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Aspectos clínicos da depressão

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P A r T E i
Aspectos clínicos 
da depressão
1
A DEfinição DE DEPrESSão
buscar maximizar as satisfações e minimi-
zar a dor. Segundo este há muito respeitado 
conceito de instinto de autopreservação, es-
ses indivíduos deveriam tentar prolongar a 
vida, e não terminar com ela.
Ainda que a depressão (ou melanco-
lia) seja reconhecida como uma síndrome 
clínica há mais de 2 mil anos, até hoje não 
foi encontrada uma explicação plenamente 
satisfatória de suas características intrigan-
tes e paradoxais. Ainda existem importantes 
questões não resolvidas sobre sua natureza, 
classificação e etiologia. Entre essas ques-
tões estão as seguintes:
 1. A depressão é o exagero de um estado 
de humor vivenciado por indivíduos 
normais, ou é qualitativa e quantitativa-
mente diferente de um estado de humor 
normal?
 2. Quais são as causas, as características de-
finidoras, os resultados e os tratamentos 
efetivos da depressão?
 3. A depressão é um tipo de reação (conceito 
meyeriano) ou uma doença (conceito 
kraepeliniano)?
 4. A depressão é causada principalmente 
por estresse psicológico e conflito, ou está 
basicamente relacionada a uma desordem 
biológica?
Não existem respostas universalmente 
aceitas para essas perguntas. Na verdade, há 
uma nítida discórdia entre os clínicos e in-
vestigadores que escreveram sobre depres-
são. Há considerável controvérsia quanto à 
classificação da depressão, e alguns escrito-
PArAdoxos dA dePressão
Um dia talvez a depressão venha a ser 
compreendida em termos de seus parado-
xos. Existe, por exemplo, um contraste im-
pressionante entre a imagem que a pessoa 
deprimida tem de si mesma e os fatos obje-
tivos. Uma mulher rica lamenta -se por não 
ter recursos financeiros para alimentar seus 
filhos. Um ator de cinema amplamente re-
conhecido implora por uma cirurgia plástica 
por acreditar -se feio. Uma física eminente 
repreende -se “por ser burra”. 
Apesar do sofrimento vivenciado em 
decorrência dessas ideias autodepreciativas, 
os pacientes não são facilmente demovidos 
por evidências objetivas ou por demonstra-
ções lógicas da natureza insensata desses 
pensamentos. Além disso, os pacientes com 
frequência praticam atos que parecem au-
mentar seu sofrimento. O homem abastado 
veste andrajos e humilha -se publicamente 
implorando por dinheiro para sustentar a si 
e sua família. Um clérigo com uma reputa-
ção impecável tenta se enforcar porque se 
diz “o pior pecador do mundo”. Um cientista 
cujo trabalho foi confirmado por numerosos 
investigadores independentes “confessa” 
publicamente que suas descobertas eram 
uma farsa.
Atitudes e comportamentos como esses 
são muito intrigantes – superficialmente, ao 
menos –, pois parecem contradizer alguns 
dos axiomas mais fortemente estabeleci-
dos da natureza humana. De acordo com o 
“princípio do prazer”, os pacientes deveriam 
14 AAron T. BECk & BrAD A. AlforD
res não vêem justificativa para utilizar essa 
categoria nosológica. A natureza e a etiolo-
gia da depressão estão sujeitas a opiniões 
ainda mais divididas. Algumas autoridades 
afirmam que a depressão é sobretudo um 
transtorno psicogênico; outras asseveram 
que ela é causada por fatores orgânicos. Um 
terceiro grupo defende o conceito de dois 
tipos diferentes de depressão: um psicogê-
nico e outro orgânico.
PreVAlênCIA dA dePressão 
A importância da depressão é reconhe-
cida por todos no campo da saúde mental. 
Segundo Kline,1 a depressão tem causado 
mais sofrimento humano do que qualquer 
outra das doenças que afetam a humanida-
de. A depressão só fica atrás da esquizofre-
nia nas primeiras e segundas internações em 
hospitais psiquiátricos nos Estados Unidos, 
e estima -se que a prevalência da depressão 
fora dos hospitais é cinco vezes maior do 
que a da esquizofrenia.2 Murray e Lopez3 
constataram que, mundialmente, a depres-
são unipolar foi a segunda maior causa de 
invalidez em 1990, medida em anos vividos 
com alguma invalidez. A depressão unipolar 
foi responsável por mais do que um de cada 
dez anos vividos com alguma invalidez.
