grafenos podem ser classificados em: grafenos de camada simples (single-layer-graphene - SG), grafenos de camada dupla (bilayer- graphene - BG) e grafenos de poucas camadas (few-layer graphene - FG, nº de camadas ≤ 10) (RAO et al., 2009). Existem quatro métodos principais de obtenção de grafenos: deposição química da fase vapor, esfoliação micromecânica, crescimento epitaxial em SiC e esfoliação química em fase líquida. A esfoliação química em fase líquida é um método usado para produzir dispersões coloidais de grafeno a partir do grafite (CUI et al., 2011). Esse é um dos métodos mais promissores para a produção de grafeno em escala industrial e as pesquisas caminham na direção de entender a interação dos grafenos com os diferentes meios e otimizar os seus parâmetros experimentais. Os parâmetros de solubilidade vêm sendo usados com sucesso na indústria de revestimento desde 1950 como uma ferramenta para medir a afinidade entre os componentes de um sistema e permitir, por exemplo, a dissolução de polímeros em solventes. Nos últimos sete anos, os parâmetros de solubilidade têm sido aplicados para se estudar as interações em dispersões coloidais de nanotubos de carbono em uma variedade de solventes. Recentemente, esta ferramenta começou a ser também usada para estudar as dispersões coloidais de grafenos em diversos solventes (HERNANDEZ et al., 2010). Além de inovador, o uso dos parâmetros de solubilidade para o estudo e a otimização das dispersões de grafeno em variados solventes e também em misturas de solventes é de extrema importância na área de nanotecnologia para a disponibilidade de grafenos em escala Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 2 industrial, com isso possibilitando a construção de novos dispositivos e sistemas à base desse nanomaterial. OBJETIVOS O Objetivo deste trabalho de mestrado é realizar a esfoliação química em fase líquida do grafite natural para a produção de dispersões coloidais estáveis de grafenos em misturas de solventes orgânicos, no qual o clorofórmio é um dos componentes, através do uso dos parâmetros de solubilidade de Hansen. Com este objetivo geral, os seguintes objetivos específicos foram criados: • Em parceria com um especialista em programação de computadores, melhorar o algoritmo que utiliza os dados dos parâmetros de solubilidade de Hansen para selecionar misturas de solventes candidatas a dispersar melhor os grafenos. O algoritmo foi inicialmente criado para o programa Matlab, em um trabalho anterior do grupo, considerando uma lista de 850 solventes; • Esfoliar o grafite natural Graflake 99580 da empresa brasileira Nacional de Grafite Ltda. na forma bruta e pré-esfoliado, nas melhores misturas de solventes indicadas teoricamente pelo algoritmo, otimizando alguns parâmetros experimentais como tempo de sonificação, tempo e força de centrifugação; • Caracterizar as dispersões coloidais e/ou o material disperso por espectroscopia na região do UV-Vis e Raman, microscopia eletrônica de transmissão e espalhamento dinâmico de luz. O DOCUMENTO Este documento está organizado em cinco capítulos. No capitulo 2 uma breve revisão da literatura é apresentada sobre a estrutura do grafeno, suas propriedades e os principais métodos de obtenção. Também foi feita uma breve revisão bibliográfica sobre as teorias de solubilidade e sua utilização na esfoliação química em fase líquida do grafite para obtenção do grafeno. Em seguida no capítulo 3 é descrito o procedimento experimental de obtenção das dispersões de grafeno em misturas de solventes orgânicos e suas caracterizações. No capítulo 4 são apresentados os resultados e as discussões e no capítulo 5 as conclusões e considerações finais. No apêndice A é apresentado a produção cientifica, no B os espectros no UV-Vis utilizados para a construção das curvas padrão, no C as imagens das dispersões finais obtidas. Por fim é apresentado as referências utilizadas no trabalho. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 3 Capítulo 2 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 Grafeno Os primeiros estudos com o grafite datam de 1840 quando o alemão Schafhaeutl produziu um grafite intercalado e esfoliado com ácido sulfúrico e ácido nítrico. Nestes experimentos, a estrutura do grafite é mantida, porém o espaçamento entre as lamelas é maior (BOEHM & STUMPP, 2007). Desde então, toda uma ciência do grafite se desenvolveu e, para tal, estudos teóricos sobre estrutura e propriedades do grafeno foram necessários ao entendimentodo comportamento e propriedades do grafite. Entretanto, apenas em 2004, com o isolamento de monocamadas de grafeno com tamanho de centenas de micrometros através da esfoliação (ou clivagem) micromecânica de um cristal de grafite pirolítico altamente orientado (HOPG), por Andre Geim e Konstantin Novoselov (NOVOSELOV et al., 2004), esse material deixou de ser virtual e tem sido extremamente estudado devido principalmente às suas propriedades eletrônicas e mecânicas excepcionais. O grafeno é um material bidimensional (2D) com uma espessura monoatômica (cerca de 0,4 nm), formado por átomos de carbono com hibridização sp2, em que cada átomo de carbono está ligado a outros três átomos de carbono em uma estrutura hexagonal (RAO et al., 2009), também conhecida com estrutura do tipo favos de mel. O grafeno é a base das várias estruturas grafíticas, como fulerenos, nanotubos de carbono e grafite, como está demonstrado na Figura 1. O grafite é formado por uma pilha de planos de grafenos, ligados por interações de van der Waals. Os grafenos podem ser definidos em: grafeno de camada simples (single-layer graphene - SG), grafeno de dupla camada (bilayer-graphene - BG) e grafeno de poucas camadas (few-layer graphene - FG) com número de camadas menor ou igual a 10 (RAO et al., 2009) . Figura 1. Estruturas grafíticas baseadas no grafeno: a) fulerenos; b) nanotubos de carbono; c) grafite (GEIM & NOVOSELOV, 2007). a) b) c) Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 4 2.2 - Estrutura Cristalina do Grafeno A célula unitária do grafite contém dois átomos (A e B) de carbono, em uma distância interatômica de a0 = 0,142 nm, que dão origem a duas sub-redes. A Figura 2 demonstra a estrutura do grafeno no espaço real (a) e no espaço recíproco (b) (MOLITOR et al., 2011). Os vetores de rede no espaço real 1a r e 2a r são usados para construir a estrutura bidimensional do grafeno a partir de quaisquer átomos A e B. Portanto, a célula unitária do grafeno pode ser definida como o losango construído por estes dois vetores no espaço real. Os dois vetores do espaço recíproco 1b r e 2b r definem a zona de Brillouin do grafeno (losango delimitado por estes vetores). a) b) Figura 2. a) Estrutura do grafeno no espaço real; b) estrutura do grafeno no espaço recíproco (MOLITOR et al., 2011). 