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1 LUIZ ANTÔNIO BARRETO TOBIAS BARRETO SOCIEDADE EDITORIAL DE SERGIPE 1994 2 Este livro, com defeitos de repetições, por se tratar de reunião de ensaios e artigos diversos, foi motivado pela efeméride de 1989, e pela edição das Obras Completas de Tobias Barreto, a partir de 1990. Não deixa de ser, então, uma homenagem, um elogio distante, que repõe à vida e à obra o exato efeito dos fatos, sublinhando a coerência de um intelectual que soube viver o seu tempo, e mais que outros soube antecipar o futuro aos brasileiros. 3 ÍNDICE A Fé e a Razão ........................................................................ .6 Tobias Barreto e a Crítica ......................................................... .45 Tobias Barreto e a Luta pelo Direito ......................................... .66 Tobias Barreto, a Abolição da Escravatura e a Organização da Sociedade......................................................... ..83 Tobias Barreto e a Filosofia no Brasil .......................................153 O Pensamento e a Ação Política de Tobias Barreto ............... .....188 Nova Missão Tobiática no Recife ..............................................214 Tobias Barreto e Seus Seguidores ..............................................256 Tobias Barreto um Agitador Social ............................................285 Tobias Barreto e a Ideologia do Progresso ................................ 290 Tobias Barreto e o Preconceito Racial ...................................... 295 Tobias Barreto e a República ................................................... 300 A Escola do Recife e a Propaganda Republicana ....................... 304 Tobias Barreto e as Causas da Liberdade .................................. 309 O Poeta em Salvador ................................................................ 314 Tobias Barreto e o Brasil que ele Queria Novo .......................... 320 Tobias Barreto e o Maranhão ................................................... 326 Tobias Barreto nas Alagoas ...................................................... 331 Tobias Barreto e a Educação da Mulher .................................... 330 Tobias Barreto e o Compromisso Democrático .......................... 341 A Edição dos Livros de Tobias ................................................. 347 As Obras Completas de Tobias Barreto ..................................... 354 Tobias Barreto e a Imprensa Alemã .......................................... 359 O Jornal Alemão de Tobias Barreto .......................................... 365 Tobias, Jhering e Losano .......................................................... 369 4 Este é um livro de elogios. Ninguém pode ficar indiferente diante de Tobias Barreto, mulato pobre de Sergipe, que se projetou, ousadamente, como jornalista, advogado, professor e crítico, compondo uma obra plural e interdisciplinar, marcando com sulcos pro - fundos a vida intelectual de Pernambuco e do Brasil, na segunda metade do século XIX. Tobias Barreto é um sedutor. Seduziu os jovens nordestinos, alunos da Faculdade de Direito do Recife, destronando os velhos conceitos embolorados nos compêndios sacralizados. Seduziu as galerias nas sessões da Assembléia Provincial de Pernambuco, defendendo teses sobre a educação da mulher. Seduziu, também o povo de Escada, que o acompanhou nas audiências, pressionando juízes e promotores para a boa administração da justiça. Somente os que não conhecem a obra tobiática, e nem o contexto que a gerou, passam ao largo da figura genial do poeta e filósofo, um dos poucos a fazer do Brasil o objeto de suas preocupações e dos seus estudos. Como Tobias Barreto foi um divisor de águas, muitos foram os seus críticos e alguns dos seus detratores. Ou- tros, contudo, fizeram o elogio da obra, como Sílvio Romero, Artur Orlando, Graça Aranha, e mais recen- temente Hermes Lima, Antônio Paim, Miguel Reale, Jackson da Silva Lima, Virgílio Campos. 5 As novas gerações não conhecem Tobias Barreto. Este livro pretende ser uma contribuição, porque mes- clado de informações biográficas, repleto de circuns- tâncias, cujo poder influi sobre as várias facetas da obra, está destinado a guiar os mais novos nos caminhos da descoberta da cultura brasileira, especialmente no capítulo que teve como personagem, no centro dos debates, Tobias Barreto. 6 A F É E A R A Z Ã O 7 O concurso para a cadeira de Filosofia do Ginásio Pernambucano, que disputou com José Soriano de Souza, em 1867, e a leitura, durante a aprendizagem da língua alemã, da História do Povo de Israel, (1) de Ewald, marcaram, sem dúvida, a evolução de Tobias Barreto, desapegando-se das raízes religiosas herdadas no convício de sua terra, no contato com o Seminário da Bahia, onde era professor o frei Itaparica, (2) e no magistério de latim, na Província de Sergipe, que largou, com licença do Governo, para estudar direito no Recife. Tobias, na verdade, participa de dois concursos. O primeiro, em 1865, para a cadeira de Latim do Curso Preparatório da Faculdade de Direito do Recife. Concorreu com seu conterrâneo e parente padre Félix Barreto de Vasconcelos, e com Samuel Wallace MacDowel, Francisco Jacinto de Sampaio e Joaquim José Henrique da Silva. As provas foram realizadas no dia 4 de abril, e apresentaram um resultado que qualificava em primeiro lugar o padre Félix, em segundo Tobias Barreto, e os demais em terceiro lugar. A Comissão examinadora, formada pelo Diretor da Faculdade, o Visconde de Camaragibe, José Nicácio, padre Joaquim Graciliano de Araújo e o dr. Pedro Autran da Mata Albuquerque, respondia pela classificação, encaminhada ao Ministro do Império com as seguintes observações: “O padre Féliz é aqui professor particular de latim, natural de Sergipe, e apresenta documentos de serviços prestados em diversas 8 províncias. O candidato Tobias Barreto de Menezes é estudante do segundo ano desta Faculdade, moço aplicado e inteligente. V. Excia. resolverá o que lhe parecer acertado.” Leopoldino Antônio da Fonseca, por não ter sua inscrição aceita no concurso, representou contra o Diretor da Faculdade junto ao Ministro do Império, e o concurso, e em 13 de julho de 1865, “julgando não serem satisfatórias as provas que exibiram os concorrentes”, foi anulado, mandando o Ministro que fosse feita nova prova. O novo concurso foi realizado nos dias 27 e 28 de novembro do mesmo ano, concorrendo padre Féliz, Tobias, Francisco Jacinto de Sampaio e Leopoldino Antônio da Fonseca. Na Comissão examinadora estavam os padres Joaquim Graciliano de Araújo e Inácio Francisco dos Santos. Mais uma vez o julgamento beneficiou o padre em primeiro lugar, com Tobias em segundo. (3) O resultado do concurso não abateu o jovem poeta sergipano. Poeta de escola própria, engajada. Seus versos, cheios de patriotismo, agitavam as massas recifenses, com o mote da guerra do Brasil contra o Paraguai. Nas ruas da capital pernambucana, Tobias era mais que um poeta condoreiro., era um orador do povo, inflamado, devolvendo a coragem de lutar aos bravos nordestinos de Pernambuco que guardavam, ainda, as amarguras das derrotas dos movimentos libertários de 1817, 1824, 1842 e 1848, vivos na memória da “cabocla civilizada.” (4) O mesmonão se poderá dizer do concurso para a cadeira de Filosofia do Ginásio Pernambucano. 9 Contra José Soriano de Souza é o estudante contra o mestre, é o jovem formando seu espírito, de um lado, e um professor experiente, médico e doutor pela Universidade de Louvain, na França, que exercia forte influência sobre professores e estudantes e jornalistas, do outro. Do concurso o próprio Tobias trata, em carta a Carvalho Lima Júnior: “Não obstante ir em primeiro lugar fui preterido por esse doutor, alegando-se como razão da preferência o ele ser casado e eu solteiro.” (5) Tobias Barreto não iria esquecer a injustiça de não ter sido o nomeado, embora guardasse um certo orgulho por ter defendido, naquele co ncurso, modernas idéias de filosofia, contrariando os ensinamentos espiritualistas de Taparreli, Sanseverino e Kleutgen, que seguramente balizavam a formação filosófica do dr. José Soriano de Souza. A Juventude e a religião A Faculdade de Direito do Recife, que fora fundada em Olinda, no Mosteiro de São Bento, quando dirigida por Pedro Autran da Mata Albuquerque, era um santuário da catequese dos moços nordestinos, oriundos de várias províncias da região. Desde 1856 que havia sido ereta, na Igreja de São Francisco, a Confraria Acadêmica Nossa Senhora do Bom Conselho, sob os aplausos dos professores, como se pode testemunhar com a leitura deste texto da Memória Histórica Acadêmica, de 1857: (6) “A instalação da Irmandade Re- ligiosa, no Convento dos Franciscanos, sob a invocação 10 de Nossa Senhora do Bom Conselho, foi uma prova de convicção de que só a religião oferece uma verdadeira e real garantia à ordem e tranqüilidade pública de que só ela pode sancionar de uma maneira positiva e dogmática a Moral social, e prevenir e acautelar crimes cuja alçada e investigação escapam às leis humanas.” Pelo seu valor como documento de época, como mostruário das idéias dominantes na Faculdade de Direito e no ambiente em que vivia a juventude no Recife, vale trazer a público algumas outras mani- festações de professores daquela Casa. Diz um texto da Memória Histórica Acadêmica de 1862: “Muito faz esta juventude, que, dotada geralmente de fervor religioso, sustenta, por meio de algumas associações e escritos pela imprensa, as et ernas verdades do Cristianismo e pugna pela difusão das boas doutrinas.” (7) Em 1863, (8) começam a surgir sintomas de que nem todos estavam de acordo com a catequese e com o controle religioso do conhecimento. Eis o que diz o autor da Memória: “O indiferent ismo de poucos estudantes – sectários do sistema da razão livre ou do puro Racionalismo (sinônimo de Protestantismo), felizmente não pode ainda influir nos louváveis atos de quase totalidade, que por aqueles é qualificada de ascética.” Mais adiante, dizia o professor: “Sem a fecunda aliança da ciência com a religião, e da liberdade com a ordem, dissolvidos estão, sem dúvida, os vínculos sociais.” 