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Resumo Partindo da constatação de que psicanálise e ética são disciplinas distintas, mas que há entre elas um importante cam- po de intersecção, pretende-se demonstrar que a diversidade de modelos metapsicológicos existentes na psicanálise produ- ziu não só diferenças na abordagem teórica da questão da ética e da consciência moral, mas também nos objetivos clínicos de cada uma dessas correntes, por meio de um esforço de sistema- tização do discurso de ambas. Serão examinados os trabalhos de autores que determinaram as quatro principais correntes do pensamento psicanalítico – Sigmund Freud, Melanie Klein, Heinz Hartmann e Jacques Lacan –, sistematização essa que será apre- sentada de modo sucinto, apontando as respectivas implicações clínicas desses discursos. Além disso, a partir do discurso de cada um desses autores sobre a questão da ética e da consciên- cia moral, tecer-se-ão alguns comentários sobre o lugar do outro na obra de cada um deles. Palavras-chave: psicanálise, Ética, consciência Moral. Abstract: Considering that Psychoanalysis and Ethics are dif- ferent fields of knowledge, but with an important field of inter- section, this paper intends to show, through a systematization effort, that the diversity of metapsychological models present in Psychoanalysis produced not only differences in the theo- retical approach of ethics and moral conscience, but also in the clinical objectives of each of these streams of thought. The pa- per examines the works of authors who determined four main psychoanalytical streams of thought – Sigmund Freud, Mela- nie Klein, Heinz Hartmann e Jacques Lacan – a systematiza- tion that will be briefly presented, pointing out the respective clinical implications of these discourses. From each of these authors’ discourse on ethics and moral conscience, this paper presents some comments on the place of the other in the work of each of these authors. Keywords: psychoanalysis, Ethics, Moral Conscience. Camila Junqueira Universidade de São Paulo (USP) camilajunqueira@hotmail.com Ética e consciência Moral: a teoria, a clínica e o outro Ethics and moral conscience: the theory, the clinic, and the other 8 Impulso, Piracicaba • 21(52), 7-18, jul.-dez. 2011 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767 Introdução Se tomarmos, de um lado, a ética, tal como é genericamente definida pela filosofia (LALANDE, 1926), ou seja, uma disciplina responsável pela investigação dos princípios que determinam, orientam e motivam o com- portamento moral, e que procura fundamen- tar e definir a natureza do bem e do mal, e, de outro, a psicanálise, definida por Freud como um procedimento para a investi- gação de processos mentais que são quase inacessíveis por qual- quer outro modo, (2) um método (baseado nessa investigação) para o tratamento de distúrbios neuró- ticos e (3) uma coleção de informa- ções psicológicas obtidas ao longo dessas linhas, e que gradualmente se acumula numa nova disciplina científica1, poderia parecer que es- tamos falando de campos comple- tamente distintos. Contudo, podemos observar que tan- to a ética como a psicanálise se interessam pelos comportamentos éticos e morais dos indivíduos, dos quais vai surgir um campo de intersecção. Desde Freud, a literatura psicanalítica vem mostrando a amplitude desse campo de intersecção. Na última década, alguns autores produziram textos nos quais se faz uma leitu- ra da crise ética vivida na atualidade a partir do referencial psicanalítico (KHEL, 2002; ROS- SI, 2001; SOUZA, 1998; COSTA, 1994; GAMPEL, 1992, entre outros), outros tratam da questão da neutralidade (ZEDDIES, 2000), do sigilo (WINNER; LAX, 2002), do diagnóstico (MEIS- SNER, 1994), da qualidade dos atendimentos (WILDLÖCHER, 1998) e do estatuto científico da psicanálise (BIRMAN, 1994; KLIMOVSKY; DEPETIT; ZYSMAN, 1995). Há, ainda, quem aponte a incompatibilidade entre o método psicanalítico e a ética (ALLOUCH, 1997) por meio da denúncia de um processo de “eti- 1 FREUD, 1923b, p. 287. ficação” da psicanálise e há também quem critique essa posição (MEZAN, 1998b). Além desses, há autores que procuram sintetizar e refletir sobre as posições de Freud (FERRAZ, 1994; WALLWORK, 1991) e de Lacan (RINALDI, 1996 MAURANO, 1995), ou criticar uma des- sas posições (MEZAN, 1998a). Grosso modo, é possível afirmar que há pelo menos três campos de intersecção entre a ética e a psicanálise que são bem estabelecidos na literatura psicanalítica, a saber: 1) o estudo dos fatores que determinam os comportamen- tos éticos e morais (a psicogênese da ética); 2) a psicanálise como produto de uma determina- da tradição cultural que carrega determinados valores; e 3) os problemas éticos colocados