2.3 - Estrutura Eletrônica do Grafeno Os átomos de carbono no grafeno possuem hibridização sp2, na qual eles se ligam entre si através de ligações σ (ligações covalentes) em um ângulo de 120º. O orbital 2pz, perpendicular ao plano do grafeno, faz uma ligação pi. Portanto, os elétrons deste orbital pz estão ligados fracamente aos átomos de carbono, fazendo com que eles possam se locomover na rede cristalina, ou serem excitados para níveis eletrônicos mais energéticos. Este estado eletrônico é chamado de estado eletrônico pi delocalizado e é o grande responsável pela condutividade elétrica do grafeno, em contraste com o diamante que possui carbonos com hibridização sp3 (STAMPFER et al., 2011). Os elétrons pi livres dos dois átomos da célula unitária do grafeno se distribuem em uma estrutura composta de uma banda de valência (pi, estados ligantes) e uma banda de condução (pi*, estados anti-ligantes da combinação dos estados eletrônicos dos átomos A e B). A Figura 3 mostra a Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 5 estrutura de bandas para o grafeno considerando apenas a ligação pi, calculada utilizando o modelo teórico de elétrons fortemente ligados (tight-binding) (STAMPFER et al., 2011). a) b) c) Figura 3. a) Relação da dispersão dos elétrons pi na primeira zona de Brillouin (espaço recíproco); b) Gráfico mostrando a dispersão de energia ao longo dos pontos de simetria KГMK’. Através da Figura 3, pode-se perceber que as bandas de valência (pi) e condução (pi*) no grafeno se tocam apenas nos pontos K (vértice dos hexágonos na zona de Brillouin), que são chamados pontos de Dirac. Estes pontos estão exatamente no nível de Fermi, fazendo com que o grafeno seja um semicondutor de gap nulo. Apenas os elétrons próximos ao ponto K podem participar do mecanismo de condução elétrica. A dispersão de energia próxima aos pontos de Dirac é linear, de modo que essas regiões podem ser entendidas como dois cones opostos (Figura 3b) que se tocam nos vértices (pontos K). Os dois elétrons pi da célula unitária do grafeno ocupam completamente a banda de valência, enquanto a banda de condução permanece vazia (STAMPFER et al., 2011). 2.4 - Propriedades do Grafeno 2.4.1 - Propriedades Elétricas A natureza incomum dos portadores de carga do grafeno é um dos aspectos mais interessantes deste material. Estes portadores de carga próximos aos pontos K (pontos de Dirac) se movem a uma velocidade efetiva cerca de 300 vezes menor que a velocidade da luz. Estes portadores podem ser considerados como elétrons (buracos) com massa de repouso nula (STAMPFER et al., 2011). Devido a isso o grafeno possui alta condutividade elétrica. Kim e colaboradores relataram mobilidades dos portadores de carga de 200.000 cm2/Vs e densidade de Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 6 portadores de carga de 2 x 1011 cm-2 para grafeno esfoliado mecanicamente e suspenso acima de um eletrodo de porta de Si/SiO2 (BOLOTIN et al., 2008). Outra característica importante do grafeno é o seu efeito de campo elétrico ambipolar à temperatura ambiente. Aplicando-se uma tensão (voltagem de entrada), o nível de Fermi pode ser ajustado para cima ou para baixo do ponto de Dirac. Ou seja, na polarização de porta positiva, o nível de Fermi fica acima do ponto de Dirac, promovendo elétrons e populando a banda de condução; na polarização de porta negativa, o nível de Fermi fica abaixo do ponto de Dirac, promovendo buracos na banda de valência. Com isso, a resistência do grafeno depende da tensão aplicada e apresenta um valor mínimo para cada valor de tensão aplicada (Figura 4). De cada lado do valor mínimo de resistência, a condutividade varia linearmente com a tensão aplicada (BOEHM & STUMPP, 2007; NOVOSELOV et al., 2004). Figura 4. Condutividade em função da voltagem de entrada para o grafeno (STAMPFER et al., 2011). Quando uma tensão é aplicada perpendicularmente a um grafeno de duas camadas (bilayer- graphene), um band gap é aberto e ajustável com o valor do campo elétrico (Figura 5) (SINGH et al., 2011). Isto acontece porque a dispersão dos elétrons no grafeno de duas camadas é diferente daquela no grafeno de camada simples. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 7 a) b) c) Figura 5. Band Gap nos grafenos: a) grafeno de camada simples; b) grafeno de duas camadas sem campo elétrico aplicado; c) grafeno de duas camadas com um campo elétrico E1 perpendicular ao grafeno. O Band Gap (2∆) éajustável pelo valor do campo elétrico (SINGH et al., 2011). Devido a essas propriedades eletrônicas descritas acima, o grafeno é um material em potencial para o desenvolvimento de transistores de efeito de campo (FET – Field Effect Transistor). Os FETs a base de grafeno podem chegar a uma freqüência de corte de 100 GHz, superior à frequência de corte dos MOSFET (40 GHz) a base de silício. O FET a base de grafeno ainda pode ser otimizado e miniatuarizado (LIN et al., 2010). 2.4.2 - Propriedades Térmicas O grafite, o diamante e os nanotubos de carbono apresentam uma alta condutividade térmica devido à forte ligação covalente C-C e ao espalhamento de fônons nesses materiais. Os nanotubos de carbono, anteriormente ao grafeno, eram considerados o material com maior condutividade térmica à temperatura ambiente (3000 W/mK para o nanotubo de paredes múltiplas e 3500 W/mK para o nanotubo de parede simples) (BALANDIN, 2011). Atualmente, o material com maior condutividade térmica é o grafeno (puro, livre de defeitos), a qual pode chegar acima de 5000 W/mK (BALANDIN et al., 2008). A condutividade térmica pode também variar dependendo do substrato onde o grafeno está depositado, porque as interações intermoleculares do grafeno com o substrato faz com que haja perda ou dispersão de fônons (SEOL et al., 2010). Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 8 Muitas técnicas estão sendo usadas para determinar a condutividade térmica dos grafenos. Uma delas é a espectroscopia Raman, onde se observa o deslocamento da banda G em diferentes temperaturas (BALANDIN, 2011). O grafeno é um material em potencial para o desenvolvimento de dispositivos eletrônicos, porém a condutividade térmica é um fator importante para este tipo de aplicação, já que os componentes eletrônicos geram calor durante sua operação e este calor deve ser dissipado. A alta condutividade térmica do grafeno pode também ser explorada em fluidos de troca térmica e na melhoria de propriedades em materiais compósitos. 