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Tobias Barreto - Luiz Antônio Barreto

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1 
 
LUIZ ANTÔNIO BARRETO 
 
 
 
 
 
 
 
 
TOBIAS BARRETO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SOCIEDADE EDITORIAL DE SERGIPE 
1994 
 2 
 
Este livro, com defeitos de repetições, por se 
tratar de reunião de ensaios e artigos diversos, foi 
motivado pela efeméride de 1989, e pela edição das 
Obras Completas de Tobias Barreto, a partir de 1990. 
Não deixa de ser, então, uma homenagem, um elogio 
distante, que repõe à vida e à obra o exato efeito dos 
fatos, sublinhando a coerência de um intelectual que 
soube viver o seu tempo, e mais que outros soube 
antecipar o futuro aos brasileiros. 
 
 
 3 
ÍNDICE 
 
 
A Fé e a Razão ........................................................................ .6 
Tobias Barreto e a Crítica ......................................................... .45 
Tobias Barreto e a Luta pelo Direito ......................................... .66 
Tobias Barreto, a Abolição da Escravatura e a 
Organização da Sociedade......................................................... ..83 
Tobias Barreto e a Filosofia no Brasil .......................................153 
O Pensamento e a Ação Política de Tobias Barreto ............... .....188 
Nova Missão Tobiática no Recife ..............................................214 
Tobias Barreto e Seus Seguidores ..............................................256 
Tobias Barreto um Agitador Social ............................................285 
Tobias Barreto e a Ideologia do Progresso ................................ 290 
Tobias Barreto e o Preconceito Racial ...................................... 295 
Tobias Barreto e a República ................................................... 300 
A Escola do Recife e a Propaganda Republicana ....................... 304 
Tobias Barreto e as Causas da Liberdade .................................. 309 
O Poeta em Salvador ................................................................ 314 
Tobias Barreto e o Brasil que ele Queria Novo .......................... 320 
Tobias Barreto e o Maranhão ................................................... 326 
Tobias Barreto nas Alagoas ...................................................... 331 
Tobias Barreto e a Educação da Mulher .................................... 330 
Tobias Barreto e o Compromisso Democrático .......................... 341 
A Edição dos Livros de Tobias ................................................. 347 
As Obras Completas de Tobias Barreto ..................................... 354 
Tobias Barreto e a Imprensa Alemã .......................................... 359 
O Jornal Alemão de Tobias Barreto .......................................... 365 
Tobias, Jhering e Losano .......................................................... 369 
 
 4 
 
 
 
Este é um livro de elogios. Ninguém pode ficar 
indiferente diante de Tobias Barreto, mulato pobre de 
Sergipe, que se projetou, ousadamente, como jornalista, 
advogado, professor e crítico, compondo uma obra 
plural e interdisciplinar, marcando com sulcos pro -
fundos a vida intelectual de Pernambuco e do Brasil, na 
segunda metade do século XIX. 
Tobias Barreto é um sedutor. Seduziu os jovens 
nordestinos, alunos da Faculdade de Direito do Recife, 
destronando os velhos conceitos embolorados nos 
compêndios sacralizados. Seduziu as galerias nas 
sessões da Assembléia Provincial de Pernambuco, 
defendendo teses sobre a educação da mulher. Seduziu, 
também o povo de Escada, que o acompanhou nas 
audiências, pressionando juízes e promotores para a boa 
administração da justiça. 
Somente os que não conhecem a obra tobiática, e 
nem o contexto que a gerou, passam ao largo da figura 
genial do poeta e filósofo, um dos poucos a fazer do 
Brasil o objeto de suas preocupações e dos seus estudos. 
Como Tobias Barreto foi um divisor de águas, muitos 
foram os seus críticos e alguns dos seus detratores. Ou-
tros, contudo, fizeram o elogio da obra, como Sílvio 
Romero, Artur Orlando, Graça Aranha, e mais recen-
temente Hermes Lima, Antônio Paim, Miguel Reale, 
Jackson da Silva Lima, Virgílio Campos. 
 5 
As novas gerações não conhecem Tobias Barreto. 
Este livro pretende ser uma contribuição, porque mes-
clado de informações biográficas, repleto de circuns-
tâncias, cujo poder influi sobre as várias facetas da 
obra, está destinado a guiar os mais novos nos caminhos 
da descoberta da cultura brasileira, especialmente no 
capítulo que teve como personagem, no centro dos 
debates, Tobias Barreto. 
 
 
 6 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A F É E A R A Z Ã O 
 7 
 
O concurso para a cadeira de Filosofia do Ginásio 
Pernambucano, que disputou com José Soriano de 
Souza, em 1867, e a leitura, durante a aprendizagem da 
língua alemã, da História do Povo de Israel,
(1)
 de 
Ewald, marcaram, sem dúvida, a evolução de Tobias 
Barreto, desapegando-se das raízes religiosas herdadas 
no convício de sua terra, no contato com o Seminário da 
Bahia, onde era professor o frei Itaparica,
(2)
 e no 
magistério de latim, na Província de Sergipe, que 
largou, com licença do Governo, para estudar direito no 
Recife. 
Tobias, na verdade, participa de dois concursos. 
O primeiro, em 1865, para a cadeira de Latim do Curso 
Preparatório da Faculdade de Direito do Recife. 
Concorreu com seu conterrâneo e parente padre Félix 
Barreto de Vasconcelos, e com Samuel Wallace 
MacDowel, Francisco Jacinto de Sampaio e Joaquim 
José Henrique da Silva. As provas foram realizadas no 
dia 4 de abril, e apresentaram um resultado que 
qualificava em primeiro lugar o padre Félix, em segundo 
Tobias Barreto, e os demais em terceiro lugar. A 
Comissão examinadora, formada pelo Diretor da 
Faculdade, o Visconde de Camaragibe, José Nicácio, 
padre Joaquim Graciliano de Araújo e o dr. Pedro 
Autran da Mata Albuquerque, respondia pela 
classificação, encaminhada ao Ministro do Império com 
as seguintes observações: “O padre Féliz é aqui 
professor particular de latim, natural de Sergipe, e 
apresenta documentos de serviços prestados em diversas 
 8 
províncias. O candidato Tobias Barreto de Menezes é 
estudante do segundo ano desta Faculdade, moço 
aplicado e inteligente. V. Excia. resolverá o que lhe 
parecer acertado.” 
Leopoldino Antônio da Fonseca, por não ter sua 
inscrição aceita no concurso, representou contra o 
Diretor da Faculdade junto ao Ministro do Império, e o 
concurso, e em 13 de julho de 1865, “julgando não 
serem satisfatórias as provas que exibiram os 
concorrentes”, foi anulado, mandando o Ministro que 
fosse feita nova prova. O novo concurso foi realizado 
nos dias 27 e 28 de novembro do mesmo ano, 
concorrendo padre Féliz, Tobias, Francisco Jacinto de 
Sampaio e Leopoldino Antônio da Fonseca. Na 
Comissão examinadora estavam os padres Joaquim 
Graciliano de Araújo e Inácio Francisco dos Santos. 
Mais uma vez o julgamento beneficiou o padre em 
primeiro lugar, com Tobias em segundo.
(3)
 
O resultado do concurso não abateu o jovem 
poeta sergipano. Poeta de escola própria, engajada. Seus 
versos, cheios de patriotismo, agitavam as massas 
recifenses, com o mote da guerra do Brasil contra o 
Paraguai. Nas ruas da capital pernambucana, Tobias era 
mais que um poeta condoreiro., era um orador do povo, 
inflamado, devolvendo a coragem de lutar aos bravos 
nordestinos de Pernambuco que guardavam, ainda, as 
amarguras das derrotas dos movimentos libertários de 
1817, 1824, 1842 e 1848, vivos na memória da “cabocla 
civilizada.” (4) O mesmonão se poderá dizer do concurso 
para a cadeira de Filosofia do Ginásio Pernambucano. 
 9 
Contra José Soriano de Souza é o estudante contra o 
mestre, é o jovem formando seu espírito, de um lado, e 
um professor experiente, médico e doutor pela 
Universidade de Louvain, na França, que exercia forte 
influência sobre professores e estudantes e jornalistas, 
do outro. Do concurso o próprio Tobias trata, em carta a 
Carvalho Lima Júnior: “Não obstante ir em primeiro 
lugar fui preterido por esse doutor, alegando-se como 
razão da preferência o ele ser casado e eu solteiro.” (5) 
Tobias Barreto não iria esquecer a injustiça de 
não ter sido o nomeado, embora guardasse um certo 
orgulho por ter defendido, naquele co ncurso, modernas 
idéias de filosofia, contrariando os ensinamentos 
espiritualistas de Taparreli, Sanseverino e Kleutgen, que 
seguramente balizavam a formação filosófica do dr. José 
Soriano de Souza. 
 