11 O ambiente da Faculdade era reproduzido na rua, na medida em que os mestres do direito continuavam com suas pregações destinadas a conter o crescimento das que reagiam ao controle. O professor Antônio Vasconcelos Menezes de Drummond, ao discursar em 7 de agosto de 1867, analisando a Constituição brasileira, afirma categórico: “A religião cristã, obra da Sabedoria Divina em prol do bem da humanidade (assim como o Protestantismo é a obra da fraqueza humana e para sua destruição), sendo a única capaz de fazer a felicidade nesta vida, e também a única capaz de fazer a felicidade na vida futura, foi pela Constituição preferida, sob cuja sombra já havia prosperado a abençoada terra da Santa Cruz, há trezentos anos.” O Curso Preparatório da Faculdade, criado em 1832, no Seminário de Olinda, como Colégio das Artes, seguia a mesma tradição catequética, e seu corpo docente era repleto de padres. A situação era idêntica no Ginásio Pernambucano, fundado em 1855, pelo des - dobramento do Liceu, abrigando padres, como Inácio Francisco dos Santos e Joaquim Graciano de Araújo, que ensinavam, respectivamente, latim, e geografia, retórica e filosofia. (9) Era, portanto, muito forte a influência religiosa no ensino pernambucano, aumentada ainda mais a partir de 1867, quando é fundado o Colégio São Francisco Xavier, confiado aos jesuítas. Abre -se um novo capítulo na questão do controle do ens ino e da cultura em Pernambuco, dando consistência ao mo- vimento que entre os professores era liderado pelo Conselheiro Pedro Autran da Mata Albuquerque e pelos 12 irmãos Braz Florentino, Tarquínio Bráulio e José Soriano de Souza. Os jesuítas chegaram a Pernambuco “como operários da educação da mocidade” a partir de 12 de fevereiro de 1866. Os primeiros que chegaram foram os padres Bento Shembri, logo designado Padre Espiritual dos Seminaristas, Márcio Arcionni, lente de Moral, e Tomé Vitale, lente de Teologia Dogmática. Em princípios de 1867 chegaram os padres Candiami e Clemente Maria Negri. Os jesuítas, mais que os outros padres e que os professores das diversas escolas e da Faculdade de Direito, atraíram a afeição da mocidade. Eles haviam sido convidados pelo Bispo de Olinda, Dom Manoel do Rego Medeiros, e estavam destinados ao auxílio da educação nos Estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Alagoas. Em homenagem a Santo Inácio, no dia 31 de julho, fundam o Colégio de São Francisco Xavier , com finalidade primeira da “educação religiosa da mo - cidade”, que não consistia apenas no ensino do catecismo, “mas também em formar o coração dos alunos para bem cumprirem com os seus deveres, esclarecendo-lhes a inteligência nas verdades e preceitos da religião cristã com progressivas instruções.” Ao lado das intenções educacionais, o Colégio fixava uma rígida disciplina para os seus alunos, que eram proibidos de saírem para visitas, nem nas férias, bem assim de mandar para fora do Colégio cartas, bilhe tes e recados, senão por intermédio do Diretor ou Vice-Diretor. 13 Os jesuítas do São Francisco Xavier estavam realizando, em limites menores e em universos restritos, os planos do anfitrião Bispo de Olinda, que dentre os seus planos para a educação em Pernambuco incluía a criação de um “Curso de Ciências Eclesiásticas”, com as seguintes matérias: Direito natural e das Gentes, Direito Público Civil, Direito Civil Pátrio, Direito Público Eclesiástico, in si e em suas relações com o Direito Civil Brasileiro, História Eclesiástica Geral e Peculiar do Brasil, Escritura Sagrada, ou Exegética, ou Explanação dos Fundamentos da Autenticidade, Canonicidade e Integridade dos Livros Bíblicos, Teo - logia Dogmática, fundamental e polêmica. (10) O que dominava, com rotunda, a ação dos jesuítas em Pernambuco era o que chegava ao Recife, através da Revista Contemporânea de Paris, porta-voz do Neotomismo que contagiava o grupo chefiado por José Soriano de Souza, reforçando o binômio educação - confessionário, espécie de estandarte dominante nas casas de ensino recifenses. A visão religiosa daquele tempo não tardaria em freqüentar as publicações especializadas que circulavam no Recife, como a Revista Mensal de Instrução Pública de Pernambuco. A Religião e a Imprensa Diversos jornais e revistas começaram a circular com objetivos definidos de propagação da fé religiosa. Alguns deles alcançaram repercussão maior, e causaram efeitos também maiores no convício com o corpo social. 14 Entre os jornais e revistasque circularam tendo em seu grupo redacional estudantes da Faculdade de Direito, professores e sacerdotes estão: O Santa Cruz, 1860; A Verdade, 1861; O Constitucional, 1861; O Lidador Acadêmico, dirigido por Tarquínio Bráulio, 1861; A Religião, 1862; A Situação, redigido por alunos do 4º ano da Faculdade de Direito, tinha no cabeçalho o seguinte: “Religião, Autoridade Forte, Monarquia Pres- tigiada, Lei, Conservação e Progresso”, 1862; O Íris da Verdade, 1864; O Oito de Dezembro, 1864; A Esperança, redigido por José Soriano de Souza, 1865; O Vinte e Cinco de Março, do padre Joaquim Pinto de Campos, 1865; O Oriente, 1866; O Democrata Fe- derativo, 1868; A União Democrática, 1869; O Católico, dirigido inicialmente por Pedro Autran da Mata Albuquerque e depois, em 1872, por José Soriano de Souza, 1869; A Santa Cruz, 1871; A União, dirigido por José Soriano de Souza, 1872; O Verdadeiro Católico, 1873; Cáritas, Caridade, 1874; e O Estudante Católico, dirigido por Albino Meira, 1875. Ninguém conseguia escapar dessa participação compulsória na propaganda religiosa pela imprensa. Num jornalzinho de 1863 – A Primavera – estão reunidos Antônio Joaquim de Passos, Castro Alves e Franklin Távora. Estava lá, no artigo de fundo de seu número único, de 17 de maio, o perfil. “Filho de uma idéia grande e generosa, vai ele professar e ensinar a verdade da ciência e o conhecimento de Deus e da humanidade, derramando a educação no seio das famílias por meio de teologias sublimes, como a religião 15 dos mártires.” E acrescentava: “A religião é a sua profissão de fé e basta para recomendar a cada cabeça um sinal de respeito e proteção ao nosso filho das letras, que vem agora à luz da imprensa.” Ainda que fossem de vida efêmera, os jornais e revistas estavam destinados ao cumprimento de uma missão, e cada órgão novo que circulava era um ânimo novo em defesa das mesmas teses, continuamente alimentando o fogo inquisitorial da propaganda, como freio antes que surgissem e proliferassem as idéias novas, que também procuravam abrigo nas páginas dos jornais recifenses. As publicações religiosas tomavam a dianteira na vigilância do conhecimento, insistindo com as velhas teses conservadas pelos ultramontanos que estavam, com os jesuítas, na retaguarda da pregação pela imprensa. Para ilustrar o pensamento comum no meio dos mentores da mocidade acadêmica e estudantil em geral, basta citar a teoria da Revista Contemporânea de Paris, repetida pela Revista Mensal da Instrução Pública de Pernambuco, que, sem rodeios, ensinava que: “O progresso das ciências, das artes e da indústria parece favorecer o desenvolvimento dos instintos menos nobres da nossa natureza.” Num discurso que pronunciou numa festa do Colégio São Francisco Xavier, sobre “O Estudo da Filosofia Natural e Racional”, o padre jesuíta Francisco Rodina alerta que “a ciência sem a virtude é tão fatal ao indivíduo como à sociedade.” Outro jesuíta, Clemente Negri, em carta publicada pela mesma Revista, (11) 16 afirma categoricamente que “a liberdade de ensinar, dada a todos é essencialmente imoral, e por conseguinte ilícita, visto que franqueará o ensino ao incrédulo, ao racionalista, ao protestante, etc.” O ambiente fazia da escola e da imprensa instrumentos do mais direto e claro uso catequético, controlando de forma ampla e quase total não apenas o conhecimento, mas e principalmente as reações e insurgências que pudessem aparecer entre os jovens nordestinos residentes no Recife. Alguns jornais não escondiam suas pretensões, como A Esperança, cuja finalidade era “operar pela palavra, pela imprensa e pelos exemplos uma saudável reação religiosa, se se quer salvar o País do abismo para que caminha a olhos vistos.” Mais do que o mostruário de intenções, das escolas e dos jornais, havia uma idéia básica, sedi- mentada, alicerçando