2.4.3 - Propriedades Mecânicas O diamante, o grafite e os nanotubos de carbono apresentam uma alta dureza e um grande valor de módulo de Young e, obviamente, espera-se que o grafeno também apresente propriedades mecânicas similares. No entanto, há uma dificuldade experimental de se medir as propriedades mecânicas do grafeno devido às suas dimensões nanométricas, já que os métodos convencionais são utilizados para matérias macroscópicos. Assim, diversos métodos, como AFM e simulações numéricas (dinâmica molecular), são utilizados para se determinar as propriedades mecânicas do grafeno. Utilizando a nanoindentação, relatou-se que o grafeno livre de defeitos apresenta módulo de Young de 1,0 TPA e resistência à fratura de 130 GPa. Um “papel” feito de óxido de grafeno, chamado de paper-like graphene, apresentou módulo de Young de cerca de 32 GPa e resistência à fratura de cerca de 120 MPa (ZHU et al., 2010). 2.4.4 - Propriedades Ópticas O grafeno absorve 2,3% da luz incidente em uma ampla faixa de comprimento de onda (ZHU et al., 2010). A absorção de luz do grafeno varia linearmente com o aumento do número de camadas (Figura 6a) e é plana na faixa de 300 a 2500 nm, com um pico de absorção apenas em cerca de 250 nm. Este pico é atribuído à transição eletrônica de elétrons entre as bandas pi e pi* desocupada (Figura 6b). Com isso, o grafeno pode ser caracterizado por contraste de imagem óptica em um substrato de Si/SiO2 devido a fenômenos de interferência. O contraste aumenta com o aumento do número de camadas do grafeno (SINGH et al., 2011). Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 9 a) b) Figura 6. a) Fotografia de uma abertura de 50 µm mostrando um grafeno de camada simples e um de duas camadas (ZHU et al., 2010). b) Espectros de transmitância e valores de transmitância a 550 nm para grafenos de diferentes camadas (SINGH et al., 2011). O comprimento de onda da transição eletrônica do grafeno pode ser modificado pela mudança do nível de Fermi através de modulação elétrica. O grafeno também pode apresentar fotoluminescência através de gap adequado (SINGH et al., 2011). As suas propriedades ópticas, juntamente com as suas propriedades eletrônicas, faz com que se possa construir novos dispositivos eletrônicos baseados em grafeno. 2.5 - Obtenção do Grafeno Basicamente existem quatro métodos de se produzir grafenos: esfoliação micromecânica, crescimento epitaxial em SiC, deposição química da fase vapor (CVD – do inglês chemical vapor deposition) e esfoliação química em fase líquida. 2.5.1 - Esfoliação Micromecânica É um processo simples onde se “descama” um cristal de grafite usando uma fita adesiva (scotch tape) do tipo utilizado em processos de litografia (Figura 7). Posteriormente, os flocos finos são transferidos para um substrato, geralmente de Si/SiO2 (SINGH et al., 2011). As primeiras amostras foram produzidas com grafite pirolítico altamente orientado (HOPG) de 5 µm de espessura, mas a técnica já foi adaptada para vários outros grafites cristalinos. Com este processo, Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 10 obtêm-se grafenos de camada simples, dupla camada e poucas camadas com dimensões laterais na ordem de dezenas de micrômetros (ZHU et al., 2010). Figura 7. Esfoliação micromecânica do HOPG usando uma fita adesiva (scotch tape) (SINGH et al., 2011). Está técnica de obtenção permitiu a Andre Geim e Konstantin Novoselov estudarem as propriedades eletrônicas do grafeno. Por esses estudos, eles foram laureados com o Prêmio Nobel de Física em 2010. Os grafenos de alta qualidade cristalográfica obtidos por esfoliação micromecânica são muito interessantes para estudos fundamentais de física de transporte e outras propriedades, mas não é possível usar está técnica para a produção de grafeno em escala industrial. 2.5.2 - Crescimento Epitaxial em SiC Neste processo, um substrato de SiC (6H-SiC) é aquecido sob condições de ultra alto vácuo (UHV - ultrahigh vacuum) até que se sublime os átomos de silício, deixando os átomos de carbono na superfície, que se reorganizam (no plano 0001 do monocristal de 6H-SiC) na estrutura do grafeno. O tempo de recozimento e a temperatura do sistema influenciam no número de camadas do grafeno obtido. Por exemplo, para a produção de grafeno de poucas camadas necessita-se apenas de alguns minutos de recozimento à temperatura de cerca de 1200 ºC (PENUELAS et al., 2009). Usando a mesma técnica sob atmosfera de argônio, é possível obter grafeno de camada simples (EMTSEV et al., 2009). Substratos de Ru em UHV a altas temperaturas também são usados para o crescimento epitaxial de grafeno. O interessante deste sistema é que foi observado que a primeira camada de grafeno interage muito com o substrato, porém a segunda camada fica livre dessa interação (SUTTER et al., 2008). Outros substratos também são usados, como Ir, Ni, Co e Pt. A indústria de semicondutores tem um enorme interesse nesta técnica de obtenção, pois se obtém o grafeno sobre substratos de SiC e, portanto, não é preciso fazer qualquer tipo de Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 11transferência do grafeno para outro substrato. Entretanto, há muitos obstáculos que impedem a aplicação real desta técnica, como, por exemplo, o controle do número de camadas de grafeno na produção de rotina das indústrias. Outro problema é o crescimento do grafeno de poucas camadas, onde algumas camadas crescem com padrões diferentes (empilhamentos diferentes). Este problema influencia diretamente as propriedades físicas e eletrônicas do grafeno (SINGH et al., 2011). 2.5.3 - Deposição Química da Fase Vapor (CVD) A deposição química da fase vapor permite o crescimento de grafeno sobre superfícies metálicas, tais como Ni, Co e Cu. Posteriormente, através de um ataque químico do substrato metálico, os grafenos podem ser transferidos para outro substrato sem um tratamento mecânico ou químico complicado. Esta técnica consiste em colocar o substrato metálico (por exemplo, o Ni) numa câmara CVD sob vácuo de 10-3 Torr na presença de gases diluídos de hidrocarbonetos e temperatura abaixo de 1000 ºC. Nessas condições, uma quantidade limitada de átomos de carbono incorpora ao substrato, semelhante ao um processo de carburação. Em seguida, o substrato é submetido a um resfriamento rápido. Como a solubilidade do carbono diminui com a temperatura, os átomos de carbono difundem-se para a superfície do Ni se organizando na estrutura do grafeno. O número de camadas do grafeno é controlado pela temperatura de resfriamento do substrato. Este é o mecanismo de obtenção do grafeno em substratos (Ni e Co, por exemplo) com alta solubilidade média de carbono (> 0,1% de carbono) (REINA et al., 2009; BHAVIRIPUDI et al., 2010). Usando o Ni como substrato se consegue produzir grafenos de duas e três camadas. O mecanismo de obtenção do grafeno por CVD no Cu é diferente, devido à baixa solubilidade no carbono no Cu (< 0,001% de carbono), e pode produzir grafenos de camada simples e dupla camada. Basicamente, ele se baseia no crescimento de “ilhas” de grafeno na superfície do cobre saturada ou supersaturada (a saturação depende da temperatura, pressão e fluxo do CH4 e pressão parcial do H2) com espécies CxHy (Figura 8) (BHAVIRIPUDI et al., 2010). Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 12 Figura 8. Obtenção do grafeno por CVD em substrato de Cu (BHAVIRIPUDI et al., 2010). 2.5.4 – Esfoliação Química em Fase Líquida A esfoliação química em fase líquida é um método usado para produzir dispersões coloidais de grafeno a partir do grafite em uma variedade de solventes. Este método se baseia em adicionar qualquer tipo de grafite (natural, expandido, oxidado, etc.) em, por exemplo, solventes orgânicos ou soluções aquosas e, em seguida, expor estas misturas a uma fonte de energia (geralmente ondas ultrasônicas - sonificação) por um determinado tempo. Ao se expor esta mistura ao ultrassom, consegue-se esfoliar o grafite (vencendo as interações de van der Waals que existem entre os planos de grafeno no grafite) e, com isso, obtém-se uma polidispersão de grafenos de números de camadas variadas. Posteriormente, esta mistura passa por um processo de centrifugação para se retirar os agregados de grafite que não são esfoliados. Etapas sucessivas e/ou com forças diferentes de centrifugação possibilitam a separação de amostras com menor distribuição da dimensão e do número de camadas dos flakes. A esfoliação química em fase líquida é um dos métodos de produção de grafeno mais promissores, pois pode ser escalonado, possibilitando a produção de grandes volumes. Além disso, é muito versátil em termos de funcionalização química do grafeno e produção de filmes finos (Figura 9). Portanto a obtenção de dispersões coloidais de grafeno é um passo crucial para muitas aplicações, como a construção de eletrodos transparentes e condutores (SUNGJIN & RODNEY, 2009). Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 13 Figura 9. Esquema geral do processo de esfoliação química em fase líquida do grafite para obtenção de grafenos (figura adaptada da referência: LOH et al., 2010). A esfoliação química em fase líquida abrange basicamente quatro métodos: esfoliação em fase líquida do óxido de grafite, esfoliação em fase líquida do grafite natural (ou primitivo), esfoliação em fase líquida do grafite expandido e esfoliação em fase líquida livre de sonificação. 2.5.4.1 – Esfoliação em Fase Líquida do Óxido de Grafite O grafeno pode ser obtido a partir da redução do óxido de grafeno (GO – graphene oxide). Por sua vez, o óxido de grafeno é obtido a partir da esfoliação e sonificação do óxido de grafite preparado pelo método de Brodie, Staudenmaier, Hummers ou alguma variação desses métodos (SUNGJIN & RODNEY, 2009). O método de Brodie e Staudenmaier consiste em oxidar o grafite com uma combinação de clorato de potássio (KClO3) com ácido nítrico (HNO3). Já o método de Hummers envolve o uso de permanganato de potássio (KMnO4) e ácido sulfúrico (H2SO4) na oxidação do grafite (SOLDANO et al., 2010). O grafite oxidado apresenta um aumento da distância entre camadas de grafeno significativo, fazendo com que sua esfoliação posterior em solventes por sonificação seja eficiente. O óxido de grafeno tem a grande vantagem de poder ser facilmente disperso em solventes orgânicos com concentrações acima de 1 mg/mL e em água com concentrações acima de 7 mg/mL (CUI et al., 2011). Um problema do processo de oxidação é que se produz defeitos na estrutura do grafite. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 14 Existem muitos modelos que explicam a estrutura do óxido de grafeno. Estudos utilizando ressonância magnética nuclear (RMN) indicam que o plano basal do óxido de grafeno possui grupos hidroxila e epóxi ligados a carbonos com hibridização sp3 e grupos carbonila e carboxila ligados à borda do óxido de grafeno em carbonos com hibridização sp2. Estes resultados concordam com os modelos de Lerf-Klinowski e Dékány (SINGH et al., 2011). Devido aos grupos funcionais do óxido de grafeno, há uma ruptura na estrutura eletrônica conjugada do grafeno, fazendo com que o óxido de grafeno seja isolante em comparação com o gap nulo do grafeno puro (LOH et al., 2010). Com isso, é necessária a redução química do óxido de grafeno para se obter um grafeno com valores de condutividade ainda abaixo da ordem de magnitude do grafeno puro obtido por esfoliação micromecânica, por exemplo (SINGH et al., 2011). A redução química do óxido de grafeno é realizada com diversos agentes redutores como a hidrazina (N2H4), hidroquinona (C6H4(OH)2), borohidreto de sódio (NaBH4) e ácido ascórbico (C6H8O6). A hidrazina, ao contrário dos outros agentes redutores fortes, não reage com a água e é o melhor agente redutor para a produção de grafenos de camada simples. A Figura 10 demonstra o mecanismo deste procedimento. Durante o processo de redução, a dispersão de óxido de grafeno passa de marrom a preta e o grafeno reduzido (hidrofóbico devido à remoção de átomos de oxigênio do plano basal do óxido de grafeno) se agrega e precipita (SINGH et al., 2011). Os grupos funcionais oxigenados das bordas não são reduzidos pela hidrazina. Li e colaboradores desenvolveram um método de dispersão destes óxidos de grafeno reduzidos em água através do ajuste de pH. Com o ajuste de pH da água com amônia, os grupos das bordas tornam-se desprotonados (carregados negativamente), evitando sua agregação e precipitação (LI et al.,2008). Wang e colaboradores desenvolveram um procedimento solvotérmico da redução de óxido de grafeno com hidrazina em N,N – dimetilformamida (DMF) a 180ºC (DREYER et al., 2010). Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 15 Figura 10. a) Oxidação do grafite e obtenção do óxido de grafeno. Posteriormente, a redução com hidrazina da folha de óxido de grafeno. b) Mecanismo proposto para redução com hidrazina do óxido de grafeno (SINGH et al., 2011). Devido a defeitos causados pelo processo de oxidação do grafite, às propriedades eletrônicas diferentes daquelas do grafeno puro e à não redução dos grupos das bordas, autores costumam nomear o grafeno obtido a partir do óxido de grafeno de várias formas, como óxido de grafeno reduzido e oxido de grafeno quimicamente reduzido (DREYER et al., 2010). Wang e colaboradores utilizaram chá verde para realizar a redução do óxido de grafeno. O método consiste na adição de óxido de grafite em uma solução de chá verde. Esta solução é levada a um ultrassom de banho e, em seguida, a dispersão é seca, obtendo um pó de óxido de grafeno reduzido que foi usado para produzir um compósito com quitosana. Segundo os autores, o óxido de grafeno é reduzido pelos polifenóis presentes no chá verde (WANG et al., 2011). 