pela prática clínica (neutralidade, sigilo, etc.). A meu ver, há ainda um quarto campo em estado embrionário que se situa em relação à funda- mentação da ética. Não se trata de discutir se a psicanálise poderia fundamentar uma ética, tarefa que pertence ao campo da filosofia; tra- ta-se apenas de questionar como pode a filoso- fia, ao realizar a fundamentação de uma ética, dispensar o apoio de teorias que abordam o comportamento humano, do funcionamento psíquico, ou mesmo de teorias acerca da psico- gênese da ética. Porém, foi apontado em outro trabalho (JUNQUEIRA, 2006), esse é um cam- po a ser explorado. Diante da vasta literatura psicanalítica acerca da ética, observa-se uma estreita lacu- na que não se situa exatamente em nenhum dos campos de intersecção, mas que os tan- gencia e diz respeito às implicações clínicas do discurso psicanalítico acerca da ética e da consciência moral. É sobre essa lacuna que recai este trabalho. É evidente que diante do estado atual de dispersão do campo analítico não é possível falar em nome [da Psicanálise Quando, em razão de um recorte que viabili- zasse o trabalho, escolhi estudar a ética e a consciência moral em Freud e em mais três autores pós-freudianos que influenciaram as principais correntes psicanalíticas – Klein, Hartmann e Lacan (BERCHERIE, 1988; ME- ZAN, 1988) –, me deparei com a constatação de que a diversidade de modelos metapsico- 9Impulso, Piracicaba • 21(52), 7-18, jul.-dez. 2011 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767 lógicos existentes na psicanálise produziu não só diferenças nas concepções sobre o tema da ética e da moral, mas também que essas diferenças são perceptíveis nos objetivos clí- nicos de cada uma dessas correntes. Desse modo, este texto tem por objeti- vo apresentar, de modo sucinto, as concep- ções de ética e moral desses quatro autores e suas implicações clínicas. Além disso, a partir do discurso de cada um desses autores sobre a questão da ética e da consciência moral, procurei tecer alguns comentários sobre o lu- gar do outro nas obras deles. É importante es- clarecer que não se pretende apresentar con- siderações sobre o lugar do outro na teoria de Freud, Klein, etc., mas, sim, tão somente apresentar o que os discursos desses quatro autores sobre a ética e a consciência moral su- gerem sobre o lugar do outro em cada uma de suas teorias. Também não faz parte do esco- po deste trabalho tecer considerações a res- peito das diferenças antagônicas entre essas teorias, originadas por divergências em seus fundamentos, assunto de grande importância e que merece uma atenção mais detida do que se poderia dar neste momento. Freud (1908) se interessava pelo tema da ética e da consciência moral pela via da clinica, pois ele percebia uma relação entre a consciência moral e as patologias psíquicas. É verdade que o interesse de Freud (1912-13, 1921, 1930) pelos comportamentos sociais foi maior do que o dos outros psicanalistas estudados, para ele a importância do estudo dos tabus, por exemplo, estava em demonstrarque a so- ciedade, a moral e a neurose tinham a mesma origem: a renúncia pulsional. Para Freud, a ci- vilização tem início quando o homem percebe que depende do trabalho coletivo para melho- rar sua sorte, e a consciência moral e a ética nas relações surgem como formas de tornar possível esse projeto de vida coletiva, tal como afirma em sua obra, Projeto para uma psicolo- gia científica, “o desamparo inicial dos seres humanos é a fonte primordial de todos os mo- tivos morais”2. 2 Idem, 1895, p. 119. Para Freud (1939), a ética se justifica pela necessidade de se delimitar os direitos da sociedade contra o indivíduo, os direitos do indivíduo contra a sociedade e os direitos dos indivíduos uns contra os outros. É verda- de que Freud (1912-13) admite que o mito do assassinato do pai primevo não precisa ter sido um acontecimento real, pois o desejo e o temor de matá-lo (no Édipo) já são suficientes para que a consciência moral no indivíduo seja instalada. Entretanto, o que importa destacar aqui é que a capacidade de pensamento an- tecipa as consequências do ato, dispensando sua realização; contudo, o que está em jogo é uma consideração a respeito do outro ex- terno e real, uma consideração que não é de todo desinteressada, pois já se reconhece o quanto o outro é importante para a sobrevi- vência de si mesmo. Conforme adverte Freud (1939), muitas vezes pode parecer que nós renunciamos aos desejos por termos preceitos éticos, mas a or- dem das coisas é inversa: nós temos preceitos éticos pelo fato de precisarmos renunciar a desejos individuais para viver em comunida- de. Dessa forma, ele conclui que os sentimen- tos éticos não são uma disposição inata, eles são construídos a partir