o edifício do pensamento do - minante. Numa vertente, ela está no interior da Faculdade de Direito, incrustada na cátedra de Direito Natural, como deixara o Conselheiro Zacarias de Goes e Vasconcelos, em 1851, abrindo o curso do ano. Dizia ele que: “O Cristianismo, senhores, a que a humanidade deve tantos benefícios, foi que despertou no ânimo do homem o sublime conceito do direito da natureza, conceito cuja verdadeira origem, por conseqüência, é toda celeste, toda evangélica.” Mais do que o Conselheiro Autran José Soriano de Souza era um exemplo de um escudeiro, fiel e leal seguidor de trilhas antigas, que ampliava com sua 17 diligente participação na vida cultural pernambucana. Em 1871 publica, em Paris, o livro Lições de Filosofia Elementar; Racional e Moral, distribuído em Per- nambuco pela Livraria Acadêmica de São Wa lfredo de Medeiros. É a melhor referência para servir de contraponto do pensamento dominante em relação à reação esboçada em fins dos anos 60 e por diante por Tobias Barreto e outros desbravadores da nova cultura, animada pelas luzes da ciência que despont ava na Europa alemã. As Lições de Soriano O livro do dr. José Soriano de Souza termina com uma nota de sujeição, nos seguintes termos: “Sujeitos estas Lições de Filosofia ao juízo indefectível da Santa Igreja Romana, isto é, à correção do Soberano Pontíf ice, Pai e Mestre infalível de todos os cristãos; e com ele digo, e tenho como verdade que é obrigação rigorosa, quer do filósofo, que deseja ser filho da Igreja, quer da mesma filosofia, não dizer nada contra o que a Igreja ensina, e retratar-se desde que ela o adverte; e bem assim que inteiramente errônea e soberanamente inju - riosa à Fé e à Igreja e à sua autoridade e doutrina que ensina o contrário disto.” (12) Retirados do corpo do livro, eis alguns ensi- namentos do dr. Soriano, característicos como produto de uma mentalidade largamente respeitada entre os católicos, como destaca o jornal O Católico, na sua edição de 20 de setembro de 1871: “Certamente per - 18 correndo-a, com satisfação temos notado sólida robustez de argumentos, clareza de exposição, exatidão de definições, propriedade de linguagem científica, e o que mais vale, bom critério na escolha das opiniões mais recebidas entre os autores católicos (S. Agostinho, S. Tomás, Audísio, Taparelli, etc.).” O jornal cita longo trecho do livro que, pela sua importância como justificativa teórica para a prática catequética, merece transcrição. Diz o autor das Lições, sobre a Igreja: “A Igreja é uma sociedade perfeita, absolutamente independente da sociedade civil em seu fim, meios e origem. Com efeito, chama-se perfeita aquela sociedade que é completa em sua natureza, e tem em si mesma todos os meios necessários e suficientes para atingir ao seu fim; ora, neste caso está a Igreja de Jesus Cristo, logo é uma sociedade perfeita. A menor deste argumento provamos logo: o fim próprio da Igreja é a salvação eterna dos homens, o culto divino, o ensino da doutrina de Jesus Cristo: ofícios estes que não lhe foram atribuídos por nenhuma outra sociedade, senão pelo mesmo Jesus Cristo, como foi dito: ao passo que o fim da sociedade civil é em substância a segurança e a felicidade temporal, e o que a ela se refere, de tal sorte porém que se não oponha ao fim último do homem. E porque este fim último, como tal que é, há de dominar os fins intermédios ou temporais, segue-se que longe do fim da Igreja ser subordinado ao do Estado, é ao contrário o fim deste que é sujeito ao daquela, como exige a razão, por ser a matéria naturalmente sujeita aoespírito.” O Católico faz o comentário: “Deste modo vê- 19 se que o claro autor segue nas suas Lições de Filosofia Elementar os sãos princípios, que são como a chave, para refutar os sofismas miseráveis da moderna incredulidade. Haveria pois estudo filosófico mais sério e mais útil para a mocidade católica do Brasil?” A pergunta fica realçando a preocupação afirmativa dos tradicionalistas que tinham no professor José Soriano de Souza um autêntico e aplicado porta-voz. Ninguém melhor que ele, que afirmava a subordinação da Filosofia à Teologia, para consolidar teorias destinadas a recrutar adeptos entre os jovens estudantes, na defesa de uma sociedade cujo poder político só poderia vir de Deus, sendo inadmissível se originar de um dos seus membros. Uma sociedade composta pela “desigualdade de méritos individuais, proveniente de ter a natureza dotado desigualmente aos homens, que consiste a verdadeira igualdade perante a lei social e não em que todos têm igual direito de pretender tudo, como propalam os ultrademocratas, porque essa igualdade material destrói o valor pessoa, a liberdade, e a mesma sociedade, que não pode existir sem ordem, e por conseguinte sem hierarquia social.” Tobias e a Religião Enquanto a figura de José Soriano de Souza era, para Tobias Barreto, a encarnação das velhas doutrinas, que “ao que parece, crê-se destinado a uma grave missão. É fabricar no Recife o melhor contraveneno das idéias perigosas” (13), o livro de Ewald era uma imensa 20 porta por onde o sergipano iria penetrar nas questões religiosas mais profundas. A um tempo, Tobias aprendia, sozinho, o alemão, que conhecia de contatos baianos, quando passara algum tempo junto a Francisco Muniz Barreto de Aragão, (14) e tomava conhecimento histórico do povo de Israel, sendo levado a discutir, pelos jornais recifenses, aquilo que de novo aprendia em suas leituras. Com tal leitura, Tobias faz passagem pelos autores franceses, entre eles os positivistas, com quem Tobias Barreto parecia ter intimidade, pondo uns contra outros, no jogo dialético do confronto que permitia adotar a evolução das idéias. Discute, com esse seu método de raciocínio crítico, a questão da relig8ã e da ciência, opondo Vacherot ao padre Gatry, para quem “a ciência e coisa de fantasia”, como assinalara Tobias em Sobre a Religião natural de Jules Simon, em agosto de 1869, pouco depois que escreveu A Luta de Gigantes. (15) Em Moisés e Laplace opõe a cosmogonia à concepção bíblica da origem do mundo. Surgem os nomes até então ignorados, ou pronunciados com reserva pelos escritores católicos e autores de compêndios e manuais de filosofia. Em “Notas de Crítica Religiosa”, “Os Livros Mosaicos, ou Assim Considerados” e “Uma Excursão de Diletante pelo Domínio da Ciência Bíblica”, Tobias se vale de Ewald para fixar seus novos horizontes na interpretação dos textos religiosos. Ewald é a porta para os demais autores alemães que Tobias incorpora aos seus estudos, muitos deles a partir da Revista de 21 Teologia de Strasburgo, onde segundo o pensador sergipano acharam eco todas as grandes questões bíblicas levantadas durante os últimos 50 anos.” (16) A ação intelectual de Tobias Barreto, nos últimos dois anos como estudante e logo depois de formado, concorre para alterar o seu perfil. O poeta das ruas e das récitas teatrais, agitando o povo ou disputando o amor das belas mulheres e artistas, cede lugar ao teórico da organização política brasileira, de feição liberal, como atestam seus artigos em O Liberal (17) e O Americano, (18) e ao crítico da religião, intuindo a busca de respostas filosóficas para as questões que desejava solucionar, como intérprete da evolução do conhecimento humano. Um compromisso que levou até o final da vida, enfrentando os dias ásperos e cruéis de sua jornada existencial. Tobias Barreto casara, em 11 de fevereiro de 1869, com Grata Mafalda dos Santos, no Oratório do Engenho Riqueza, do seu sogro João Félix dos Sant os, no município de Escada. Em princípios de 1871 Tobias fez a opção por fixar residência em Escada, ainda Termo da Comarca de Santo Antão. Advogado, Curador de Órfãos e de Escravos, Juiz Municipal Substituto, editor, em tipografia própria, de diversos jornais, incluindo o Deutscher Kaempfer, inteiramente redigido em língua alemã, Tobias Barreto molda, definitivamente, com a publicação de Ensaios e Estudos de Filosofia e Crítica, seu perfil de pensador e de crítico, filiando-se completamente ao germanismo. 