A Juventude e a religião 
 
A Faculdade de Direito do Recife, que fora 
fundada em Olinda, no Mosteiro de São Bento, quando 
dirigida por Pedro Autran da Mata Albuquerque, era um 
santuário da catequese dos moços nordestinos, oriundos 
de várias províncias da região. Desde 1856 que havia 
sido ereta, na Igreja de São Francisco, a Confraria 
Acadêmica Nossa Senhora do Bom Conselho, sob os 
aplausos dos professores, como se pode testemunhar 
com a leitura deste texto da Memória Histórica 
Acadêmica, de 1857:
(6)
 “A instalação da Irmandade Re-
ligiosa, no Convento dos Franciscanos, sob a invocação 
 10 
de Nossa Senhora do Bom Conselho, foi uma prova de 
convicção de que só a religião oferece uma verdadeira e 
real garantia à ordem e tranqüilidade pública de que só 
ela pode sancionar de uma maneira positiva e dogmática 
a Moral social, e prevenir e acautelar crimes cuja alçada 
e investigação escapam às leis humanas.” 
Pelo seu valor como documento de época, como 
mostruário das idéias dominantes na Faculdade de 
Direito e no ambiente em que vivia a juventude no 
Recife, vale trazer a público algumas outras mani-
festações de professores daquela Casa. 
Diz um texto da Memória Histórica Acadêmica de 
1862: “Muito faz esta juventude, que, dotada geralmente 
de fervor religioso, sustenta, por meio de algumas 
associações e escritos pela imprensa, as et ernas 
verdades do Cristianismo e pugna pela difusão das boas 
doutrinas.” (7) 
Em 1863,
(8)
 começam a surgir sintomas de que 
nem todos estavam de acordo com a catequese e com o 
controle religioso do conhecimento. Eis o que diz o 
autor da Memória: “O indiferent ismo de poucos 
estudantes – sectários do sistema da razão livre ou do 
puro Racionalismo (sinônimo de Protestantismo), 
felizmente não pode ainda influir nos louváveis atos de 
quase totalidade, que por aqueles é qualificada de 
ascética.” Mais adiante, dizia o professor: “Sem a 
fecunda aliança da ciência com a religião, e da liberdade 
com a ordem, dissolvidos estão, sem dúvida, os vínculos 
sociais.” 
 11 
O ambiente da Faculdade era reproduzido na rua, 
na medida em que os mestres do direito continuavam 
com suas pregações destinadas a conter o crescimento 
das que reagiam ao controle. O professor Antônio 
Vasconcelos Menezes de Drummond, ao discursar em 7 
de agosto de 1867, analisando a Constituição brasileira, 
afirma categórico: “A religião cristã, obra da Sabedoria 
Divina em prol do bem da humanidade (assim como o 
Protestantismo é a obra da fraqueza humana e para sua 
destruição), sendo a única capaz de fazer a felicidade 
nesta vida, e também a única capaz de fazer a felicidade 
na vida futura, foi pela Constituição preferida, sob cuja 
sombra já havia prosperado a abençoada terra da Santa 
Cruz, há trezentos anos.” 
O Curso Preparatório da Faculdade, criado em 
1832, no Seminário de Olinda, como Colégio das Artes, 
seguia a mesma tradição catequética, e seu corpo 
docente era repleto de padres. A situação era idêntica no 
Ginásio Pernambucano, fundado em 1855, pelo des -
dobramento do Liceu, abrigando padres, como Inácio 
Francisco dos Santos e Joaquim Graciano de Araújo, 
que ensinavam, respectivamente, latim, e geografia, 
retórica e filosofia.
(9)
 Era, portanto, muito forte a 
influência religiosa no ensino pernambucano, aumentada 
ainda mais a partir de 1867, quando é fundado o Colégio 
São Francisco Xavier, confiado aos jesuítas. Abre -se um 
novo capítulo na questão do controle do ens ino e da 
cultura em Pernambuco, dando consistência ao mo-
vimento que entre os professores era liderado pelo 
Conselheiro Pedro Autran da Mata Albuquerque e pelos 
 12 
irmãos Braz Florentino, Tarquínio Bráulio e José 
Soriano de Souza. 
Os jesuítas chegaram a Pernambuco “como 
operários da educação da mocidade” a partir de 12 de 
fevereiro de 1866. Os primeiros que chegaram foram os 
padres Bento Shembri, logo designado Padre Espiritual 
dos Seminaristas, Márcio Arcionni, lente de Moral, e 
Tomé Vitale, lente de Teologia Dogmática. Em 
princípios de 1867 chegaram os padres Candiami e 
Clemente Maria Negri. Os jesuítas, mais que os outros 
padres e que os professores das diversas escolas e da 
Faculdade de Direito, atraíram a afeição da mocidade. 
Eles haviam sido convidados pelo Bispo de Olinda, Dom 
Manoel do Rego Medeiros, e estavam destinados ao 
auxílio da educação nos Estados de Pernambuco, 
Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Alagoas. 
Em homenagem a Santo Inácio, no dia 31 de 
julho, fundam o Colégio de São Francisco Xavier , com 
finalidade primeira da “educação religiosa da mo -
cidade”, que não consistia apenas no ensino do 
catecismo, “mas também em formar o coração dos 
alunos para bem cumprirem com os seus deveres, 
esclarecendo-lhes a inteligência nas verdades e preceitos 
da religião cristã com progressivas instruções.” Ao lado 
das intenções educacionais, o Colégio fixava uma rígida 
disciplina para os seus alunos, que eram proibidos de 
saírem para visitas, nem nas férias, bem assim de 
mandar para fora do Colégio cartas, bilhe tes e recados, 
senão por intermédio do Diretor ou Vice-Diretor. 
 13 
Os jesuítas do São Francisco Xavier estavam 
realizando, em limites menores e em universos restritos, 
os planos do anfitrião Bispo de Olinda, que dentre os 
seus planos para a educação em Pernambuco incluía a 
criação de um “Curso de Ciências Eclesiásticas”, com as 
seguintes matérias: Direito natural e das Gentes, Direito 
Público Civil, Direito Civil Pátrio, Direito Público 
Eclesiástico, in si e em suas relações com o Direito 
Civil Brasileiro, História Eclesiástica Geral e Peculiar 
do Brasil, Escritura Sagrada, ou Exegética, ou 
Explanação dos Fundamentos da Autenticidade, 
Canonicidade e Integridade dos Livros Bíblicos, Teo -
logia Dogmática, fundamental e polêmica.
(10)
 
O que dominava, com rotunda, a ação dos jesuítas 
em Pernambuco era o que chegava ao Recife, através da 
Revista Contemporânea de Paris, porta-voz do 
Neotomismo que contagiava o grupo chefiado por José 
Soriano de Souza, reforçando o binômio educação -
confessionário, espécie de estandarte dominante nas 
casas de ensino recifenses. A visão religiosa daquele 
tempo não tardaria em freqüentar as publicações 
especializadas que circulavam no Recife, como a 
Revista Mensal de Instrução Pública de Pernambuco. 
 
A Religião e a Imprensa 
 
Diversos jornais e revistas começaram a circular 
com objetivos definidos de propagação da fé religiosa. 
Alguns deles alcançaram repercussão maior, e causaram 
efeitos também maiores no convício com o corpo social. 
 14 
Entre os jornais e revistasque circularam tendo em seu 
grupo redacional estudantes da Faculdade de Direito, 
professores e sacerdotes estão: O Santa Cruz, 1860; A 
Verdade, 1861; O Constitucional, 1861; O Lidador 
Acadêmico, dirigido por Tarquínio Bráulio, 1861; A 
Religião, 1862; A Situação, redigido por alunos do 4º 
ano da Faculdade de Direito, tinha no cabeçalho o 
seguinte: “Religião, Autoridade Forte, Monarquia Pres-
tigiada, Lei, Conservação e Progresso”, 1862; O Íris da 
Verdade, 1864; O Oito de Dezembro, 1864; A 
Esperança, redigido por José Soriano de Souza, 1865; O 
Vinte e Cinco de Março, do padre Joaquim Pinto de 
Campos, 1865; O Oriente, 1866; O Democrata Fe-
derativo, 1868; A União Democrática, 1869; O 
Católico, dirigido inicialmente por Pedro Autran da 
Mata Albuquerque e depois, em 1872, por José Soriano 
de Souza, 1869; A Santa Cruz, 1871; A União, dirigido 
por José Soriano de Souza, 1872; O Verdadeiro 
Católico, 1873; Cáritas, Caridade, 1874; e O Estudante 
Católico, dirigido por Albino Meira, 1875. 
Ninguém conseguia escapar dessa participação 
compulsória na propaganda religiosa pela imprensa. 
Num jornalzinho de 1863 – A Primavera – estão 
reunidos Antônio Joaquim de Passos, Castro Alves e 
Franklin Távora. Estava lá, no artigo de fundo de seu 
número único, de 17 de maio, o perfil. “Filho de uma 
idéia grande e generosa, vai ele professar e ensinar a 
verdade da ciência e o conhecimento de Deus e da 
humanidade, derramando a educação no seio das 
famílias por meio de teologias sublimes, como a religião 
 15 
dos mártires.” E acrescentava: “A religião é a sua 
profissão de fé e basta para recomendar a cada cabeça 
um sinal de respeito e proteção ao nosso filho das letras, 
que vem agora à luz da imprensa.” 
Ainda que fossem de vida efêmera, os jornais e 
revistas estavam destinados ao cumprimento de uma 
missão, e cada órgão novo que circulava era um ânimo 
novo em defesa das mesmas teses, continuamente 
alimentando o fogo inquisitorial da propaganda, como 
freio antes que surgissem e proliferassem as idéias 
novas, que também procuravam abrigo nas páginas dos 
jornais recifenses. 
As publicações religiosas tomavam a dianteira na 
vigilância do conhecimento, insistindo com as velhas 
teses conservadas pelos ultramontanos que estavam, 
com os jesuítas, na retaguarda da pregação pela 
imprensa. Para ilustrar o pensamento comum no meio 
dos mentores da mocidade acadêmica e estudantil em 
geral, basta citar a teoria da Revista Contemporânea de 
Paris, repetida pela Revista Mensal da Instrução 
Pública de Pernambuco, que, sem rodeios, ensinava 
que: “O progresso das ciências, das artes e da indústria 
parece favorecer o desenvolvimento dos instintos menos 
nobres da nossa natureza.” 
Num discurso que pronunciou numa festa do 
Colégio São Francisco Xavier, sobre “O Estudo da 
Filosofia Natural e Racional”, o padre jesuíta Francisco 
Rodina alerta que “a ciência sem a virtude é tão fatal ao 
indivíduo como à sociedade.” Outro jesuíta, Clemente 
Negri, em carta publicada pela mesma Revista,
(11)
 
 16 
afirma categoricamente que “a liberdade de ensinar, 
dada a todos é essencialmente imoral, e por conseguinte 
ilícita, visto que franqueará o ensino ao incrédulo, ao 
racionalista, ao protestante, etc.” 
O ambiente fazia da escola e da imprensa 
instrumentos do mais direto e claro uso catequético, 
controlando de forma ampla e quase total não apenas o 
conhecimento, mas e principalmente as reações e 
insurgências que pudessem aparecer entre os jovens 
nordestinos residentes no Recife. Alguns jornais não 
escondiam suas pretensões, como A Esperança, cuja 
finalidade era “operar pela palavra, pela imprensa e 
pelos exemplos uma saudável reação religiosa, se se 
quer salvar o País do abismo para que caminha a olhos 
vistos.” 
Mais do que o mostruário de intenções, das 
escolas e dos jornais, havia uma idéia básica, sedi-
mentada, alicerçando o edifício do pensamento do -
minante. Numa vertente, ela está no interior da 
Faculdade de Direito, incrustada na cátedra de Direito 
Natural, como deixara o Conselheiro Zacarias de Goes e 
Vasconcelos, em 1851, abrindo o curso do ano. Dizia 
ele que: “O Cristianismo, senhores, a que a humanidade 
deve tantos benefícios, foi que despertou no ânimo do 
homem o sublime conceito do direito da natureza, 
conceito cuja verdadeira origem, por conseqüência, é 
toda celeste, toda evangélica.” 
Mais do que o Conselheiro Autran José Soriano 
de Souza era um exemplo de um escudeiro, fiel e leal 
seguidor de trilhas antigas, que ampliava com sua 
 17 
diligente participação na vida cultural pernambucana. 
Em 1871 publica, em Paris, o livro Lições de Filosofia 
Elementar; Racional e Moral, distribuído em Per-
nambuco pela Livraria Acadêmica de São Wa lfredo de 
Medeiros. É a melhor referência para servir de 
contraponto do pensamento dominante em relação à 
reação esboçada em fins dos anos 60 e por diante por 
Tobias Barreto e outros desbravadores da nova cultura, 
animada pelas luzes da ciência que despont ava na 
Europa alemã. 
 