de uma necessidade de sobrevivência; porém, na verdade, são via- bilizados pelo aparelho psíquico, esse sim po- tencialmente inato, mas que também só vai se desenvolver na medida em que o indivíduo passar pelo mesmo percurso que a civilização usou na conquista dos preceitos morais. Nes- se sentido, para Freud, o individual remonta ao coletivo, o Édipo ao pai primevo, a filogê- nese à ontogênese. A principal implicação clínica das refle- xões de Freud sobre a ética e a consciência moral é o desenvolvimento do conceito de superego como produto da renúncia pulsio- nal, bem como um balizador ético para o ego. O superego é, então, formado tanto pela in- trojeção do amor sexual, que não pode ser realizado em relação aos pais (FREUD, 1923a), como pelos impulsos agressivos que não podem ser realizados na realidade externa (FREUD, 1930), tornando-se um importante 10 Impulso, Piracicaba • 21(52), 7-18, jul.-dez. 2011 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767 aliado da civilização e do indivíduo no contro- le das moções pulsionais renunciadas. Freud mostra que enquanto o amor dessexualizado se transforma na parte ideal do superego e no laço emocional que une as famílias e os grupos, o controle da agressivi- dade, por meio da introjeção, é o responsável pela severidade do superego. “Quando mais o homem controla sua agressividade para com o exterior, mais severo – isso é, mais agressi- vo – ele se torna em seu ideal de ego”3. Desse modo, a severidade do superego está muito mais relacionada com a quantidade de agres- sividade introjetada do que com a severidade com que o indivíduo foi criado. Os objetivos terapêuticos do proces- so analítico foram abordados por Freud em diversos momentos de sua obra, e suas va- riações podem ser atribuídas ao momento conceitual que a psicanálise se encontrava. Porém, o objetivo central que permeia toda sua obra era o de tornar consciente o incons- ciente. Todavia, após o estabelecimento da segunda tópica, quando o interesse de Freud mudou do conteúdo recalcado para as forças recalcadoras, ele vai focar seu trabalho nas resistências ao processo analítico e, assim, vai passar a incluir o trabalho com o superego em seus objetivos clínicos. Segundo Freud (1938), o principal motivador de resistência à análise se deve a um “fator moral”, um sentimento de culpa que prende o indivíduo ao sintoma como forma de sua satisfação. No tocante às reflexões de Freud, outra implicação clínica importante é ele sustentar] que a civilização e a neuroses têm a mesma origem (a renúncia pulsional) e que, portanto, conflitos éticos se sobrepõem aos conflitos psíquicos e podem ser tratados em análise. Assim sendo, a partir do discurso de Freud sobre gênese dos sentimentos éticos e da consciência moral, é possível afirmar que o outro real tem, para ele, importância funda- mental na constituição do psiquismo; apare- lho que tem por função absorver o impacto da renúncia pulsional realizada pela necessidade 3 Idem, 1923a, p. 70. individual de convivência em comunidade, ou seja, a renúncia pulsional promovida pelo con- tato com a alteridade funda o psiquismo. Tomando apenas a clínica de Freud, é possível compreender que ele seja classificado como um integrante da one-person psycholo- gy, pois ele não leva em conta a constituição e as transformações do analista no contato com o analisando. Por outro lado, quando a análise implica o trabalho com o superego, estamos indiretamente lidando com o outro externo e real internalizado, que é mais do que um ob- jeto interno, é uma instância psíquica, é parte da estrutura e da organização do psiquismo, é parte do que garante seu funcionamento. Em Klein, há uma situação diferente. Se para Freud as relações éticas e a consciência moral são uma necessidade social da ordem da sobrevivência da espécie, para Klein elas surgem de uma necessidade muito mais inter- na e pulsional, revelando um pensamento for- temente inatista. O problema da convivência em comunidade e das relações sociais não foi um foco de interesse para Klein, embora ela se interessasse muito pela gênese dos com- portamentos antissociais, situando-os como um distúrbio psíquico (KLEIN, 1927, 1933), seguindo nisso a linha de Freud, que aproxi- mava os conflitos morais à neurose. Klein, contudo, não faz suas considerações sobre as relações sociais, seus textos são fundamen- talmente clínicos. Porém, seu modo peculiar de conceber a agressividade e a origem da an- siedade, e mesmo o complexo de Édipo e o superego, resultou numa teoria própria a res- peito da gênese dos comportamentos éticos e da consciên cia moral. A partir da observação de ansiedades in- tensas em crianças muito pequenas, Klein co- meçou a desenvolver a ideia de um superego precoce que se forma a partir das identifica- ções com os objetos por meio dos processos de projeção e introjeção. Mas, para Klein, há uma diferença grande entre o objeto externo e real e aquele objeto que é introjetado, dife- rença que se explica pela ação do sadismo, ou resultado da luta entre as pulsões de vida 11Impulso, Piracicaba • 21(52), 7-18, jul.