22 O germanismo de Tobias Barreto leva a que compreenda, de forma desapaixonada, o alcance, a extensão da reforma luterana do século XVI. Tobias passa a entender a reforma como uma nova teoria da fé, e, qualificando Martinho Lutero como “o mais valente orador alemão”, duvida se seria possível Kant sem Lutero. Para ele os feitos do pensamento alemão após a reforma levantam um novo princípio de moralidade, o qual, em oposição à Renascença, corresponde essen- cialmente ao espírito alemão, repousando sobre o lar e a família. Estava claro, para Tobias, que as transformações operadas pela reforma fixavam uma nova ciência e uma nova cultura, que dificilmente vicejariam no húmus do Catolicismo tradicional. Impressiona, no entanto, que a visão esclarecida e singular de Tobias não o leve a participar das questões mais ruidosas do seu tempo de crítico de religião: a polêmica do general Abreu e Lima, assinando-se Cristão Velho, com o padre Joaquim Pinto de Campos e com outros católicos, que resultou, anos mais tarde, na posição radical da administração eclesiástica de negar sepultura ao general de Bolívar, finalmente enterrado no cemitério dos ingleses, e a chamada Questão Religiosa, envolvendo os maçons e o bispo Dom Vital. Tobias estava nas páginas dos seus jornais, como a Razão e a Regeneração, O Americano, e de outros que se abriam para a crítica religiosa no Recife, prin- cipalmente a partir de 1869, como a Consciência Livre, que precedeu ao Americano, Correio Pernambucano, O 23 Liberal e o Jornal do Recife, o mais antigo deles. Era a imprensa aberta às contribuições mais novas, com- batendo aquele outro grupo de jornais católicos, todos com disposição férrea para a propaganda religiosa tradicionalista. A única das questões de evidência que atrai Tobias é a discussão sobre a infalibilidade papal, antes e depois do Concílio de 1870. Entre os católicos havia o temor contra a Igreja. É o bispo Cardozo Ayres, em texto de 29 de setembro de 1869, publicado em O Católico de 17 de outubro do mesmo ano, que diz ser “notório o incremento que vão tomando em algumas folhas públicas desta diocese as idéias anti-religiosas, e sendo de esperar que esse espírito de iniqüidade se exacerbe, durante os trabalhos do sagrado Concílio.” Ao ser concluído, com a afirmação do dogma, o Concílio foi entusiasticamente saudado pelo O Católico, que desabafa: “A definição da infalibilidade pontifícia foi o ato mais brilhante do Concílio Vaticano, a suprema idéia para que Deus o quis reunir. De feito, donde, a não ser deste dogma, dependeria o triunfo do Cato licismo sobre o Racionalismo, e a firmeza do reino de Jesus Cristo sobre a terra? Portanto, definir a infalibilidade pontifícia importava tanto quanto importa a duração do reino de Jesus Cristo sobre a terra: especialmente nesta nossa época, quando o alvo da atual guerra satânica é destronizar a Jesus Cristo, e despedaçar-lhe o cetro. Não podia pois o Concílio Vaticanoprestar ao século XIX serviço mais relevante que proclamar a infalibilidade do Pontífice Romano.” (19) 24 A Igreja não estava disposta a ceder nada em sua forma de ver e de compreender o mundo e firmava, cada vez de forma mais radical, a sua postura, tomando como inimigos a todos os que questionavam ou queriam respostas para questões antigas, que antes sequer eram discutidas. A Maçonaria, animada pela discussão dos jornais contra o jesuitismo, fortalecia suas lojas, festejava o gesto de Pombal, um século antes, e atraía grande número de adeptos. Jornais e jornalistas tinham ligações com as lojas Regeneração, Restauração Pernambucana, Seis de Março, Segredo e Amor da Ordem, as que funcionavam legalmente no começo da década 70. Com os liberais, e entre eles Tobias Barreto, os maçons tratavam com interesse da questão da escravidão e em suas festas costumavam alforriar alguns escravos. O ambiente agitado do Recife não era ignorado por Tobias, que em seu refúgio de Escada, zona da mata sul de Pernambuco, com 120 engenhos de açúcar, de senhores conservadores e liberais, mas sempre senhores, continuava mergulhado na leitura dos autores alemães, como se verá em 1874, ao editar o seu primeiro jornal, Um Signal dos Tempos, trazendo à cena da cultura nomes como o de Strauss, por ocasião de sua morte, e de Eduard von Hartmann, cuja obra, em sua edição alemã, Filosofia do Inconsciente, é objeto de análise, três anos antes que apareça no Recife a edição francesa. É em Escada que Tobias Barreto aperfeiçoa o seu entendimento das diversas correntes transformadoras, que desde o Positivismo influem na mente dos jovens 25 insubmissos ao controle da Igreja. Os autores alemães , em número cada vez maior, ocupam Tobias. Não há como separar a crítica religiosa, a filosofia, o direito, a ciência política, da influência germânica. Charles Darwin, Ernest Haeckel, Rudolf von Jhering, Hermann Post, Eduard von Hartmann passam a exercer sobre o sergipano uma decisiva orientação, a partir da qual, em todos os campos em que atua, Tobias exporá o conjunto das novas idéias. Assim faz nos jornais escadenses, no Clube Popular, quando pronuncia “Um discurso em Mangas de Camisa”, em 1877, como deputado à Assembléia Provincial, e discute a questão da educação da mulher, quando publica a “Jurisprudência da Vida Diária”, em 1878, quando mantém correspondência com autores alemães e colabora com jornais germânicos editados no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Porto Alegre, ou em jornais da Alemanha, ou ainda quando concorre à cadeira de Lente da Faculdade de Direito do Recife. É evidente que a posição de Tobias Barreto gerara grandes incômodos. Em 1870, quando ainda engatinhava em seus estudos alemães, Tobias enfrentou ou católicos tradicionalistas do jornal O Católico, sob a chefia do Conselheiro Autran. Em 1875, ao publicar seu livro de estudos filosóficos, mede forças com Albino Meira, do Culto às Letras, e na Assembléia Provincial, como deputado e orador muito aplaudido, tem um projeto rejeitado, sob a justificativa de teorias antigas, atrasadas, que predominaram. (20) Mas, ao anotar o seu “Um Discurso em mangas de Camisa”, em 11 de 26 fevereiro de 1879, revela sua opção filosófica irrevogável: “não sou judeu para crer no Messias, nem tenho a ingenuidade dos primitivos cristãos para acreditar na parousia; mas sou filósofo em confiar nas leis da história, que regulam os destinos dos povos, e essas hão de também cumprir-se entre nós.” Tobias e o Direito Ao retornar ao Recife, carregando a dura experiência de uma convivência atribulada, onde não faltaram ameaças e agressões, como no cerco feito a sua casa, a caça de escravos que ele alforriara, por sua mulher, seu cunhado e outros herdeiros de João Félix dos Santos, Tobias era, já, o pensador maduro, com a cabeça fértil para desencadear o mais notável movimento intelectual do século XIX. Começa por escrever Algumas Idéias Sobre o Chamado Fundamento do Direito de Punir, em 1881, e Sobre uma Nova Intuição do Direito, 1881/1882. Neste último desabafa, numa nota de pé de página, anunciando trabalho inédito – Die akademischen Lehrkraefte an der juristischen Facultaet in Pernambuco: ein Beitrag zur Kunde des geistigen Lebens in Brasilien – irônico: “Assim Deus me ajude; não só o Deus da teologia, mas também o Deus da ciência econômica, a substância spinosística do mundo, na qual... vivimus, movemur et sumus.” O germanismo que abrira os olhos de Tobias para o futuro encantava os moços da Faculdade de Direito, pela voz do candidato a uma cadeira de professor de 27 Direito. O concurso de Tobias Barreto, em 1882, representa, na opinião unânime dos historiadores das idéias do século passado, uma ruptura formal com o atraso, com o domínio das velhas teorias mofadas nos compêndios, da lavra de professores que bebiam no Catolicismo tradicional as “verdades” imutáveis que transmitiam aos jovens acadêmicos nordestinos. Demolindo, com o fogo das novas idéias, a construção antiga da filosofia e do direito, Tobias Barreto causava grande impacto na sua geração e impunha uma derrota sem precedentes aos ultra- montanos que abanavam a fogueira velha da inquisição cultural. A partir daquele momento de reação, o Brasil, como viria mais tarde a dizer Graça Aranha,(21) uma das testemunhas arrebatadas pela palavra do mestre. A vitória das idéias novas, festejada nas ruas recifenses pelos moços da Faculdade, dava a Tobias Barreto a certeza de que havia conquistado a adesão dos estudantes, retirando-os da tutela intelectual a que estavam, historicamente, submetidos. A Escola do Recife – assim ficou conhecido o movimento emancipador da cultura brasileira, liderado por Tobias Barreto – produziu uma geração de abolicionistas, de republicanos, de democratas, de socialistas, de agnósticos e materialistas que, de volta aos seus Estados, seguiam com a demolição de todas as velhas estruturas. A reação não tardara. Ao pronunciar discurso de paraninfa de colação de grau, Tobias aprofundara sua visão do direito, dizendo: “É mister bater, bater cem 28 vezes, e cem vezes repetir: o direito não é um filho do céu, é simplesmente um fenômeno histórico, um produto cultural da humanidade.” Adiante, na mesma oração, diz: “Tal é a concepção que está de acordo com a intuição monística do mundo. Perante a consciência moderna, o direito é o modus vivendi, é a participação da antagonismo das forças sociais, da mesma forma que, perante o telescópio moderno, os sistemas planetários são tratados de paz entre as estrelas.” Na mesma ordem de idéias, afirma categoricamente: “... mas somos nós os primeiros a tratar de reformar-nos; somos os primeiros que devemos munir-nos de abnegação e de coragem, tanto quanto havemos mister de coragem e abnegação para despirmo-nos das nossas bocas, mofadas de teorias caducas, e tomarmos trajo novo. Releva dizer à ciência velha: retira-te; e à ciência nova: entra moça. Darwinista ou Haeckeliana, pouco nos importa, o que queremos é a verdade. As faculdades não são somente estabelecimentos de instrução, mas ainda e princi- palmente, como diz Henrique von Sybel, verdadeiros laboratórios, oficinas de ciência. É preciso também pensar por nossa conta. Eis aí tudo.” (22) O discurso propagou-se em todo o Nordeste e, ao ser publicado em O País, no Maranhão, mereceu severas restrições do órgão oficial religioso Civilização, le- vando a uma longa polêmica, que toma todo o segundosemestre