Há mais de 40 anos, um levantamen-
to sistemático da prevalência da depressão 
em uma área geográfica bem definida indi-
cou que 3,9% da população de mais de 20 
anos de idade sofria de depressão em algum 
momento especificado.4 De acordo com a 
quarta edição do Manual Diagnóstico e Es-
tatístico de Transtornos Mentais (DSM -IV) da 
Associação Psiquiátrica Americana (APA),5 
a probabilidade de desenvolvermos trans-
torno depressivo maior durante nossa vida 
é de 12 a 15% para os homens e de 10 a 
25% para as mulheres. Em qualquer ponto 
no tempo (“prevalência pontual”), de 2 a 
3% da população masculina e de 5 a 9% da 
feminina sofrem de depressão maior. Picci-
nelli6 analisou os estudos sobre diferenças 
de gênero na depressão e constatou que as 
diferenças de gênero se iniciam em meados 
da puberdade e continuam durante a vida 
adulta.
TABelA 1.1
Principais causas de invalidez no mundo (1990)
 Total de anos 
 vividos com Porcentagem 
	 deficiência	(milhões)	 do	total
Todas as causas 427,7
1. Depressão maior unipolar 50,8 10,7
2.	 Anemia	por	deficiência	de	ferro	 22,0	 4,7
3. Quedas 22,0 4,6
4. uso de álcool 15,8 3,3
5. Doença pulmonar obstrutiva crônica 14,7 3,1
6. Transtorno bipolar 14,1 3,0
7. Anomalias congênitas 13,5 2,9
8. osteoartrite 13,3 2,8
9. Esquizofrenia 12,1 2,6
10. Transtorno obsessivo ‑compulsivo 10,2 2,2
Adaptado de lopez e Murray (1998). Para dados atualizados da oMS, visite http://www.who.int/mental_health/
management/depression/definition/en/
DEPrESSão 15
Prevalência	e	intensidade 
por tipos e idade de início
As taxas de prevalência na vida de ou-
tros transtornos de humor (ver Capítulo 4 
para distinções entre os tipos) são descritas 
no DSM -IV5 como segue: transtorno distími-
co, 6%; bipolar I, 0,4 -1,6%; bipolar II, 0,5%; 
ciclotímico, de 0,4 - 1%. O Instituto Nacional 
de Saúde Mental (EUA)7 relata que 18,8 mi-
lhões de americanos adultos (9,5% da popu-
lação de 18 anos ou mais) em um dado ano 
sofre de algum tipo de transtorno depressivo. 
O transtorno depressivo maior é a principal 
causa de invalidez nas economias de merca-
do consagradas ao redor do mundo.7
A prevalência em 12 meses e as taxas 
de gravidade são fornecidas por Kessler e co-
laboradores.8 O U.S. National Comorbidity 
Survey Replication incluiu um levantamento 
domiciliar face a face de representatividade 
nacional realizado entre fevereiro de 2001 
e abril de 2003. O estudo empregou uma 
entrevista diagnóstica estruturada, uma ver-
são da Composite International Diagnostic 
Interview, da World Mental Health Survey 
Initiative, da Organização Mundial da Saú-
de (OMS). Os participantes incluíram 9.282 
entrevistados fluentes em inglês com18 
anos ou mais. A prevalência em12 meses 
e as estimativas dos transtornos de humor 
desse estudo constam na Tabela 1.3.
As taxas de idade de início e prevalên-
cia (a probabilidade de sofrer de um trans-
torno do humor em algum momento na vida) 
são apresentadas nas Tabelas 1.4 e 1.5.9
TABelA 1.2
Prevalência de transtorno depressivo maior por gênero (%)
	 Homens	 Mulheres
na vida 5 a 12 10 a 25
Prevalência pontual 2 a 3 5 a 9
Adaptado de DSM ‑iV ‑Tr.
TABelA 1.3
Prevalência em 12 meses e gravidade dos transtornos de humor (%)
 Intensidade
 Total Grave Moderada leve
Transtorno depressivo maior 6,7 30,4 50,1 19,5
Distimia 1,5 49,7 32,1 18,2
Transtornos bipolares i e ii 2,6 82,9 17,1 0
Qualquer transtorno de humor 9,5 45,0 40,0 15,0
Adaptado de kessler et al. (2005).