As Lições de Soriano 
 
O livro do dr. José Soriano de Souza termina com 
uma nota de sujeição, nos seguintes termos: “Sujeitos 
estas Lições de Filosofia ao juízo indefectível da Santa 
Igreja Romana, isto é, à correção do Soberano Pontíf ice, 
Pai e Mestre infalível de todos os cristãos; e com ele 
digo, e tenho como verdade que é obrigação rigorosa, 
quer do filósofo, que deseja ser filho da Igreja, quer da 
mesma filosofia, não dizer nada contra o que a Igreja 
ensina, e retratar-se desde que ela o adverte; e bem 
assim que inteiramente errônea e soberanamente inju -
riosa à Fé e à Igreja e à sua autoridade e doutrina que 
ensina o contrário disto.” (12) 
Retirados do corpo do livro, eis alguns ensi-
namentos do dr. Soriano, característicos como produto 
de uma mentalidade largamente respeitada entre os 
católicos, como destaca o jornal O Católico, na sua 
edição de 20 de setembro de 1871: “Certamente per -
 18 
correndo-a, com satisfação temos notado sólida robustez 
de argumentos, clareza de exposição, exatidão de 
definições, propriedade de linguagem científica, e o que 
mais vale, bom critério na escolha das opiniões mais 
recebidas entre os autores católicos (S. Agostinho, S. 
Tomás, Audísio, Taparelli, etc.).” O jornal cita longo 
trecho do livro que, pela sua importância como 
justificativa teórica para a prática catequética, merece 
transcrição. Diz o autor das Lições, sobre a Igreja: “A 
Igreja é uma sociedade perfeita, absolutamente 
independente da sociedade civil em seu fim, meios e 
origem. Com efeito, chama-se perfeita aquela sociedade 
que é completa em sua natureza, e tem em si mesma 
todos os meios necessários e suficientes para atingir ao 
seu fim; ora, neste caso está a Igreja de Jesus Cristo, 
logo é uma sociedade perfeita. A menor deste argumento 
provamos logo: o fim próprio da Igreja é a salvação 
eterna dos homens, o culto divino, o ensino da doutrina 
de Jesus Cristo: ofícios estes que não lhe foram 
atribuídos por nenhuma outra sociedade, senão pelo 
mesmo Jesus Cristo, como foi dito: ao passo que o fim 
da sociedade civil é em substância a segurança e a 
felicidade temporal, e o que a ela se refere, de tal sorte 
porém que se não oponha ao fim último do homem. E 
porque este fim último, como tal que é, há de dominar 
os fins intermédios ou temporais, segue-se que longe do 
fim da Igreja ser subordinado ao do Estado, é ao 
contrário o fim deste que é sujeito ao daquela, como 
exige a razão, por ser a matéria naturalmente sujeita aoespírito.” O Católico faz o comentário: “Deste modo vê-
 19 
se que o claro autor segue nas suas Lições de Filosofia 
Elementar os sãos princípios, que são como a chave, 
para refutar os sofismas miseráveis da moderna 
incredulidade. Haveria pois estudo filosófico mais sério 
e mais útil para a mocidade católica do Brasil?” A 
pergunta fica realçando a preocupação afirmativa dos 
tradicionalistas que tinham no professor José Soriano de 
Souza um autêntico e aplicado porta-voz. 
Ninguém melhor que ele, que afirmava a 
subordinação da Filosofia à Teologia, para consolidar 
teorias destinadas a recrutar adeptos entre os jovens 
estudantes, na defesa de uma sociedade cujo poder 
político só poderia vir de Deus, sendo inadmissível se 
originar de um dos seus membros. Uma sociedade 
composta pela “desigualdade de méritos individuais, 
proveniente de ter a natureza dotado desigualmente aos 
homens, que consiste a verdadeira igualdade perante a 
lei social e não em que todos têm igual direito de 
pretender tudo, como propalam os ultrademocratas, 
porque essa igualdade material destrói o valor pessoa, a 
liberdade, e a mesma sociedade, que não pode existir 
sem ordem, e por conseguinte sem hierarquia social.” 
 
Tobias e a Religião 
 
Enquanto a figura de José Soriano de Souza era, 
para Tobias Barreto, a encarnação das velhas doutrinas, 
que “ao que parece, crê-se destinado a uma grave 
missão. É fabricar no Recife o melhor contraveneno das 
idéias perigosas” (13), o livro de Ewald era uma imensa 
 20 
porta por onde o sergipano iria penetrar nas questões 
religiosas mais profundas. A um tempo, Tobias 
aprendia, sozinho, o alemão, que conhecia de contatos 
baianos, quando passara algum tempo junto a Francisco 
Muniz Barreto de Aragão,
(14)
 e tomava conhecimento 
histórico do povo de Israel, sendo levado a discutir, 
pelos jornais recifenses, aquilo que de novo aprendia em 
suas leituras. 
Com tal leitura, Tobias faz passagem pelos 
autores franceses, entre eles os positivistas, com quem 
Tobias Barreto parecia ter intimidade, pondo uns contra 
outros, no jogo dialético do confronto que permitia 
adotar a evolução das idéias. Discute, com esse seu 
método de raciocínio crítico, a questão da relig8ã e da 
ciência, opondo Vacherot ao padre Gatry, para quem “a 
ciência e coisa de fantasia”, como assinalara Tobias em 
Sobre a Religião natural de Jules Simon, em agosto de 
1869, pouco depois que escreveu A Luta de Gigantes.
(15)
 
Em Moisés e Laplace opõe a cosmogonia à concepção 
bíblica da origem do mundo. Surgem os nomes até então 
ignorados, ou pronunciados com reserva pelos escritores 
católicos e autores de compêndios e manuais de 
filosofia. 
Em “Notas de Crítica Religiosa”, “Os Livros 
Mosaicos, ou Assim Considerados” e “Uma Excursão de 
Diletante pelo Domínio da Ciência Bíblica”, Tobias se 
vale de Ewald para fixar seus novos horizontes na 
interpretação dos textos religiosos. Ewald é a porta para 
os demais autores alemães que Tobias incorpora aos 
seus estudos, muitos deles a partir da Revista de 
 21 
Teologia de Strasburgo, onde segundo o pensador 
sergipano acharam eco todas as grandes questões 
bíblicas levantadas durante os últimos 50 anos.” (16) 
A ação intelectual de Tobias Barreto, nos últimos 
dois anos como estudante e logo depois de formado, 
concorre para alterar o seu perfil. O poeta das ruas e das 
récitas teatrais, agitando o povo ou disputando o amor 
das belas mulheres e artistas, cede lugar ao teórico da 
organização política brasileira, de feição liberal, como 
atestam seus artigos em O Liberal
(17)
 e O Americano,
(18)
 