-dez. 2011 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767 e morte que o bebê experimenta desde seu nascimento (KLEIN, 1926, 1932, 1933). Desse modo, nos momentos iniciais do desenvolvi- mento, por mais que os objetos reais – em ge- ral, os pais – se apresentem de forma gentil e acolhedora, suas imagos estarão tão contami- nadas pela projeção dos impulsos sádicos que aparecerão, necessariamente, como figuras assustadoras. Com essa hipótese, Klein pre- tende explicar porque o superego primitivo, que irá se formar a partir dessas imagos, será sempre cruel e severo. Klein afirma, portanto, que a severidade do superego primitivo se deve a um fator constitucional. Ela será pro- porcional ao sadismo, ou, ainda, à quantidade de pulsão de vida e de morte que estiver em jogo, e não poderá ser atribuída, pelo menos nesse momento inicial do desenvolvimento, às experiências reais. A quebra do ciclo sadismo-ansiedadeque alimenta a severidade do superego pode ocorrer na fase genital devido ao aumento natural da libido. Quando Klein (1935) se re- fere a um aumento “natural” compreendo que ela está mais uma vez valorizando o que é inato e constitucional. Quando esse au- mento transcorre normalmente, os objetos formam imagos mais benignas, que, quando introjetadas, diminuem a severidade do su- perego tornando-o, tal como Klein (1935) de- nomina, “a consciência propriamente dita”. Essa transformação se dá porque a diminui- ção do sadismo possibilita a diminuição da cisão; como consequência, ocorre o aumen- to da integração dos objetos bons e maus, o que dá origem à ansiedade depressiva, medo de destruir o objeto bom, ou sentimento de culpa por tê-lo danificado, que toma o lugar da ansiedade esquizo-paranóide. A ansieda- de depressiva será, então, a grande moti- vação para as ações reparatórias, base dos comportamentos éticos. Mas, nesse mo- mento, além do aumento natural da libido, será também muito importante para essa transformação na qualidade da ansiedade, de esquizo-paranóide para depressiva e, por- tanto, na passagem para a posição depres- siva, a sobrevivência concreta do objeto ex- terno (geralmente a mãe), que demonstra à criança que pode sobreviver a seus ataques e aceitar suas tentativas de reparação. Para Klein, ego e superego, no período de latência, também precisarão encontrar apoio na realidade externa na luta contra o sa- dismo do id. Mas após a puberdade, o indiví- duo irá novamente se desligar desses objetos externos e reais. O ego irá substituir os obje- tos e as experiências reais por objetos abs- tratos, tais como valores, ideais e princípios, realizando uma consolidação do superego e tornando-o novamente independente dos ob- jetos reais. Porém, sua situação do ego nesse momento será bem diferente, pois a qualida- de dos objetos internos será outra, menos in- fluenciada pelo sadismo. O superego, para Klein será formado não só pela introjeção dos objetos maus, sen- do sádico e severo, mas também pela intro- jeção dos objetos bons, responsáveis pelas ações reparatórias, base dos comportamen- tos éticos e morais. Os objetivos da terapia, segundo Klein, incluem a diminuição da ansiedade, impor- tante para a quebra do ciclo vicioso entre o sadismo que sustenta a severidade e o su- perego, bem como uma modificação da an- siedade, ou seja, uma elaboração das ansie- dades esquizoparanóides e uma passagem para a posição depressiva, o que permite a dissolução de grande parte das fixações sá- dicas, a diminuição dos processos de cisão e o consequente aumento dos processos de integração. Essas modificações implicam na diminuição da severidade do superego, fun- damental para que a ansiedade seja substitu- ída pela culpa que desperta o indivíduo para a necessidade de ações reparatórias e com- portamentos éticos. Nesse sentido, a principal implicação clí- nica da reflexão de Klein acerca da ética e da moral é a importância atribuída à passagem da posição depressiva, que, além de ser parte do desenvolvimento do psiquismo, é objetivo do processo terapêutico e está intimamente implicado no surgimento da ‘consciência mo- ral propriamente dita’. 12 Impulso, Piracicaba • 21(52), 7-18, jul.