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DEZEMBRO / 200676 REVISTA PROTEÇÃO PROTEÇÃO DE MÁQUINAS Nota técnica traz avanços, mas ainda deixa dúvidas O dilema continua Não tenhamos receio em chamar as prensas de chaveta de máquinas mutila- doras. Sabemos que todas as máquinas são passíveis de produzir acidentes. Con- tudo, as prensas de chaveta, no conjunto das máquinas destinadas à conformação de materiais (que são aquelas objetivadas pelo PPRPS - Programa de Prevenção de Riscos em Prensas e Similares - e pela Nota Técnica 16/2005), apresentam ris- cos muito maiores, centrados na sua na- tureza e na sua estrutura construtiva atra- sada. Vamos recordar alguns passos da lu- ta para combater esse mal, com apresen- tação de alguns esclarecimentos impor- tantes. As prensas de chaveta representam uma modalidade de prensa mecânica proi- bida há muitos anos nos países europeus e em muitos outros países. É proibido atu- almente, no Estado de São Paulo, fabri- car e comercializar prensa de chaveta, por força da Convenção Coletiva das Indús- trias Metalúrgicas, assinada em 29 de no- vembro de 2002, vigente a partir de 29 de janeiro de 2003. A nova convenção, assi- nada em 20 de abril de 2006, mantém a proibição. Pode-se afirmar também que é proibido atualmente, no Brasil, fabricar e comercializar prensa de chaveta. Essa proibição decorre da combinação da Nor- ma Técnica da ABNT, a NBR-13930 (veja “Novidade para prensas”, página 19), com outras disposições legais que permitem, por exemplo, que o Ministério Público considere a ilegalidade da sua fabricação e da sua comercialização. Para o Estado de São Paulo, o uso das prensas de chaveta, isto é, daquelas que já estavam nas fábricas antes do advento da proibição (dia 29 de janeiro de 2003, considerada a carência de 60 dias conce- dida pelo acordo tripartite), está condici- onado ao adequado enclausuramento da área de prensagem, com barreiras mecâ- nicas que impeçam o ingresso de qualquer parte do corpo nos pontos de risco, como Carlos Augusto Lopes - Presidente do INPAME carlos@thomastecnica.com.br Marcilio Marchi Testa - Diretor de Máquinas INPAME Josebel Rubin - Conselheiro e Fundador do INPAME Os três autores fazem parte do comitê de certificação INPAME. Carlos Augusto Lopes, Marcilio Marchi Testa e Josebel Rubin AR QU IV O YA LE L A FO NT E mostram algumas fotos disponíveis no site do INPAME - Instituto Nacional de Pre- venção aos Acidentes em Máquinas e E- quipamentos (www.inpame.org.br). RISCOSRISCOSRISCOSRISCOSRISCOS Afinal, o que é uma prensa de chaveta? O nome correto e completo são prensas mecânicas com acionamento por engate de chaveta. Elas são extremamente peri- gosas e produzem graves e freqüentes a- cidentes, porque é impossível interrom- per o curso do martelo, após o início do movimento. Outro fator que agrava muito o risco é a grande possibilidade de repeti- ção involuntária do golpe, fenômeno cha- mado de repique, que é a repetição da ba- tida do martelo, independente da vonta- de do operador e independente do acio- namento da máquina (seja ele por sistema de pedal, comando bimanual, ou outro). A contrapartida correta do ponto de vista da estrutura construtiva é a prensa mecânica com dispositivo de freio-embre- agem, que permite a interrupção do cur- so do martelo, em qualquer ponto desse trajeto, e que não permite, em condições normais, a ocorrência da repetição involuntária. É importante registrar que também são encontradas prensas com outras modalidades de sistemas de trans- missão de movimentos (hidráulicas, pneu- máticas, hidropneumáticas), que garan- tem, por força de estruturas construtivas específicas, a adequada interrupção do movimento do martelo. A Convenção Coletiva das Indústrias Metalúrgicas do Estado de São Paulo proí- be a fabricação, mas não estabelece prazo limite para a proibição do uso. A limitação é que seu usuário/proprietário não pode- rá passá-la adiante (vender, emprestar, Prensas por engate de chaveta só podem funcionar com proteção DEZEMBRO / 200678 REVISTA PROTEÇÃO PROTEÇÃO DE MÁQUINAS trocar, etc.), devendo sucatear a máquina, quando seu uso ficar inviável ou antieco- nômico. Respondendo indagações muito fre- qüentes, não existe, pelo menos até ago- ra, nenhuma lei que trate da fabricação ou do uso específico das prensas de chaveta. Aqui, é necessário ressaltar que, além