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ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. LEUCEMIA MIELOIDE AGUDA NO ADULTO Curso de Medicina – Seminário Integrador III Universidade Federal da Fronteira Sul – PF/RS Maria Alice De Costa Ferro BASES MOLECULARES DAS NEOPLASIAS HEMATOLÓGICAS ALTERAÇÕES FUNDAMENTAIS ENVOLVIDAS NA ONCOGÊNESE Em que difere uma célula normal de uma célula neoplásica? Esta última não responde aos mecanismos regulatórios da proliferação, apoptose e senescência celular. As alterações adquiridas pela célula ao longo do processo de transformação maligna contribuem para a evasão da regulação. Essas alterações adquiridas pela célula têm como base mudanças genéticas ou epigenéticas (mudanças no genoma funcional que não alteram a sequência de nucleotídeos do DNA). (ZAGO et al., 2013, p. 269) Alterações fundamentais envolvidas na oncogênese: Fonte: ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. 2 RESISTÊNCIA ADQUIRIDA A SINAIS INIBITÓRIOS DA PROLIFERAÇÃO CELULAR Alterações genéticas do clone maligno que afetam genes que codificam proteínas que regulam etapas do ciclo celular. Ciclo celular é o intervalo entre cada divisão celular; composto de 4 fases (G1, S, G2 e M). O controle do ciclo é feito basicamente em G1 por meio de uma rede de proteínas. Uma vez iniciado o ciclo, sua regulação se dá em momentos de pausa da atividade metabólica: os checkpoints. O que se faz nesses checkpoints? Se verifica: a fidelidade da duplicação da informação genética e a partição e duplicação adequada dos cromossomos para as células filhas. Se houverem falhas, nos checkpoints poderão ser reparadas. (ZAGO et al., 2013, p. 269) Uma das proteínas essências que regula o ciclo celular é a proteína nuclear do Retinoblastoma (Rb) codificada pelo gene Rb. Se a proteína estiver ativa (hipofosforilada), ela conterá a progressão das células da fase G1 para a fase S; se estiver inativa (hiperfosforilada) (quando as células forem estimuladas por fatores de crescimento), permitirá que a célula vença o checkpoint. Existem outros fatores como E2A, CDK4, CDK6 e E/CDK2 que regulam o gene Rb. Então podemos ter: Deleções ou mutações do gene Rb pouco comuns nas neoplasias hematológicas Anormalidades da via transcricional ciclina-Rb-E2A mais frequente nas neoplasias hematológicas Ex.: inativação homozigótica do gene p16, que codifica a proteína que inibe a cinase 4, exercendo efeito similar à perda de ambas as cópias de Rb, ou seja, sem p16, CDK4 perde sua regulação negativa (inibitória), passando a fosforilar descontroladamente Rb (ou seja, sua forma inativa), achado comum na leucemia linfoide aguda. (ZAGO et al., 2013, p. 270) ESCAPE DA VIGILÂNCIA IMUNOLÓGICA Escape por quê? Porque o desenvolvimento de tumores geralmente está associado à expressão de novos Ag ou ao aumento anormal da expressão de Ag habituais, o que poderá induzir uma resposta do sistema imune. Então é “lógico” que o tumor crie mecanismos de escape. (ZAGO et al., 2013, p. 210) Existem ao menos 5 mecanismos pelos quais o tumor pode evadir a vigilância imunológica: - Eliminação das células efetoras por meio da expressão pelas células tumorais de ligantes indutores de apoptose (Ex.: ligante de Fas {Fas-L}) - Indução de tolerância pelo tumor nos linfócitos T reacionais. - Expansão e/ou estimulação de células T regulatórias, que possuem ação inibitória sobre a resposta imune (linfócitos que são ditos regulatórios e estão envolvidos na inibição de fenômenos autoimunes). - Indução de falha no reconhecimento do tumor por células T reativas por meio da separação física entre os dois tipos celulares (células tumorais ficariam em lugares inacessíveis aos linfócitos efetores). (ZAGO et al., 2013, p. 271) - Indução de tolerância por meio da apresentação cruzada de Ag tumorais por células apresentadoras de Ag da medula óssea. (ZAGO et al., 2013, p. 272) MULTIPLICAÇÃO INDEFINIDA (RESISTÊNCIA À SENESCÊNCIA) Células humanas primárias não podem ser propagadas de forma ilimitada. Após várias divisões há a senescência celular, caracterizada pelo bloqueio da divisão, seguida de morte celular. 3 A senescência celular é “regulada” pelos telômeros: seu encurtamento desencadeia a senescência; seu alongamento a “perpetuação”, a progressão da divisão. O comprimento do telômero depende do equilíbrio entre o atrito e o alongamento. Atrito: ocorre à medida que a célula se divide e induz o encurtamento. Alongamento: é modulado em grande parte pela enzima telomerase, que adiciona sequências de repetição nas extremidades dos cromossomos. (ZAGO et al., 2013, p. 272) ALTERAÇÃO DA RESPOSTA INFLAMATÓRIA Nos tecidos saudáveis a inflamação é autolimitada e depende da regeneração tecidual, resposta imunológica contra patógenos e cicatrização. Porém a inflamação crônica poderá promover o crescimento tumoral por meio do estímulo à proliferação celular, resistência à apoptose, indução de angiogênese e formação de metástases. Secreção de algumas citocinas e quimiocinas, ação das espécies reativas de oxigênio e ativação de alguns fatores transcricionais contribuem para a progressão tumoral associada à inflamação. (ZAGO et al., 2013, p. 272) AQUISIÇÃO DE HABILIDADE INVASIVA E DE PRODUZIR METÁSTASES Para um tumor produzir metástases, existem etapas para que ele consiga se disseminar: - invasão do tecido circunjacente e mobilidade local - circulação pelo sangue ou linfa mediadas por várias substâncias e fatores - ancoragem em um tecido distante e extravasamento - crescimento nesse novo ambiente (ZAGO et al., 2013, p. 272) ANGIOGÊNESE Formação de novos vasos a partir de vasos pré-existentes. É um processo com múltiplas etapas regulado por diferentes