-dez. 2011 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767 O próprio conceito de Klein (1932) de adaptação à realidade, um dos objetivos analí- ticos – compreendido como ‘perceber a reali- dade tal como ela é’, ou seja, de modo menos distorcido pela projeção dos impulsos sádicos –, já implica numa atribuição de importância ao outro externo e real. Se, para Klein, no início do desenvolvi- mento psíquico o outro real é plenamente dis- pensável porque estará sempre contaminado por projeções sádicas, para a continuidade do desenvolvimento por meio da instalação da posição depressiva – com a qual surgem os comportamentos éticos e a consciência moral –, a sobrevivência e a benevolência do outro real serão fundamentais. Tal posição revela um pensamento nem tanto inatista e constitucio- nal como se costuma atribuir a essa autora. Já o discurso de Hartmann sobre as ques- tões éticas e morais é influenciado por sua tentativa de tornar a psicanálise uma psicolo- gia geral, que pertença ao campo das ciências empíricas. Hartmann não procura, assim como Freud e Klein, estabelecer uma teoria sobre a psicogênese dos sentimentos e comporta- mentos éticos. Hartmann parece não discor- dar de Freud nesse ponto, porém não atribui a mesma importância a essa teorização. A psi- canálise está em constante contato com pro- blemas relacionados à moral, contudo Hart- mann (1960) usa o critério de ‘cientificidade’ para estabelecer um limite entre o que tange à psicanálise e o que tange à filosofia. Para esse autor, a psicanálise é uma ciência empírica e, nesse sentido, não é capaz de nos prover com objetivos ou imperativos morais, não poden- do, portanto, contribuir para a construção de uma Weltanschauung4. Para ele, dizer que a psi- canálise é uma ciência significa dizer que ela é isenta de valores morais: “a terapia analítica é um tipo de tecnologia [...] No uso de técnicas pedagógicas valores morais não podem ser co- locados entre parênteses, assim como são na técnica psicanalítica”5 e, desse modo, os úni- cos valores que interessam para a psicanálise 4 Visão de mundo. 5 HARTMANN, 1960, p. 20-21. são os valores de saúde sem relações com os valores morais (HARTMANN, 1939b). A partir do conceito de “mudança de função”, Hartmann desvincula a gênese da moral de sua função posterior e admite o valor adaptativo do código moral em sua gênese. Contudo, na medida em que o código moral entra em conflito com o ego, desfavorecen- do a adaptação, este pode perder seu valor adaptativo. Para Hartmann, a saúde mental tem como base a adaptação, o que não signi- fica um simples ajustamento social. A adapta- ção estaria ligada à capacidade de regulação da relação entre indivíduo e meio visando à sobrevivência daquele (HARTMANN, 1939a). O principal objetivo da terapia analítica é a adaptação entretanto essa terapia pode influenciar na ética pessoal ou na construção do código moral tão somente na medida em que contribui para a clarificação e organiza- ção dos valores morais. Tornando o código moral menos distorcido e aumentando o senso de responsabilidade dos indivíduos, a terapia analítica pode resultar numa mudança de comportamento, bem como pode tornar o controle moral mais sutil. Apesar das poucas afirmações de Hart- mann acerca dos objetivos da clínica, é pos- sível observar certa influência de sua refle- xão acerca da ética e da consciência moral na forma como concebe a clínica. Na mesma medida em que Hartmann minimiza a relação da ética e da moral com a teoria psicanalítica, ele minimiza, também, a atuação da clínica so- bre os comportamentos morais. Isso pode ser observado, por exemplo, quando Hartmann procura eliminar o elemento moral da subli- mação e da etiologia das neuroses, a despeito do pensamento de Freud e o de Klein. Ou, ain- da, quando Hartmann restringe os efeitos da terapia psicanalítica a “clarear e organizar” o código moral, quando enfatiza que a psicaná- lise não é formadora de código moral. Segundo Hartmann (1960), a relação en- tre clínica e moral pode ser reconhecida, so- bretudo, por meio do processo de autoconhe- cimento, resultado esperável para qualquer 13Impulso, Piracicaba • 21(52), 7-18, jul.-dez. 2011 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767 análise. Para ele, há uma mistura problemáti- ca entre o que é demandado de mim pelo ou- tro e o que eu mesmo demando de mim. Nes- se sentido, o autoconhecimento significa não apenas se descobrir como agente de valoriza- ção moral, mas também distinguir quaissão seus próprios imperativos e quais são os dos outros. Segundo esse autor, reconhecermo- -nos como agentes da moral e formadores de imperativos é dinamicamente tão relevante para a personalidade e para o direcionamento de nossa ação quanto reconhecer os objeti- vos de nossas pulsões e das funções do ego. Hartmann (1944) sugere, ainda, que as instituições sociais existem para satisfazer objetivos pulsionais, interesses do ego ou de- mandas do superego. Esse autor questiona até que ponto uma