de 1883. Mas, enquanto as críticas, os insultos, as mesmas e velhas cantilenas tradicionalistas, que repercutem no Recife e são transcritas no Diário de Pernambuco, visam a atacar Tobias, ele produz, mais e 29 mais, artigos de interpretação da literatura, da Bíblia, sem esquecer de fustigar aquele seu velho adversário, José Soriano de Souza, que parece estar escondido, ao anonimato, na produção e na divulgação das críticas. Tobias Barreto cresce na admiração e no respeito dos seus alunos, que incorporados assinam nota de repúdio contra o médico Antônio de Siqueira Carneiro da Cunha, que usava o pseudônimo de Hunger par atacar o autor do instigante discurso. Em 1884, refeito da ruidosa polêmica e animado pela boa repercussão que obtivera o seu livro Estudos Alemães, publica Menores e Loucos, onde revela a face, também inovadora, do criminalista. E lá, com todas as letras, define-se: “Não faço mistério da minha fé filosófica: eu sou um materialista, no bom sentido da palavra. Não me insurjo nem mesmo contra a tentativa de fazer-se da chamada Ciência da alma um com- partimento da meteorologia. ‘O homem é o que ele come’, disse o autor de Kraft um Stoff, e não hesito em glosar: o homem é todo feito a imagem e semelhança, não de Deus, porém da natureza, isto é, do céu que ele contempla, do ar que respira, da terra em que pisa, do leito em que dorme, e até das flores que colhe, se não até dos lábios que beija.” (23) Tobias Diante da Morte Doente, recolhido por longo período ao leito, com saídas esporádicas, e sofrendo as mesquinhas perse- guições do meio, Tobias Barreto produzia, mais e mais, 30 com suas leituras, uma vasta contribuição ao direito à filosofia, aos estudos literários, à ciência política, e ainda aceitava encomendas de trabalhos especiais, como a apresentação e notas da Gramática de Castro Nunes, (24) em 1883, saudada efusivamente pela crítica, e Gramática Latina do mesmo padre Féliz, do Concurso de 1865, que fez prólogo e notas, em 1889. (25) Nos últimos meses de vida tentou uma viagem à Europa, ajudado por subscrições de estudantes, alguns amigos da colônia alemã, alguma pessoas da Província de Alagoas. Embarca com um dos seus filhos no piquete Alagoas, com destino inicial ao Rio de Janeiro, no dia 18 de março de 1889. No dia seguinte, como piorara, nem podia ler e nem escrever. Assim, alternando ligeiras melhoras, com pioras cada vez mais irreversíveis, Tobias Barreto morreu na noite de 26 de junho. A sua morte comoveu o Recife e enlutou o Nordeste todo. Estava em silêncio aquele que dera ao Brasil o direito de pensar por si, e de buscar construir um futuro para o seu povo. A morte era o final triste de uma vida criadora. Sentida por muitos, mas esperada e até mesmo antecipada, nos jornais, por outros, que não tendo como refutar as idéias queriam a liquidação física do mestre. Esses mesmos, tomados de estranha atitude, espalham pelas ruas e pelos jornais a reconciliação de Tobias, no leito de morte, com a Igreja. Falam em confissão, e até mesmo um padre – João Vaessen – lazarista do Convento das Missões, em Fortaleza, Ceará, dissera anos mais tarde que “confessou e ministrou a comunhão a Tobias Barreto.” Em julho de 31 1939, quando do Cinqüentenário da Morte de Tobias, seu filho João Barreto de Menezes foi a Fortaleza e colheu do velho padre a informação de que houvera engano de nomes no caso da confissão de Tobias Barreto, difundida pelos jornais brasileiros. O padre esclarecera, em entrevista à Agência Meridional, que chegara ao Brasil, procedente da Holanda, em 1897, oito anos após a morte de Tobias. É o próprio padre quem diz: “faço a questão de restabelecer a verdade. Em 1897, eu ainda era clérigo, não podendo confessar.” Dele fica, para a história, a coerência de uma vida de lutas, na síntese que o Diário de Pernambuco, em 1939, traçou-lhe: “Entretanto, esse homem de poderosa personalidade encheu uma época e quase foi todo o seu tempo. Há Faculdade de Direito, pode-se dizer que o vulto enorme desse mestiço de talento tomava a casa toda. Tobias era a academia. A sua ânsia de renovação e de reforma dos estudos de Direito, a sua veia poética e o s4eu gênio oratório, tudo fazia dele um homem diferente dos outros. No Recife, transcorreu a parte mais brilhante dessa existência romântica e inquieta. Tobias foi um precursor e daqui fez jorrar pelo País inteiro um pensamento novo. Esse é, aliás, o destino heróico do Recife: aqui brotou a primeira idéia da República, aqui se venceu a batalha da Abolição, aqui se reformou a ciência do Direito, aqui se deu ao Brasil o que ele nunca possuiu: a crítica filosófica. A glória de Tobias é também a glória do Recife.” (26) 32 O Legado de Tobias A geração de seguidores de Tobias Barreto her - dou a mesma força de luta e esteve na vanguarda das grandes transformações das últimas décadas e da virado de século. Em seus estudos fundaram jornais, revistas, associações, faculdades, assumiram posturas críticas, públicas, como germanistas, agnósticos, anticlericais e, em muitos casos, amargaram a reação desmedida da Igreja. O alemão Carl von Koseritz, divulgador de textos em alemão de Tobias Barreto, em sua Koseritz Deutsche Zeitung, em Porto Alegre, havia sido excomungado pelo bispo do Rio Grande do Sul, pela publicação do livro Roma Perante o Século. Almáchio Dizin, na Bahia, sofrera igual sanção, por causa de uma obra literária. Fausto Cardoso, um dos diletos discípulos de Tobias, enfrentou, até com o sacrifício da vida, a oligarquia do padre Olímpio Campos, escudada em figuras originárias da Faculdade de Direito do Recife, co mo Coelho e Campos e Pelino Nobre, formados na escola do dr. Braz Florentino – o Ensaio Filosófico Pernambuca. (27) Está ainda por ser feito um inventário completo da seqüência de fatos culturais, a partir da geração da Escola do Recife. Nelson Saldanham (28) Dagoberto Carvalho Júnior, (29) Aluízio Bezerra Coutinho (30) e Antônio Paim (31) trataram, em suas obras, da influência da Tobias Barreto sobre a geração que depois dele ocupou as cátedras, redigiu os compêndios e os programas das Faculdades, assumiu cargos públicos, editou jornais e revistas, levando o Brasil a sedimentar 33 as suas referências e a fazer a interface com a história dos outros povos. Os seguidores de Tobias Barreto (32) herdaram a razão científica, como troféu da afirmação vitoriosa contra a espada afiada da fé, na luta mais que simbólica pela cultura, em seu múltiplo e infinito poder de transformar a natureza, em função da vida, do bem e do belo. NOTAS (1) História do Povo de Israel, Ein leitung in die Geschichte des Volkes Israels, por Heir inch Ewald, 8 volumes, 1864. (2) Tobias Barreto deve ter assistido ao Discurso proferido pelo padre Fr. Antônio da Virgem Maria Itaparica, por ocasião da abertura da aula de Filosofia do Seminário da Bahia, em março de 1861. Nele o padre exorta os alunos com versos de “um Sapientíssimo e Santo Bispo: Quem não louva Deus, é um ingrato./Quem se opõe a que o louvem é realmente um monstro.” Em Diário da Bahia, 27 de março de 1861. (3) O padre Félix havia perdido, em 1863, concurso para a mesma cadeira de Latim, quando saiu vencedor Joaquim José Henrique da Silva. (4) Verso do poema “À vista do Recife”, de 1862, o primeiro dos grandes poemas patrióticos de Tobias Barreto, publicado em Dias e Noites, edição de 1881 e seguintes.(5) Carta de 13 de setembro de 1880. (6) Memória Histórica Acadêmica, 1857, pelo professor José Antônio de Figueiredo. 34 (7) Memória Histórica Acadêmica, 1861, pelo professor João Capistrano Bandeira de Melo Filho, Recife, 1862. (8) Memória Histórica Acadêmica, 1863, pelo professor Antônio Vasconcelos Menezes de Drummond. Recife, 1864. (9) O nome do padre Joaquim Graciano de Araújo é também grafado, por alguns autores, como Joaquim Graciano de Araújo. (10) Ver Ensino, Jornalismo e Missões Jesuíticas em Pernambuco, por padre Ferdinand Azevedo, FASA, Recife, 1983. (11) Revista Mensal de Instrução Pública de Pernambuco. Recife, 1872. (12) Trata-se da Declaração do Autor, no livro Lições de Filosofia Elementar, Racional e Moral. Paris, 1871. (13) Sobre o livro de Soriano, Tobias escreveu três artigos, sob o título de “O Atraso da Filosofia entre Nós”, publicados no Jornal do Recife, nos dias 20 de julho, 3 de setembro e 18 de novembro de 1872. (14) Francisco Muniz Barreto de Aragão, parente de Tobias, era diplomado em Direito e em Filosofia pela Universidade de Heidelberg, e foi grande propagandista da cultura alemã, através dos jornais O Monitor, Diário da Bahia, Gazeta da Bahia, Diário de Notícias e Jornal de Notícias, com artigos sobre filosofia, crítica, política, finanças, economia política e literatura, além de publicar Das Verfassungs – Wesen in Brasilien. Francisco Muniz Barreto de Aragão era pai do poeta Egas Muniz, o Petion de Vilar, professor de alemão do Ginásio da Bahia, redator da Revista do Grêmio Literário e considerado por Arno Philipp, redator-chefe da Deutsche Zeitung, como “o único escritor brasileiro que hoje (1903) estuda com perseverança e entusiasmo o germanismo e continua a obra de Tobias Barreto.” (15) Este artigo foi publicado em 1869 e é dos mais antigos trabalhos de Tobias Barreto. Por muito tempo figurou nas edições de Tobias como de 1871. 