moléculas em cada uma dessas etapas. (ZAGO et al., 2013, p.273) INSTABILIDADE GENÔMICA Existem sistemas que vigiam a integridade do nosso DNA, compreendendo famílias de genes, uns capazes de reparar anormalidades que envolvem grande extensão de material genético, outros atuam em lesões que compreendem um pequeno número de nucleotídeos. Esses genes, sob formas mutadas, predispõem a neoplasias. Exemplo de genes que fazem pequenos reparos no DNA: MSH2, MLH1, PMS1, BRCA1, BRCA2. Mutações nesses genes podem levar as células a acumular erros no DNA a cada divisão celular, resultando na aquisição de mutações ativadoras de oncogenes ou inativadoras de genes supressores de tumor. Um grupo de doenças autossômicas recessivas associadas a sistemas diferentes de reparo de DNA está implicado na origem de doenças hematológicas. Ex.: Síndrome de Bloom, ataxia-telangiectasia e anemia de Fanconi apresentam grande suscetibilidade para o desenvolvimento de leucemia mielóide aguda. (ZAGO et al., 2013, p. 274) RESISTÊNCIA À APOPTOSE A apoptose permite a eliminação de células que perderam a função ou que vão ser substituídas por outras, e aquelas que sofreram lesões sutis que impeçam sua viabilidade. A apoptose é uma mecanismo que envolve a ação coordenada de genes pró-apoptóticos e ativação de uma cadeia de enzimas (caspases) que degradam o DNA. Exemplo de gene antiapoptótico bel-2. Aumentos desse gene são observados em linfomas não Hodgkin. 4 A família bel possui genes pró-apoptóticos (bax, bel-xS, bad) e antiapoptóticos (bel-2, bel-xL), que é regulada pelo gene p53. A ativação de p53 aumenta a expressão de bax, o que supera o efeito antiapoptótico de bel-2. O gene p53 é o alvo mais comum de aberrações estruturais nas neoplasias humanas. Diversas funções já foram identificadasassociadas a esse gene, mas uma das mais importantes refere-se à vigilância do ciclo celular e controle da apoptose. Em condições fisiológicas sua meia-vida é curta, ou seja, ao contrário da proteína Rb, p53 não tem participação no ciclo celular normal. Porém, quando o DNA é lesado (por irradiação UV ou agentes mutagênicos), os níveis de p53 aumentam, culminando na parada do ciclo celular no final de G1. Essa parada permitirá o reparo ao DNA. Se o dano for reparado com sucesso, a célula segue para a próxima etapa do ciclo celular. Se o dano for irreparável, p53 ativa genes de apoptose (pró-apoptóticos), como o bax, que conduzirá a célula à morte. (ZAGO et al., 2013, p. 275-276) Mutações no p53 levam à sua disfunção; o que gera descontrole no reparo a danos do DNA, resultando em alterações na célula. PROLIFERAÇÃO INDEPENDENTE DE ESTÍMULOS COMO FATORES DE CRESCIMENTO Proto-oncogene: genes promotores do crescimento e diferenciação celulares contraparte normal de um oncogene (sem mutação). Mutação Dominante Ganho de função Oncogene: genes mutados cuja expressão alterada estimula a proliferação celular de forma anormal. (BORGES-OSÓRIO & ROBINSON, 2013) Oncogenes codificam proteínas chamadas de oncoproteínas, as quais perdem a capacidade de ser controladas pelos seus elementos regulatórios originais e a sua atividade independe do estímulo de fatores de crescimento ou de outros sinais externos, ou seja, torna-se autônoma. Assim, a ativação de alguns oncogenes pode ser responsável pela proliferação celular independente de estímulos como fatores de crescimento (autonomia) que é característico das neoplasias. (ZAGO et al., 2013, p. 276) COMPROMETIMENTO DO METABOLISMO ENERGÉTICO Há várias alterações metabólicas induzidas por mutações em genes que podem contribuir diretamente para a oncogênese. Essas mutações, em geral, afetam a função mitocondrial. (ZAGO et al., 2013, p. 278) MECANISMOS DE LESÃO GÊNICA EM CÂNCER Certas aberrações cromossômicas estão associadas a neoplasias hematológicas. Essas aberrações podem ser: translocações cromossômicas (troca de material genético entre cromossomos não homólogos), aneuploidias (aberração no número de cromossomos; podem simplesmente representar epifenômenos no processo de transformação maligna), mutações pontuais (genes adquirem mutações pontuais na sua sequência de codificação), deleções (perda de grandes fragmentos cromossômicos; deleção provoca perda de genes supressores de tumor) e amplificações (fragmentos cromossômicos replicam-se gerando múltiplas cópias de um gene). (ZAGO et al., 2013, p. 278-280) 5 Quanto a seu papel etiopatogênico Principais métodos de detecção desta aberrações: Fonte: ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. ALTERAÇÕES CITOGENÉTICAS NAS NEOPLASIAS As anormalidades citogenéticas estão intimamente relacionadas ao processo neoplásico, representando tanto uma causa como uma consequência do tumor. As anormalidades cromossômicas pode ser: Numéricas (resulta em clones hiper, hipo ou pseudodiploides) Quanto às suas características Estruturais estáveis (translocações, deleções, inserções e inversões) Qualitativas estáveis (não são transmitidas para as células filhas) Anormalidades primárias (provavelmente possuem papel central no estabelecimento das neoplasias) Anormalidades secundárias* Ruído citogenético** * Resultantes da instabilidade do genoma da célula neoplásica, que origina novas anormalidades cromossômicas que vão se somando à anomalia primária. As anormalidades secundárias são importantes 6 depois que a neoplasia se estabeleceu, contribuindo para sua evolução, malignização e modificação da suscetibilidade terapêutica. ** Corresponde a alterações citogenéticas bizarras e bastante variáveis resultantes da instabilidade citogenética produzida pelo tumor. Diferindo das anteriores, essas anormalidades provavelmente não conferem vantagem ao