e ao crítico da religião, intuindo a busca de respostas 
filosóficas para as questões que desejava solucionar, 
como intérprete da evolução do conhecimento humano. 
Um compromisso que levou até o final da vida, 
enfrentando os dias ásperos e cruéis de sua jornada 
existencial. 
Tobias Barreto casara, em 11 de fevereiro de 
1869, com Grata Mafalda dos Santos, no Oratório do 
Engenho Riqueza, do seu sogro João Félix dos Sant os, 
no município de Escada. Em princípios de 1871 Tobias 
fez a opção por fixar residência em Escada, ainda Termo 
da Comarca de Santo Antão. Advogado, Curador de 
Órfãos e de Escravos, Juiz Municipal Substituto, editor, 
em tipografia própria, de diversos jornais, incluindo o 
Deutscher Kaempfer, inteiramente redigido em língua 
alemã, Tobias Barreto molda, definitivamente, com a 
publicação de Ensaios e Estudos de Filosofia e Crítica, 
seu perfil de pensador e de crítico, filiando-se 
completamente ao germanismo. 
 22 
O germanismo de Tobias Barreto leva a que 
compreenda, de forma desapaixonada, o alcance, a 
extensão da reforma luterana do século XVI. Tobias 
passa a entender a reforma como uma nova teoria da fé, 
e, qualificando Martinho Lutero como “o mais valente 
orador alemão”, duvida se seria possível Kant sem 
Lutero. Para ele os feitos do pensamento alemão após a 
reforma levantam um novo princípio de moralidade, o 
qual, em oposição à Renascença, corresponde essen-
cialmente ao espírito alemão, repousando sobre o lar e a 
família. 
Estava claro, para Tobias, que as transformações 
operadas pela reforma fixavam uma nova ciência e uma 
nova cultura, que dificilmente vicejariam no húmus do 
Catolicismo tradicional. Impressiona, no entanto, que a 
visão esclarecida e singular de Tobias não o leve a 
participar das questões mais ruidosas do seu tempo de 
crítico de religião: a polêmica do general Abreu e Lima, 
assinando-se Cristão Velho, com o padre Joaquim Pinto 
de Campos e com outros católicos, que resultou, anos 
mais tarde, na posição radical da administração 
eclesiástica de negar sepultura ao general de Bolívar, 
finalmente enterrado no cemitério dos ingleses, e a 
chamada Questão Religiosa, envolvendo os maçons e o 
bispo Dom Vital. 
Tobias estava nas páginas dos seus jornais, como 
a Razão e a Regeneração, O Americano, e de outros que 
se abriam para a crítica religiosa no Recife, prin-
cipalmente a partir de 1869, como a Consciência Livre, 
que precedeu ao Americano, Correio Pernambucano, O 
 23 
Liberal e o Jornal do Recife, o mais antigo deles. Era a 
imprensa aberta às contribuições mais novas, com-
batendo aquele outro grupo de jornais católicos, todos 
com disposição férrea para a propaganda religiosa 
tradicionalista. 
A única das questões de evidência que atrai 
Tobias é a discussão sobre a infalibilidade papal, antes e 
depois do Concílio de 1870. Entre os católicos havia o 
temor contra a Igreja. É o bispo Cardozo Ayres, em 
texto de 29 de setembro de 1869, publicado em O 
Católico de 17 de outubro do mesmo ano, que diz ser 
“notório o incremento que vão tomando em algumas 
folhas públicas desta diocese as idéias anti-religiosas, e 
sendo de esperar que esse espírito de iniqüidade se 
exacerbe, durante os trabalhos do sagrado Concílio.” 
Ao ser concluído, com a afirmação do dogma, o 
Concílio foi entusiasticamente saudado pelo O Católico, 
que desabafa: “A definição da infalibilidade pontifícia 
foi o ato mais brilhante do Concílio Vaticano, a suprema 
idéia para que Deus o quis reunir. De feito, donde, a não 
ser deste dogma, dependeria o triunfo do Cato licismo 
sobre o Racionalismo, e a firmeza do reino de Jesus 
Cristo sobre a terra? Portanto, definir a infalibilidade 
pontifícia importava tanto quanto importa a duração do 
reino de Jesus Cristo sobre a terra: especialmente nesta 
nossa época, quando o alvo da atual guerra satânica é 
destronizar a Jesus Cristo, e despedaçar-lhe o cetro. Não 
podia pois o Concílio Vaticanoprestar ao século XIX 
serviço mais relevante que proclamar a infalibilidade do 
Pontífice Romano.” (19) 
 24 
A Igreja não estava disposta a ceder nada em sua 
forma de ver e de compreender o mundo e firmava, cada 
vez de forma mais radical, a sua postura, tomando como 
inimigos a todos os que questionavam ou queriam 
respostas para questões antigas, que antes sequer eram 
discutidas. A Maçonaria, animada pela discussão dos 
jornais contra o jesuitismo, fortalecia suas lojas, 
festejava o gesto de Pombal, um século antes, e atraía 
grande número de adeptos. Jornais e jornalistas tinham 
ligações com as lojas Regeneração, Restauração 
Pernambucana, Seis de Março, Segredo e Amor da 
Ordem, as que funcionavam legalmente no começo da 
década 70. Com os liberais, e entre eles Tobias Barreto, 
os maçons tratavam com interesse da questão da 
escravidão e em suas festas costumavam alforriar alguns 
escravos. 
O ambiente agitado do Recife não era ignorado 
por Tobias, que em seu refúgio de Escada, zona da mata 
sul de Pernambuco, com 120 engenhos de açúcar, de 
senhores conservadores e liberais, mas sempre senhores, 
continuava mergulhado na leitura dos autores alemães, 
como se verá em 1874, ao editar o seu primeiro jornal, 
Um Signal dos Tempos, trazendo à cena da cultura 
nomes como o de Strauss, por ocasião de sua morte, e de 
Eduard von Hartmann, cuja obra, em sua edição alemã, 
Filosofia do Inconsciente, é objeto de análise, três anos 
antes que apareça no Recife a edição francesa. 
É em Escada que Tobias Barreto aperfeiçoa o seu 
entendimento das diversas correntes transformadoras, 
que desde o Positivismo influem na mente dos jovens 
 25 
insubmissos ao controle da Igreja. Os autores alemães , 
em número cada vez maior, ocupam Tobias. Não há 
como separar a crítica religiosa, a filosofia, o direito, a 
ciência política, da influência germânica. Charles 
Darwin, Ernest Haeckel, Rudolf von Jhering, Hermann 
Post, Eduard von Hartmann passam a exercer sobre o 
sergipano uma decisiva orientação, a partir da qual, em 
todos os campos em que atua, Tobias exporá o conjunto 
das novas idéias. Assim faz nos jornais escadenses, no 
Clube Popular, quando pronuncia “Um discurso em 
Mangas de Camisa”, em 1877, como deputado à 
Assembléia Provincial, e discute a questão da educação 
da mulher, quando publica a “Jurisprudência da Vida 
Diária”, em 1878, quando mantém correspondência com 
autores alemães e colabora com jornais germânicos 
editados no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Porto 
Alegre, ou em jornais da Alemanha, ou ainda quando 
concorre à cadeira de Lente da Faculdade de Direito do 
Recife. 
É evidente que a posição de Tobias Barreto gerara 
grandes incômodos. Em 1870, quando ainda engatinhava 
em seus estudos alemães, Tobias enfrentou ou católicos 
tradicionalistas do jornal O Católico, sob a chefia do 
Conselheiro Autran. Em 1875, ao publicar seu livro de 
estudos filosóficos, mede forças com Albino Meira, do 
Culto às Letras, e na Assembléia Provincial, como 
deputado e orador muito aplaudido, tem um projeto 
rejeitado, sob a justificativa de teorias antigas, 
atrasadas, que predominaram.
(20)
 Mas, ao anotar o seu 
“Um Discurso em mangas de Camisa”, em 11 de 
 26 
fevereiro de 1879, revela sua opção filosófica 
irrevogável: “não sou judeu para crer no Messias, nem 
tenho a ingenuidade dos primitivos cristãos para 
acreditar na parousia; mas sou filósofo em confiar nas 
leis da história, que regulam os destinos dos povos, e 
essas hão de também cumprir-se entre nós.” 
 
Tobias e o Direito 
 
Ao retornar ao Recife, carregando a dura 
experiência de uma convivência atribulada, onde não 
faltaram ameaças e agressões, como no cerco feito a sua 
casa, a caça de escravos que ele alforriara, por sua 
mulher, seu cunhado e outros herdeiros de João Félix 
dos Santos, Tobias era, já, o pensador maduro, com a 
cabeça fértil para desencadear o mais notável 
movimento intelectual do século XIX. Começa por 
escrever Algumas Idéias Sobre o Chamado Fundamento 
do Direito de Punir, em 1881, e Sobre uma Nova 
Intuição do Direito, 1881/1882. Neste último desabafa, 
numa nota de pé de página, anunciando trabalho inédito 
– Die akademischen Lehrkraefte an der juristischen 
Facultaet in Pernambuco: ein Beitrag zur Kunde des 
geistigen Lebens in Brasilien – irônico: “Assim Deus 
me ajude; não só o Deus da teologia, mas também o 
Deus da ciência econômica, a substância spinosística do 
mundo, na qual... vivimus, movemur et sumus.” 
O germanismo que abrira os olhos de Tobias para 
o futuro encantava os moços da Faculdade de Direito, 
pela voz do candidato a uma cadeira de professor de 
 27 
Direito. O concurso de Tobias Barreto, em 1882, 
representa, na opinião unânime dos historiadores das 
idéias do século passado, uma ruptura formal com o 
atraso, com o domínio das velhas teorias mofadas nos 
compêndios, da lavra de professores que bebiam no 
Catolicismo tradicional as “verdades” imutáveis que 
transmitiam aos jovens acadêmicos nordestinos. 
Demolindo, com o fogo das novas idéias, a 
construção antiga da filosofia e do direito, Tobias 
Barreto causava grande impacto na sua geração e 
impunha uma derrota sem precedentes aos ultra-
montanos que abanavam a fogueira velha da inquisição 
cultural. A partir daquele momento de reação, o Brasil, 
como viria mais tarde a dizer Graça Aranha,(21) uma 
das testemunhas arrebatadas pela palavra do mestre. A 
vitória das idéias novas, festejada nas ruas recifenses 
pelos moços da Faculdade, dava a Tobias Barreto a 
certeza de que havia conquistado a adesão dos 
estudantes, retirando-os da tutela intelectual a que 
estavam, historicamente, submetidos. 
A Escola do Recife – assim ficou conhecido o 
movimento emancipador da cultura brasileira, liderado 
por Tobias Barreto – produziu uma geração de 
abolicionistas, de republicanos, de democratas, de 
socialistas, de agnósticos e materialistas que, de volta 
aos seus Estados, seguiam com a demolição de todas as 
velhas estruturas. 
A reação não tardara. Ao pronunciar discurso de 
paraninfa de colação de grau, Tobias aprofundara sua 
visão do direito, dizendo: “É mister bater, bater cem 
 28 
vezes, e cem vezes repetir: o direito não é um filho do 
céu, é simplesmente um fenômeno histórico, um produto 
cultural da humanidade.” Adiante, na mesma oração, 
diz: “Tal é a concepção que está de acordo com a 
intuição monística do mundo. Perante a consciência 
moderna, o direito é o modus vivendi, é a participação 
da antagonismo das forças sociais, da mesma forma que, 
perante o telescópio moderno, os sistemas planetários 
são tratados de paz entre as estrelas.” Na mesma ordem 
de idéias, afirma categoricamente: “... mas somos nós os 
primeiros a tratar de reformar-nos; somos os primeiros 
que devemos munir-nos de abnegação e de coragem, 
tanto quanto havemos mister de coragem e abnegação 
para despirmo-nos das nossas bocas, mofadas de teorias 
caducas, e tomarmos trajo novo. Releva dizer à ciência 
velha: retira-te; e à ciência nova: entra moça. 
Darwinista ou Haeckeliana, pouco nos importa, o que 
queremos é a verdade. As faculdades não são somente 
estabelecimentos de instrução, mas ainda e princi-
palmente, como diz Henrique von Sybel, verdadeiros 
laboratórios, oficinas de ciência. É preciso também 
pensar por nossa conta. Eis aí tudo.” (22) 
O discurso propagou-se em todo o Nordeste e, ao 
ser publicado em O País, no Maranhão, mereceu severas 
restrições do órgão oficial religioso Civilização, le-
vando a uma longa polêmica, que toma todo o segundosemestre de 1883. Mas, enquanto as críticas, os insultos, 
as mesmas e velhas cantilenas tradicionalistas, que 
repercutem no Recife e são transcritas no Diário de 
Pernambuco, visam a atacar Tobias, ele produz, mais e 
 29 
mais, artigos de interpretação da literatura, da Bíblia, 
sem esquecer de fustigar aquele seu velho adversário, 
José Soriano de Souza, que parece estar escondido, ao 
anonimato, na produção e na divulgação das críticas. 
Tobias Barreto cresce na admiração e no respeito dos 
seus alunos, que incorporados assinam nota de repúdio 
contra o médico Antônio de Siqueira Carneiro da Cunha, 
que usava o pseudônimo de Hunger par atacar o autor do 
instigante discurso. 
Em 1884, refeito da ruidosa polêmica e animado 
pela boa repercussão que obtivera o seu livro Estudos 
Alemães, publica Menores e Loucos, onde revela a face, 
também inovadora, do criminalista. E lá, com todas as 
letras, define-se: “Não faço mistério da minha fé 
filosófica: eu sou um materialista, no bom sentido da 
palavra. Não me insurjo nem mesmo contra a tentativa 
de fazer-se da chamada Ciência da alma um com-
partimento da meteorologia. ‘O homem é o que ele 
come’, disse o autor de Kraft um Stoff, e não hesito em 
glosar: o homem é todo feito a imagem e semelhança, 
não de Deus, porém da natureza, isto é, do céu que ele 
contempla, do ar que respira, da terra em que pisa, do 
leito em que dorme, e até das flores que colhe, se não 
até dos lábios que beija.” (23) 
 