2.5.4.2 - Esfoliação em Fase Líquida do Grafite Natural Esta é talvez a rota mais viável para se obtiver dispersões coloidais de folhas de grafeno. A qualidade estrutural dos grafenos obtidos por este método é superior à das folhas obtida pela redução do óxido de grafeno, principalmente devido à ausência dos grupos funcionais de oxigênio e os defeitos causados pelo processo de oxidação. O grafite natural pode ser esfoliado através de sonificação e centrifugação em diversos solventes orgânicos que são conhecidos por dispersar a) b) Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 16 efetivamente os nanotubos de carbono, como NMP (N-metilpirrolidona), DMF e 1,3-dimetil-2- imidazolidinona (CUI et al., 2011). É demonstrado que o sucesso destas dispersões coloidais só acontece quando a interação solvente-grafeno é maior do que a interação grafeno-grafeno no grafite. Portanto, a energia de superfície do solvente deve ser similar ou menor que a do grafite. Como a energia de superfície da água (72,75 mJ/m2) é muito maior que a do grafite (40 mJ/m2), surfactantes são empregados para que se possa dispersar o grafeno em água a partir da sonificação do grafite (Figura 10). Os grafenos são estabilizados pelos surfactantes (Figura 11) impedindo a agregação das folhas novamente (LOH et al., 2010). Figura 11. Esquema do processo de esfoliação do grafite em meio aquoso com o uso de surfactantes. a) Sonificação do grafite misturado com surfactante. b) Dispersão de grafenos após centrifugação estabilizada por sufarctantes. c) Modelo mostrando moléculas de surfactantes estabilizando um grafeno de camada simples (SINGH et al., 2011). Lotya e colaboradores usaram água e dodecilbenzeno sulfonato de sódio (DBS) para esfoliar o grafite por sonificação. Nesta dispersão havia mais do que 40% de grafenos com menos de 5 camadas e 3 % de grafenos de camada simples. Além disso, foi demonstrado que estes grafenos eram livres de defeitos através de espectroscopia Raman e microscopia eletrônica de transmissão de alta resolução. No entanto, as concentrações de grafenos encontradas foram na faixa de 0,002 mg/mL a 0,05 mg/mL (LOTYA et al., 2009), muito abaixo das concentrações obtidas com esfoliação em NMP. Em dispersões de grafeno usando surfactantes ainda não se obteve concentrações de grafenos acima de 1 mg/mL (LOTYA et al., 2010; GUARDIA et al., 2011). Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 17 KHAN e colaboradores produziram dispersões de grafeno em NMP, usando longos tempos de sonificação (460 h), com concentrações de 1,2 mg/mL em que 4% do material disperso era de grafenos de camadas simples (KHAN et al., 2010). Em outro trabalho, KHAN e colaboradores produziram dispersões a partir da esfoliação do grafite em NMP, com concentrações acima de 17 mg/mL em que 17% do material disperso era de grafenos de poucas camadas (KHAN et al., 2011). Estas dispersões concentradas foram produzidas a partir da re-dispersão do material decantado da primeira centrifugação do primeiro procedimento de dispersão. Neste trabalho, os autores conseguiram dispersões com concentrações acima de 63 mg/mL em que 19% do material disperso era de grafenos de poucas camadas, porém estas dispersões são pouco estáveis. Estas concentrações elevadas foram alcançadas através do seguinte procedimento: primeiramente, o grafite foi adicionado em NMP e sonificado por um determinado tempo. Em seguida, esta dispersão foi filtrada e o material disperso foi seco e adicionado em um novo NMP e sonificado novamente. Existem algumas técnicas diferentes de produzir dispersões de grafeno em fase líquida. Zhang e coloboradores produziram dispersões de grafeno usando a troca de solventes. Primeiramente o grafite foi dispersado em NMP usando sonificação e centrifugação; em seguida, o sobrenadante foi filtrado e o material seco resultante foi re-disperso em etanol. Concentrações da dispersão acima de 0,04 mg/mL foram produzidas, em que grande parte do material disperso era de grafenos com espessura abaixo de 10 nm (ZHANG et al., 2010). Choi e colaboradores esfoliaram o grafite para produzir grafenos em 1-propanol (PE: 97ºC), que é um solvente orgânico mais volátil do que os solventes comumente usados como NMP (PE: 202ºC) e 1,3-dimetil-2-imidazolidinona (PE: 224-226ºC). As dispersões produzidas tinham uma concentração de 25 µg/mL, onde grande parte do material disperso era de grafenos de poucas camadas (CHOI et al., 2011). O’Neill e colaboradores realizaram dispersões de grafeno em vários solventes com baixo ponto de ebulição, tais como clorofórmio e isopropanol. Nesse trabalho, conseguiu-se concentrações de material disperso acima de 0,5 mg/mL no qual havia grafenos de poucas camadas com dimensões de 1 µm (O’NEILL et al., 2011). Segundo Choi e O’Neill, os melhores solventes tendem a ter pontos de ebulição mais altos e por isso são difíceis de se retirar quando se produz filmes de grafeno com as dispersões. A vantagem de se usar solventes mais voláteis seria a de produzir filmes de grafeno sem resíduos de solvente, não precisando de procedimentos a altas temperaturas e longos tempos de secagem à vácuo. Líquidos iônicos são também candidatos promissores para se produzir dispersões de grafeno. Eles se enquadram nos “solventes verdes”, devido à sua baixa toxicidade, alta estabilidade Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 18 e pressão de vapor desprezível (CUI et al., 2011). Nuvoli e colaboradores usaram o líquido iônico comercial 1-hexil-3-metillimidazólio hexafluorofosfato para produzir dispersões de grafeno. As dispersões continham concentrações acima de 5,3 mg/mL em que 5% de material disperso era de grafenos de poucas camadas (NUVOLI et al., 2011). 