16 AAron T. BECk & BrAD A. AlforD
ConCeITos desCrITIVos 
dA dePressão
A condição que hoje rotulamos de 
depressão foi descrita por alguns autores 
antigos sob a categoria de “melancolia”. A 
primeira descrição clínicada melancolia foi 
feita por Hipócrates no século IV a.C. Ele 
também se referiu a oscilações semelhantes 
a mania e depressão.10
Aretaeus, um médico que viveu no sé-
culo II d.C., descreveu o paciente melancó-
lico como “triste, consternado, insone [...]
Eles emagrecem por causa de sua agitação 
e perda do sono reparador [...] Em idade 
mais avançada, queixam -se de milhares de 
futilidades e desejam a morte”. É digno de 
nota que Aretaeus delineou especificamente 
o ciclo maníaco -depressivo. Algumas autori-
dades acreditam que ele antecipou a síntese 
de Kraepelin da psicose maníaco -depressiva, 
mas Jelliffe desconsidera esta hipótese.
No século II d.C., Plutarco apresentou 
uma descrição particularmente vívida e de-
talhada da melancolia:
Ele vê a si mesmo como alguém 
que os Deuses odeiam e perseguem 
com sua raiva. Um mal muito pior o 
aguarda; ele não ousa tentar evitar 
ou remediar tal mal, por medo de 
encontrar -se lutando contra os deu-
ses. O médico e o amigo consolador 
são afastados. “Deixe -me”, diz o 
infeliz, “eu, o ímpio, o amaldiçoado, 
odiado pelos deuses, sofrer meu cas-
tigo”. Senta -se ao relento, enrolado 
em aniagem ou em trapos imundos. 
Vez ou outra rola nu sobre a sujeira, 
TABelA 1.5
Prevalência (%) ao longo da vida dos transtornos por idade
 Idade
 Total 18 ‑29 30 ‑44 45 ‑59 >60
Transtorno depressivo maior 16,6 15,4 19,8 18,8 10,6
Distimia 2,5 1,7 2,9 3,7 1,3
Transtornos bipolares i e ii 3,9 5,9 4,6 3,5 1,0
Qualquer transtorno de humor 20,8 21,4 24,6 22,9 11,9
Adaptado de kessler et al. (2005).
TABelA 1.4
Percentis selecionados sobre distribuições de idade de início padronizadas dos transtornos 
de humor do DSM ‑iV/WMH ‑CiDi, com risco na vida projetado aos 75 anos
 Idade em percentis de 
 idade de início selecionados
 5 10 25 50 75 90 95 99
Transtorno depressivo maior 23,2 12 14 19 32 44 56 64 73
Distimia 3,4 7 11 17 31 43 51 57 73
Transtornos bipolares i e ii 5,1 11 13 17 25 42 50 57 65
Qualquer transtorno de humor 28,0 11 13 18 30 43 54 63 73
Adaptado de kessler et al. (2005).
risco 
na vida 
projetado 
aos 75 
anos	(%)
DEPrESSão 17
confessando sobre um ou outro peca-
do. Ele comeu ou bebeu algo errado. 
Fez alguma coisa ou outra que o Ser 
Divino não aprovou. Os festejos em 
homenagem aos deuses não lhe tra-
zem prazer e sim enchem -no de medo 
ou pavor. (citado em Zilboorg11)
No início do século XIX, Pinel descre-
veu a melancolia da seguinte maneira:
Os sintomas geralmente abarcados 
pelo termo melancolia são taciturni-
dade, um ar pensativo sério, suspeitas 
soturnas e amor à solidão. Esses tra-
ços, sem dúvida, parecem distinguir 
a personalidade de alguns homens 
com boa saúde e frequentemente em 
circunstâncias prósperas. Contudo, 
nada pode ser mais abominável do 
que a figura do melancólico remoen-
do seus imaginários infortúnios. Se 
ademais possuído de poder, e dotado 
de uma disposição perversa e de 
um coração sanguinário, a imagem 
torna -se ainda mais repulsiva.