Tobias Diante da Morte 
 
Doente, recolhido por longo período ao leito, com 
saídas esporádicas, e sofrendo as mesquinhas perse-
guições do meio, Tobias Barreto produzia, mais e mais, 
 30 
com suas leituras, uma vasta contribuição ao direito à 
filosofia, aos estudos literários, à ciência política, e 
ainda aceitava encomendas de trabalhos especiais, como 
a apresentação e notas da Gramática de Castro 
Nunes,
(24)
 em 1883, saudada efusivamente pela crítica, e 
Gramática Latina do mesmo padre Féliz, do Concurso 
de 1865, que fez prólogo e notas, em 1889.
(25)
 
Nos últimos meses de vida tentou uma viagem à 
Europa, ajudado por subscrições de estudantes, alguns 
amigos da colônia alemã, alguma pessoas da Província 
de Alagoas. Embarca com um dos seus filhos no piquete 
Alagoas, com destino inicial ao Rio de Janeiro, no dia 
18 de março de 1889. No dia seguinte, como piorara, 
nem podia ler e nem escrever. Assim, alternando ligeiras 
melhoras, com pioras cada vez mais irreversíveis, 
Tobias Barreto morreu na noite de 26 de junho. 
A sua morte comoveu o Recife e enlutou o 
Nordeste todo. Estava em silêncio aquele que dera ao 
Brasil o direito de pensar por si, e de buscar construir 
um futuro para o seu povo. A morte era o final triste de 
uma vida criadora. Sentida por muitos, mas esperada e 
até mesmo antecipada, nos jornais, por outros, que não 
tendo como refutar as idéias queriam a liquidação física 
do mestre. Esses mesmos, tomados de estranha atitude, 
espalham pelas ruas e pelos jornais a reconciliação de 
Tobias, no leito de morte, com a Igreja. Falam em 
confissão, e até mesmo um padre – João Vaessen – 
lazarista do Convento das Missões, em Fortaleza, 
Ceará, dissera anos mais tarde que “confessou e 
ministrou a comunhão a Tobias Barreto.” Em julho de 
 31 
1939, quando do Cinqüentenário da Morte de Tobias, 
seu filho João Barreto de Menezes foi a Fortaleza e 
colheu do velho padre a informação de que houvera 
engano de nomes no caso da confissão de Tobias 
Barreto, difundida pelos jornais brasileiros. O padre 
esclarecera, em entrevista à Agência Meridional, que 
chegara ao Brasil, procedente da Holanda, em 1897, oito 
anos após a morte de Tobias. É o próprio padre quem 
diz: “faço a questão de restabelecer a verdade. Em 1897, 
eu ainda era clérigo, não podendo confessar.” 
Dele fica, para a história, a coerência de uma vida 
de lutas, na síntese que o Diário de Pernambuco, em 
1939, traçou-lhe: “Entretanto, esse homem de poderosa 
personalidade encheu uma época e quase foi todo o seu 
tempo. Há Faculdade de Direito, pode-se dizer que o 
vulto enorme desse mestiço de talento tomava a casa 
toda. Tobias era a academia. A sua ânsia de renovação e 
de reforma dos estudos de Direito, a sua veia poética e o 
s4eu gênio oratório, tudo fazia dele um homem diferente 
dos outros. No Recife, transcorreu a parte mais brilhante 
dessa existência romântica e inquieta. Tobias foi um 
precursor e daqui fez jorrar pelo País inteiro um 
pensamento novo. Esse é, aliás, o destino heróico do 
Recife: aqui brotou a primeira idéia da República, aqui 
se venceu a batalha da Abolição, aqui se reformou a 
ciência do Direito, aqui se deu ao Brasil o que ele nunca 
possuiu: a crítica filosófica. A glória de Tobias é 
também a glória do Recife.” (26) 
 32 
O Legado de Tobias 
 
A geração de seguidores de Tobias Barreto her -
dou a mesma força de luta e esteve na vanguarda das 
grandes transformações das últimas décadas e da virado 
de século. Em seus estudos fundaram jornais, revistas, 
associações, faculdades, assumiram posturas críticas, 
públicas, como germanistas, agnósticos, anticlericais e, 
em muitos casos, amargaram a reação desmedida da 
Igreja. O alemão Carl von Koseritz, divulgador de textos 
em alemão de Tobias Barreto, em sua Koseritz Deutsche 
Zeitung, em Porto Alegre, havia sido excomungado pelo 
bispo do Rio Grande do Sul, pela publicação do livro 
Roma Perante o Século. Almáchio Dizin, na Bahia, 
sofrera igual sanção, por causa de uma obra literária. 
Fausto Cardoso, um dos diletos discípulos de Tobias, 
enfrentou, até com o sacrifício da vida, a oligarquia do 
padre Olímpio Campos, escudada em figuras originárias 
da Faculdade de Direito do Recife, co mo Coelho e 
Campos e Pelino Nobre, formados na escola do dr. Braz 
Florentino – o Ensaio Filosófico Pernambuca. (27) 
Está ainda por ser feito um inventário completo 
da seqüência de fatos culturais, a partir da geração da 
Escola do Recife. Nelson Saldanham
(28)
 Dagoberto 
Carvalho Júnior,
(29)
 Aluízio Bezerra Coutinho
(30)
 e 
Antônio Paim
(31)
 trataram, em suas obras, da influência 
da Tobias Barreto sobre a geração que depois dele 
ocupou as cátedras, redigiu os compêndios e os 
programas das Faculdades, assumiu cargos públicos, 
editou jornais e revistas, levando o Brasil a sedimentar 
 33 
as suas referências e a fazer a interface com a história 
dos outros povos. 
Os seguidores de Tobias Barreto
(32)
 herdaram a 
razão científica, como troféu da afirmação vitoriosa 
contra a espada afiada da fé, na luta mais que simbólica 
pela cultura, em seu múltiplo e infinito poder de 
transformar a natureza, em função da vida, do bem e do 
belo. 
 
 
NOTAS 
 
(1) História do Povo de Israel, Ein leitung in die Geschichte des 
Volkes Israels, por Heir inch Ewald, 8 volumes, 1864. 
 
(2) Tobias Barreto deve ter assistido ao Discurso proferido pelo 
padre Fr. Antônio da Virgem Maria Itaparica, por ocasião da 
abertura da aula de Filosofia do Seminário da Bahia, em março de 
1861. Nele o padre exorta os alunos com versos de “um 
Sapientíssimo e Santo Bispo: Quem não louva Deus, é um 
ingrato./Quem se opõe a que o louvem é realmente um monstro.” 
Em Diário da Bahia, 27 de março de 1861. 
 
(3) O padre Félix havia perdido, em 1863, concurso para a 
mesma cadeira de Latim, quando saiu vencedor Joaquim José 
Henrique da Silva. 
 
(4) Verso do poema “À vista do Recife”, de 1862, o primeiro dos 
grandes poemas patrióticos de Tobias Barreto, publicado em Dias e 
Noites, edição de 1881 e seguintes.(5) Carta de 13 de setembro de 1880. 
 
(6) Memória Histórica Acadêmica, 1857, pelo professor José 
Antônio de Figueiredo. 
 
 34 
(7) Memória Histórica Acadêmica, 1861, pelo professor João 
Capistrano Bandeira de Melo Filho, Recife, 1862. 
 
(8) Memória Histórica Acadêmica, 1863, pelo professor Antônio 
Vasconcelos Menezes de Drummond. Recife, 1864. 
 
(9) O nome do padre Joaquim Graciano de Araújo é também 
grafado, por alguns autores, como Joaquim Graciano de Araújo. 
 
(10) Ver Ensino, Jornalismo e Missões Jesuíticas em Pernambuco, 
por padre Ferdinand Azevedo, FASA, Recife, 1983. 
 
(11) Revista Mensal de Instrução Pública de Pernambuco. Recife, 
1872. 
 
(12) Trata-se da Declaração do Autor, no livro Lições de Filosofia 
Elementar, Racional e Moral. Paris, 1871. 
 
(13) Sobre o livro de Soriano, Tobias escreveu três artigos, sob o 
título de “O Atraso da Filosofia entre Nós”, publicados no Jornal 
do Recife, nos dias 20 de julho, 3 de setembro e 18 de novembro de 
1872. 
 
(14) Francisco Muniz Barreto de Aragão, parente de Tobias, era 
diplomado em Direito e em Filosofia pela Universidade de 
Heidelberg, e foi grande propagandista da cultura alemã, através 
dos jornais O Monitor, Diário da Bahia, Gazeta da Bahia, Diário 
de Notícias e Jornal de Notícias, com artigos sobre filosofia, 
crítica, política, finanças, economia política e literatura, além de 
publicar Das Verfassungs – Wesen in Brasilien. Francisco Muniz 
Barreto de Aragão era pai do poeta Egas Muniz, o Petion de Vilar, 
professor de alemão do Ginásio da Bahia, redator da Revista do 
Grêmio Literário e considerado por Arno Philipp, redator-chefe da 
Deutsche Zeitung, como “o único escritor brasileiro que hoje 
(1903) estuda com perseverança e entusiasmo o germanismo e 
continua a obra de Tobias Barreto.” 
 
(15) Este artigo foi publicado em 1869 e é dos mais antigos 
trabalhos de Tobias Barreto. Por muito tempo figurou nas edições 
de Tobias como de 1871. 
 35 
 
(16) A Faculdade de Direito do Recife está reunindo, em estantes 
separadas, as obras de autores alemães que pertenceram à biblioteca 
pessoal de Tobias Barreto. São mais de 200 volumes, muitos dos 
quais foram citados por Vamireh Chacon em Da Escola do Recife 
ao Código Civil. Organização Simões, Rio de Janeiro, 1969, e em 
artigo do mesmo autor, na Revista Acadêmica da Faculdade de 
Direito do Recife, LXVII, 1971. 
 