tumor, pois a sua gravidade faz com que as células por elas afetadas morram rapidamente. Adicionalmente, a presença de anormalidades cariotípicas representa uma importante informação no que diz respeito ao prognóstico da doença neoplásica, à resposta ao tratamento quimioterápico e à probabilidade de cura. Em alguns casos constitui importante parâmetro de orientação quanto à escolha da abordagem terapêutica. De modo geral, nas leucemias mieloides agudas (LMA) o prognóstico é pior nos casos que exibem anormalidades citogenéticas do que naqueles em que não há alterações. (ZAGO et al., 2013, p. 281-283) ALTERAÇÕES EPIGENÉTICAS NAS NEOPLASIAS Alterações epigenéticas são alterações na expressão gênica que não são causadas por alterações diretas na sequência de nucleotídeos no DNA. Exemplificação: Gêmeos idênticos, apesar da mesma carga genética, com o passar da vida, vão apresentar modificações na expressão gênica provocados por eventos epigenéticos que buscam adaptar o indivíduo de acordo com o ambiente em que está exposto. Aberrações em mecanismos epigenéticos (metilação do DNA e modificação das histonas com remodelação dos nucleossomos), causando expressão ou repressão anômala de genes, são uma das características do processo de carcinogênese, sendo um mecanismo utilizado pelas células malignas. (ZAGO et al., 2013, p. 283) 7 CLASSIFICAÇÃO DAS NEOPLASIAS HEMATOLÓGICAS. MARCADORES. IMUNOFENOTIPAGEM. CLASSIFICAÇÃO DAS NEOPLASIAS HEMATOLÓGICAS As neoplasias hematológicas podem comprometer as linhagens linfoide ou mielóide, os macrófagos e seus precursores, ou os mastócitos. Assim diferem quanto ao quadro citomorfológico, aos aspectos clínicos, incluindo evolução e resposta ao tratamento. (ZAGO et al., 2013, p. 287) NEOPLASIAS MIELOIDES As doenças mieloproliferativas clonais resultam da mutação de uma célula progenitora pluripotencial que mantém a capacidade, embora de maneira imperfeita, de diferenciação e maturação para cada uma das linhagens mieloides. No entanto, o clone neoplásico suprime a multiplicação e a diferenciação das linhagens normais, levando habitualmente à anemia, neutropenia e plaquetopenia (trombocitopenia), que são reversíveis. Nas LMA os blastos leucêmicos podem ter características das células eritroides, monocíticas, megacariocítica ou de mieloblastos ou promielócitos. Em um grupo de LMA com anormalidades genéticas recorrentes os estudos citogenético ou molecular são essenciais para o diagnóstico. Nesses casos o diagnóstico pode ser feito com a presença de < 20% de blastos leucêmicos no sangue periférico ou na medula óssea. As leucemias agudas de linhagem ambígua compreendem um grupo que não mostram uma evidência clara de definição de linhagem, incluindo doenças que não expressam marcadores específicos de qualquer linhagem ou outras que apresentam marcadores concomitantes de mais de uma linhagem. Uma característica das doenças mieloproliferativas é a possibilidade de evolução de uma doença para outra e a presença de quadros hematológicos mistos. (ZAGO et al., 2013, p. 288) MARCADORES IMUNOFENOTÍPICOS Atualmente, numerosos antígenos foram descritos e caracterizados quanto a sua distribuição na hematopoese normal e nas diferentes neoplasias, e sua pesquisa pode ser feita por técnicas de imunocitoquímica e por citometria de fluxo. MARCADORES MIELOIDES A identificação da Mieloperoxidase (MPO), quer por citoquímica quer por imunofenotipagem, é ainda hoje o critério mais importante para a demonstração de diferenciaçãomielóide. Porém, a MPO não é expressa nos casos de LMA do subtipo M0; desse modo, para demonstrar a diferenciação mielóide (que se trata da linhagem mielóide) a detecção de MPO deve ser feita por métodos mais sensíveis ou detecção de antígenos mieloides por imunofenotipagem. CD33, CD13 e CD117 são considerados antígenos pan-mieloides devido ao fato de serem expressos pela maior parte das células da linhagem mielóide. CD14, CD64 e CD11c costumam estar associados à linhagem monocítica, e CD15 à linhagem granulocítica. Porém, existe uma grande variação na frequência desses antígenos nas LMA, por isso, deve-se associar à imunofenotipagem a expressão de outros componentes além dos antígenos. Por exemplo, a expressão de glicoforina é bastante específica para a linhagem eritroide. Do ponto de vista diagnóstico, a imunofenotipagem é fundamental para o diagnóstico da LMA minimamente diferenciada (LMA-M0), Leucemia Megacarioblástica (LMA-M7), e nas leucemias agudas de linhagem ambígua. (ZAGO et al., 2013, p. 297-298) 8 Marcadores celulares mieloides Linhagem granulocítica Fonte: ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. Linhagem monocítica Fonte: ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. 9 Linhagem megacariocítica Fonte: ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. Linhagem eritroide Fonte: ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. 