Esses relatos guardam uma seme-
lhança impressionante com as descrições 
de depressão dos livros modernos e são si-
milares também às descrições autobiográ-
ficas contemporâneas, como as de Clifford 
W. Beers.12 Os sinais e sintomas cardinais 
atualmente utilizados no diagnóstico da 
depressão encontram -se nas descrições an-
tigas: humor perturbado (triste, consterna-
do, inútil), autopunições (“o amaldiçoado, 
odiado pelos deuses”), comportamentos au-
todepreciativos (“enrolado em aniagem ou 
em trapos imundos”, “rola nu sobre a sujei-
ra”), desejo de morrer, sintomas físicos e ve-
getativos (agitação, perda de apetite e peso, 
insônia), e delírios de ter cometido pecados 
imperdoáveis.
As descrições da depressão menciona-
das incluem as características típicas dessa 
condição. Poucas são as síndromes psiquiá-
tricas que têm descrições clínicas tão cons-
tantes ao longo de sucessivas épocas da his-
tória (para descrições da depressão através 
dos tempos, ver Burton13). É digno de nota 
que as descrições históricas da depressão in-
dicam que se observam manifestações desse 
transtorno em todos os aspectos do compor-
tamento, incluindo as divisões psicológicas 
tradicionais de afeição, cognição e conação.
Uma vez que a perturbação das emo-
ções é uma característica marcante da de-
pressão, tornou -se comum considerar tal 
condição um “transtorno primário de hu-
mor” ou um “transtorno afetivo”. A impor-
tância central atribuída ao componente 
emocional da depressão é exemplificada 
pelo uso de listas de adjetivos afetivos para 
definir e medir o transtorno. A representa-
ção da depressão como um transtorno afeti-
vo é tão enganosa quanto seria descrever a 
escarlatina como uma “doença de pele” ou 
como uma “desordem basicamente febril”. 
Existem muitos outros componentes da de-
pressão além dos desvios de humor. Em uma 
significativa parcela dos casos, não se obser-
va absolutamente nenhuma anormalidade 
no paciente. Em nosso atual nível de conhe-
cimento, não sabemos qual componente do 
quadro clínico da depressão é o principal 
ou se esses componentes são simplesmente 
manifestações externas de algum processo 
patológico desconhecido.
A depressão pode hoje ser definida em 
termos dos seguintes atributos:
 1. Alteração específica no humor: tristeza, 
solidão, apatia.
 2. Autoconceito negativo associado a autor-
recriminações e autoacusações.
 3. Desejos regressivos e autopunitivos: de-
sejos de fugir, esconder -se ou morrer.
 4. Alterações vegetativas: anorexia, insônia, 
perda da libido.
 5. Alteração no nível de atividade: retardo 
psicomotor ou agitação.
seMânTICA dA dePressão
Uma das dificuldades de se conceituar 
a depressão é essencialmente semântica: o 
termo tem sido variavelmente aplicado para 
designar um determinado tipo de sentimen-
18 AAron T. BECk & BrAD A. AlforD
to ou sintoma, um complexo de sintomas (ou 
síndrome) e uma patologia bem definida.
É comum indivíduos normais dizerem 
que estão deprimidos quando observam 
qualquer queda em sua disposição de ânimo 
para um nível mais baixo do que o costu-
meiro. O indivíduo que vivencia tristeza ou 
solidão transitória pode dizer que está de-
primido. É discutível se essa disposição de 
ânimo normal equivale ao sentimento viven-
ciado na condição anormal da depressão ou 
mesmo se tem alguma relação com ela. Seja 
como for, quando alguém se queixa de estar 
se sentindo exageradamente desanimado, 
desesperançado ou infeliz, o termo deprimi-
do com frequência é usado para rotular esse 
estado subjetivo.
O termo depressão muitas vezes é usa-
do para designar um complexo padrão de 
desvios nos sentimentos, na cognição e no 
comportamento (descritos na seção ante-
rior) não representado como um transtorno 
psiquiátrico distinto. Nestes casos, a depres-
são é considerada uma síndrome ou comple-
xo de sintomas. O aglomerado de sinais e 
sintomas às vezes é conceituado como uma 
dimensão psicopatológica cuja intensidade 
(ou grau de anormalidade) varia de leve a 
grave. A síndrome da depressão pode ser 
concomitante a um transtorno psiquiátrico 
definido, tal como a reação esquizofrêni-
ca; nesse caso, o diagnóstico seria “reação 
esquizofrênica com depressão”. Às vezes, a 
síndrome é uma manifestação secundária 
ou uma afecção orgânica do cérebro, como, 
por exemplo, paresia cerebral ou arterios-
clerose cerebral.