(17) Os Homens e os Princípios. 1870. 
 
(18) Política Brasileira, artigos de fundo, 1870. 
 
(19) O Católico, 20 de agosto de 1870. 
 
(20) Trata-se do projeto nº 129, criando o Partenogógio do Recife, 
escola superior, profissionalizante, para moças. Em 1880, quando já 
não era deputado, o seu projeto mereceu defesa do Barão de 
Nazaré, que enfrentou a reação do médico Ermírio Coutinho, no seu 
projeto Tobias abria alternativa para, enquanto não houvesse prédio 
próprio, a escola – também chamada de Liceu para moças – 
funcionasse no Ginásio Pernambucano. O dr. Ermínio Coutinho 
considerara que esta idéia concorria para a promiscuidade, alegando 
condicionamentos climáticos que, no seu entender, fomentavam as 
paixões. Apesar da defesa do Barão de Nazaré, o projeto foi 
esmagado pela reação e terminou arquivado na Comissão de 
Instrução Pública. 
 
(21) O Meu Próprio Romance, por Graça Aranha, 1931. Também 
em Obras Completas, INL, Rio de Janeiro, 1969. 
 
(22) Discurso proferido na cerimônia de colação de grau de 
doutor em direito. 10p., Recife, 1883. Incluído, sob o título de 
Idéia do Direito, no volume Estudos de Direito-1, das Obras 
Completas – Edição Comemorativa. O termo Monismo, explicitado 
por Tobias no discurso, não foi convenientemente compreendido. 
Mais do que a sua força – como sinônimo de materialismo 
científico, que impor6ta sublinhar para realçar a posição 
progressista de Tobias Barreto e dos integrantes da Escola do 
Recife que adotaram o Monismo, discutiu-se as diversas correntes 
 36 
monistas, e seus líderes, como principalmente Ernest Haeckel e 
Ludwig Noiré, sublimando a essência doutrinária do conteúdo do 
termo. O Monismo não era um eufemismo vazio, mas uma 
afirmação categórica dos que escapando das rédeas do controle 
clerical abraçavam o materialismo científico, como o fez, com 
clareza, Tobias, seguido por Fausto Cardoso. A concepção 
materialista explica, de algum modo, o fato de o fundador da Escola 
do Recife ter passado ao largo das discussões sobre a Bíublia, de 
fundo protestante, e sobre a Questão Religiosa, de fundo maçônico. 
 
(23) Menores e Loucos em Direito Criminal; estudo sobre o artigo 
10 do Código Criminal Brasileiro, Rio de Janeiro, Laermmert, 
1884. 
 
(24) Compêndio Elementar de Gramática Nacional, por J. A. de 
Castro Nunes. Livraria Francesa, I. W. Medeiros, Pernambuco, 
1883. Nova edição reformada e muito melhorada pelo dr. Tobias 
Barreto de Menezes. 
 
(25) Resumo de Gramática Latina ou arte explicatória das regras 
indispensáveis nos estudantes de latim, pelo padre Félix Barreto de 
Vasconcelos (obra póstuma), com um prólogo e notas do dr. Tobias 
Barreto de Menezes, Livraria Francesa, Recife, 1889. 
 
(26) Diário de Pernambuco, 8 de junho de 1939. 
 
(27) O Ensaio Filosófico Pernambucano era, ao mesmo tempo, 
nome de uma sociedade e de um periódico, científico e literário, 
que no nº 6, de julho de 1860, publica artigo de Seve Navarro, A Fé 
e a Razão, que começa dizendo: “Renegando o homem a fé para 
integrar-se livre, absoluta, e exclusivamente a sua razão e reflexão 
privada, jamais poderá chegar à verdade duma maneira fácil, 
infalível e sem mancha de erro; portanto ele tem necessidade para 
assenhorear-se da verdade, esta luz medianeira entre o espírito e a 
coisa, de abraçar a fé naquilo que lhe for superior, e que a sua vista 
não puder atingir, a fim de que coligando-se à crença e prestando-
lhe um assentimento forte, inabalável e consciencioso, possa 
aportar são e salvo ao porto da verdade.” 
 
 37 
(28) A Escola do Recife, Nelson Saldanha, 2ª edição, Editora 
Convívio/INL/Fundação Pró-Memória, 1985. 
 
(29) A Escola do Recife, Reflexos no Piauí, Dagoberto Carvalho 
Jr., Revista Presença, Ano IV, nº 9, outubro/dezembro, 1983. 
 
(30) A Filosofia das Ciências Naturais na Escola do Recife, por 
Aluízio Bezerra Coutinho. Editora Universitária da UFPE, Recife, 
1988. 
 
(31) A Filosofia da Escola do Recife, Antônio Paim, Editora 
Convívio, São Paulo, 1981. 
 
(32) Tobias Barreto e seus Seguidores, Luiz Antônio Barreto, série 
de 9 artigos, publicados na Gazeta de Sergipe, de 4 a 22 de março 
de 1989. Vide, também, Nova Missão Tobiática no Recife, Por Luiz 
Antônio Barreto, série de 13 artigos. Gazeta de Sergipe. 
 
 38 
NOTAS COMPLEMENTARES ÀS POLÊMICAS 
SOBRE RELIGIÃO 
 
 
POLÊMICA COM O CATÓLICO 
 
 
Tobias Barreto participava, a partir de 1868, da 
agitação em torno de temas religiosos. Cria e participa 
de redação de diversos jornais, como A Regeneração, O 
Vesúvio, Correio Pernambucano, Jornal do Recife, O 
Liberal, A Crença, que juntamente com A Consciência 
Livre, jornal que antecedeu a O Americano, abre uma 
verdadeira campanha contra a Igreja católica. Alguns 
assuntos dominam as sessões literárias, as colaborações, 
as publicações solicitadas. Possivelmente a chegada dos 
jesuítas “como operários da educação da mocidade”, a 
partir de 1866, dava nova conformação às discussões 
religiosas. Mas é a partir de 1869, com o grande debate 
em torno da negativa do bispo Cardozo Ayres de 
conceder sepultura ao general Abreu e Lima, que as 
opiniõesse dividem e os debates se tornam apaixonados. 
A autoridade eclesiástica resolveu punir Abreu e Lima 
que, também pela imprensa, havia mantido uma 
polêmica com alguns padres, entre eles o monsenhor 
Pinto de Campos, sobre as Bíblias falsas, negando-lhe 
sepultura no Cemitério de Santo Amaro. Os ingleses 
permitiram o sepultamento no cemitério que tinham no 
Recife, mas a questão mereceu longa discussão pelo 
Jornal do Recife. Em 1870, repercute no Recife a 
 39 
notícia de que os gabinetes europeus, entre os quais 
figuravam os da França, Itália, Inglaterra, Rússia e 
Espanha, fizeram chegar ao Vaticano uma nota 
declarando ao Santo Padre que o dogma da 
infalibilidade papal não seria admitido e que deixava 
com Pio IX toda a responsabilidade pelo que produziria 
a promulgação do novo dogma. A Igreja, reunida em 
Concílio, aprovou, na terceira sessão, em 24 de abril de 
1870, pela vontade unânime de 667 padres, a 
Constituição dogmática da fide catolica. Aparece no 
Jornal do Recife, assinando artigos intitulados “Resumo 
Histórico do Desenvolvimento da Supremacia dos 
Papas”, para servir de introdução ao estudo da questão 
da sua infalibilidade, ao lado de “O Jesuitismo En tre 
Nós”, do mesmo jornal. O Americano, com os artigos de 
crítica religiosa de Tobias Barreto, participa desse 
momento de agitação, que bem pode ser testemunhado 
pela carta enviada a Tobias por Antônio dos Santos 
Pontual, datada do Engenho Cabeça de Negro, Escada, 
de 11 de agosto, que entre outras coisas diz: “Apesar de 
minha pouca capacidade para apreciar o estilo útil de 
que usa o dito jornal, e que muito nos convém, para 
algum dia sairmos deste estado de jesuitismo que nos 
acabrunha, com tudo declaro que é o jornal de que mais 
tenho gostado.” Logo o jornal O Católico não tinha 
apenas O Americano, e nem somente Tobias Barreto, 
para se preocupar. O Conselheiro Autran, Diretor do 
Jornal, mantinha uma seção – “Crônica dos Disparates” 
– na qual refutava as críticas dos diversos jornais. E 
mais uma vez se valeu desse espaço para combater as 
 40 
idéias de Tobias Barreto. Os textos que vão aqui 
reproduzidos seguem a cronologia e a ordem com que 
apareceram nos jornais, para melhor proveito dos 
leitores. As notas de O Católico começam em 28 de 
agosto de 1870. 
 
Sobre um Escrito de A. Herculano 
 
A publicação deste ensaio no Liberal, a partir de 
3 de julho de 1873, gerou uma ligeira polêmica de 
Tobias com Franklin Távora, que, assinando Lessingh, 
no Diário de Pernambuco, investe contra o germanismo 
do sergipano, em artigo de 19 de julho, recebendo 
respostas em 27 de julho, pelas páginas de O Liberal: 
Tobias ao dito Lessing do Diário de 19 do corrente. 
Mais tarde, em 1879, o ensaio merece de Artur Leal, no 
seu Impressões Acadêmicas – ensaios Críticos (Tipo-
grafia do Correio da Noite, Recife, 1879) o seguinte 
comentário, à página 20: “O distinto alemão Tobias 
Barreto, envenenado pelo fel do seu pessimismo, qual 
D. Quixote de lança em riste, arremete contra Portugal, 
apedreja sua literatura, corre os seus literatos, e por 
último põe fogo no feudal castelo de um Alexandre 
Herculano.” É desta mesma época, da publicação do 
ensaio, 1873, que datam os primeiros comentários 
críticos contra o germanismo de Tobias. No Culto às 
Letras Albino Meira faz crítica, recebendo forte 
reprimenda de Sílvio Romero, através de O Liberal, 
ainda quando assinava Sílvio da Silveira Ramos. Sílvio, 
conterrâneo e discípulo, além de enaltecer Tobias aponta 
 41 
as ligações do sergipano com os cultores do direito, da 
filosofia, da crítica religiosa, aí aparecendo o autor da 
História do Povo de Israel. 
 