estrutura social provoca certas tendências do id, certas formas de su- blimação, ou, como participa na solução de conflitos. Para ele “as possibilidades de adap- tação da mesma (ou quase mesma) estrutura psíquica podem ser diferentes em diferentes tipos de sociedade, e entre diferentes classes sociais”6. Desse modo, a sociedade é, para Hartmann (1939a/1960), codeterminante do processo de adaptação. Assim, é possível compreender que, para Hartmann, o outro real faz parte do meio ambiente ao qual o ego se desdobra para se adaptar. Se pensarmos que a sociedade e suas instituições são formadas pelos outros reais, poderemos pensar que eles têm uma impor- tância no processo de adaptação que o autor relaciona com a sobrevivência do indivíduo e, desse modo, é possível afirmar que o ou- tro real externo está implicado no desenvol- vimento psíquico, tal como proposto por ele Mas o fato é que o desse autor discurso acerca da ética e da moral não nos dão elementos su- ficientes para irmos além em nossas conside- rações sobre o lugar do outro em sua teoria. Já para Lacan (1959-60, entre outros), a psicanálise é uma ética referenciada ao dese- jo e aos meios de gozo e, portanto, é a uma experiência da ordem da subjetivação não 6 Idem, 1944, p. 28. passível de universalização, como gostaria a maioria dos filósofos que versam sobre ética. Dessa forma, o autor se afasta da ética filosó- fica e das questões morais. O sujeito, para Lacan se define pela estru- tura simbólica, sendo efeito da linguagem. O sujeito é dito barrado na medida em que a lin- guagem não dá conta de simbolizar tudo. Essa impossibilidade de simbolização total coloca a falta como inerente e estrutural ao sujeito. Por mais que o sujeito encontre objetos que lhe pareçam responder ao seu desejo – isso será por um momento extremamente fugaz –, ha- verá sempre um resto não satisfeito, uma falta extremamente importante para o sujeito, pois é o que o mantém vivo e se mexendo sempre em busca de algo que o complete. Nesse sen- tido, Lacan (1959-60) afirma que “tudo o que existe vive senão na falta-a-ser”7. Enquanto para Freud o desejo nasce de um reinvestimento psíquico, num traço mnêmico ligado à satisfação de uma pulsão, para Lacan o desejo se refere, sobretudo, a uma falta constitutiva que não pode ser pre- enchida por um objeto da realidade. Aquilo que falta – pois não pôde ser simbolizado, o que Lacan denomina “Coisa” (das Ding), é o objeto do desejo que resta no Real. Segundo Almeida, “há sempre um resto que resiste a nomeação e esse resto – que é Real – como sabemos, chama-se desejo”8. Desse modo, a ética da psicanálise se define em termos de uma “ética do desejo” e está, assim, referida à falta, ou seja, à falha estrutural que existe na determinação simbólica do sujeito. Para Lacan (1959-60), a Coisa é anterior a todo re- calque, estando “fora-do-significado”, mas, por outro lado, é o que dá significado para tudo o que vem depois dela, é o que marca a orientação do sujeito. Na psicanálise lacaniana não é mais pos- sível falar de desejo sem fazer referencia ao gozo. No seminário sobre A Ética da Psicaná- lise (1959-60), em que Lacan defende a con- cepção de uma “ética do desejo”, ele também 7 LACAN, 1959-60, p. 353. 8 ALMEIDA, 1989, p. 370. 14 Impulso, Piracicaba • 21(52), 7-18, jul.-dez. 2011 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767 deixa aberta uma porta para a questão do gozo e, em Kant com Sade (1963), esse autor dá mais um passo em direção ao que se pode denominar “ética do gozo”: “E se a máxima universal fosse de gozo? E se essa máxima de gozo pretexte o imperativo da lei moral?”9; indaga-se Lacan. Para ele, aquém de qualquer possibilidade de racionalidade, que Kant de- finia como base de qualquer ação ética, está o imperativo de gozo, resultado do Real que não para de se inscrever. De acordo com Valas (2001) [Esta fonte não consta das referências. Favor inseri-la], o que Lacan introduz de novo com o conceito de gozo é que o sintoma não é mais visto ape- nas como uma mensagem, mas também como algo que comporta um gozo, no qual o sujeito se encontra fixado, sendo aí que a eficácia do tratamento deve incidir. Para Lacan, o gozo se transforma no principal fator de resistência à análise. O “imperativo moral” mencionado por ele não possui, desse modo, relação com a moralidade no sentido filosófico, e é isso jus- tamente que ele aponta ao aproximar Sade de Kant. O imperativo moral kantiano é, então, transformado por esse autor em herdeiro de um superego poderoso que, muito além de ser o que baliza nossas ações, como apontou Freud, é, sobretudo, o impositor da busca in- cessante pelo gozo que está muito além, ou aquém, do Bem do sujeito. Nesse ponto, entra a questão da lei. Para Lacan (1959-60), lei, desejo e gozo têm uma íntima ligação. A lei é a proteção contra esse gozo extremo, o qual não podemos su- portar; a lei interdita o gozo. A lei adquire seu valor para o sujeito na medida em que coloca uma distância entre ele e a Coisa, objeto do desejo. Pois, conforme Lacan (1959-60), o en- contro com o objeto de desejo equivaleria à morte enquanto cessação de demanda. A rea- lização do desejo se coloca numa perspectiva de condição absoluta, de juízo final, pois um desejo só se realiza de fato no final. Lacan afir- ma, então, que não se conhece a Coisa senão pela lei, que nos limita seu acesso. Ele adverte 9 Idem, 1963, p. 780. ainda que não há comparação entre a satisfa- ção de um gozo e a satisfação direta por for- mas desviadas (pelos bens), ou sublimadas, das quais a civilização tanto se utiliza. Lacan afirma ao longo de sua obra a exis- tência de varias modalidades de gozo. A mais importante para a compreensão de uma ética do gozo é o mais-gozar, ou o gozo do objeto a. A linguagem não pode dizer tudo, há sem- pre um resto que fica fora do processo de sig- nificância, esse é o mais-gozar. Como aponta Valas, “o objeto a comemora a perda de gozo. Mas, como esse objeto representa um resto de gozo que escapou ao processo da significância, ele é designado por Lacan como mais-gozar”10. A diferença importante para a questão da ética é que o mais-gozar, diferente do gozo do Ou- tro, está submetido à castração. Para que ele exista, a castração simbólica operou na sepa- ração entre sujeito e gozo. É quando S2 vem se colocar na sequência de S1 ou seja, no proces- so de significância, que o mais-gozar advém. E a psicanálise, por sua vez, pode ajudar o sujeito a sair do campo do gozo mortífero do Outro em direção ao campo mais-gozar, em que o gozo é referenciado à castração. Para Lacan (1959-60), o que ele intro- duz de novo no campo da ética é a atenção à barreira que existe em relação à Coisa e ao desejo, a inacessibilidade do objeto enquanto objeto de gozo. A partir da discussão acerca da inacessibilidade da Coisa, Lacan conclui que o “Bem Supremo”, tão almejado na ética filosófica e pela sociedade em geral, não exis- te, e que nenhum outro bem pode equivaler à Coisa, a qual, além de proibida, é perdida. O imperativo ético, para Lacan (1959-60), se resume em “não ceder do desejo” e, para isso, é necessário conhecer a verdade do de- sejo; ainda que não se possa atingir a Coisa, é necessário bordejá-la. Bordejar a Coisa,saber ao máximo sobre nosso desejo e sobre nossos meios de gozo é uma das vias que a análise nos oferece para nos tornarmos, ao menos, “mais livres” de nossa neurose, ou menos engessa- dos em formas nocivas de gozo. 10 VALAS, 2001, p.69. 15Impulso, Piracicaba • 21(52), 7-18, jul.-dez. 2011 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767 O que o sujeito conquista na análise não está no nível dos bens, nem do acesso à Coisa. É, na realidade, sua própria “lei” (regra), a ver- dade de seu desejo, o que rege seu princípio de prazer/desprazer. Isso ao mesmo tempo em que o sujeito se dá conta de que é castra- do, ou seja, de que a falta é constitutiva e, por- tanto, por mais que se saiba acerca do desejo, não saberá nada além de suas marcas. A falta sempre existirá, e nunca haverá resposta para o desejo. A ética da psicanálise se dá, portanto, em relação à ação e ao desejo que a habita, em que o questionamento será sempre ‘agiste em conformidade com o desejo que te habita?’. Ao se distanciar das questões morais para construir uma ética balizada pelo dese- jo e pelo gozo, Lacan põe em questão a rela- ção entre o Supereu e a consciência moral, na qual este vai ter uma dimensão menos ideal e mais ligada aos imperativos de gozo. Lacan (1959-60/1991) não nega a existência de algo que pode ser denominado “consciência mo- ral”; contudo, ele a exclui completamente ao que tange ao campo de teorização da psica- nálise. Já do campo da clínica psicanalítica, ele não pode excluí-la, uma vez que aparece com frequência no discurso do paciente. Todavia, na clínica psicanalítica proposta por Lacan, a consciência moral fica relegada ao plano dos engodos, dos bens, todos falsos, o qual, de acordo com o pensamento do sujeito, pode- ria resolver seu problema em relação a seu desejo e, ainda, poderia harmonizá-lo com a sociedade. A consciência moral fica, então, re- lacionada ao ideal do eu que se desenvolve no plano Imaginário. A outra via proposta pela psicanálise é a da sublimação. Freud marcou a diferença entre satisfação por sintoma, que inclui o re- calque e a satisfação por meio da sublimação, que, por sua vez, não envolve recalque. Entre- tanto, para Oliveira (1999), há um problema na posição de Freud na medida em que Freud re- laciona sublimação a