Por fim, o termo depressão tem sido 
usado também para designar uma entidade 
nosológica distinta. Geralmente é qualifica-
do por algum adjetivo para indicar deter-
minado tipo ou forma, como, por exemplo, 
depressão reativa, depressão agitada ou 
reação psicótico -depressiva. Quando a de-
pressão é conceituada como uma entidade 
clínica específica, presume -se que possui al-
guns atributos consistentes além dos sinais e 
sintomas característicos;esses atributos in-
cluem um tipo especificável de início, curso, 
duração e resultado.
O sistema de classificação da APA (APA)5 
ilustra alguns desses aspectos. A APA categori-
za os transtornos de humor em
 1. transtornos depressivos (depressão uni-
polar) e
 2. transtornos bipolares.
No primeiro tipo, não há história de 
episódio maníaco ou hipomaníaco; no se-
gundo, existe essa história.
Os transtornos depressivos incluem 
transtorno depressivo maior e transtorno 
distímico. O transtorno depressivo maior é 
definido por um ou mais episódios depres-
sivos. Tais episódios incluem 2 semanas de 
humor deprimido ou perda de interesse e no 
mínimo quatro sintomas de depressão adi-
cionais. O transtorno distímico é, em parte, 
definido por ao menos 2 anos de humor 
deprimido de baixa intensidade, e a pessoa 
está deprimida na maior parte dos dias. Os 
transtornos bipolares geralmente são acom-
panhados por episódios de depressão maior 
e divididos em dois tipos: bipolar I e bipolar 
II.5 A classificação dos transtornos de humor 
será considerada mais minuciosamente no 
Capítulo 4.
 Na medicina, presume -se que uma 
entidade clínica ou doença responda a for-
mas específicas de tratamento (não neces-
sariamente já descobertos) e tenha uma 
etiologia específica. Existe um considerável 
conjunto de evidências indicativas de que 
a depressão responde a certas drogas e/ou 
eletroconvulsoterapia (ECT), mas ainda não 
existe consenso sobre sua etiologia. Essa 
questão será adicionalmente analisada na 
Parte II, “Aspectos Experimentais da Depres-
são”.
dePressão e esTAdos de 
huMor norMAIs
Existe bastante discussão entre os es-
tudiosos sobre a relação entre a depressão e 
mudanças de humor vivenciadas por indiví-
duos normais. A palavra humor geralmente 
DEPrESSão 19
é aplicada a um espectro de sentimentos que 
vão da euforia e felicidade em um extremo 
à tristeza e infelicidade no outro. Os senti-
mentos particulares abrangidos por essa pa-
lavra, em consequência, estão diretamente 
relacionados ou à felicidade ou à tristeza. 
Estados subjetivos, tais como ansiedade ou 
raiva, que não se enquadram nas categorias 
de felicidade e tristeza geralmente não são 
incluídos. Alguns autores14 acreditam que 
todos os indivíduos têm oscilações de hu-
mor e que indivíduos normais podem apre-
sentar momentos de tristeza ou dias tristes. 
Esta crença tem sido respaldada por estudos 
sistemáticos das oscilações de humor em su-
jeitos normais.15
Os episódios de humor deprimido ou 
de tristeza que ocorrem nos indivíduos nor-
mais assemelham -se, em diversos aspectos, 
aos estados clínicos da depressão. Em pri-
meiro lugar, existe uma semelhança entre 
as descrições da experiência subjetiva do 
humor deprimido normal e da depressão. 
As palavras usadas para descrever o humor 
deprimido normal tendem a ser as mesmas 
usadas por depressivos para descrever seus 
sentimentos – triste, infeliz, vazio, mal, so-
litário. Contudo, é possível que esta seme-
lhança se deva ao fato de que os pacientes 
deprimidos utilizam vocabulário familiar 
para descrever um estado patológico para o 
qual não dispõem de palavras. Na verdade, 
alguns pacientes afirmam que seus senti-
mentos durante suas depressões são muito 
diferentes de qualquer sentimento já viven-
ciado quando não estavam clinicamente de-
primidos. 