Sobre David Strauss 
(Um Fragmento Biográfico) 
 
Artigo de maio de 1874, incluído no livro Ensaios 
e Estudos de Filosofia e Crítica, edição de 1875. O 
primeiro livro de Tobias Barreto sofreu pesada crítica de 
Albino Meira, escondido sob o pseudônimo de O 
Carvoeiro, na revista acadêmica Culto às Letras. Apesar 
de tratar apenas de um dos artigos do livro – 
“Socialismo em Literatura” – o crítico investe contra 
Tobias, perguntando “com que direito um tribunal 
composto de materialistas julgaria um autor espi-
ritualista?” Não, em sua resposta, insinua que Albino 
Meira estava a serviço de um “dr. filósofo que me 
odeia”, possivelmente referindo a José Soriano de 
Souza. Convém anotar que Albino Meira, à época, era 
presidente da União da Mocidade Católica e redator do 
jornal O Estudante Católico. Logo, havia razão 
ideológica para as críticas, pelo Culto às Letras, 
respondidas por Tobias em A Província, de 24 e 29 de 
agosto de 1875. Em compensação, Strauss, que por 
muito foi lido e seguido por protestantes, terminou 
redescoberto pelos católicos, especialmente depois da 
Encíclica Divino Afflante Spiritu, de 1943, de Pio XII. E 
Tobias Barreto, que fez a síntese biográfica do autor de 
A Vida de Jesus, que teve tradução francesa do 
 42 
positivista Littré, no ano de sua morte, está sendo 
lembrado no prefácio do padre José Nogueira Machado 
ao livro Cristo Nasceu em Belém, do padre Victor 
Notter, que vive em Taiwan, na China, justamente pela 
compreensão que teve e pela divulgação que fez de 
Strauss. 
 
Polêmica com a Civilização 
 
O discurso pronunciado por Tobias Barreto, numa 
colação de grau, em abril de 1883, levou a que o jornal 
religioso A Civilização, editado em São Luiz, Maranhão, 
levantasse um escudo de proteção e de defesa do 
Catolicismo e de tudo o que dele decorria em termos de 
controle da informação, da educação e da cultura. O 
discurso de Tobias abrira mais uma clareira entre os 
jovens nordestinos que estudavam no Recife e obteve, 
de imediato, grande repercussão, sendo publicado em 
jornais e avulso. No Maranhão coube ao jornal O País, 
dirigido por Temístocles Aranha, pai de Graça Aranha, 
então aluno de Tobias, divulgar o discurso no 
Maranhão, merecendo pronta resposta da Civilização. 
Três pessoas – o padre Raimundo Alves da Fonseca, o 
monsenhor João Tolentino Guedelha Mourão e o poeta 
Euclides Farias – comandaram a reação a Tobias, 
produzindo textos que variaram da defesa de princípios 
até a ofensa pessoal, eivada de preconceito racial, como 
está na série de Cartas ao Pai Tobias, em versos por 
Euclides Farias, sob o pseudônimo de Lourenço Gomes 
Furtado. Os artigos da Civilização, que começaram a 
 43 
sair em 7 de julho de 1883, foram reproduzidos no 
Diário de Pernambuco, palco da polêmica, a part ir de 3 
de agosto. Antes, em 28 de julho, alguém, que poderia 
ser o próprio Tobias, sob o pseudônimo de Baur, 
desagrava o fundador da Escola do Recife, com um 
longo artigo intitulado O dr. Tobias Barreto de Menezes 
e a Civilização do Maranhão. No dia 8 de agosto, 
Tobias comparece ao Diário de Pernambuco com o 
artigo “Os Teólogos da Civilização”, e leva, até final de 
outubro, a polêmica com a Civilização e com adeptos 
pernambucanos, como Antônio de Siqueira Carneiro da 
Cunha, que se assinava Hunger, produzindo, para 
resposta direta e indireta, os seguintes termos, 
publicados no Diário de Pernambuco, na seguinte 
ordem: “Os Teólogos da Civilização” (8.8), “Teoria do 
Peruísmo ou Filosofia do Peru” (11.8), “Ao Sacerdos 
Pernambucensis” (14.8), “Ainda os Sacerdos 
Pernambucensis” (17.8), “O Doutor Hipnótico” (17.8), 
“O Almocreve Padre Joaquim de Albuquerque” (7.9), 
“Uma Nova Contribuição à Filosofia do Peru” (8.9), 
“Um Esclarecimento” (11.9), “Ensaio de Pré-história de 
Literatura Clássica Alemã”-I (12.9), “Ensaio de Pré-
história de Literatura Clássica Alemã” -II(15.9), “Ainda 
o Padre do Maranhão” (18.9), “Ensaio de Pré-história de 
Literatura Clássica Alemã”-III (21.9), “Os Decotes da 
Bíblia” (23.9), “Ensaio de Pré-história de Literatura 
Clássica Alemã”-IV (27.9), “Declaração” (2.10), 
“Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã” -V 
(4.10), “Que Padre Danado” (5.10), “Ensaio de Pré -
história de Literatura Clássica Alemã” -VI (7.10), 
 44 
“Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica Alemã” -
VII (9.10), “Ensaio de Pré-história de Literatura 
Clássica Alemã”-VII (10.10), “Ensaio de Pré-história de 
Literatura Clássica Alemã”-IX final (11.10), “É 
Mentira” (13.10), “Um Capítulo da História da 
Renascença-Leão X” (13.10), “Um Capítulo da História 
da Renascença-Leão X”-II (14.10), “Uma Pequena 
Excursão no Domínio da Teologia” (16.10), “Um 
Quadro da Igreja Romana – Vitória Accoramboni”-I 
(21.10), “Um Quadro da Igreja Romana – Vitória 
Accoramboni”-II (23.10). Para tornar mais com-
preensível o embate intelectual travado por Tobias 
Barreto contra os padres e agregados do jornal 
Civilização é que se reúne os textos, publicando -os pela 
ordem de saída no Diário de Pernambuco. Não apenas 
os textos de Tobias, mas também os textos dos seus 
opositores, republicados no mesmo Diário. 
 
 45 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TOBIAS BARRETO E 
 
 A CRÍTICA 
 
 46 
 
Toda a obra de Tobias Barreto é de crítica, ainda 
quando, ao modo de Kant, formula teorias, indica 
caminhos, questiona roteiros estéticos, ou valores 
éticos, ou ainda compromissos ideológicos. O manejo da 
crítica em toda a obra tobiática equivale ao efeito 
caleidoscópico da sua coerência como um bom juiz de 
valores, um perspicaz observador diante das expe -
riências, com capacidade para distinguir uma das outras, 
e um experimentador ousado, atributos que combinam 
com a idéia das qualificações do crítico, segundo J. A. 
Richards.
(1)
 
Na poesia, entendendo-a como a “expressão das 
lutas da alma humana”, o autor de Dias e Noites agitou 
as massas nordestinas no Recife, fazendo -se poeta do 
povo. A sua obra poética está repleta de profecias, de 
denúncias e de crítica. Nos jornais, anos mais tarde, é 
crítico de religião, tomando partido no Iluminismo 
alemão – o Aufklarung – que produzira dois eminentes 
vultos que passam a freqüentar os escritos de Tobias nos 
jornais pernambucanos: Immanuel Kant e Gotthold 
Lessing, pondo em evidência o poder da razão humana. 
Tão forte e entranhada é a sua crítica que a série de 
artigos Ensaio de Pré-história de Literatura Clássica 
Alemã pode ser enquadrada nos limites da apreciação 
literária, ou como exegese que faz aflorar questões 
religiosas.
(2)
 Da crítica de religião à filosofia, e desta ao 
direito, e deste à organização da sociedade, cresce o 
intérprete do seu tempo, buscando a estatura do seu 
século. 
 47 
Não deve causar surpresa, portanto, que em sua 
maioria os escritos de Tobias Barreto sejam de crítica. 
Sejam recensões, no sentido típico da palavra, 
anunciando a obra ou o espetáculo, discutindo o assunto 
e fazendo a apreciação dos seus méritos e defeitos. 
Sejam as animadversões, com suas censuras. Sejam 
ainda, como ele próprio o diz, “quase sempre um 
trabalho, não por assim dizer de fisiologia, mas de 
anatomia literária”, (3) considerando a crítica como um 
estudo de cadáveres. Este tom de sarcasmo, comum em 
Tobias, remete ao fato comum de que a crítica, na 
literatura brasileira, tem uma função post-mortem. O 
trabalho do crítico se confunde, então, com o de um 
arqueólogo, em permanente investigação do passado. 
Não raro, a crítica literária tem sido produzida a 
posteriori, já na distância do tempo entre a obra e o 
público. Por outro lado, há uma crítica geralmente feita 
pelos próprios criadores, abrindo caminho à compre-
ensão das obras literárias. Assim foi com o Modernismo 
de 1922, com a Geração de 45, com o Concretismo, de 
1956, e com o Poema-Processo, em 1965. A crítica 
revelou-se desaparelhada para compreender o sentido 
renovador da estética nova dos modernistas, dos 
concretistas e de outros grupos da vanguarda literária do 
País. O Brasil guarda os textos históricos, manifestos e 
ensaios, produzidos pelos poetas, e ao mesmo tempo 
críticos, dos movimentos, muitos dos quais se tornaram 
também intérpretes da vida literária do País, como os 
Mário de Andrade, Augusto e Haroldo de Campos, 
Décio Pignatari, Wladimir Dias Pino. 
 48 
Tobias Barreto foi um crítico do seu tempo, como 
tinha sido um poeta engajado nas lutas da sua fase 
estudantil. Combateu o ars gratia artis que animava a 
muitos escritores do século, e estabeleceu uma longa 
discussão entre o romantismo, de França e Portugal, e o 
germanismo. Esse debate, presente em toda a obra 
crítica do pensador sergipano, é a chave da melhor 
compreensão das posições assumidas pelo fundador e 
pelos integrantes da Escola do Recife, uma espécie 
mesmo de marca registrada, que se constituiu na mais 
renovadora contribuição ao pensamento brasileiro, na 
segunda metade do século passado e que levou Graça 
Aranha, um dos modernistas, a declarar que Tobias 
emancipou, intelectualmente, o Brasil.
(4)
 