da Convenção Coletiva do Estado de São Paulo, que é obrigatória para todos os segmentos signatários, a simples apli- cação da NR-12 já traz a obrigação de pro- teger adequadamente as prensas de cha- veta em operação. A Nota Técnica 16/2005 (que substituiu a Nota Técnica 37/2004, publicada em 16 de dezembro de 2004), é uma importan- te referência, especialmente em três as- pectos: é extensiva para todo o território nacional; constitui uma base técnica in- teressante, uma partida que estabelece princípios gerais para a criação de anexo à NR-12, que trate da proteção em pren- sas e similares; e é um documento que tomou como partida a versão anterior do PPRPS (2º versão, vigente a partir de no- vembro de 2002), mas que produziu al- guns avanços importantes, quando com- parados àquela versão do PPRPS. Entre- tanto, a Nota Técnica, a despeito da sua oportunidade e das suas qualidades, con- tém algumas impropriedades técnicas. Uma delas é exatamente referida à prote- ção em prensas de chaveta e que aborda- remos mais abaixo (veja o intertítulo Nota técnica). NÚMEROSNÚMEROSNÚMEROSNÚMEROSNÚMEROS O número de prensas excêntricas de chaveta no ano de 1999, no Estado de São Paulo, era projetado em 29.000 unidades. Várias pesquisas apontaram para esse número, tornando-o confiável. Estimamos uma redução, projetada para o final de 2004, não superior a 20%, decorrente do sucateamento ou do processo de trans- formação para prensas freio embreagem, permitidas pelo PPRPS. Assim, o número estimativo atual de prensas e similares de chaveta em uso, em São Paulo, deve ser da ordem de 24.000 unidades. Essas prensas estão adequadamente protegidas? Se considerarmos somente as prensas e equipamentos similares de cha- veta no Estado de São Paulo, estimamos que um número não superior a 30% apre- senta a área de prensagem adequadamen- te protegida (atendendo, ao mesmo tem- po, o PPRPS, a NR-12, a NBR 13930 e as demais normas técnicas aplicáveis). Im- portante lembrar que há uma porcenta- gem expressiva de prensas que apresen- ta proteção parcial em sua área de prensagem, porque estão com um progra- ma de implantação do PPRPS. Esses nú- meros, tanto de proteção completa quanto de proteção parcial em curso, são crescen- tes, em função dos processos de informa- ção e de educação, da aplicação da con- venção coletiva, da ação do Ministério Pú- blico do Trabalho e dos auditores fiscais do trabalho. Essa situação pode comportar uma lei- tura positiva e outra menos otimista. A leitura positiva é aquela que considera que o principal avanço ocorrido não é medido pelas máquinas protegidas, mas sim pelo crescimento da informação e pela cons- ciência. É difícil hoje identificar uma em- presa que desconheça a necessidade da proteção adequada em prensas e simila- res, ainda que haja muita dúvida e dificul- dade na identificação dos recursos utiliza- dos para proteção adequada desses equi- pamentos. A leitura menos otimista tem um fundamento justo, considera que o número de acidentes com mutilação e com perda de capacidade de trabalho ain- da é muito grande. Combina com essa consideração o tempo corrido, desde a im- plantação da primeira convenção coleti- va de prensas, que vigorou só para o muni- cípio de São Paulo, desde o início do ano de 1999. Considera também que, antes disso, houve vários projetos de proteção ao trabalho em prensas, coordenados por órgão públicos e por sindicatos, ou desen- volvidos em parcerias entre essas partes. A conclusão dessaleitura menos otimista é de que já poderíamos ter atingido um estágio melhor, medido por um número muito menor de mutilação de mãos e de- dos de cidadãos trabalhadores brasileiros. No entanto, a expressa proibição da fa- bricação e da comercialização das pren- sas de chaveta não está preocupando o setor do comércio de máquinas de São Paulo. Lojas situadas em lugares bastan- te conhecidos oferecem essas prensas, abertamente. Não bastasse esse frontal desrespeito com o texto da Convenção (assinado pelos representantes nacionais dos fabricantes de máquinas), muitas des- sas prensas são comercializadas sem pro- teção adequada, o que agrava o desrespei- to para com os trabalhadores, com as em- presas cumpridoras da lei, com o poder DEZEMBRO / 200680 REVISTA PROTEÇÃO PROTEÇÃO DE MÁQUINAS público e com a sociedade civil, aquela que paga a conta previdenciária. NOTNOTNOTNOTNOTA