10 IMUNOFENOTIPAGEM A identificação de antígenos na membrana, no citoplasma ou no núcleo da célula, pode ser feita por imunocitoquímica ou por imunofluorescência. Na imunocitoquímica é possível a avaliação imunofenotípica e morfológica ao mesmo tempo. Nessa técnica se conjuga aos anticorpos enzimas; e a reação antígeno anticorpo será identificada pela produção de compostos coloridos derivados da ação dessas enzimas sobre substratos específicos. Na imunofluorescência se faz a imunofenotipagem apenas. Nessa técnica os anticorpos são conjugados a fluorocromos, os quais, ao serem excitados por um feixe luminoso, produzem luminescência de cores diversas. (ZAGO et al., 2013, p. 298) 11 QUIMIOTERAPIA E RADIOTERAPIA. RECAÍDA, REMISSÃO E DOENÇA RESIDUAL MÍNIMA. ABORDAGEM CLÍNICA DO PACIENTE COM NEOPLASIA HEMATOLÓGICA EM TRATAMENTO Há uma série de desafios na abordagem terapêutica do paciente com neoplasia hematológica, os quais vão desde a escolha do melhor tratamento e sua administração segura até a avaliação cuidadosa da resposta terapêutica; passos essenciais para assegurar o melhor desfecho clínico. AVALAÇÃO PRÉ-TRATAMENTO – A importância do diagnóstico Antes de iniciar qualquer tratamento, é essencial proceder de forma sistemática na obtenção dos elementos clínicos, laboratoriais, radiológicos, citológicos e histopatológicos necessários para a caracterização diagnóstica da doença. Como regra geral, nenhum tratamento quimioterápico ou radioterápico deve ser administrado antes da formalização do diagnóstico. São raríssimas as exceções em que o tratamento anti-neoplásico é antecipado ao diagnóstico. AVALIAÇÃO PRÉ-TRATAMENTO – Estadiamento e outros sistemas de avaliação de risco O estadiamento cumpre diversas funções essenciais: delinear por completo a extensão da doença, e servir como roteiro para a caracterização da resposta ao final do tratamento; contribuir para a avaliação prognóstica; ajudar a definir a melhor estratégia terapêutica. Com o acúmulo de conhecimento dos últimos anos, foi possível desenvolver índices de avaliação prognóstica para as neoplasias hematológicas. Esses índices de avaliação prognóstica incorporam os fatores clínicos e laboratoriais que comprovadamente se associam com a probabilidade de sucesso ou falha do tratamento. Exemplo: nas mielodisplasias diversos índices têm sido propostos, e incluem, entre outros fatores, a porcentagem de blastos na medula óssea, o número de citopenias e a presença de alterações cariotípicas. AVALIAÇÃO PRÉ-TRATAMENTO – Avaliação da saúde geral e de comorbidades Avaliar função renal é primordial antes do tratamento quimioterápico; são feitas correções de dose de acordo com o clearance de creatinina. Avaliar a função hepática também é primordial antes do tratamento quimioterápico, uma vez que muitas drogas anti-neoplásicas sofre algum metabolismo no fígado. Uma das recomendações que existe e a correção ou mesmo suspensão de doses, sobretudo se a bilirrubina estiver elevada. Se avalia ainda a função cardíaca, a função pulmonar; primordial para o melhor desfecho clínico. AVALIAÇÃO DA RESPOSTA AO TRATAMENTO – Desfechos clínicos (definições operacionais) O objetivo inicial do tratamento quimioterápico que tenha finalidade curativa é o desaparecimento de quaisquer evidências (clínicas, laboratoriais e radiológicas) da doença. O que é denominado REMISSÃO COMPLETA. Quando a doença não apresenta resposta satisfatória ao tratamento inicial, considera-se que a doença apresenta resistência primária ao tratamento, situação indicativa de pior prognóstico. REMISSÃO COMPLETA: é uma redução extraordinária na massa tumoral, mas não equivale à erradicação definitiva da neoplasia. Muitos pacientes apresentam RECAÍDA da doença após algum tempo em remissão completa. Nas leucemias agudas, por exemplo, é necessário prosseguir com o tratamento após a obtenção da remissão completa, sob o pena de altas taxa de recaída. 12 AVALIAÇÃO DA RESPOSTA AO TRATAMENTO – Doença residual mínima Doença residual mínima é a detecção e quantificação – via, principalmente, reação em cadeia da polimerase (PCR) – de células neoplásicas remanescentes em pacientes com remissão completa. Outras técnicas empregadas são citogenética, Fish (Fluorescent “In situ” Hybridization) e imunofenotipagem multiparamétrica. Todas com sensibilidade inferior à PCR. (ZAGO et al., 2013, p. 303-305) CARACTERÍSTICAS BIOLÓGICAS DO TECIDO NEOPLÁSICO Algumas características biológicas do tecido neoplásico têm implicações clínicas de grande relevância. CINÉTICA DO CRESCIMENTO TUMORAL A taxa de crescimento do tecido neoplásico é determinada por um conjunto de fatores, que incluem a velocidade do ciclo celular, a taxa intrínseca de morte celular e a fração de crescimento. Os quimioterápicos atuam em diversas etapas do ciclo celular, por isso tumores altamente proliferativos são muito mais sensíveis aos quimioterápicos. A taxa de crescimento tumoral não é constante ao longo da vida da neoplasia; ela cresce lentamente no início, segue com uma rápida proliferação e por fim há um declínio gradual da taxa de crescimento do tumor, quase um platô, com acentuada redução da fração de crescimento, à medida que o tumor atinge o volume necessário para matar o hospedeiro. Por isso, a eficácia do tratamento é maior quando o diagnóstico é precoce, pois o número total de células ainda é limitado e a maioria das células está em ciclo celular. RESISTÊNCIA GENÉTICA O clone neoplásico se estabelece e evolui como resultado de uma sequência cumulativa de mutações genéticas. Por tanto, outra característica biológica das neoplasias é a alta taxa de mutações. À medida que novas mutações ocorrem no clone original, novos subclones mais proliferativos e menos sensíveis aos quimioterápicos se estabelecem, de forma análoga à conhecida resistência bacteriana aos antibióticos. Por esse motivo, a maioria das neoplasias é tratada desde o início com combinações de 3 ou mais drogas. A probabilidade de atingir o clone primárioe os novos subclones aumenta quando diversas drogas, com mecanismos de ação diferentes, são empregadas. (ZAGO et al., 2013, p. 305-306) INTRODUÇÃO À QUIMIOTERAPIA Os quimioterápicos são substâncias tóxicas que atuam em diversas etapas do ciclo celular. As drogas citotóxicas não têm seletividade pelas células neoplásicas, e atuam em todos os tecidos do organismo. Os tecidos com rápida proliferação celular são, como esperado, os mais atingidos, e essa é a razão da ocorrência frequente de toxicidade hematológica, sintomas gastrointestinais e queda de cabelos. DROGAS ANTINEOPLÁSICAS: CLASSIFICAÇÃO E MECANISMO DE AÇÃO ANTAGONISTAS DOS FOLATOS: competem com os folatos na captação pela célula, e também inibem diversas reações mediadas por coenzimas dos folatos. Ex.: metotrexate, pralatrexate. Efeitos colaterais mais comuns: mucosite e mielotoxicidade. ANÁLOGOS DAS PIRIMIDINAS E DAS PURINAS (ANTIMETABÓLITOS): Citarabina: é um análogo do nucleosídeo deoxicitidina, e age pela inibição da síntese nuclear de DNA. Usado no tratamento da leucemia mieloblástica e também em leucemias linfoblásticas e linfomas. 