Não ficou assunto, ainda que fosse árido, que não 
merecesse uma abordagem crítica por parte de Tobias 
Barreto, nos jornais recifenses, nos seus pequenos 
periódicos de Escada, ou nas preleções e discursos, 
transformados em veículos de vulgarização cultura. Até 
mesmo sua passagem pela Assembléia Provincial, como 
deputado liberal, serviu para informar aos seus pares das 
suas leituras científicas sobre a mulher. O poder crítico 
de Tobias é algo que ainda falta ser dimensionado, 
porque a leitura de sua obra sempre revela ângulos 
novos, informações e contribuições singulares, apre -
ciações originais, que dão grandeza ao ofício jor-
nalístico do trato recensor. 
É possível, então, levantar-se o itinerário do 
pensamento brasileiro, na segunda metade do século 
assado, a partir da obra de Tobias Barreto. Não apenas 
 49 
naquilo que ele operou de transformação, a par tir dos 
seus contatos com autores alemães e com a própria 
língua de Kant, mas também na fixação das idéias 
dominantes, dentro e fora da velha Faculdade de Direito 
do Recife, que foram objeto da crítica tobiática. Mais 
importante se torna esse inventário intelectual, quando 
se sabe, com certeza, que a discussão ditou dois corpos 
distintos em peleja: o dos professores, intelectuais de 
formação religiosa, tradicionalistas, ultramontanos, de 
um lado, e a mocidade, formada por estudantes, 
jornalistas, maçons, liberais, do outro. Tobias é a grande 
figura que desfralda aos ventos nordestinos do Recife a 
bandeira dos novos tempos, com a essência das novas 
idéias, que espalharam rápido as teorias européias, 
principalmente alemãs, da ciência, em oposição aos 
dogmas e compromissos da fé. 
Como escritor e como crítico Tobias fundava suas 
convicções no avanço da ciência e da arte, como asas do 
espírito humano. Circunscrevendo o seu entendimento, a 
filosofia prima entre as ciências e a poesia entre as 
artes. Daí sua crença de que os poetas e os sábios devem 
ser iguais. No âmbito menor da discussão, Tobias chega 
a afirmar que os padres são, em geral, inimigos da 
poesia, porque eles gostam do culto da morte, enquanto 
a poesia é liberdade e liberdade é vida. Na projeção 
maior, ideológica, Tobias Barreto chega a citar, em 
1872, diversos exemplos das mudanças sociais e po -
lít icas da Europa, graças ao poder dos romances que 
propagaram, por exemplo, as idéiasanarquistas. Na 
esteira da mesma discussão, lembra que a França 
 50 
moderna possuía um idioma compacto, resultado da 
autoridade e da concentração literária, ao lado da 
autoridade e da concentração política, que dificultava a 
expressão intelectual, de criação, para ele comum na 
Alemanha, onde o “ato de escrever é sempre, mais ou 
menos, um ato criador.” 
Em 1875, passando uma vista ampla e demolidora 
por sobre a vida intelectual brasileira, pugna por uma 
“Internacional de Crítica”, citando, pela primeira vez, 
Karl Marx.
(5)
 Seu trabalho mereceu forte reação por 
parte de Albino Meira, na revista Culto às Letras. 
Tobias Barreto reduziu a reação de Albino Meira a duas 
ou três páginas de resposta, mas acompanhou com todo 
o interesse a polêmica entre Sílvio Romero, que então se 
assinava Sílvio da Silveira Ramos, e o redator do Culto 
às Letras. Essa não fora a única fonte das discórdias de 
Tobias Barreto no mundo cultural pernambucano. Suas 
críticas a Alexandre Herculano e a outros autores 
portugueses, aos tomistas e neotomistas, tiveram o 
mesmo efeito provocador que os seus estudos alemães, 
publicados a partir de 1874 no jornal escadense Um 
Signal dos Tempos. 
Para Tobias a “Internacional de Crítica” deveria 
ser uma espécie de fórum, de espíritos cultos e 
independentes, ao qual seriam submetidas “todas as 
obras frívolas, que têm firmado a reputação de certos 
vultos em Portugal e Brasil.” Para ele, os escritos que 
fossem publicados deviam ser enviados para análise 
imparcial dos homens competentes, onde receberiam o 
placet ou o não presta. Arremata Tobias: “Destarte, à 
 51 
face do mundo inteiro, e sem abalos de ordem alguma, 
poríamos fogo no castelo feudal de um Alexandre 
Herculano; deitaríamos por terra a vila senhoril de um 
José de Alencar, e tantos outros enfatuados de uma 
nomeada toda local...” (6) 
Com a crítica e pela crítica Tobias Barreto 
marcou sua presença na luta intelectual que travou em 
Pernambuco, de 1862 a 1889, deixando em todos os seus 
escritos o traço inquieto do investigador, do intérprete, 
do pensador, revelando e abrindo caminhos ao futuro. 
 
A Licenciatura 
 
Para Tobias, literatura tinha a significação de 
vida espiritual. Contrariando os conceitos vigentes, que 
limitavam a literatura ao poema e ao romance, ele 
aprofunda a questão, ainda em 1872, numa nota de 
crítica ao livro do dr. José Soriano de Souza.
(7)
 Sendo, 
como Tobias assim a entendia, a literatura uma 
estatística aprofundada de todas as produções inte-
lectuais de um País, em uma época dada, são 
incorporadas, com suas valorações próprias, a ciência, a 
filosofia, a poesia, o teatro, o romance, e até a pintura e 
a música. Diz Tobias: “Assim se compreende na 
Alemanha, onde os livros ou tratados de literatura nos 
dão a conhecer não só Goethe e Schiller, como Kant e 
Hegel, não só Freytag e Stiffer, como Strauss e Baur, 
não só Beethoven e Mozart, como Cornelius (pintor), 
etc., etc.” (8) 
 52 
A vastidão do quadro literário, segundo a 
aprendizagem alemã de Tobias Barreto, explica seus 
vôos de longo alcance sobre obras e autores que 
trataram de Religião, como Ewald, de Filosofia, como 
Kant, de Educação, como Frederico Diesterweg, de 
Cultura, como Júlio Froebel, de Psicologia, como 
Eduardo von Hartmann, de Economia Política, como 
Karl Marx, de Antropologia, como Hermann Post, de 
Direito, como Rudolf Von Jhering, de Psicologia 
Feminina, como Adolfo Jellinck, e de tantos e tantos 
outros temas que interessaram e moveram a sua 
curiosidade crítica. Está, portanto, decodificado o facho 
luminoso que Tobias lançou sobre o seu tempo e seus 
contemporâneos: o amplo espectro da sua crítica, 
correspondente ao corpus cultural objeto do seu 
interesse. 
Vocacionado para a crítica, menospreza o livro de 
Ferdinand Wolf
(9)
 e não poupa, sequer, seu amigo, 
conterrâneo, e parceiro Sílvio Romero, quando publica a 
História da Literatura Brasileira.
(10)
 A obra de crítica 
literária de Tobias supera, em muito, as informações e 
inventários de época, ainda que alguns, como o próprio 
livro de Sílvio Romero, preencham lacunas na 
bibliografia brasileira. Não causa espécie, por isso 
mesmo, que os críticos brasileiros e portugueses, 
lançando os olhos sobre a literatura, isolem Tobias, 
negando-lhe as qualidades de escritor e de filósofo. O 
Brasil Mental, de Bruno,
(11)
 é um exemplo que 
proliferou, lá e cá, como uma posição sobre o mulato 
sergipano. Ainda que tenha testemunhado, apaixo -
 53 
nadamente, sobre a genialidade de Tobias, Sílvio 
Romero faz menor a poética condoreira, divide a 
primazia do germanismo, e assume posturas de outras 
escolas, contradizendo a evolução intelectual do mestre. 
Mais que isto, Sílvio faz de Tobias, não raro, um 
escudo, com o qual enfrenta as rivalidades fluminenses. 
Assim, torna-se comum ao historiador da literatura, ao 
apresentar Tobias Barreto aos leitores, diminuir o valor 
de outros poetas e escritores, criando dificuldades para 
o seu apresentado. Isto é visível na apreciação feita pelo 
poeta Luiz Delfino do livro Dias e Noites, em sua 
primeira edição, de 1881. No longo artigo o poeta se 
ocupa de rebater as afirmações de Sílvio Romero, 
terminando por julgar, de forma apressada, a obra em 
versos de Tobias que deveria ser o objeto da crítica. 
Sílvio Romero chega ao cúmulo de inserir, nos textos de 
Tobias, citações de nomes de forma desfavorável, como 
ocorreu num dos artigos do ensaio O Atraso da Filosofia 
entre Nós.
(12)
 
Tanto a amplitude dada à literatura, em sua 
crítica, por Tobias Barreto, quanto sua disposição de 
brigar pelas verdades que defendia, e mais a atitude 
partidária de Sílvio Romero, devem ter concorrido para 
que a obra do mestre não merecesse, no inventário da 
história e da crítica literária, o juízo justo, o exame 
correto. Fala-se mais de Tobias por ouvir dizer, do que 
mesmo pelo conhecimento de seus textos, todos eles de 
reflexão, por circunstanciais que possam parecer. Pois 
essa é uma característica permanente na obra de Tobias: 
a reflexão. 
 54 
Conceituando de forma larga e refletindo sobre 
suas leituras, Tobias construiu um monumento de 
crítica, valendo-se da ferramenta contundente que, de 
cedo, preferiu para o trabalho intelectual: o ger -
manismo. Com ele, penetra seu olhar agudo por sobre 
várias literaturas, comparando-as, identificando raízes e 
arquétipos, formas e compromissos. É pioneiro em 
estudos comparados, acreditando que “segundo o plano 
da história, que muitos chamariam de a economia 
providencial do universo, todo o povo que progride e se 
desenvolve tem uma dupla missão: ima interna e outra 
externa; uma volvida para si mesmo e outra para os 
demais povos.” (13) Daí a literatura ter, no seu entender, 
caráter universalizante. Apoiado em George Brandes, 
aprecia, comparativamente, as literaturas da França, da 
Itália e da Alemanha, tendo esta última como uma 
espécie de modelo. Será a primeira vez, no Brasil, que 
os estudos literários ganham um método, o comparativo. 
Com ele Tobias sente firmeza para explorar, com seu 
agudo espírito crítico, todo o campo intelectual. 
Citando Henrique Klenke, para quem os povo s 
são divididos em três grupos – os solares, os 
planetários, e os de transição – Tobias Barreto não 
hesita em colocar o Brasil na terceira categoria, a da 
transição, diferenciando os brasileiros dos povos 
planetários, os do lado noturno da humanidade, e dos 
solares, os do lado “diurno”. A transição é o lado 
“crepuscular” da humanidade, valendo para os povos

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