35 (16) A Faculdade de Direito do Recife está reunindo, em estantes separadas, as obras de autores alemães que pertenceram à biblioteca pessoal de Tobias Barreto. São mais de 200 volumes, muitos dos quais foram citados por Vamireh Chacon em Da Escola do Recife ao Código Civil. Organização Simões, Rio de Janeiro, 1969, e em artigo do mesmo autor, na Revista Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife, LXVII, 1971. (17) Os Homens e os Princípios. 1870. (18) Política Brasileira, artigos de fundo, 1870. (19) O Católico, 20 de agosto de 1870. (20) Trata-se do projeto nº 129, criando o Partenogógio do Recife, escola superior, profissionalizante, para moças. Em 1880, quando já não era deputado, o seu projeto mereceu defesa do Barão de Nazaré, que enfrentou a reação do médico Ermírio Coutinho, no seu projeto Tobias abria alternativa para, enquanto não houvesse prédio próprio, a escola – também chamada de Liceu para moças – funcionasse no Ginásio Pernambucano. O dr. Ermínio Coutinho considerara que esta idéia concorria para a promiscuidade, alegando condicionamentos climáticos que, no seu entender, fomentavam as paixões. Apesar da defesa do Barão de Nazaré, o projeto foi esmagado pela reação e terminou arquivado na Comissão de Instrução Pública. (21) O Meu Próprio Romance, por Graça Aranha, 1931. Também em Obras Completas, INL, Rio de Janeiro, 1969. (22) Discurso proferido na cerimônia de colação de grau de doutor em direito. 10p., Recife, 1883. Incluído, sob o título de Idéia do Direito, no volume Estudos de Direito-1, das Obras Completas – Edição Comemorativa. O termo Monismo, explicitado por Tobias no discurso, não foi convenientemente compreendido. Mais do que a sua força – como sinônimo de materialismo científico, que impor6ta sublinhar para realçar a posição progressista de Tobias Barreto e dos integrantes da Escola do Recife que adotaram o Monismo, discutiu-se as diversas correntes 36 monistas, e seus líderes, como principalmente Ernest Haeckel e Ludwig Noiré, sublimando a essência doutrinária do conteúdo do termo. O Monismo não era um eufemismo vazio, mas uma afirmação categórica dos que escapando das rédeas do controle clerical abraçavam o materialismo científico, como o fez, com clareza, Tobias, seguido por Fausto Cardoso. A concepção materialista explica, de algum modo, o fato de o fundador da Escola do Recife ter passado ao largo das discussões sobre a Bíublia, de fundo protestante, e sobre a Questão Religiosa, de fundo maçônico. (23) Menores e Loucos em Direito Criminal; estudo sobre o artigo 10 do Código Criminal Brasileiro, Rio de Janeiro, Laermmert, 1884. (24) Compêndio Elementar de Gramática Nacional, por J. A. de Castro Nunes. Livraria Francesa, I. W. Medeiros, Pernambuco, 1883. Nova edição reformada e muito melhorada pelo dr. Tobias Barreto de Menezes. (25) Resumo de Gramática Latina ou arte explicatória das regras indispensáveis nos estudantes de latim, pelo padre Félix Barreto de Vasconcelos (obra póstuma), com um prólogo e notas do dr. Tobias Barreto de Menezes, Livraria Francesa, Recife, 1889. (26) Diário de Pernambuco, 8 de junho de 1939. (27) O Ensaio Filosófico Pernambucano era, ao mesmo tempo, nome de uma sociedade e de um periódico, científico e literário, que no nº 6, de julho de 1860, publica artigo de Seve Navarro, A Fé e a Razão, que começa dizendo: “Renegando o homem a fé para integrar-se livre, absoluta, e exclusivamente a sua razão e reflexão privada, jamais poderá chegar à verdade duma maneira fácil, infalível e sem mancha de erro; portanto ele tem necessidade para assenhorear-se da verdade, esta luz medianeira entre o espírito e a coisa, de abraçar a fé naquilo que lhe for superior, e que a sua vista não puder atingir, a fim de que coligando-se à crença e prestando- lhe um assentimento forte, inabalável e consciencioso, possa aportar são e salvo ao porto da verdade.” 37 (28) A Escola do Recife, Nelson Saldanha, 2ª edição, Editora Convívio/INL/Fundação Pró-Memória, 1985. (29) A Escola do Recife, Reflexos no Piauí, Dagoberto Carvalho Jr., Revista Presença, Ano IV, nº 9, outubro/dezembro, 1983. (30) A Filosofia das Ciências Naturais na Escola do Recife, por Aluízio Bezerra Coutinho. Editora Universitária da UFPE, Recife, 1988. (31) A Filosofia da Escola do Recife, Antônio Paim, Editora Convívio, São Paulo, 1981. (32) Tobias Barreto e seus Seguidores, Luiz Antônio Barreto, série de 9 artigos, publicados na Gazeta de Sergipe, de 4 a 22 de março de 1989. Vide, também, Nova Missão Tobiática no Recife, Por Luiz Antônio Barreto, série de 13 artigos. Gazeta de Sergipe. 38 NOTAS COMPLEMENTARES ÀS POLÊMICAS SOBRE RELIGIÃO POLÊMICA COM O CATÓLICO Tobias Barreto participava, a partir de 1868, da agitação em torno de temas religiosos. Cria e participa de redação de diversos jornais, como A Regeneração, O Vesúvio, Correio Pernambucano, Jornal do Recife, O Liberal, A Crença, que juntamente com A Consciência Livre, jornal que antecedeu a O Americano, abre uma verdadeira campanha contra a Igreja católica. Alguns assuntos dominam as sessões literárias, as colaborações, as publicações solicitadas. Possivelmente a chegada dos jesuítas “como operários da educação da mocidade”, a partir de 1866, dava nova conformação às discussões religiosas. Mas é a partir de 1869, com o grande debate em torno da negativa do bispo Cardozo Ayres de conceder sepultura ao general Abreu e Lima, que as opiniõesse dividem e os debates se tornam apaixonados. A autoridade eclesiástica resolveu punir Abreu e Lima que, também pela imprensa, havia mantido uma polêmica com alguns padres, entre eles o monsenhor Pinto de Campos, sobre as Bíblias falsas, negando-lhe sepultura no Cemitério de Santo Amaro. Os ingleses permitiram o sepultamento no cemitério que tinham no Recife, mas a questão mereceu longa discussão pelo Jornal do Recife. Em 1870, repercute no Recife a 39 notícia de que os gabinetes europeus, entre os quais figuravam os da França, Itália, Inglaterra, Rússia e Espanha, fizeram chegar ao Vaticano uma nota declarando ao Santo Padre que o dogma da infalibilidade papal não seria admitido e que deixava com Pio IX toda a responsabilidade pelo que produziria a promulgação do novo dogma. A Igreja, reunida em Concílio, aprovou, na terceira sessão, em 24 de abril de 1870, pela vontade unânime de 667 padres, a Constituição dogmática da fide catolica. Aparece no Jornal do Recife, assinando artigos intitulados “Resumo Histórico do Desenvolvimento da Supremacia dos Papas”, para servir de introdução ao estudo da questão da sua infalibilidade, ao lado de “O Jesuitismo En tre Nós”, do mesmo jornal. O Americano, com os artigos de crítica religiosa de Tobias Barreto, participa desse momento de agitação, que bem pode ser testemunhado pela carta enviada a Tobias por Antônio dos Santos Pontual, datada do Engenho Cabeça de Negro, Escada, de 11 de agosto, que entre outras coisas diz: “Apesar de minha pouca capacidade para apreciar o estilo útil de que usa o dito jornal, e que muito nos convém, para algum dia sairmos deste estado de jesuitismo que nos acabrunha, com tudo declaro que é o jornal de que mais tenho gostado.” Logo o jornal O Católico não tinha apenas O Americano, e nem somente Tobias Barreto, para se preocupar. O Conselheiro Autran, Diretor do Jornal, mantinha uma seção – “Crônica dos Disparates” – na qual refutava as críticas dos diversos jornais. E mais uma vez se valeu desse espaço para combater as 40 idéias de Tobias Barreto. Os textos que vão aqui reproduzidos seguem a cronologia e a ordem com que apareceram nos jornais, para melhor proveito dos leitores. As notas de O Católico começam em 28 de agosto de 1870. Sobre um Escrito de A. Herculano A publicação deste ensaio no Liberal, a partir de 3 de julho de 1873, gerou uma ligeira polêmica de Tobias com Franklin Távora, que, assinando Lessingh, no Diário de Pernambuco, investe contra o germanismo do sergipano, em artigo de 19 de julho, recebendo respostas em 27 de julho, pelas páginas de O Liberal: Tobias ao dito Lessing do Diário de 19 do corrente. Mais tarde, em 1879, o ensaio merece de Artur Leal, no seu Impressões Acadêmicas – ensaios Críticos (Tipo- grafia do Correio da Noite, Recife, 1879) o seguinte comentário, à página 20: “O distinto alemão Tobias Barreto, envenenado pelo fel do seu pessimismo, qual D. Quixote de lança em riste, arremete contra Portugal, apedreja sua literatura, corre os seus literatos, e por último põe fogo no feudal castelo de um Alexandre Herculano.” É desta mesma época, da publicação do ensaio, 1873, que datam os primeiros comentários críticos contra o germanismo de Tobias. No Culto às Letras Albino Meira faz crítica, recebendo forte reprimenda de Sílvio Romero, através de O Liberal, ainda quando assinava Sílvio da Silveira Ramos. Sílvio, conterrâneo e discípulo, além de enaltecer Tobias aponta 41 as ligações do sergipano com os cultores do direito, da filosofia, da crítica religiosa, aí aparecendo o autor da História do Povo de Israel. Sobre David Strauss (Um Fragmento Biográfico) Artigo de maio de 1874, incluído no livro Ensaios e Estudos de Filosofia e Crítica, edição de 1875. O primeiro livro de Tobias Barreto