Em segundo lugar, o comportamento 
do paciente deprimido se assemelha ao de 
uma pessoa que está triste ou infeliz, prin-
cipalmente na expressão facial lúgubre e na 
voz baixa. Em terceiro lugar, algumas das 
manifestações vegetativas e físicas caracte-
rísticas da depressão podem ser observadas 
em indivíduos que estão se sentindo tristes 
mas que não seriam considerados clinica-
mente deprimidos. Uma pessoa que é repro-
vada em uma prova, que perde um emprego 
ou que recebe um fora pode não apenas se 
sentir desanimada e desamparada, mas tam-
bém apresentar anorexia, insônia e fadiga. 
Por fim, muitos indivíduos vivenciam estados 
de tristeza que parecem oscilar de maneira 
regular ou rítmica, independentemente de 
estímulos externos, sugerindo variações rít-
micas na intensidade da depressão.15
A semelhança entre depressão e hu-
mor deprimido de indivíduos normais levou 
ao conceito de que o patológico é simples-
mente uma exacerbação do normal. À pri-
meira vista, essa conclusão parece plausível. 
Como será discutido no Capítulo 2, cada 
sintoma de depressão pode ter sua intensi-
dade graduada ao longo de uma dimensão, 
e as intensidades mais leves são com certeza 
semelhantes aos fenômenos observados em 
indivíduos normais que se sentem tristes.
Em respaldo à perspectiva da continui-
dade, Hankin e colaboradores16 utilizaram 
os procedimentos taxométricos de Meehl 
para analisar a estrutura da depressão em 
uma amostra de crianças e adolescentes. 
Levando em conta a assimetria dos sinto-
mas depressivos, os autores descreveram a 
depressão nos jovens como um construto 
dimensional, não categórico. Ao discutirem 
as implicações de suas descobertas, Hankin 
e colaboradores16 assinalam que o poder es-
tatístico da pesquisa aumenta com a utili-
zação de escores distribuídos de forma con-
tínua, assim auxiliando a capacidade dos 
pesquisadores de identificar corretamente 
as verdadeiras causas e consequências da 
depressão.
À semelhança das descobertas de Han-
kin e colaboradores,17 Haslam e Beck18 utili-
zaram procedimentos taxométricos para 
testar a distinção (descontinuidade) de cin-
co subtipos hipotéticos de depressão maior, 
incluindo as formas endógena, sociotrópica, 
autônoma, autocrítica e desesperançada. O 
estudo utilizou perfis de sintomas e de per-
sonalidade autorrelatados de 531 pacientes 
ambulatoriais consecutivamente atendidos 
e diagnosticados com depressão maior. As 
características dos respectivos subtipos não 
apresentaram a covariância prevista, exce-
tuando -se o subtipo endógeno.18
Pode -se afirmar que muitos estados 
pa tológicos que parecem situar -se em um 
20 AAron T. BECk & BrAD A. AlforD
con tinuum com o estado normal diferem do 
estado normal em sua qualidade essencial. 
Para ilustrar isso, considere -se uma analo-
gia entre os desvios de humor e os desvios 
da temperatura corporal interna. Ainda 
que mudanças acentuadas na temperatura 
corporal estejam no mesmo continuum que 
tem peraturas normais, os fatores subjacen-
tes que produzem os grandes desvios não 
são uma extensão do estado normal de saú-
de: uma pessoa pode ter uma doença (por 
exemplo, febre tifoide) que se manifesta 
por uma progressão serial na temperatura 
e contudo é categoricamente diferente do 
estado normal. Do mesmo modo, o desvio 
de humor observado na depressão pode ser 
a manifestação de um processo patológico 
que é diferente do estado normal.
Não há consenso absoluto entre as au-
toridades sobre a relação entre depressão e 
oscilações de humor normais. Alguns escri-
tores, notavelmente Kraepelin e seus segui-
dores, consideram a depressão uma doença 
bem definida, muito distinta do humor nor-
mal. Esses autores postularam a presença 
de uma desorganização biológica profunda 
como o fator essencial na depressão. Este 
conceito de uma dicotomia entre saúde e 
doença é em geral compartilhado pela esco-
la somatogênica. Os ambientalistas parecem 
favoráveis à hipótese da continuidade. Em 
seu ponto de vista, existe uma série con-
tínua de reações de humor que variam de 
normais a extremas em um indivíduo espe-
cialmente suscetível. A escola psicobiológica 
criada por Adolph Meyer tende a favorecer 
esta visão.
A resposta final para a questão de ha-
ver uma dicotomia ou continuidade entre 
humor normal e depressão terá que esperar 
até que a questão da etiologia da depressão 
esteja plenamente resolvida.

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