13 5-azacitidina e Decitabina: agem como falsos substratos e potentes inibidores das metiltransferases, levando à redução da metilação do DNA. Usadas (aprovadas recentemente) em pacientes com síndromes mielodisplásicas. Fludarabina, cladribina e pentostatina: induzem deficiência intracelular de Adenosino-Deaminase (ADA), enzima essencial no processamento fisiológicos das purinas. A cladribina e a pentostatina são antagonistas competitivos diretos da adenosina. Já a fludarabina causa também a redução da síntese do DNA pela inibição da ribonucleotídeo redutase e da DNA polimerase. As 3 drogas causam linfopenia intensa e prolongada. A fludarabina é muito usada nas doenças linfoproliferativas indolentes, e a cladribina é o tratamento de escolha da tricoleucemia. DROGAS ALQUILANTES E COMPOSTOS À BASE DE PLATINA: Os alquilantes e os compostos antitumorais à base de platina reagem com átomos ricos em elétrons, sobretudo nitrogênio e enxofre, nas moléculas de ácidos nucleicos. Essas reações produzem diversos efeitos, sendo o principal a formação de ligações cruzadas no DNA, que impedem a separação das fitas de DNA e interferem assim na replicação celular. Alquilantes ciclofosfamida, ifosfamida, melfalano, clorambucil usados para linfomas, mieloma múltiplo e leucemia linfocítica crônica. Procarbazina e dacarbazina usados no tratamento do linfoma de Hodgkin. Compostos à base de platina cisplatina (tem atividade em diversos tumores sólidos e em linfomas). Porém devido à nefrotoxicidade e neurotoxicidade causadas pela cisplatina, levaram ao desenvolvimento da carboplatina. ANTRACICLINAS E OUTROS INIBIDORES DE TOPOISOMERASES: Topoisomerases são enzimas que controlam o grau de enrolamento das fitas do DNA. As drogas que inibem essa enzima, agem da seguinte forma: ligam-se às topoisomerases, ao DNA ou a ambos simultaneamente, no sítio de ligação da enzima ao DNA, favorecendo a clivagem da dupla hélice ou impedindo a sua religação. Em ambos os casos, o resultado é a morte celular. Antraciclinas doxorrubicina (usada em linfomas), daunorrubicina (usada nas leucemias agudas), idarrubicina (LMA). Todas podem causar lesão cardíaca grave. Epipodofilotoxinas etoposide (usado para linfomas e para LMA) e teniposide (usado na leucemia linfoblásticas refretária). ALCALOIDES DA VINCA E OUTRAS TOXINAS DOS MICROTÚBULOS CELULARES: Alcaloides da vinca e taxanos são toxinas dos microtúbulos (fuso mitótico). Alcaloides da vinca vincristina (usado para linfomas e leucemias linfoides agudas, diversas neoplasias sólidas prevalentes na infância), vinblastina (usado para linfoma de Hodgkin, sarcoma de Kaposi). Todos induzem neurotoxicidade, mas principalmente a vincristina. Por outro lado, a vincristina apresenta menos mielotoxicidade, uma característica que favorece sua utilização em regimes com múltiplas drogas. Taxanos paclitaxel e docetaxel; apresentam atividade em diversos tumores sólido (ovário e mama), sua atividade em neoplasias hematológicas é baixa e não estão em uso terapêutico para essas doenças. OUTRAS DROGAS: duas outras drogas muito usadas em onco-hematologia não se enquadram em nenhuma das classes acima. Hidroxiureia: usado no tratamento de policitemia vera, mielofibrose, trombocitopenia essencial. Via oral e tem meia vida curta. Mecanismo de ação: bloqueia a enzima ribonucleotídeo redutase, o que resulta na inibição da síntese de desoxirribonucleotídeos. 14 Bleomicina: utilizado no tratamento do linfoma de Hodgkin. (ZAGO et al., 2013, p. 307-309) TERAPIAS INOVADORAS DIRIGIDAS A ALVOS MOLECULARES A maior limitação da quimioterapia é a sua falta de especificidade. Os medicamentos quimioterápicos agem indiscriminadamente sobre todas as células, em replicação rápida, seja elas normais ou neoplásicas. Um primeiro passo na direção de tentar direcionar a terapia para determinadas células foi a criação do anticorpo monoclonal anti-CD20, denominado rituximabe, aprovado pelo FDA em 1997 para o tratamento de linfomas de grandes células e desde então vem se expandindo para diversas outras neoplasias linfoproliferativas. O CD20 é uma molécula presente na superfície dos linfócitos B, e o rituximabe tem sua ação restrita a essas células (normais ou anormais, desde que apresentem o CD20). Embora produza linfopenia acentuada e persistente, não causa mielodepressão, mucosite ou alopecia. Há outros exemplos como o brentuximabe-vedotin (anticorpo anti-CD30 acoplado a uma droga anti-mitótica). Os inibidores da tirosinocinase (terapia-alvo) imatinibe, nilotinibe e desatinibe. (ZAGO et al., 2013, p. 309) ►PRINCIPAIS TOXICIDADES IMEDIATAS DA QUIMIOTERAPIA Mielossupressão: redução temporária da replicação celular na medula óssea. Monitorar paciente com hemogramas, especialmente antes da administração de cada novo ciclo. A complicação mais temida da mielotoxicidade é a neutropenia (especialmente se neutrófilos < 500/mm³ e o paciente apresentar febre). É a complicação mais temida, pois o risco de sépsis neutropênica é elevado, e a ausência de neutrófilos resulta em mascaramento das manifestações