sofreu pesada crítica de Albino Meira, escondido sob o pseudônimo de O Carvoeiro, na revista acadêmica Culto às Letras. Apesar de tratar apenas de um dos artigos do livro – “Socialismo em Literatura” – o crítico investe contra Tobias, perguntando “com que direito um tribunal composto de materialistas julgaria um autor espi- ritualista?” Não, em sua resposta, insinua que Albino Meira estava a serviço de um “dr. filósofo que me odeia”, possivelmente referindo a José Soriano de Souza. Convém anotar que Albino Meira, à época, era presidente da União da Mocidade Católica e redator do jornal O Estudante Católico. Logo, havia razão ideológica para as críticas, pelo Culto às Letras, respondidas por Tobias em A Província, de 24 e 29 de agosto de 1875. Em compensação, Strauss, que por muito foi lido e seguido por protestantes, terminou redescoberto pelos católicos, especialmente depois da Encíclica Divino Afflante Spiritu, de 1943, de Pio XII. E Tobias Barreto, que fez a síntese biográfica do autor de A Vida de Jesus, que teve tradução francesa do 42 positivista Littré, no ano de sua morte, está sendo lembrado no prefácio do padre José Nogueira Machado ao livro Cristo Nasceu em Belém, do padre Victor Notter, que vive em Taiwan, na China, justamente pela compreensão que teve e pela divulgação que fez de Strauss. Polêmica com a Civilização O discurso pronunciado por Tobias Barreto, numa colação de grau, em abril de 1883, levou a que o jornal religioso A Civilização, editado em São Luiz, Maranhão, levantasse um escudo de proteção e de defesa do Catolicismo e de tudo o que dele decorria em termos de controle da informação, da educação e da cultura. O discurso de Tobias abrira mais uma clareira entre os jovens nordestinos que estudavam no Recife e obteve, de imediato, grande repercussão, sendo publicado em jornais e avulso. No Maranhão coube ao jornal O País, dirigido por Temístocles Aranha, pai de Graça Aranha, então aluno de Tobias, divulgar o discurso no Maranhão, merecendo pronta resposta da Civilização. Três pessoas – o padre Raimundo Alves da Fonseca, o monsenhor João Tolentino Guedelha Mourão e o poeta Euclides Farias – comandaram a reação a Tobias, produzindo textos que variaram da defesa de princípios até a ofensa pessoal, eivada de preconceito racial, como está na série de Cartas ao Pai Tobias, em versos por Euclides Farias, sob o pseudônimo de Lourenço Gomes Furtado. Os artigos da Civilização, que começaram a 43 sair em 7 de julho de 1883, foram reproduzidos no Diário de Pernambuco, palco da polêmica, a part ir de 3 de agosto. Antes, em 28 de julho, alguém, que poderia ser o próprio Tobias, sob o pseudônimo de Baur, desagrava o fundador da Escola do Recife, com um longo artigo intitulado O dr. Tobias Barreto de Menezes e a Civilização do Maranhão. No dia 8 de agosto, Tobias comparece ao Diário de Pernambuco com o artigo “Os Teólogos da Civilização”, e leva, até final de outubro, a polêmica com a Civilização e com adeptos pernambucanos, como Antônio de Siqueira Carneiro da Cunha, que se assinava Hunger, produzindo, para resposta direta e indireta, os seguintes termos, publicados no Diário de Pernambuco, na seguinte ordem: “Os Teólogos da Civilização” (8.8), “Teoria do Peruísmo ou Filosofia do Peru” (11.8), “Ao Sacerdos Pernambucensis” (14.8), “Ainda os Sacerdos Pernambucensis” (17.8), “O Doutor Hipnótico” (17.8), “O Almocreve Padre Joaquim de Albuquerque” (7.9), “Uma Nova Contribuição à Filosofia do Peru” (8.9), “Um Esclarecimento” (11.9), “Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã”-I (12.9), “Ensaio de Pré- história de Literatura Clássica Alemã” -II(15.9), “Ainda o Padre do Maranhão” (18.9), “Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã”-III (21.9), “Os Decotes da Bíblia” (23.9), “Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã”-IV (27.9), “Declaração” (2.10), “Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã” -V (4.10), “Que Padre Danado” (5.10), “Ensaio de Pré - história de Literatura Clássica Alemã” -VI (7.10), 44 “Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã” - VII (9.10), “Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã”-VII (10.10), “Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã”-IX final (11.10), “É Mentira” (13.10), “Um Capítulo da História da Renascença-Leão X” (13.10), “Um Capítulo da História da Renascença-Leão X”-II (14.10), “Uma Pequena Excursão no Domínio da Teologia” (16.10), “Um Quadro da Igreja Romana – Vitória Accoramboni”-I (21.10), “Um Quadro da Igreja Romana – Vitória Accoramboni”-II (23.10). Para tornar mais com- preensível o embate intelectual travado por Tobias Barreto contra os padres e agregados do jornal Civilização é que se reúne os textos, publicando -os pela ordem de saída no Diário de Pernambuco. Não apenas os textos de Tobias, mas também os textos dos seus opositores, republicados no mesmo Diário. 45 TOBIAS BARRETO E A CRÍTICA 46 Toda a obra de Tobias Barreto é de crítica, ainda quando, ao modo de Kant, formula teorias, indica caminhos, questiona roteiros estéticos, ou valores éticos, ou ainda compromissos ideológicos. O manejo da crítica em toda a obra tobiática equivale ao efeito caleidoscópico da sua coerência como um bom juiz de valores, um perspicaz observador diante das expe - riências, com capacidade para distinguir uma das outras, e um experimentador ousado, atributos que combinam com a idéia das qualificações do crítico, segundo J. A. Richards. (1) Na poesia, entendendo-a como a “expressão das lutas da alma humana”, o autor de Dias e Noites agitou as massas nordestinas no Recife, fazendo -se poeta do povo. A sua obra poética está repleta de profecias, de denúncias e de crítica. Nos jornais, anos mais tarde, é crítico de religião, tomando partido no Iluminismo alemão – o Aufklarung – que produzira dois eminentes vultos que passam a freqüentar os escritos de Tobias nos jornais pernambucanos: Immanuel Kant e Gotthold Lessing, pondo em evidência o poder da razão humana. Tão forte e entranhada é a sua crítica que a série de artigos Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã pode ser enquadrada nos limites da apreciação literária, ou como exegese que faz aflorar questões religiosas. (2) Da crítica de religião à filosofia, e desta ao direito, e deste à organização da sociedade, cresce o intérprete do seu tempo, buscando a estatura do seu século. 47 Não deve causar surpresa, portanto, que em sua maioria os escritos de Tobias Barreto sejam de crítica. Sejam recensões, no sentido típico da palavra, anunciando a obra ou o espetáculo, discutindo o assunto e fazendo a apreciação dos seus méritos e defeitos. Sejam as animadversões, com suas censuras. Sejam ainda, como ele próprio o diz, “quase sempre um trabalho, não por assim dizer de fisiologia, mas de anatomia literária”, (3) considerando a crítica como um estudo de cadáveres. Este tom de sarcasmo, comum em Tobias, remete ao fato comum de que a crítica, na literatura brasileira, tem uma função post-mortem. O trabalho do crítico se confunde, então, com o de um arqueólogo, em permanente investigação do passado. Não raro, a crítica literária tem sido produzida a posteriori, já na distância do tempo entre a obra e o público. Por outro lado, há uma crítica geralmente feita pelos próprios criadores, abrindo caminho à compre- ensão das obras literárias. Assim foi com o Modernismo de 1922, com a Geração de 45, com o Concretismo, de 1956, e com o Poema-Processo, em 1965. A crítica revelou-se desaparelhada para compreender o sentido renovador da estética nova dos modernistas, dos concretistas e de outros grupos da vanguarda literária do País. O Brasil guarda os textos históricos, manifestos e ensaios, produzidos pelos poetas, e ao mesmo tempo críticos, dos movimentos, muitos dos quais se tornaram também intérpretes da vida literária do País, como os Mário de Andrade, Augusto e Haroldo de Campos, Décio Pignatari, Wladimir Dias Pino. 48 Tobias Barreto foi um crítico do seu tempo, como tinha sido um poeta engajado nas lutas da sua fase estudantil. Combateu o ars gratia artis que animava a muitos escritores do século, e estabeleceu uma longa discussão entre o romantismo, de França e Portugal, e o germanismo. Esse debate, presente em toda a obra crítica do pensador sergipano, é a chave da melhor compreensão das posições assumidas pelo fundador e pelos integrantes da Escola do Recife, uma espécie mesmo de marca registrada, que se constituiu na mais renovadora contribuição ao pensamento brasileiro, na segunda metade do século passado e que levou Graça Aranha, um dos modernistas, a declarar que Tobias emancipou, intelectualmente, o Brasil. (4) Não ficou assunto, ainda que fosse árido, que não merecesse uma abordagem crítica por parte de Tobias Barreto, nos jornais recifenses, nos seus pequenos periódicos de Escada, ou nas preleções e discursos, transformados em veículos de vulgarização cultura. Até mesmo sua passagem pela Assembléia Provincial, como deputado liberal, serviu para informar aos seus pares das suas leituras científicas sobre a mulher. O poder crítico de Tobias é algo que ainda falta ser dimensionado, porque a leitura de sua obra sempre revela ângulos novos, informações e contribuições