2.5.4.3 - Esfoliação em Fase Líquida do Grafite Expandido Temperatura alta ou microondas têm sido empregadas para expandir (aumentar a distância interplanar) o grafite e melhorar sua esfoliação em fase líquida.Neste método, introduzem-se moléculas entre os planos do grafite através de reações químicas. Em seguida, o grafite intercalado por essas moléculas (grafite expansível - GICs – graphite intercalation compounds) passa por tratamento térmico (aquecimento rápido) ou microondas para que as moléculas se decompõem produzindo gases que se expandem e consequentemente aumentam o espaço interplanar dos planos de grafeno no grafite. Então, o grafite expandido (EG – expanded graphite) é esfoliado em fase líquida através de sonificação e centrifugação. Moléculas como H2SO4, H2O2 e ácido acético são usadas para expandir grafite (SINGH et al., 2011). O grafite expansível sem passar pelo tratamento térmico ou com microondas também é muito usado como material de partida para a esfoliação nos solventes (CUI et al., 2011). Wei e Jian produziram dispersões de grafeno em vários solventes orgânicos com adição de NaOH. Eles observaram que o NaOH intercala entre os planos de grafeno do grafite, aumentando a distância interplanar e melhorando a eficiência da esfoliação cerca de 20 vezes (LIU et al., 2011). Dhakate e colaboradores produziram dispersões com grafenos de camada simples e dupla camada através da re-intercalação e re-esfoliação de grafite expandido (DHAKATE et al., 2011). Primeiramente, produziu-se grafite expandido (EG) através de intercalação com H2SO4 e HNO3 e tratamento térmico. Em seguida, esfoliou-se o EG em DMF através de sonificação e centrifugação e o sobrenadante da centrifugação foi coletado. Finalmente, o sobrenadante passou novamente pelo processo de re-intercalação re-esfoliação (Figura 12). Nesse trabalho, cerca de 4 a 5% do material disperso da dispersão final era de grafenos de camada simples e dupla camada. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 19 Figura 12. As etapas envolvidas no trabalho do Dhakate (DHAKATE et al., 2011). 2.5.4.4 - Esfoliação em Fase Líquida Livre de Sonificação Existem basicamente três métodos de esfoliação química em fase líquida que não têm em seu procedimento a sonificação. A primeira é a esfoliação com CO2 supercrítico. Nesse método, o grafite é adicionado a uma atmosfera de CO2 supercrítico por um tempo (intercalação do CO2 supercrítico nos interplanos do grafite) e, depois de uma rápida despressurização do sistema, o fluido supercrítico expande o grafite produzindo grafenos que são coletados em meio aquoso com surfactantes (PU et al., 2009). O segundo método é a esfoliação eletroquímica. Nele é montada uma célula eletroquímica com eletrodos de grafite (anodo e catodo), onde se usa como eletrólito uma mistura de água e líquidos iônicos. Através da aplicação de um potencial elétrico entre os dois eletrodos, há deposição de folhas de grafeno no anodo. O mecanismo de esfoliação envolve uma complexa combinação entre a oxidação anódica da água e a intercalação aniônica do líquido iônico no grafite (LU et al., 2009). O terceiro e último método é a auto-esfoliação do grafite em fase líquida. Nesse método, o grafite entra em um processo de auto-esfoliação em fase líquida devido a fortes forças repulsivas induzidas por moléculas que estão intercaladas entre os planos de grafeno do grafite. Por exemplo, grafite intercalado por moléculas de K(tetrahidrofurano)xC24 pode ser esfoliado espontaneamente em NMP sem sonificação, devido a fortes repulsões dos próprios planos de grafeno que ficam carregados negativamente com a redução por metais alcalinos [K(tetrahidrofurano)xC24] (Figura 12) (VALLÉS et al., 2008). Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 20 Figura 13. Grafenos carregados negativamente devido a intercalação de moléculas de K(tetrahidrofurano)xC24 (VALLÉS et al., 2008). 2.6 - Teorias de Solubilidade Dentro das teorias de solubilidade, os parâmetros de solubilidade de Hildebrand, Hansen e o parâmetro de interação de Flory-Huggins têm sido usados há muitos anos na indústria de revestimento para a seleção dos melhores solventes para a solubilização de polímeros (macromoléculas) e para predizer afinidades entre polímeros na formação de blendas (HANSEN, 2000). Como os nanotubos de carbono e o grafeno podem ser considerados macromoléculas, muitos trabalhos nos últimos sete anos têm aplicado os parâmetros de solubilidade para determinar quais solventes são melhores para se produzir dispersões coloidais de nanotubos de carbono e grafeno. Neste trabalho, usamos os parâmetros de solubilidade para avaliar quais misturas de solventes orgânicos, nas quais o clorofórmio é um dos componentes, seriam candidatas teoricamente a produzir uma esfoliação eficiente (em termos de concentração e qualidade estrutural) do grafite em dispersões coloidais de grafenos. (Observação: nos próximos itens do trabalho ocasionalmente será usada a idéia de “solubilização” ou “dissolução” para o grafeno. Esses termos são utilizados apenas para soluções e não para dispersões. Isto foi feito por motivo de simplificação do texto, mas dispersões são conceitualmente diferentes de soluções: dispersões de partículas (soluto) levam à formação de colóides ou suspensões, e soluções podem ser obtidas como resultado da solubilização de um soluto (molécula ou íon) em um solvente específico (PREMKUMAR et al., 2012)). Os parâmetros de solubilidade são regidos pelo princípio que diz que “semelhante dissolve semelhante”, ou seja, os solventes que têm parâmetros de solubilidade similares a de um determinado soluto (grafeno, nanotubo ou polímero) solubiliza-o melhor. Será também demonstrado adiante que quando há um solvente que possui um parâmetro maior que o do soluto e outro solvente que possui um parâmetro menor, a mistura dos dois solventes (numa determinada proporção) solubilizará melhor este soluto, pois o parâmetro de solubilidade da mistura terá um Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 21 valor intermediário ao dos dois solventes. Os parâmetros de solubilidade de dois solventes numa mistura são proporcionais às frações volumétricas de cada solvente na mistura (BARTON, 1975). 2.6.1 – Interações Intermoleculares e Energia Coesiva As folhas de grafeno no grafite estão unidas devido às interações intermoleculares do tipo van der Waals. Para que ocorra a esfoliação do grafite em solventes orgânicos, estas interações (potencial atrativo entre as folhas de grafeno) devem ser rompidas e, para isso, elas devem ser balanceadas por interações (potencial repulsivo) mais fortes entre os grafenos e as moléculas do solvente (COLEMAN, 2009). A medida do custo energético no processo de evaporação de uma substância é chamada de energia coesiva. Na evaporação as forças intermoleculares (atrativas) que mantém as moléculas da substância no estado líquido coesas (unidas) são rompidas e assim a energia coesiva pode ser usada como um parâmetro para medir quantitativamente as forças intermoleculares de uma substância ou material (folhas de grafeno no grafite), considerando que no estado gasoso as forças intermoleculares são praticamente nulas (BARTON, 1975). Existem três principais tipos de interações intermoleculares entre moléculas neutras: dispersão (apolares ou dipolo induzido-dipolo induzido), dipolo permanente-dipolo permanente (polar ou dipolares) e ligação de hidrogênio (ATKINS & DE PAULA, 2008). Os parâmetros de solubilidade que são chamados geralmente de parâmetros de energiacoesiva tornaram-se uma ferramenta importante para medir a afinidade entre os componentes de um sistema, como o grafeno e uma determinada molécula de solvente em uma dispersão. 