juízo de valor, o que teria motivado Lacan a refletir sobre o assunto: A sublimação questiona a psicaná- lise em sua ética, promovendo em Lacan a iniciativa de tomá-la como objeto de estudo e aprofundamen- to em seu seminário ‘A Ética da Psi- canálise’ [...], pois a sublimação, tal como Freud a colocou, arma uma cilada, a idéia de que pode haver uma fácil conciliação entre o indivi- dual e o coletivo.11 Contudo, para Lacan, a sublimação se confirma como face do pensamento ético, uma vez que também se impõe como forma de interdição e de consciência moral ao nos ofere- cer outro objeto de satisfação, afastando-nos daquele que realmente foi desejado e que é proibido. Segundo Lacan (1959-60), a questão da sublimação se coloca no campo das pul- sões, que, diferentemente dos instintos, são plásticas e aceitam uma substituição de objeto. Quando uma satisfação é recusada pela reali- dade, a pulsão pode encontrar satisfação em outro objeto, comportando-se como uma rede de vasos comunicantes; mas há um limite para isso, pois nem toda sublimação será possível. O autor define a sublimação como a satisfação di- reta, que é alcançada por meio de outro objeto (distinto daquele que era desejado inicialmen- te), diferenciando-a do recalque. O que ocorre na sublimação é que o objeto é tido como a Coisa. A elevação do ob- jeto ao estatuto de Coisa só é possível porque há entre o objeto e a Coisa uma articulação significante que permite que sejam substitu- ídos como metonímia. A sublimação é estru- tural e não apenas um dote para poucos. O saber sobre as marcas do desejo e do gozo liberta e acalma o sujeito. Liberta-o dos fal- sos bens, assim como de valores que não lhe pertencem, mas que lhe foram impingidos. Deixa-o livre para circular entre os objetos e procurar aquele que tem uma melhor articu- lação com seu desejo. Acalma, pois conhecer as marcas do desejo permite ao sujeito gozar pelas bordas, uma vez que o gozo da Coisa lhe é interditado. O sujeito, por meio da análise, 11 OLIVEIRA, 1999, p. 79. 16 Impulso, Piracicaba • 21(52), 7-18, jul.-dez. 2011 • ISSN Impresso: 0103-7676 • ISSN Eletrônico: 2236-9767 pode ficar menos engessado num só objeto, ou num só tipo de gozo. Pode libertar-se do gozo mortífero do Outro e permanecer no ní- vel do mais-gozar, que é o gozo parcial e pos- sível dos objetos e da falta. Em suma, a ética do Bem-dizer opera tanto no âmbito das interpretações quanto das construções, a fim de constituir um enun- ciado possível sobre o desejo e sobre o gozo, sobre essa verdade singular, que liberta o su- jeito para o encontro de formas menos noci- vas de gozo. Nisso constitui-se toda a essên- cia da cura em psicanálise lacaniana. A concepção de ética de Lacan se apre- senta muito bem articulada com a sua propos- ta clínica. A ética da psicanálise, descrita pelo autor em questão como uma ética do desejo e do gozo, tem uma importância fundamen- talmente clínica, pois, a partir dela, é possível encontrar uma direção para o processo analí- tico, que será, então, baseado, de um lado, no desejo do sujeito (do analisando) e, de outro, no desejo do analista. Portanto, se observa no discurso de La- can acerca da ética da psicanálise essencial- mente a presença do Outro, do Simbólico ou da Linguagem. É verdade que o outro real, o seme- lhante ou o “outrinho” aparecem como impor- tantes na constituição subjetiva, especialmente no Estádio do Espelho, o qual se localiza no plano imaginário. Muito diferente da questão ética em Lacan que circula entre o Simbólico e o Real, ética que se instala no momento em que se perde a Coisa, no momento em que se instala a falta e o desejo; no momento em que o Outro, encarnado pela mãe, insere o bebê no Simbólico e que se forja, então, o sujeito. Espera-se, com isso, ter apresentado como as diferenças metapsicológicas entre esses autores marcam diferenças importantes na forma de abordagem do tema da ética e da consciência moral, e como essas diferenças são perceptíveis nos objetivos clínicos de cada corrente. Espera-se ter demonstrado, ainda, como essas diferenças, nas concepções acerca da ética e da moral, dão diferentes aberturas para o papel do outro nas diferentes teorias. Referências ALLOUCH, J. A etificação da Psicanálise – calamidade. Tradução de Dulce Duque Estrada, Rio de Janeiro: Companhia de Freud Editora, 1997. ALMEIDA, M. P. Da ética da psicanálise: a dimensão da ética da interpretação. In: A ética da Psicanálise: suas incidências clínicas. II Encontro Brasileiro do Campo Freudiano, p.363-75, São Paulo: Biblioteca Freudiana Brasileira/Sociedade Psicanalítica de São Paulo, 1989. BERCHERIE, P. Géographie du Champ Psychanalytique, Paris: Navarin Editeur, 1988. BIRMANN, J. 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