singulares, apre - ciações originais, que dão grandeza ao ofício jor- nalístico do trato recensor. É possível, então, levantar-se o itinerário do pensamento brasileiro, na segunda metade do século assado, a partir da obra de Tobias Barreto. Não apenas 49 naquilo que ele operou de transformação, a par tir dos seus contatos com autores alemães e com a própria língua de Kant, mas também na fixação das idéias dominantes, dentro e fora da velha Faculdade de Direito do Recife, que foram objeto da crítica tobiática. Mais importante se torna esse inventário intelectual, quando se sabe, com certeza, que a discussão ditou dois corpos distintos em peleja: o dos professores, intelectuais de formação religiosa, tradicionalistas, ultramontanos, de um lado, e a mocidade, formada por estudantes, jornalistas, maçons, liberais, do outro. Tobias é a grande figura que desfralda aos ventos nordestinos do Recife a bandeira dos novos tempos, com a essência das novas idéias, que espalharam rápido as teorias européias, principalmente alemãs, da ciência, em oposição aos dogmas e compromissos da fé. Como escritor e como crítico Tobias fundava suas convicções no avanço da ciência e da arte, como asas do espírito humano. Circunscrevendo o seu entendimento, a filosofia prima entre as ciências e a poesia entre as artes. Daí sua crença de que os poetas e os sábios devem ser iguais. No âmbito menor da discussão, Tobias chega a afirmar que os padres são, em geral, inimigos da poesia, porque eles gostam do culto da morte, enquanto a poesia é liberdade e liberdade é vida. Na projeção maior, ideológica, Tobias Barreto chega a citar, em 1872, diversos exemplos das mudanças sociais e po - lít icas da Europa, graças ao poder dos romances que propagaram, por exemplo, as idéiasanarquistas. Na esteira da mesma discussão, lembra que a França 50 moderna possuía um idioma compacto, resultado da autoridade e da concentração literária, ao lado da autoridade e da concentração política, que dificultava a expressão intelectual, de criação, para ele comum na Alemanha, onde o “ato de escrever é sempre, mais ou menos, um ato criador.” Em 1875, passando uma vista ampla e demolidora por sobre a vida intelectual brasileira, pugna por uma “Internacional de Crítica”, citando, pela primeira vez, Karl Marx. (5) Seu trabalho mereceu forte reação por parte de Albino Meira, na revista Culto às Letras. Tobias Barreto reduziu a reação de Albino Meira a duas ou três páginas de resposta, mas acompanhou com todo o interesse a polêmica entre Sílvio Romero, que então se assinava Sílvio da Silveira Ramos, e o redator do Culto às Letras. Essa não fora a única fonte das discórdias de Tobias Barreto no mundo cultural pernambucano. Suas críticas a Alexandre Herculano e a outros autores portugueses, aos tomistas e neotomistas, tiveram o mesmo efeito provocador que os seus estudos alemães, publicados a partir de 1874 no jornal escadense Um Signal dos Tempos. Para Tobias a “Internacional de Crítica” deveria ser uma espécie de fórum, de espíritos cultos e independentes, ao qual seriam submetidas “todas as obras frívolas, que têm firmado a reputação de certos vultos em Portugal e Brasil.” Para ele, os escritos que fossem publicados deviam ser enviados para análise imparcial dos homens competentes, onde receberiam o placet ou o não presta. Arremata Tobias: “Destarte, à 51 face do mundo inteiro, e sem abalos de ordem alguma, poríamos fogo no castelo feudal de um Alexandre Herculano; deitaríamos por terra a vila senhoril de um José de Alencar, e tantos outros enfatuados de uma nomeada toda local...” (6) Com a crítica e pela crítica Tobias Barreto marcou sua presença na luta intelectual que travou em Pernambuco, de 1862 a 1889, deixando em todos os seus escritos o traço inquieto do investigador, do intérprete, do pensador, revelando e abrindo caminhos ao futuro. A Licenciatura Para Tobias, literatura tinha a significação de vida espiritual. Contrariando os conceitos vigentes, que limitavam a literatura ao poema e ao romance, ele aprofunda a questão, ainda em 1872, numa nota de crítica ao livro do dr. José Soriano de Souza. (7) Sendo, como Tobias assim a entendia, a literatura uma estatística aprofundada de todas as produções inte- lectuais de um País, em uma época dada, são incorporadas, com suas valorações próprias, a ciência, a filosofia, a poesia, o teatro, o romance, e até a pintura e a música. Diz Tobias: “Assim se compreende na Alemanha, onde os livros ou tratados de literatura nos dão a conhecer não só Goethe e Schiller, como Kant e Hegel, não só Freytag e Stiffer, como Strauss e Baur, não só Beethoven e Mozart, como Cornelius (pintor), etc., etc.” (8) 52 A vastidão do quadro literário, segundo a aprendizagem alemã de Tobias Barreto, explica seus vôos de longo alcance sobre obras e autores que trataram de Religião, como Ewald, de Filosofia, como Kant, de Educação, como Frederico Diesterweg, de Cultura, como Júlio Froebel, de Psicologia, como Eduardo von Hartmann, de Economia Política, como Karl Marx, de Antropologia, como Hermann Post, de Direito, como Rudolf Von Jhering, de Psicologia Feminina, como Adolfo Jellinck, e de tantos e tantos outros temas que interessaram e moveram a sua curiosidade crítica. Está, portanto, decodificado o facho luminoso que Tobias lançou sobre o seu tempo e seus contemporâneos: o amplo espectro da sua crítica, correspondente ao corpus cultural objeto do seu interesse. Vocacionado para a crítica, menospreza o livro de Ferdinand Wolf (9) e não poupa, sequer, seu amigo, conterrâneo, e parceiro Sílvio Romero, quando publica a História da Literatura Brasileira. (10) A obra de crítica literária de Tobias supera, em muito, as informações e inventários de época, ainda que alguns, como o próprio livro de Sílvio Romero, preencham lacunas na bibliografia brasileira. Não causa espécie, por isso mesmo, que os críticos brasileiros e portugueses, lançando os olhos sobre a literatura, isolem Tobias, negando-lhe as qualidades de escritor e de filósofo. O Brasil Mental, de Bruno, (11) é um exemplo que proliferou, lá e cá, como uma posição sobre o mulato sergipano. Ainda que tenha testemunhado, apaixo - 53 nadamente, sobre a genialidade de Tobias, Sílvio Romero faz menor a poética condoreira, divide a primazia do germanismo, e assume posturas de outras escolas, contradizendo a evolução intelectual do mestre. Mais que isto, Sílvio faz de Tobias, não raro, um escudo, com o qual enfrenta as rivalidades fluminenses. Assim, torna-se comum ao historiador da literatura, ao apresentar Tobias Barreto aos leitores, diminuir o valor de outros poetas e escritores, criando dificuldades para o seu apresentado. Isto é visível na apreciação feita pelo poeta Luiz Delfino do livro Dias e Noites, em sua primeira edição, de 1881. No longo artigo o poeta se ocupa de rebater as afirmações de Sílvio Romero, terminando por julgar, de forma apressada, a obra em versos de Tobias que deveria ser o objeto da crítica. Sílvio Romero chega ao cúmulo de inserir, nos textos de Tobias, citações de nomes de forma desfavorável, como ocorreu num dos artigos do ensaio O Atraso da Filosofia entre Nós. (12) Tanto a amplitude dada à literatura, em sua crítica, por Tobias Barreto, quanto sua disposição de brigar pelas verdades que defendia, e mais a atitude partidária de Sílvio Romero, devem ter concorrido para que a obra do mestre não merecesse, no inventário da história e da crítica literária, o juízo justo, o exame correto. Fala-se mais de Tobias por ouvir dizer, do que mesmo pelo conhecimento de seus textos, todos eles de reflexão, por circunstanciais que possam parecer. Pois essa é uma característica permanente na obra de Tobias: a reflexão. 54 Conceituando de forma larga e refletindo sobre suas leituras, Tobias construiu um monumento de crítica, valendo-se da ferramenta contundente que, de cedo, preferiu para o trabalho intelectual: o ger - manismo. Com ele, penetra seu olhar agudo por sobre várias literaturas, comparando-as, identificando raízes e arquétipos, formas e compromissos. É pioneiro em estudos comparados, acreditando que “segundo o plano da história, que muitos chamariam de a economia providencial do universo, todo o povo que progride e se desenvolve tem uma dupla missão: ima interna e outra externa; uma volvida para si mesmo e outra para os demais povos.” (13) Daí a literatura ter, no seu entender, caráter universalizante. Apoiado em George Brandes, aprecia, comparativamente, as literaturas da França, da Itália e da Alemanha, tendo esta última como uma espécie de modelo. Será a primeira vez, no Brasil, que os estudos literários ganham um método, o comparativo. Com ele Tobias sente firmeza para explorar, com seu agudo espírito crítico, todo o campo intelectual. Citando Henrique Klenke, para quem os povo s são divididos em três grupos – os solares, os planetários, e os de transição – Tobias Barreto não hesita em colocar o Brasil na terceira categoria, a da transição, diferenciando os brasileiros dos povos planetários, os do lado noturno da humanidade, e dos solares, os do lado “diurno”. A transição é o lado “crepuscular” da humanidade, valendo para os povos
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