inflamatórias (dor, rubor, edema). Por isso, inicia-se antibioticoterapia profilática sem a certeza de que há uma infecção instalada. Anemia: pode ocorrer por vários fatores (mielotoxicidade, perda sanguínea, anemia imuno-hemolítica nos linfomas e na leucemia linfocítica crônica e anemia de doença crônica). Usualmente não requer a redução de doses ou retardo no tratamento, mas pode comprometer a qualidade de vida. Pode-se manejar uma anemia decorrente de mielotoxicidade com transfusões ou eritropoietina. Mucosite: como a mucosa que reveste o TGI também é um tecido de replicação intensa, ela também sofre com os efeitos da quimioterapia. Pode haver ardência na boca e na língua (podendo surgir úlceras orais), disgeusia ou ageusia. É possível também haver diarreia. O tratamento seria para alívio dos sintomas e prevenção de infecções; então, higiene oral, hidratação adequada e restrição de irritantes orais (sucos cítricos, álcool e condimentos). Náuseas e vômitos: efeitos pouco frequentes pela introdução de antagonistas do receptor de serotonina 5- HT3 que têm alta eficácia antiemética. Alopecia: Não traz riscos à saúde do paciente, porém pode ser fonte de angústia. Usualmente resolução espontânea após o término do tratamento. Infertilidade: a quimioterapia pode comprometer a fertilidade dos pacientes de ambos os sexos. Flebites e reações locais: os quimioterápicos que mais podem causar flebites são os alcaloides de vinca,os alquilantes e a decarbazina; essas drogas devem ser administradas diluídas em infusão rápida, de preferência por meio de cateter implantado em uma veia central. 15 Uma complicação mais grave é o extravasamento acidental do medicamento no tecido subcutâneo, pois as drogas citadas acima e também as antraciclinas têm capacidade de causar necrose tecidual. (ZAGO et al., 2013, p. 310-311) ►PRINCIPAIS EFEITOS TARDIOS DA QUIMIOTERAPIA Um dos efeitos mais temidos é o desenvolvimento de segundas neoplasias, seja mielodisplasias ou leucemia aguda nos primeiros anos após o tratamento, ou tumores sólidos nas décadas subsequentes. (ZAGO et al., 2013, p. 311) INTRODUÇÃO À RADIOTERAPIA Nas neoplasias hematológicas é utilizada principalmente no tratamento dos linfomas. Também é usada na profilaxia e no tratamento da infiltração do SNC em leucemia e linfomas. Mais raramente, a radioterapia pode ter um papel no tratamento paliativo de graves esplenomegalias associadas a infartos esplênicos nas neoplasias mieloproliferativas, no tratamento da compressão medular por massas de tecido hematopoético extramedular nas neoplasias mieloproliferativas. EFEITOS COLATERAIS Anorexia, náuseas, diarreia, alopecia na área irradiada e mielossupressão são efeitos esperados. Se a irradiação for no pescoço pode causar faringite e boca seca (se permanente pode ser um problema para a saúde dentária e qualidade de vida). Outros efeitos colaterais são pneumonia, pericardite, e a síndrome de Lhermitte, que é a sensação de choque elétrico nas pernas quando se faz a flexão da cabeça, possivelmente secundária à desmielinização. Essa síndrome é autolimitada e de resolução espontânea. (ZAGO et al., 2013, p. 312) 16 SUPORTE TRANSFUSIONAL DE PACIENTES COM NEOPLASIAS HEMATOPOÉTICAS CONCENTRADO DE HEMÁCIAS (CH) Está indicada para ↑ a oferta de O2 nos pacientes que apresentam anemia sintomática não responsiva às terapias específicas. A indicação transfusional deve levar em conta parâmetros clínicos e laboratoriais. A [Hb] pode fornecer indícios para indicação ou não. O transporte adequado de O2 para manter as funções metabólicas basais pode se dar com [Hb] > 7g/dL (hematócrito de 21%). Pacientes com 8g /dL estabilizados clinicamente em geral são assintomáticos. Elevar o nível de Hb a níveis > 10g/dL normalmente não traz benefício ao paciente. Os CH para utilização em pacientes com neoplasias hematológicas devem sofrer modificações que podem incluir: lavagem, desleucotização e irradiação. (ZAGO et al., 2013, p. 313) CONCENTRADO DE PLAQUETAS (CP) As transfusões de CP podem ser feitas com objetivos terapêuticos ou profiláticos. TRANSFUSÕES PROFILÁTICAS: Deve ser considerada quando o nível de plaquetas estiver < 10 mil/µL em pacientes sem complicações. Nos que apresentarem complicações (febre, infecções, alterações da coagulação ou que foram transplantados) é suficiente 20 mil plaquetas/µL para iniciar CP. Procedimentos invasivos do tipo punção lombar, anestesia epidural, implantação de cateter, biópsia brônquica ou hepática devem ser precedidos por transfusão de CP para elevar a contagem plaquetária acima de 50 mil/µL. Cirurgias que envolvam órgãos críticos (cérebro, olhos), necessitam de contagens plaquetária acima de 100 mil/µL. TRANSFUSÕES TERAPÊUTICAS: indicadas para pacientes plaquetopênicos ou com alterações funcionais plaquetária com sangramento importante em órgão interno (sangramento digestivo, pulmonar, no SNC). A quantidade transfundida deve permitir o incremento na contagem de plaquetas para mais de 50 mil/µL. (ZAGO et al., 2013, p. 313-314) TRANSFUSÃO DE GRANULÓCITOS É reservado para pacientes nas seguintes condições: - Granulocitopenia com menos de 500 granulócitos/µL - Febre persistente por 24 a 48 horas ou septicemia não responsivo ao uso adequado de antibióticos - Hipoplasia mielóide - Possibilidade de recuperação da função medular (ZAGO et al., 2013, p. 315) IRRADIAÇÃO Pacientes portadores de neoplasias hematológicas são imunossuprimidos em decorrência da própria doença ou do seu tratamento e, portanto, devem receber componentes sanguíneos celulares (CH e CP) irradiados para prevenir a Doença do Enxerto contra o Hospedeiro Transfusional (DEHT). (ZAGO et al., 2013, p. 315) 17 INFECÇÕES NO