TÉCNICAA TÉCNICAA TÉCNICAA TÉCNICAA TÉCNICA Repetindo o caráter positivo e os im- portantes avanços trazidos pela Nota Téc- nica, que devem ser valorizados e sauda- dos, relembramos aqui o que chamamos acima de impropriedades técnicas. Uma delas é a cláusula sexta, que estabelece que (combinamos o texto do caput com a letra a dessa mesma cláusula sexta): “As prensas mecânicas excêntricas de engate por chaveta devem ser... a) enclausuradas com proteções fixas, e, havendo ne- cessidade de troca freqüente de ferramen- tas (destaque nosso), com proteções mó- veis dotadas de intertravamento com blo- queio, por meio de chave de segurança, de modo a permitir a abertura somente após a parada total dos movimentos de risco”. Primeiramente, o texto enseja a inter- pretação ambígua, com a expressão “troca freqüente”. Trata-se, sem dúvida, de uma frase de conotação não objetiva que não define um limite claro, permitindo diver- sas interpretações e contendas. Outro fa- tor a ser ponderado na Nota Técnica é que sua publicação estava associada ao anún- cio de que o Ministério do Trabalho pu- blicaria em seguida uma portaria própria proibindo a fabricação de prensa de chaveta. Como isso não aconteceu, conti- nuamos a depender da combinação da NBR-13930 com outras disposições legais, para estendermos a proibição da prensa de chaveta aos outros Estados do país. Há alguns outros pontos polêmicos, pre- sentes na NT 16/2005, e que merecem uma reflexão ampla e aberta. Ao levantar- mos essas questões, reforçamos nossa dis- posição de colaborar com o debate. É im- portante que documentos dessa magnitu- de, que muito podem contribuir para a regulamentação da proteção ao trabalho em máquinas e para a adequada orienta- ção de empresas e de trabalhadores, se- jam amplamente discutidos, especialmen- te pelas entidades e pelos profissionais de Saúde, Segurança e Meio Ambiente. A conseqüência mais conhecida do tra- balho em máquinas, pensando na Seguran- ça e Saúde do trabalhador, é o acidente de trabalho mutilador, responsável, portanto, por dano grave e irreversível e por decor- rente perda da capacidade de trabalho. Es- sa justa preocupação, centrada nos aciden- tes mutiladores, acaba por relegar muitos aspectos importantes, causadores de danos igualmente graves, freqüentemente des- prezados ou minimizados e que devem com- por um bom programa de prevenção de ris- cos. Assim, é fundamental pensar o espectro das doenças ocupacionais típicas das rela- ções de trabalho em máquinas. Mesmo para os casos em que são doenças freqüentes em outras atividades produtivas, é necessá- rio considerar suas peculiaridades, por de- corrência do trabalho em máquinas. Condições no trabalho com máquinas O trabalho repetitivo e monótono, a fadi- ga, as condições e recursos não ergonômi- cos, o ruído, ambientes de trabalho insalu- bres, relações com chefias e supervisores, problemas pessoais e vários outros fatores produzem ou contribuem para produzir do- enças ocupacionais no trabalho em máqui- nas e equipamentos. Ação progressiva Ao contrário dos acidentes mutiladores, cujo aspecto trágico é de revelação imedi- DOENÇAS LABORAIS & PRENSAS ata, as doenças do trabalho em máqui- nas somente mani- festam suas conse- qüências mais gra- ves depois de um longo período de exposição. Assim, even- tuais perdas auditivas ou manifestações de LER/DORT somente serão percebidas, na condição de doenças e, muitas vezes, no estágio de dano irreversível e de perda de capacidade de trabalho, muito depois do iní- cio da exposição. Potencialização do risco Conseqüência muito previsível, as doen- ças do trabalho, à medida que seus efeitos avançam no corpo (e na mente) do traba- lhador, fazem com que ele fique mais exposto aos acidentes, inclusive às ocorrências com mutilação. É importante lembrar que o tra- balho em máquinas envolve uma série de esforços repetitivos, capazes de produzir manifestações de LER/DORT e de contribuir com o aparecimento de fadiga e monotonia. Assim, reiteramos a preocupação em prote- ger adequadamente o trabalhador, o que deve contemplar uma ação focada na detec- ção e no mapeamento dos riscos de doen- ças laborais, ao mesmo tempo em que deve ser capaz de apontar soluções de curto e de médio prazo, conforme sejam os riscos e as dificuldades de implantação.
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