2.6.2 - Parâmetro de Solubilidade de Hildebrand O parâmetro de solubilidade (ou parâmetro de energia coesiva) foi primeiramente estudado por Hildebrand e Scott na década de 50. O parâmetro de solubilidade de Hildebrand (δ) é definido como a raiz quadrada da densidade de energia coesiva (DEC): δ = (DEC)1/2 = (E /V)1/2 (1), onde V é o volume molar do solvente puro e E é a energia de vaporização. A unidade no SI usada para o parâmetro de Hildebrand é o MPa1/2 que é 2,0455 vezes maior do que a unidade (cal/cm3)1/2 (HANSEN, 2000). Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 22 O pararâmetro de solubilidade de Hildebrand (δ) pode ser usado como uma estimativa numérica das forças intermoleculares atrativas e repulsivas que mantém unidas as folhas de grafeno no grafite e que precisam ser superadas para que se consiga dispersar os grafenos em solventes orgânicos. Num sistema ideal, o parâmetro de solubilidade de um soluto, no caso o grafeno, deve ter exatamente o mesmo valor (ou valores próximos) do parâmetro de solubilidade do solvente ou uma mistura de solvente, para que eles sejam completamente miscíveis em qualquer proporção, sem variação da entalpia de mistura e de volume e sem interações químicas específicas. O valor do parâmetro de solubilidade de Hildebrand para uma mistura de solventes onde todos os componentes têm volumes molares similares está relacionado com as frações volumétricas (φ i) e os parâmetros de solubilidade (δι) dos componentes da mistura, como demonstrado pela equação 2 a seguir: ∑= i iiδφδ (2), onde a soma engloba todos os componentes da mistura, incluindo o soluto quando sua fração volumétrica é calculável (BARTON, 1975). Em termos gerais, uma mistura de um “não solvente” e um solvente ou a mistura de dois “não solventes”, em determinada proporção de cada componente, pode solubilizar um determinado soluto, por exemplo, um nanomaterial de carbono. A equação 2 pode ser melhorada através da definição de fração volumétrica efetiva ( *φ ): para um soluto B em uma mistura de solventes (A + C) onde ( 1≈+ BA φφ ): CCAACA δφδφδ ** +=− (3) e 2 2 * * )( )( ABC CBA C A δδφ δδφ φ φ − − = (4). O termo da fração volumétrica efetiva ( *φ ) está relacionado à maior parte do termo da fração volumétrica (φ i) pelo inverso do ∆H do processo de mistura do soluto B nos solventes puros A e B. Isto tem a desvantagem de que o comportamento no limite 0)( →− AB δδ e 0)( →− CB δδ é incoerente (BARTON, 1975). Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 23 O parâmetro de solubilidade de Hildebrand foi desenvolvido apenas para soluções com moléculas cujas interações são exclusivamente apolares e não leva em conta outros tipos de interações intermoleculares como as polares e as ligações de hidrogênio. Tentando contornar esta limitação, Hansen em sua tese de doutorado em 1967 propôs o parâmetro de solubilidade de multicomponentes (HANSEN, 2000). 2.6.3 - Parâmetros de Solubilidade de Hansen Hansen propôs que o conceito de parâmetro de solubilidade envolve mais do que um componente, de acordo com as interações intermoleculares existentes no sistema. Os parâmetros de solubilidade de Hansen (PSHs) se baseiam na idéia de que a energia total de vaporização de um líquido (ou densidade de energia coesiva - DEC) pode ser dividida em três componentes: energias de dispersão ED, energias de dipolo permanente-dipolo permanente EP e ligações de hidrogênio EH, como demonstrado nas equações a seguir. E = ED + EP + EH DEC = ∆E/V = ∆ED/V + ∆EP/V + ∆EH/V DEC = δ2 = δ2D + δ2P + δ2H (5), onde δD, δP, δH são os parâmetros de solubilidade de Hansen para as interações intermoleculares de dispersão (interação apolar), polar e de hidrogênio, respectivamente. A unidade no SI usada para os PSHs é o MPa1/2 (HANSEN, 2000). Do mesmo modo que o parâmetro de solubilidade de Hildebrand, em um sistema ideal, os PSHs (δD, δP, δH) de um soluto, no caso o grafeno, devem ter valores próximos dos PSHs do solvente (ou uma mistura de solventes) para que se consiga romper as interações que mantém unidas as folhas de grafeno no grafite em qualquer proporção, sem variação da entalpia de mistura e de volume e sem interações químicas específicas. Procedimentos experimentais foram realizados por Hansen para calcular os três parâmetros de 90 solventes líquidos baseando nos dados de solubilidade de 32 polímeros (HANSEN, 2000). Alguns anos depois do trabalho de doutorado de Hansen (1967), através de cálculos teóricos e observações experimentais, Hansen e outros autores, além de validarem a equação 5, calcularam os três parâmetros de solubilidade para uma lista de milhares de solventes e solutos (principalmente polímeros). Atualmente estes dados disponíveis na literatura podem ser usados para calcular teoricamente ou experimentalmente os parâmetros de solubilidade de substâncias e materiais novos. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 24 O parâmetro de solubilidade de energia coesiva de dispersão (δD) está relacionado com as interações dipolo induzido-dipolo induzido (ou interações de London) que são as interações dominantes em moléculas apolares, como, por exemplo, nos hidrocarbonetos saturados alifáticos. As interações de London são resultantes de um desequilíbrio momentâneo na distribuição eletrônica de uma molécula, gerando dipolos instantâneos. As forças de London entre moléculas e grupos apolares são extremamente fracas, sendo dadas pela equação 6: 6 2 4 3 r IE α−= (6), onde I é a energia de ionização da espécie e α é a polarizabilidade, ou seja, a facilidade com que a nuvem eletrônica pode ser distorcida por um campo elétrico. As interações de London diminuem muito com o aumento da distância entre as moléculas (inversamente proporcional a r6) e aumentam com a polarizabilidade α. Essa aumenta com o volume molar, pois quando maior a molécula, mais elétrons haverá e menor será a influência dos núcleos sobre eles, tornando a nuvem mais polarizável (BARBOSA, 2004). O segundo parâmetro proposto por Hansen é o parâmetro de solubilidade de energia coesiva polar (ou dipolar) (δP) e esse está relacionado às interações intermoleculares dipolo permanente- dipolo permanente. Muitas moléculas orgânicas apresentam dipolos permanentes devido à atração da extremidade positiva de uma molécula pela extremidade negativa de outra.Esse tipo de interação é dominante nestas moléculas. A