PACIENTE COM NEOPLASIA HEMATOLÓGICA. DIAGNÓSTICO, TRATAMENTO E PREVENÇÃO. Como muitas modalidades de tratamento estão associadas a graves defeitos na imunidade, esses pacientes passaram a apresentar infecções graves por germes que normalmente, em um imunocompetente, não causaria infecção ou a infecção é leve. Infecções oportunistas IDENTIFICANDO A IMUNODEFICIÊNCIA EM NEOPLASIAS HEMATOLÓGICAS As neoplasias hematológicas apresentam uma série de defeitos nos mecanismos de defesa. Essas alterações no sistema imune podem depender da doença de base, ou estar associadas às diferentes modalidades de tratamento oferecidas aos pacientes. Embora na maioria das vezes a imunodeficiência resulte de uma combinação desses dois fatores. Reconhecer qual fator predomina em certo momento pode ser de grande ajuda no manejo desses pacientes. (ZAGO et al., 2013, p. 317) Fonte: ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. 18 Saber que tipo de imunodeficiência predomina em um paciente ao diagnóstico e o potencial efeito do tratamento proposto na imunidade possibilitam antecipar a identificação do risco de infecção a que esse paciente está exposto. (ZAGO et al., 2013, p. 320) Exemplo na tabela a seguir. Fonte: ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. DIAGNÓSTICO Neutropenia é considerada como uma contagem de neutrófilos < 500/µL. Mas, em pacientes com contagem maior, que receberam quimioterapia recente com potencial de induzir neutropenia, devem ser considerados como neutropênicos. O paciente neutropênico tem particularidades na abordagem diagnóstica e terapêutica por 2 motivos básicos: os sinais e sintomas de infecção são discretos, muitas vezes inexistentes, e as infecções pode ser fatais!!! Desse modo, a abordagem universal é instituição de terapia empírica (antibioticoterapia profilática de amplo espectro ao primeiro sinal de febre). Entretanto, para se instituir terapia empírica é necessário conhecer os principais patógenos que acometem esses indivíduos e os locais mais frequentes de infecção. As principais portas de entrada para infecções nesse pacientes são pele, trato respiratório superior e TGI. Os germes mais comumente isolados variam em cada instituição e têm mudado nos últimos anos. (ZAGO et al., 2013, p. 322) 19 TRATAMENTO Na neutropenia febril, seguido ao diagnóstico inicia-se um esquema empírico antibiótico com o objetivo de evitar o óbito do paciente nas primeiras 48-72 horas, até que o resultado das culturas estejam disponíveis. Bactérias Gram-negativas são aquelas que podem causar morte precoce. (ZAGO et al., 2013, p. 325) Desse modo se utiliza antibióticos voltados para a cobertura a esses germes. Antibióticos β-lactâmicos indicados para monoterapia empírica em pacientes com neutropenia são: Ceftazidima, Cefepima, Imipenem, Meropenem e Piperacilina-tazobactam. Após o início do esquema empírico, o paciente deve ser avaliado diariamente. Em geral, a febre tende a desaparecer após quatro dias nos pacientes sem documentação de infecção, e mais tarde se houver documentação (cinco dias em bacteremias e mais de seis em infecções clinicamente documentadas). Assim, mudanças no esquema empírico antesde cinco dias raramente resultam em beneficio. Hemoculturas devem ser colhidas caso o paciente permaneça febril. Pacientes com febre e neutropenia persistentes estão em risco de desenvolver infecções fúngicas. Tradicionalmente se recomendava o início empírico de um antifúngico de amplo espectro após cinco a sete dias de febre persistente (terapia antifúngica empírica). Tal prática tem sido progressivamente substituída pela monitorização com biomarcadores (galactomanana). Nesse contexto, pacientes neutropênicos que apresentam galactomanana persistentemente negativa têm remota chance de estar com aspergilose invasiva. Assim, se o paciente está recebendo Fluconazol em profilaxia (candidíase), tem galactomananas persistentemente negativas e tomografia de tórax e seios da face normais, pode-se manter somente o Fluconazol e continuar a monitorização, sem trocar o antifúngico. A suspensão do esquema antimicrobiano depende se houve recuperação medular e se houve documentação de infecção MEDIDAS DE PREVENÇÃO As medidas de prevenção de infecção consistem em controle do ambiente, uso de antimicrobianos, bem como imunização passiva e ativa. Em relação à profilaxia antifúngica, os pacientes em expectativa de neutropenia prolongada e mucosite (por exemplo, em indução de remissão de LMA) deve receber profilaxia para candidíase invasiva. As melhores opções são Fluconazol, Posaconazol ou Voriconazol. Em relação à profilaxia antifúngica para fungos filamentosos (Aspergillus ), pacientes com leucemia aguda em indução podem se beneficiar do seu uso. Nesse caso, o Posaconazol é a droga aprovada para essa indicação. Profilaxia para reativação de herpes simplex é recomendada nos pacientes com LMA submetidos a quimioterapia de indução de remissão. (ZAGO et al., 2013, p. 328-329) 20 CLASSIFICAÇÃO DAS LEUCEMIAS AGUDAS. CITOLOGIA, CITOQUÍMICA, IMUNOFENOTIPAGEM, CITOGENÉTICA E GENÉTICA MOLECULAR. As leucemias agudas (LA) são hoje classificadas de acordo com o aspecto citomorfológico, citoquímico, imunofenotípico (por citometria de fluxo multiparamétrica) e citogenético. Estes dados permitem a estratificação prognóstica, asseguram a escolha da terapia mais adequada e auxiliam na monitoração após o tratamento. Atualmente existe uma classificação subsidiada pela OMS que estratifica as doenças em diferentes categorias e as define de acordo com a combinação da morfologia, imunofenótipo, aspecto genético-moleculares e síndromes clínicas. (ZAGO et al., 2013, p. 335) Fonte: ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. A porcentagem de blastos necessários para se concluir o diagnóstico de LMA foi fixada em 20%, tanto no sangue periférico quanto na medula óssea. (ZAGO et al., 2013, p. 335) 21 LEUCEMIA MIELOIDE AGUDA (LMA) NO ADULTO DEFINIÇÃO E EPIDEMIOLOGIA LMA constitui um grupo heterogêneo de doenças clonais caracterizadas pela proliferação anormal de progenitores hematopoéticos, os quais são incapazes de amadurecer e de responder aos reguladores naturais de proliferação e morte celular. Como consequência, essas células malignas se acumulam na medula óssea e prejudicam a produção normal das células sanguíneas, mas podem também se acumular em outros tecidos e órgãos, cujas funções são frequentemente comprometidas. (ZAGO et al., 2013, p. 343) [Outra definição] É um tumor de progenitores hematopoiéticos causado por mutações oncogênicas adquiridas que impedem a diferenciação, resultando na acumulação de blastos mieloides imaturos na medula. A interrupção no desenvolvimento mielóide conduz à falência da medula e a complicações relacionadas com anemia, trombocitopenia e neutropenia. (KUMAR et al., 2010, p. 629-630) LMA é o tipo mais frequente de leucemia aguda no adulto 90% dos casos. Em crianças < de 10 anos 15%. No Brasil a incidência de LMA é desconhecida, uma vez que o Inca relata apenas dados referentes às leucemias em geral. (ZAGO et al., 2013, p. 343) Um estudo retrospectivo desenvolvido no RS estimou a incidência em 1,11 caso de LMA/100mil habitantes/ano com base em registros hospitalares (CAPRA et al., 2007 apud ZAGO et al., 2013, p. 343). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Os sinais e sintomas apresentados pelos pacientes com LMA ao diagnóstico em geral são em consequência da falência da hematopoese e/ou da infiltração de tecidos por células leucêmicas. As manifestações a seguir são frequentes na LMA: Fadiga, palidez e fraqueza geralmente observados por conta da anemia Infecções em virtude da leucopenia Febre pode ser resultado de infecções ou da própria leucemia Hemorragias, petéquias e epistaxe decorrem pela trombocitopenia Hepatomegalia, esplenomegalia, linfadenopatia, hipertrofia de gengivas e dor óssea causados pela infiltração de órgãos e tecidos pelas células leucêmicas Cefaleia, convulsões ou alteração visual podem ser por infiltração do SNC Leucemia cútis é rara infiltração na pele (ZAGO et al., 2013, p. 343) ACHADOS LABORATORIAIS As contagens hematológicas são muito variáveis nos casos de LMA. Em mais da metade dos pacientes há leucocitose; mas hiperleucocitose (>100 mil/mm³) ocorre em menos de 20% dos casos. A leucocitose está frequentemente acompanhada por anemia e plaquetopenia (trombocitopenia). A anemia é na maioria das vezes normocrômica ou normocítica. 22 No sangue periférico com frequência são detectados mieloblastos. A detecção de 20% ou mais de mieloblastos entre os leucócitos do sangue periférico é considerado um dos critério da OMS, uma vez que a infiltração leucêmica pode ser detectável apenas na medula óssea em alguns casos (leucemia aleucêmica). A análise morfológica do aspirado de medula óssea revela: infiltração por mieloblastos (20% ou mais); a diminuição do número de células das outras linhagens hematológicas; e podem ocorrer também alterações qualitativas (displasias) em alguns casos. Pode ser detectado hiperuricemia devido a elevada produção e a lise de células tumorais. (ZAGO et al., 2013, p. 343-344) DIAGNÓSTICO De acordo com a OMS amostras de medula óssea (MO) e de sangue periférico (SP) devem ser obtidas antes de qualquer intervenção terapêutica. A detecção de pelo menos 20% de blastos leucêmicos em aspirado de MO ou em SP é necessária para o diagnóstico definitivo. Porém, existem casos em que o diagnóstico pode ser confirmado por meio da demonstração de determinados rearranjos gênicos, independentemente do percentual de blastos na MO ou no SP. (ZAGO et al., 2013, p. 344) Os mieloblastos típicos são células grandes (15 a 20 µm de diâmetro), cujo núcleo é arredondado ou irregular, com um padrão de cromatina reticulada e múltiplos nucléolos distintos. Eles apresentam pouco citoplasma, geralmente contendo finos grânulos azurófilos e podem conter um número variável de bastonetes de Auer (grânulos azurófilos anormais nos lisossomos). Os bastonetes de Auer são patognomônicos de LMA. Fonte: LONGO, Dan L. et al. Medicina interna de Harrison. 18 ed. Porto Alegre: AMGH, 2013. 1v. Além da análise morfológica, outras técnicas podem ser empregadas para determinar a linhagem hematopoética do blasto. Dentre as técnicas mais comuns estão as colorações citoquímica, a imunofenotipagem (muito importante, pois pode identificar blastos muito imaturos, que sem imunofenotipagem, utilizando análise morfológica e citoquímica, podem ser classificados erroneamente como linfoblastos). E também, a avaliação diagnóstica da LMA deve sempre incluir a análise genética, pois essas alterações são as que possuem maior correlação com o prognóstico e influenciam na estratégia terapêutica.(ZAGO et al., 2013, p. 344) População uniforme de mieloblastos primitivos com cromatina imatura, nucléolos em algumas células e grânulos citoplasmáticos primários. Mieloblasto leucêmico contendo um bastão de Auer 23 REFERÊNCIAS ZAGO, M. A. et al. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. BORGES-OSÓRIO, M. R.; ROBINSON, W. M. Genética Humana. 3 ed. Porto Alegre: Artmed, 2013. KUMAR, V. et al. Robbins e Cotran, bases patológicas das doenças. 8 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010. LONGO, Dan L. et al. Medicina interna de Harrison. 18 ed. Porto Alegre: AMGH, 2013. 1v.
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