energia envolvida nesta interação pode ser expressa na equação 7: 0 3 21 4 2 εpi µµ r E −= (7), onde µ1 e µ2 correspondem aos momentos de dipolo das moléculas que estão interagindo, r é a distância entre elas e ε0 é a constante diéletrica do vácuo. Quanto mais polares as moléculas, maior os valores de momentos de dipolo e consequentemente maior a interação entre elas (BARBOSA, 2004). O terceiro parâmetro de solubilidade de Hansen (δH) está relacionado com as interações intermoleculares de ligação de hidrogênio. Este é um tipo de interação dipolo permanente-dipolo permanente que ocorre quando o hidrogênio numa molécula está ligado a um elemento eletronegativo pequeno, como o flúor, oxigênio ou nitrogênio e outra molécula que possua também Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 25 átomos muito eletronegativos (como F, O e N) com pares de elétrons não-ligantes. Estas moléculas são muito polares e o átomo de hidrogênio nelas carrega uma carga positiva substancial. O grupo que possui o hidrogênio denominado doador de ligação de hidrogênio (por exemplo, A-H), enquanto o que participa com o par de elétrons livres (B:) é denominado receptor de hidrogênio (BARBOSA, 2004). Basicamente, Hansen utilizou este parâmetro para coletar energias de interação excluídas dos outros parâmetros (HANSEN, 2000). Os parâmetros δD, δP e δH são dependentes da temperatura e do tamanho (ou volume molar) das moléculas do sistema. O PSHs diminuem com o aumento da temperatura e, dependendo dos parâmetros do soluto, um “não solvente” pode se tornar um “bom solvente”. Moléculas de solventes menores tendem a solubilizar melhor o soluto, já que elas solvatam melhor, mesmo que os parâmetros do soluto e do solvente não sejam idênticos (HANSEN, 2000). Dentro da teoria de solubilidade, Hansen e outros autores decidiram trabalhar apenas como os parâmetros δD, δP e δH e omitiram os outros tipos de energia coesiva que existem nos sistemas estudados, por exemplo, as interações de dipolo permanente-dipolo induzido, ligações metálicas, interações eletrostáticas, etc. Isto se deu devido ao fato de que, estes parâmetros são os mais importantes para a solubilidade de substâncias orgânicas e também devido à praticidade, já que os parâmetros de solubilidade foram utilizados primeiramente como ferramenta para selecionar solventes na indústria de revestimento (BARTON, 1975). Ainda em 1967, Hansen e Skaarup desenvolveram a equação 8 para calcular a “distância” dos parâmetros de solubilidade de dois materiais ou substâncias (HANSEN, 2000): 2 12 2 12 2 12 2 )()()(4)( HHPPDDRa δδδδδδ −+−+−= (8) onde o índice 1 é para o soluto e 2 é para o solvente. Esta equação foi desenvolvida a partir de dados experimentais onde a constante 4 define um esferóide e valoriza o parâmetro de solubilidade de energia coesiva de dispersão em relação aos outros. Mais tarde esta constante foi melhor explicada pela teoria de Prigogine (HANSEN, 2000). Utilizando a equação 8, os parâmetros de solubilidade já conhecidos de um dado soluto e a observação da solubilidade desse em 40 ou 45 diferentes solventes (com PSHs bem conhecidos), é possível construir um modelo tridimensional (ou bidimensional) onde as coordenadas cartesianas são os três parâmetros (δD, δP e δH). Neste modelo, os “bons” solventes delimitam um esferóide com raio Ro. O centro do esferóide é o soluto, como demonstrado nas Figuras 14 e 15. Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 26 Figura 14. Parâmetros de solubilidade δP versus δD para o poliestireno, mostrando o raio da circunferência de solubilidade (Ro) (HANSEN, 2000). . Figura 15. Gráfico 3D do esferóide de solubilidade de Hansen onde os pontos azuis são os “bons” solventes e os vermelhos são os solventes “ruins” (figura adaptada da referência: HANSEN, 2000). A maioria dos solventes que não solubilizam bem o soluto apresenta os parâmetros de solubilidade fora dos limites do esferóide e os “bons” solventes no interior, como demonstrado na Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 27 Figura 15, porém podem ocorrer desvios exatamente nos limites. Segundo o autor isto acontece principalmente com moléculas que apresentam um valor alto de volume molar. Como já foi mencionado no texto acima, os parâmetros de solubilidade são dependentes do volume molar, pois moléculas menores solubilizam melhor o soluto do que moléculas maiores, mesmo que seus parâmetros de solubilidade sejam idênticos (HANSEN, 2000). Hansen também definiu em seus trabalhos, baseado no modelo do esferóide de solubilidade, a diferença de energia relativa (DER), que é dada pela equação 9: DER = Ra / Ro (9), onde Ra é a distância dos PSHs do solvente aos PSHs do soluto (centro do esferóide) e Ro é o raio da esferóide. Os “bons” solventes geralmente apresentam DER menor que 1,0 e os solventes “ruins” maior que 1,0. 2.6.4 - Parâmetro de Interação de Flory-Huggins A teoria de Flory-Huggins descreve o balanço da energia de interação de um soluto (A) e um solvente (B) com volumes moleculares similares numa solução através do parâmetro de Flory- Huggins (χ) que está definido abaixo na equação 10: Tk z BBAAAB )2( 2 εεεχ −−−= (10), onde z é o número de coordenação de ambos soluto e solvente, ε representa a energia de interação intermolecular entre os pares (A-B, A-A e B-B), k é a constante dos gases e T é a temperatura. A equação 10 pode ser aplicada a estruturas maiores como a do nanotubo de carbono e o grafeno. Se χ < 0, a interação soluto-solvente (A-B) é dominante e se χ > 0 a interação soluto-soluto (A-A) é dominante (COLEMAN, 2009). O parâmetro de Flory-Huggins foi utilizado para entender o comportamento de soluções de polímeros e atualmente está sendo aplicada para outros sistemas, como a dispersão de grafenos em fase líquida. Num processo de dissolução, segundo a termodinâmica química, a variação da energia livre de Gibbs na mistura (∆Gmis) é dada pela equação 11: mismismis STHG ∆−∆=∆ (11), Esfoliação Química do Grafite Natural em Misturas de Solventes Orgânicos: a Obtenção de Grafenos de Poucas Camadas Dissertação de Mestrado – Jefferson Patrício Nascimento - 2013 28 onde ∆Hmis é a entalpia de mistura (energia envolvida no processo à pressão constante), ∆Smis é a mudança de entropia (grau de desordem do sistema) e T é a temperatura absoluta. Nos processos espontâneos de dissolução, o ∆Gmis (à temperatura e à pressão constantes) é menor ou igual a zero (ATKINS & DE PAULA, 2008). Em muitos processos, a força motriz é a entropia de mistura, o que leva a energia livre de Gibbs para valores negativos. No entanto, as macromoléculas como os polímeros e os nanomateriais
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